O que acontece no nosso cérebro durante um crash do mercado
Artigo da autoria de Jason Zweig, originalmente publicado no Wall Street Journal de 19 de março de 2020
O que acontece no nosso cérebro durante um crash do mercado
Não são apenas os nossos portfólios que estão a ser massacrados. Nós também.
Todos os ativos financeiros estão a cair simultaneamente e a própria economia parece estar a implodir. Todos os investidores, individuais e profissionais - precisam de compreender o caos que este stress provoca no cérebro humano. De modo a impedir que destrua os nossos planos de investimento de longo prazo, precisamos de gerir este stress e restaurar uma sensação de controlo.
Um crash no mercado é sempre assustador, mas desta vez o medo e pânico de enormes perdas diárias são reforçadas pela ameaça de uma pandemia global. Enquanto os mercados caem e o vírus se dissemina, muito de nós observam esta situação num isolamento social sem precedentes, incapazes de estar com a família e amigos que normalmente nos ajudam a pôr estes eventos em perspetiva.
Tudo isto desencadeia uma tempestade nos nossos cérebros. Compreender isto poderá ajudar-nos a acalmá-la.
"O stress diminui os investidores, torna-os uma versão mais pobre de si próprios", diz Peter Sokol-Hessner, um neurocientista cognitivo da Universidade de Denver. "Faz com regressemos a métodos mais simples de abordar o mundo que nos rodeia. Temos uma capacidade reduzida de utilizar as nossas experiências e conhecimento para tomar decisões inteligentes em novas circunstâncias".
O stress coloca o nosso corpo e cérebro em alerta vermelho: adrenalina e noradrenalina correm na nossa corrente sanguínea, a pulsação acelera, a pressão sanguínea sobe, a respiração torna-se ofegante e a sudação aumenta. O nosso córtex pré-frontal, a área do cérebro responsável pelo planeamento de longo prazo, torna-se menos ativo. Os músculos retesam-se. O corpo liberta cortisol, aumentando os níveis de açúcar no sangue e mobilizando a nossa energia armazenada.
"À medida que o nosso corpo se prepara para responder à ameaça com a resposta "lutar ou fugir", isso afeta a nossa cognição e perceção", observa Maurício Delgado, psicólogo na Universidade Rutgers em Newark, New Jersey.
Se, por exemplo, estivermos a ver, nos canais financeiros, os mercados a colapsar, podemos nem sequer reparar que um familiar entrou na sala e está a falar connosco. Essa visão afunilada pode tornar-nos cegos às boas notícias que podem estar já a desenvolver-se na periferia desta calamidade.
Entretanto, o stress intensifica tudo o que é negativo. "À medida que a sensibilidade às ameaças aumenta, tendemos a enviesar as nossas previsões para o que de mau pode acontecer", diz Candace Raio, neurocientista cognitiva da NYU Langone Health em New York.
E isto pode estilhaçar a nossa capacidade de pensar por nós próprios. "na busca da forma mais rápida de resolver a incerteza e assegurar a segurança e sobrevivência", declara a Dra. Raio, "corremos o risco de dar mais peso ao que os outros estão a fazer do que à informação objetiva à nossa frente".
O stress também restringe a nossa memória operacional, restringe a variedade de escolhas que levamos em conta na tomada de decisões e aumenta a ativação da amígdala, a região do cérebro que responde ao perigo.
"Qualquer tipo de stress - leve, severo, crónico ou agudo - debilita a nossa capacidade de pensar com flexibilidade, de recorrer às funções do córtex pré-frontal, de exercer o controlo executivo", diz Elizabeth Phelps, neurocientista na Universidade de Harvard.
Mais uma razão porque é tão importante assegurarmo-nos que as nossas decisões resistirão ao teste do tempo.
Algumas técnicas poderão ser úteis.
Em primeiro lugar, tome controlo de tudo o que estiver ao seu alcance. "Quando as pessoas percebem que têm algum controlo sobre o seu ambiente", observa o Prof. Delgado, "essa simples crença pode ajudá-las a persistir na prossecução dos seus objetivos".
Decida, portanto, o que vai fazer quando os mercados estiverem fechados, para impedir que o pânico dos outros domine as suas decisões.
E dê pequenos passos, não grandes saltos.
Se acha que apenas se consegue acalmar vendendo algumas ações, venda um montante fixo ou uma percentagem a cada mês durante o próximo ano. Automatize este processo com o seu corretor através de transferências eletrónicas. Isto retirará as emoções da decisão.
Com a ajuda do seu contabilista, poderá vender ações que caíram abaixo do preço de compra. Isto transformará algumas das perdas em dinheiro - e abate às mais valias já realizadas ou por realizar.
Tal como escrevi em 2008, tente reavaliar a situação: "Esqueça o que pagou por aquela ação ou fundo; imagine que foi um presente. agora que cota a menos 20% do que em dezembro, vai querer devolver o presente? Ou deverá comprar mais enquanto está em saldo? (Se repensar um preço que caiu desta forma não o faz sentir-se melhor, provavelmente deveria vender)."
Combata, como puder, o contágio do stress das outras pessoas. Warren Buffett, dizem, acalma-se a si próprio olhando para os retratos da sua família.
O isolamento social é uma ameaça, não só para o seu portfólio, mas também para a sua saúde mental. Sem contacto social normal, é muito mais difícil as pessoas regularem as suas emoções, diz Jamil Zaki, psicólogo social na Universidade de Stanford.
Ainda que nos isolemos para combater o coronavírus, é vital que nos mantenhamos tão conectados quanto possível com amigos, família, mentores e pessoas que admiramos. "Precisamos de estar fisicamente separados, mas unidos psicologicamente", diz o Prof. Zaki. "Isto significa utilizar a tecnologia para criar uma experiência partilhada."
Por isso, não telefone a um amigo apenas para dizer olá. Faça uma visita guiada - em vídeo - ao seu escritório em casa, sincronize as horas das refeições, faça uma reunião de um clube do livro - tudo o que lhe permita partilhar um momento de acalmia com alguém que é importante para si.