Espelho meu, espelho meu, quem previu a queda nas ações?
Artigo de Jason Zweig, publicado originalmente em The Wall Street Journal em 16 de dezembro de 2022
Espelho meu, espelho meu, quem previu a queda nas ações?
Os leitores do The Wall Street Journal tentaram recentemente recordar-se do que esperavam, há um ano, que os mercados fizessem em 2022. Acontece que eles estavam a iludir-se - e pode acontecer o mesmo connosco.
Três das palavras mais dolorosas no investimento são "se ao menos...".
Se ao menos tivéssemos prestado atenção à voz na nossa cabeça que nos dizia que a inflação ia destroçar todos os níveis máximos recentes e que as ações de energia iriam disparar. Se ao menos, quando a Reserva federal começou a subir as taxas de juro, tivéssemos resgatado todos os fundos de obrigações e fechado a aposta nas criptomoedas. Se ao menos tivéssemos agido quando nos palpitou que as ações de tecnologia estavam sobreavaliadas e as tivéssemos vendido antes que caíssem.
Se ao menos tivéssemos dado ouvidos ao nosso instinto, não teríamos as perdas que temos hoje. Se ao menos tivéssemos tido a coragem de agir de acordo com a nossa visão e discernimento...
Se ao menos...
Incontáveis palpites e pressentimentos passam pela nossa consciência ao longo de um ano. Só nos recordamos, naturalmente, daqueles que se revelaram acertados. A multidão dos outros palpites que acabaram por se revelar errados vão para a nossa lata de lixo mental.
Revisitando os nossos "eus" de há um ano, o que sabemos agora alterou indelevelmente a nossa perceção do que sabíamos à data.
Este padrão, a que os psicólogos dão o nome de "viés retrospetivo", faz-nos sentir que já sabíamos o que ia acontecer, que o que aconteceu era inevitável e que quem foi surpreendido pelos acontecimentos, não passa de um idiota. Isto é quase irresistível - e é uma ilusão.
É por isto que recomendo um exercício anual que chamo de Hindsight Bias Buster.
Há quase exatamente um ano, na newsletter que escrevo para o The Wall Street Journal, pedi aos subscritores que previssem, para a data de 31 de dezembro de 2022:
- o valor de fecho do Dow Jones Industrial Average;
- o retorno total do S&P 500;
- a yield das notas do Tesouro dos EUA a 10 anos;
- a taxa anual de inflação;
- o preço da bitcoin;
- o preço do ouro;
- o preço do petróleo;
- e o principal ativo financeiro com a melhor performance.
No início deste mês, pedi aos subscritores que recordassem as suas previsões de há um ano - ou o que eles teriam previsto.
Os leitores que tentaram reconstruir as suas projeções anteriores afirmaram, em média, que previram que o Dow fechasse 2022 nos 34.269 pontos e que o S&P 500 cairia 1%. (No dia anterior ao envio do inquérito deste ano, o Dow fechou nos 33.947 e o S&P 500 estava a cair 14,8%.)
Os leitores estimaram, em média, que teriam previsto que os yields das notas de tesouro atingiriam os 3% e que a bitcoin atingiria cerca de 30.850 dólares. (O Tesouro a 10 anos rendeu 3,6% no dia anterior, acima dos 1,4% na altura do inquérito original. A Bitcoin cotava a 16.970 dólares - abaixo dos 46.900 dólares, um ano antes.)
Em tempo real, no final de 2021, os leitores previram que o Dow terminaria 2022 nos 36.853 pontos, em média, e que o S&P 500 ganharia 6% - muito mais do que agora se lembram. Previram também que as taxas de juros atingiriam os 2% e esperavam que o preço da bitcoin chegasse aos 53.900 dólares. Apenas um único leitor previu que o sector da energia, que subiu quase 60% até agora em 2022, teria a melhor performance.
Tom Raycroft, 65 anos, é um limpador de chaminés reformado em Alexandria, Virgínia. No inquérito do ano passado, ele previu que o Dow atingiria os 42.000. Quando lhe pedi para recordar a previsão que tinha feito, ele respondeu. "aí pelos 37.000 pontos
Isto foi um dia depois do Dow ter fechado acima de 34100. "Depois de vermos as coisas acontecer, ficamos com essas ideias ancoradas", disse o Sr. Raycroft. "Já vimos a resposta."
Adam Jones, 46 anos, é engenheiro da indústria de petróleo e gás de Houston. Esta semana, ele disse-me que teria previsto há um ano o Dow terminaria 2022 nos 34.000, o S&P 500 subiria 5%, na melhor das hipóteses e as taxas de juros subiriam para 3% a 5%.
Na verdade, ele previu, no ano passado, que o Dow atingiria 40.000 pontos, o S&P 500 subiria 33% e os rendimentos das obrigações subiriam apenas para 2,1%.
"Uau, uau", exclamou o Sr. Jones quando lhe li as suas respostas originais.
"Obviamente, a minha avaliação do mercado de ações na época foi amplamente influenciada pelo que o mercado estava a fazer até aquele momento", disse ele. "E agora estou a ajustar as minhas projeções anteriores ao conjunto atual de dados! É muito interessante ver como o meu pensamento é influenciado pelo que aconteceu desde então."
O verdadeiro significado do presente está quase sempre oculto até que se torna passado - e nessa altura, já não somos capazes de reconstruir o nosso estado anterior de ignorância.
Isto faz com que seja muito fácil iludirmo-nos e ficarmos convencidos que já sabíamos o que ia acontecer - o que, por sua vez, pode iludir-nos a pensar que sabemos o que vai acontecer a seguir.
Portanto, invista um momento agora para responder às perguntas acima, desta vez com o que acha que os mercados farão em 2023. Guarde as respostas num local seguro.
Daqui a um ano, olhe para as suas respostas. De repente, o que parecia óbvio pode parecer obscuro; responsabilidades que pareciam claras, tornam-se ambíguas; certezas podem parecer tolices.
E o leitor terá dado um grande passo em frente como investidor.