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Aos nossos Clientes,
"As nossas experiências pessoais com o dinheiro representam talvez 0,00000001% do que aconteceu no mundo, mas representam cerca de 80% de como julgamos que o mundo funciona."
Morgan Housel
Desde o primeiro dia, há 10 anos, que consideramos que a comunicação direta e objetiva com os nossos Clientes é importante porque nos dá a oportunidade de explicar a nossa estratégia de investimento, o que fazemos e os resultados que conseguimos, sem que os nossos Clientes tenham que adivinhar ou especular sobre as nossas decisões de alocação de capital. Fazê-lo é especialmente importante quando as coisas correm mal ou cometemos erros, o que acontecerá de tempos a tempos, uma vez que pode evitar que os nossos Clientes tomem decisões que os prejudicam e que põem em causa uma estratégia bem estruturada de criar valor a longo prazo. Por isso, não são apenas as cartas trimestrais que escrevemos, e o Relatório & Contas anual, mas também as cartas que escrevemos sempre que há eventos que consideramos relevantes e que poderão contribuir para que os Clientes aproveitem oportunidades que o pessimismo produz. É nestas alturas que os bons negócios se conseguem comprar em saldo. Também sabemos que é nestas alturas que os investidores têm medo e preferem estar em dinheiro. É por isso que investir não é fácil.
Esta é também a oportunidade para explicar algumas das lições que aprendemos:
A primeira é que a estratégia de investimento em negócios de qualidade excecional funciona. O nosso objetivo é encontrar negócios excecionais a preços razoáveis e fugir dos negócios razoáveis a preços excecionais. Como somos investidores de longo prazo, os primeiros rapidamente ganharão vantagem.
A segunda é que não precisamos de adivinhar o mercado ou estar certos todos os dias.
A terceira é que quanto maior for a liquidez disponível em carteira, menor será o retorno dos nossos investimentos.
O pior investimento de todos
Quando pensamos em classes de ativos arriscadas, tendemos a pensar em ações. O imobiliário e as obrigações são vistos como pouco arriscados. O dinheiro nem aparece nesta lista. No entanto, o dinheiro é a classe de ativos com a pior performance da história. Ao longo de prolongados períodos de tempo, o dinheiro teve sempre piores performances face a todas as classes de ativos. Imagine que deposita 100 mil euros no banco a uma taxa anual de 1% a 10 anos. Poderá pensar que ganhou dinheiro, mas na realidade perdeu poder de compra. Esta é a ilusão de segurança, perigosa, que o dinheiro transmite. Os juros que ganhou não acompanharam o preço de um pão, uma barra de chocolate, cuidados de saúde ou educação.
A razão pela qual muitos investidores mantêm dinheiro em carteira é para tentar adivinhar o mercado e a melhor altura para entrar. Fazem-no apesar de não existir qualquer estudo, no mundo real, que demonstre que sair do mercado e ficar em dinheiro e depois reentrar no mercado repetidamente funciona. No fim de contas, é preciso acertar quando sair e depois quando entrar e fazê-lo uma e outra vez. Se errar uma única vez, pode ser o fim e a performance de longo prazo ficar irremediavelmente comprometida. Este tipo de estratégia de investimento por feeling garante, a quem o faz, custos mais elevados de transação e maiores penalizações fiscais (se conseguir ganhar dinheiro).
Finalmente, muitos investidores mantêm dinheiro em carteira para o caso de uma catástrofe financeira, uma situação em que os mercados vão a zero, ou lá perto, e nunca mais recuperam. Na realidade, se vivêssemos num mundo em que a Walmart, a Nike, a McDonald's, a Microsoft, a Nestlé ou a Google e o resto das maiores empresas do mundo caíssem e nunca mais recuperassem, o mais provável é que a maior parte dos países entrariam em incumprimento nas suas obrigações (dívida). Como poderiam os governos arcar com o serviço da sua dívida se as maiores empresas colapsassem? Quem estaria a trabalhar e a pagar impostos para cobrir o serviço da dívida? Nesta situação, o dinheiro não valeria nada, uma vez que as garantias de depósitos (da FDIC, SII e outras instituições do género) seriam essencialmente inúteis.
O dinheiro dá conforto às pessoas, uma vez que não se mexe. É fácil de compreender e a cotação não cai. Mas a história tem mais que se lhe diga. Embora o dinheiro traga conforto, perde poder de compra constantemente, pesa nos retornos dos investimentos de longo prazo e, no evento de um verdadeiro colapso económico, não tem valor.
Manter reservas de curto prazo é uma boa ideia. Açambarcar dinheiro como investimento de longo prazo, não.
Porque é importante que este conhecimento chegue às pessoas?
As pessoas ainda precisam que lhes digam que devem poupar e investir melhor? Precisam.
A esperança média de vida continua a aumentar, os rendimentos do trabalho têm contraído a nível mundial e as taxas de juro estão perto de zero por tempo indeterminado, tornando estes investimentos ridículos. São estes instrumentos de taxa fixa que constituem a maioria das poupanças dos aforradores portugueses.
Garantir os meios pelos quais as pessoas possam viver confortavelmente as suas reformas é um dos maiores desafios globais que o mundo desenvolvido enfrenta no Séc. XXI. Embora do conhecimento dos legisladores, demasiadas pessoas mantêm-se alheias ao fosso crescente entre os benefícios financeiros de que os pensionistas de amanhã vão precisar (e que lhes foram prometidos) e os ativos que existem atualmente para fazer face a essas necessidades crescentes.
Num país gerido sem margem de segurança é ainda mais urgente motivar os aforradores para o investimento a longo prazo em ações de boas empresas mundiais.
Lançamento do Fundo Casa Global Value PPR 100% ações - classe FOUNDERS
Foi com esta preocupação e vontade de contribuir para ajudar as pessoas a entender melhor e a beneficiar de uma filosofia de investimento em valor a longo prazo que lançámos, no dia 1 de outubro passado, o Fundo Casa Global Value PPR 100% Ações.
O nosso objetivo é criar uma legião de investidores em valor que se identifique com a ideia de que só seremos verdadeiramente livres para tomar decisões se formos economicamente livres.
A filosofia de investimento e a carteira em que investimos os valores do fundo são iguais às da gestão de carteiras. Utilizando como referencial o período 31-12-2011 a 31-12-2019, e como resultado das diferentes vantagens elencadas, a rentabilidade líquida de todos os encargos e tributações teria sido superior em 2,5 pontos percentuais por ano no caso do fundo PPR quando comparado com a gestão discricionária.
Só as melhores empresas servem
Como identificar estes negócios e que tipo de características deverá um investidor procurar?
Warren Buffett refere, na sua estratégia de investimento, cinco características partilhadas por negócios excecionais:
- Vantagens competitivas duradouras - isto é, o negócio tem barreiras à entrada que dificultam a sua substituição por concorrentes,
- A qualidade da gestão - a empresa é gerida por pessoas honestas e capazes, que procuram maximizar os interesses dos acionistas,
- Balanços sólidos,
- Retornos sobre os capitais investidos acima da média,
- Capacidade de alocação de capital, nomeadamente se a empresa tem a capacidade de reinvestir o excesso de capital em projetos de crescimento com rentabilidades acima da média.
As empresas capazes de reunir estes cinco atributos são os melhores negócios, e os que nos permitem a melhor relação de risco-retorno. Nos últimos 10 anos, temos assistido a muitos exemplos de quedas abruptas e indiscriminadas nos mercados acionistas. Para os investidores cuja atuação é ditada pela razão, ao invés da emoção, a volatilidade é uma grande aliada para criar riqueza.
De que não gostar nesta estratégia de investimento?
A resposta é que tudo se resume ao conhecimento e temperamento do investidor. Para muitos, o investimento deve ser excitante e aventureiro. Quem julga que o mercado acionista é um casino, começa com a perspetiva errada. A boa prática de investimento requer humildade, conhecimento, resistência e um horizonte de investimento de longo prazo.
Hoje parece que já todos sabem como investir. Comprar o que está a dar, seguir a tendência e esperar que se encontre um "tolo maior", alguém que deseje ainda mais estas ações do que os próprios. O futuro encarregar-se-á de mostrar quem está a investir e quem esteve a especular.
Ignorar as cotações de mercado a maior parte do tempo é essencial para conseguir bons retornos. Só devemos agir quando nos cotam o preço de compra que nos permite comprar qualidade a desconto ou o preço de venda que nos permite vender consideravelmente acima do valor intrínseco.
A pandemia e a crise económica resultante
A pandemia Covid-19 marcou o ano de 2020 e lançou a economia global na pior recessão desde a segunda guerra mundial. Esta recessão está a ter uma série de características que justificam a rápida recuperação a que assistimos nos mercados acionistas.
Em primeiro lugar, a intervenção das autoridades monetárias e fiscais foi rápida e numa escala sem precedentes. Esta atuação das autoridades levou a que esta crise se assemelhe mais a uma crise resultante de uma catástrofe: um impacto elevado causado por uma interrupção abrupta da atividade, seguido de uma reposição rápida dos níveis de atividade.
Em segundo lugar, as empresas não foram igualmente afetadas nesta crise, que recaiu de forma desproporcional sobre os setores de turismo, transportes, restauração e entretenimento. As restantes empresas mantiveram a sua atividade e muitas já estavam a crescer no final do ano face ao ano anterior. Note-se que as empresas do índice norte-americano S&P500 já estavam a registar no último trimestre um nível de resultados semelhante ao do final de 2019 (ou seja, estão a crescer face aos números pré-pandemia).
Em terceiro lugar, as intervenções monetárias têm afetado principalmente os preços das obrigações, levando as taxas de juro para níveis incomparavelmente baixos, que não remuneram de todo o risco que um aforrador tem em emprestar as suas poupanças a um governo ou empresa. Tal tem o efeito de criar condições de financiamento altamente favoráveis, aliviar as entidades mais endividadas e reforçar a ideia de que não há alternativa às ações para rentabilizar o capital a médio e longo prazo. Esse efeito tem ajudado a evitar falências e até as obrigações de alto risco negoceiam a taxas que não refletem de todo o momento do ciclo que vivemos.
A carteira de investimentos
A carteira de investimentos que hoje temos tem uma qualidade muito acima da média dos índices e um potencial de valorização muito superior. Estamos investidos em alguns negócios onde as famílias mais ricas do mundo têm posições relevantes e o controlo da gestão. A carteira transaciona a cerca de 15,5x os resultados esperados para 2022, comparando com níveis de cerca de 20x para um índice global para o mesmo período.
A média do retorno dos capitais próprios das empresas em carteira ronda os 18%, o que compara com cerca de 12% para um índice global. E nos últimos três anos, as vendas das empresas em carteira cresceram a uma taxa próxima de 4% ao ano, mesmo num contexto de pandemia em que a taxa de crescimento foi negativa para a maior parte do universo empresarial. É de esperar que nos próximos três anos, com a saída da atual recessão, estas empresas registem crescimentos superiores. Ora é na conjugação de crescimento com elevadas taxas de retorno de capital (que significam que a empresa não tem de investir muito para sustentar a sua expansão) que assenta o mecanismo de criação de valor que permite que estas empresas continuem a gerar elevados retornos para o acionista. Estes são motivos que nos permitem estar otimistas quanto aos retornos que a carteira produzirá a prazo.
Fique connosco para o longo prazo. Muito obrigada pela sua confiança. Estamos sempre ao seu dispor.
Com os melhores cumprimentos e elevada estima,
Emília O. Vieira
Chief Executive Officer
Carta de Jeff Bezos aos acionistas da Amazon, publicada a 15 de abril de 2021.
Aos nossos acionistas:
Na carta da Amazon aos acionistas de 1997, a nossa primeira carta, falei acerca da nossa esperança em criar uma "empresa duradoura", que reinventasse o que significa servir um cliente através do poder da internet. Observei que a Amazon tinha crescido de 158 para 614 colaboradores e que tínhamos ultrapassado os 1,5 milhões de contas de clientes. Tínhamos acabado de cotar na bolsa a um preço ajustado de 1,5 dólares por ação. Escrevi também que era o Dia 1.
Desde então, já percorremos um longo caminho e estamos a trabalhar mais do que nunca para servir e deliciar clientes. No ano passado, contratámos 500 000 funcionários e empregamos agora 1,3 milhões de pessoas em todo o mundo. Temos mais de 200 milhões de clientes Prime pelo mundo inteiro. Mais de 1,9 milhões de pequenas e médias empresas vendem produtos na nossa loja e representam cerca de 60% das nossas vendas a retalho. Os clientes ligaram mais de 100 milhões de casas aos nossos dispositivos Alexa. Amazon Web Services serve milhões de clientes e terminou 2020 com uma receita anualizada de 50 biliões de dólares. Em 1997, ainda não tínhamos inventado Prime, Marketplace, Alexa ou AWS. Não eram sequer ideias ainda e nenhuma delas estava predestinada. Corremos enormes riscos em cada uma e canalizámos suor e engenho em cada uma delas.
Pelo caminho, criámos 1,6 triliões de dólares de riqueza para os acionistas. Quem são eles? O vosso CEO é um deles e as minhas ações da Amazon tornaram-me rico. No entanto, mais de 7/8 das ações, que representam 1,4 triliões de riqueza, são propriedade de outros. Quem são eles? São fundos de pensões, universidades, planos de poupança reforma e são a Mary e o Larry, que me enviaram esta carta, precisamente na altura em que me preparava para escrever esta carta aos acionistas:
5 de março de 2021
Mr. Jeff Bezos
Executive Chairman
Amazon.com Inc.
410 Terry Avenue North
Seattle, WA 98109
Caro Sr. Bezos,
Obrigado por fazer da Amazon uma empresa excecional! Acreditamos que gostaria de saber como a Amazon beneficiou a nossa família.
Em 1997, quando a Amazon entrou em bolsa, o nosso filho Ryan tinha 12 anos e era um leitor voraz. No aniversário dele, oferecemos-lhe duas ações da sua empresa que vendia livros - não tínhamos dinheiro para mais na altura. Passado um ano, as ações tiveram um stock split de 2 para 1, depois de 3 para 1 e finalmente de 2 para 1 e o Ryan ficou com 24 ações. As ações estavam em nosso nome devido à sua idade. Pretendíamos colocá-las em nome dele, mas nunca chegámos a fazê-lo, mas ele sabia que eram dele.
Por várias vezes, ao longo dos anos, o Ryan quis liquidar as ações, mas sempre lhe dissemos que lhas comprávamos. Depois, eventualmente, acabávamos por lhas oferecer novamente. Era uma espécie de piada privada na família.
Dado o crescimento exponencial no valor das ações, decidimos dividi-las entre nós próprios e ambos os nossos filhos, Ryan e Katy.
O Ryan vai comprar casa este ano e gostaria de vender algumas ações. Antes de as vender, tivemos que converter os certificados originais em papel para um formato digital. Reparámos que o primeiro certificado tinha um número extremamente baixo. Nem consigo imaginar quantas mais ações foram emitidas desde essa data!
Anexo uma cópia do certificado original das ações de 1997 - há 24 anos. Essas duas ações tiveram uma influência maravilhosa na nossa família. Todos nós adoramos testemunhar o crescimento da Amazon ano após ano e esta é uma história que adoramos contar.
Parabéns pela sua carreira como CEO da Amazon. Nem conseguimos imaginar o esforço e o trabalho que o Sr. Bezos e a sua equipa tiveram que fazer para tornar a Amazon na empresa mais bem-sucedida e inventiva do planeta. Desejamos que tenha agora tempo para relaxar e para fazer as coisas que deseja fazer, tal como explorar o espaço!
Mal podemos esperar para ver onde a Amazon vai entregar de seguida! No Dia Seguinte em Marte!
Com os melhores cumprimentos,
Mary e Larry
Recebo constantemente histórias parecidas. Conheço pessoas que utilizaram o dinheiro das ações Amazon para a universidade, para emergências, casas, férias, para dar início à sua empresa, para ajudar os outros - e a lista é interminável. Tenho muito orgulho na riqueza que criámos para os acionistas. É significativa e melhora as suas vidas. No entanto, estou seguro de outra coisa: este não é o maior quinhão do valor que criámos.
Crie mais do que consome
Se queremos ser bem-sucedidos nos negócios (na realidade, na vida), temos que criar mais do que consumimos. O nosso objetivo deverá ser criar valor para todos aqueles com quem interagimos. Qualquer negócio que não crie valor para as pessoas com que entra em contacto, mesmo que aparente ter sucesso à superfície, não perdurará. Está de saída.
Recordemos que os preços das ações não têm a ver com o passado. Os preços das ações são uma previsão dos cash flows futuros descontados para o presente. O mercado de ações antecipa. Permitam-me falar um pouco do passado. Quanto valor criámos para os acionistas em 2020? Esta é uma questão relativamente fácil de responder uma vez que existem sistemas contabilísticos preparados para isso. O nosso lucro em 2020 foi de 21,3 biliões de dólares. Se, ao invés de ser uma empresas publicamente cotada com milhares de donos, a Amazon tivesse um único dono, esse teria sido o lucro que o dono arrecadaria em 2020.
E os funcionários? Esta também é uma pergunta relativamente fácil de responder uma vez que podemos consultar os gastos com pessoal. Em 2020, os funcionários ganharam 80 biliões de dólares, a que se somam mais 11 biliões de dólares em benefícios e impostos, para um total de 91 biliões de dólares.
E quanto aos vendedores na nossa loja? Temos uma equipa (Selling Partner Services) que trabalha para responder a esta questão. Estimam que, em 2020, os lucros das suas vendas nas nossas lojas foram entre 25 e 39 biliões de dólares. Sendo conservador, levamos em consideração os 25 biliões de dólares.
Para os clientes, temos que os dividir entre clientes consumidores e clientes AWS.
Primeiro, os consumidores. Oferecemos preços baixos, uma vasta seleção e entregas rápidas, mas imaginemos que, para o propósito desta estimativa, ignoramos tudo isto e avaliamos apenas uma coisa: poupamos tempo aos nossos clientes.
Os clientes completam 28% das compras na Amazon em três minutos ou menos e metade de todas as compras são concluídas em menos de 15 minutos. Se compararmos isto a uma típica saída às compras numa loja física - conduzir, estacionar, procurar nas estantes da loja, esperar na caixa, encontrar o carro no parque e regressar a casa. Estudos sugerem que a típica viagem à loja demora cerca de uma hora. Se assumirmos que uma compra típica na Amazon demora 15 minutos e que nos poupa um par de viagens a uma loja física, isto significa uma poupança de mais de 75 horas por ano. Isto é importante. Neste início do Séc. XXI, estamos todos muito ocupados.
Para que possamos chegar a um número em dólares, vamos avaliar a poupança no tempo em 10 dólares por hora, um número conservador. Setenta e cinco horas multiplicadas por dez menos o custo do Amazon Prime resulta numa criação de valor para cada membro do Prime de cerca de 630 dólares. Temos 200 milhões de membros Prime e uma criação de valor, em 2020, de 126 biliões de dólares.
É difícil estimar a criação de valor na AWS uma vez que as exigências de cada cliente são tão diferentes, mas vamos tentar de qualquer maneira, reconhecendo à partida que as margens de erro são elevadas. As reduções de custos diretos devidas à operação de servidores na cloud em vez de localmente variam enormemente, mas uma estimativa razoável é de 30%. Com base nas receitas da AWS de 2020, 45 biliões de dólares, esses 30$ significam uma criação de valor para os clientes de 19 biliões (o que lhes custaria 64 biliões de dólares isoladamente, custa-lhes 45 biliões com a AWS). A parte difícil deste exercício de estimativa é que a redução de custos direta é a porção mais pequena do benefício que o cliente consegue ao mudar-se para a cloud. O maior benefício é o aumento na velocidade de desenvolvimento de software - algo que pode melhorar significativamente a competitividade e lucros do cliente. Não temos qualquer forma razoável de estimar essa porção de criação de valor para o cliente exceto dizer que é quase certo que é superior à poupança nos custos diretos. Sendo conservadores (e tendo em mente que estamos apenas a tentar chegar a valores aproximados), diria que é equivalente e que a criação de valor da AWS para o cliente, em 2020, foi de 38 biliões.
Somando a AWS e os consumidores dá-nos um total de criação de valor para o cliente, em 2020, de 164 biliões de dólares.
Resumindo:
Acionistas: 21 biliões de dólares
Funcionários: 91 biliões de dólares
Vendedores: 25 biliões de dólares
Clientes: 164 biliões de dólares
Total: 301 biliões de dólares
Se cada grupo tivesse uma demonstração de resultados representando as suas interações com a Amazon, os números acima seriam os "lucros" dessas demonstrações de resultados. Estes números são parte da razão pela qual estas pessoas trabalham para nós, pela qual os vendedores vendem através da nossa plataforma e pela qual os clientes compram na nossa loja. Nós criamos valor para eles. E esta criação de valor não é um jogo soma zero. Não é apenas mover dinheiro de um bolso para outro. Se desenharmos um círculo à volta de toda a sociedade, descobrimos que a invenção está na raiz de toda a verdadeira criação de valor. E o valor criado é, no fundo, uma métrica para a inovação.
Obviamente que a nossa relação com estes parceiros e o valor que criamos não é medido exclusivamente em dólares e cêntimos. O dinheiro não conta a história toda. A nossa relação com os acionistas, por exemplo, é relativamente simples. Eles investem e mantêm as ações em carteira pelo tempo que desejarem. Fornecemos instruções aos acionistas pouco frequentemente em matérias como reuniões anuais e o processo para votar com as suas ações. E mesmo assim, os acionistas podem ignorar essas instruções e simplesmente não votar.
A nossa relação com os funcionários é um exemplo muito diferente. Temos processos que eles seguem e padrões que respeitam. Exigimos formação e vários certificados. Os funcionários devem marcar presença nos horários estabelecidos. As nossas interações com os funcionários são numerosas e são complexas. Não se limitam ao salário e benefícios. Têm também a ver com outros detalhes da relação.
Será que o vosso CEO está satisfeito com o desfecho da recente votação do sindicato em Bessemer? Não, não está. Acho que devemos fazer mais pelos nossos funcionários. Embora a votação tenha sido desequilibrada e a nossa relação direta com os funcionários seja forte, é evidente para mim que precisamos de uma visão melhor para a forma de criar valor para os funcionários - uma visão para o seu sucesso.
Se lerem algumas notícias, poderá pensar que não nos importamos com os nossos funcionários. Nessas notícias, os nossos funcionários são descritos como almas desesperadas e tratados como robôs. Isto não é verdade. São pessoas sofisticadas e ponderadas que têm opções para trabalhar noutros locais. Quando fazemos inquéritos aos funcionários dos nossos armazéns, 94% dizem que recomendariam a um amigo a Amazon como um sítio para trabalhar.
Os funcionários podem fazer pausas informais ao longo dos seus turnos para esticar as pernas, beber água, utilizar a casa de banho ou falar com um supervisor sem que isso tenha impacto na sua performance. Estas pausas informais são acumuláveis com o intervalo de 30 minutos para almoço e o intervalo de 30 minutos já incorporado no horário normal.
Não estabelecemos objetivos de performance irrazoáveis. Estabelecemos objetivos alcançáveis que levam em conta a antiguidade e os dados da performance passada. A performance é avaliada ao longo de períodos de tempo prolongados; sabemos que uma variedade de fatores pode ter impacto na performance de uma determinada semana, dia ou hora. Se um funcionário está prestes a falhar um objetivo num determinado período de tempo, o seu supervisor fala com ele e providencia coaching.
Coaching é também providenciado aos funcionários que excedem os seus objetivos e que estão na calha para responsabilidades acrescidas. Na realidade, 82% do coaching é positivo, providenciado a funcionários que cumprem ou excedem os seus objetivos. Rescindimos o contrato de trabalho de menos de 2,6% dos funcionários devido à sua incapacidade de levar a cabo o seu trabalho (e esse número foi ainda mais baixo em 2020 devido aos impactos operacionais do COVID-19).
O Melhor Empregador da Terra e o Local Mais Seguro para Trabalhar da Terra
A realidade é que a vasta equipa de milhares de pessoas que lideram as operações na Amazon se preocupam profundamente com os nossos funcionários que trabalham à hora e estamos orgulhosos do ambiente de trabalho que criámos. Estamos também orgulhosos do facto de que a Amazon é uma empresa que faz mais do que criar empregos para engenheiros informáticos e pessoas com graus académicos avançados. Criamos empregos para pessoas que nunca tiveram essas vantagens.
Apesar de tudo aquilo que alcançámos, torna-se evidente para mim que necessitamos de uma melhor visão para o sucesso dos nossos funcionários. Sempre almejámos ser a Empresa Mais "Cliente-cêntrica" da Terra. Não vamos mudar isso. Foi isso que nos trouxe ao momento atual. Mas prometo uma adição. Vamos ser O Melhor Empregador da Terra e O Local Mais Seguro para Trabalhar da Terra.
No meu futuro papel de Executive Chair, vou focar-me em novas iniciativas. Eu sou um inventor. É o que gosto mais de fazer e o que eu faço melhor. É onde crio mais valor. Estou ansioso para iniciar o trabalho ao lado da vasta equipa de pessoas apaixonadas que temos nas Operações e para ajudar a inventar nesta arena de O Melhor Empregador da Terra e O Local Mais Seguro para Trabalhar da Terra. Nos detalhes, nós, na Amazon, somos sempre flexíveis, mas, na visão somos teimosos e implacáveis. Nunca falhámos quando nos decidimos a algo e não vamos falhar aqui.
Temos uma profunda preocupação com questões de segurança. Por exemplo, 40% dos acidentes de trabalho na Amazon estão relacionados com desordens musculoesqueléticas (MSDs), coisas como entorses e tensões que podem ser causadas por movimentos repetitivos. MSDs são comuns neste tipo de trabalho e a probabilidade de ocorrerem aumenta nos primeiros seis meses do funcionário na Amazon. Precisamos de inventar soluções para reduzir as MSDs nos novos funcionários, muitos dos quais poderão estar a trabalhar em posições que exigem trabalho físico.
Um destes programas chama-se WorkingWell - que, em 2020, abrange 850 000 funcionários em 350 locais nos Estados Unidos e Europa - onde formamos pequenos grupos de funcionários em mecânica corporal, em estar proativo e segurança. Para além de reduzir lesões no local de trabalho, estes conceitos têm um impacto positivo nas atividades diárias fora do trabalho.
Estamos a desenvolver novos agendamentos de horários de trabalho automatizados que utilizam sofisticados algoritmos de forma a poder rodar funcionários por diferentes funções que utilizam diferentes grupos de tendões/músculos com o objetivo de minimizar movimentos repetitivos e ajudar a proteger os funcionários de MSDs. Esta tecnologia é essencial para o programa de rotação de funções que temos vindo a implementar desde o início de 2021.
Esta nossa atenção à prevenção das MSDs está já a alcançar resultados. De 2019 para 2020, as MSDs caíram cerca de 32% e as MSDs que resultam em baixas médicas caíram mais de metade.
Na Amazon, empregamos mais de 6200 profissionais de segurança. Utilizam a ciência da segurança para resolver problemas complexos e estabelecer novas melhores práticas para a indústria. Em 2021, vamos investir mais de 300 milhões de dólares em projetos de segurança, incluindo uns iniciais 66 milhões de dólares para criar tecnologia que ajudará a evitar colisões entre empilhadoras e outros tipos de veículos industriais.
Quando lideramos, outros seguem. Há dois anos e meio, quando aumentámos o salário mínimo para 15 dólares por hora, fizemo-lo porque queríamos liderar nos salários - não apenas correr junto com a matilha - e porque acreditávamos que era a coisa certa a fazer. Um paper recente de economistas das Universidades da Califórnia/Berkeley e Brandeis analisaram o impacto da nossa decisão em aumentar o salário mínimo inicial para 15 dólares por hora. As suas conclusões refletem aquilo que já ouvimos de funcionários, das suas famílias e das comunidades em que vivem.
O nosso aumento dos salários estimulou as economias locais pelo país inteiro, beneficiando, não apenas os nossos funcionários, mas também outros trabalhadores na mesma comunidade. O estudo demonstrou que o nosso aumento de salário resultou num aumento de 4,7% nos salários horários médios de outros empregadores no mesmo mercado de trabalho.
E a nossa liderança não acaba aqui. Se queremos ser O Melhor Empregador da Terra, não nos podemos contentar que apenas 94% dos funcionários digam que recomendariam a Amazon a um amigo como um local para trabalhar. Temos que apontar para 100%. E faremos isso continuando a liderar nos salários, benefícios, oportunidades de formação e doutras formas que, ao longo do tempo, descobriremos.
Se algum acionista estiver preocupado que O Melhor Empregador da Terra e O Local Mais Seguro para Trabalhar da Terra diluirão o nosso foco n' A Empresa Mais "Cliente-cêntrica" da Terra, deixem-me sossegá-los. Pensem nisto da seguinte maneira. Se conseguimos operar dois negócios tão diferentes como o Ecommerce e AWS, e fazê-lo ao mais alto nível, podemos certamente fazer o mesmo com duas declarações de princípios. Na realidade, estou convencido que elas se reforçarão mutuamente.
O Compromisso do Clima (The Climate Pledge)
Numa primeira versão desta carta, comecei esta secção com argumentos e exemplos escolhidos para demonstrar que as alterações climáticas induzidas pelos humanos são reais. No entanto, para ser franco, acho que podemos parar de dizer isto. Não temos que dizer que a fotossíntese é real, ou defender a teoria da gravidade ou que a água ferve a 100 graus centígrados ao nível do mar. Estas coisas são simplesmente verdade, assim como a realidade das alterações climáticas.
Há não muito tempo, a maioria das pessoas acreditava que seria bom resolver os problemas das alterações climáticas, mas também acreditavam que seria muito caro e que ameaçaria os empregos, a competitividade e o crescimento económico. Hoje, já sabemos mais. Iniciativas inteligentes no combate às alterações climáticas não apenas impedirão coisas más de acontecer, mas também tornarão a nossa economia mais eficiente, impulsionarão a mudança tecnológica e reduzirão riscos. Em conjunto, estes fatores podem levar a mais e melhores empregos, crianças mais saudáveis e felizes, trabalhadores mais produtivos e a um futuro mais próspero. Isto não significa que será fácil. Não o vai ser. A próxima década será decisiva. A economia de 2030 terá que ser vastamente diferente do que é agora e a Amazon tenciona estar no coração da mudança. Lançámos o Compromisso do Clima juntamente com o Otimismo Global (Global Optimism) em setembro de 2019 porque queríamos ajudar a impulsionar esta revolução positiva. Precisamos de ser parte de um conjunto crescente de empresas que compreendam estes imperativos e oportunidades do Séc. XXI.
Hoje, menos de dois anos depois, 53 empresas de quase todos os setores da economia, assinaram o Compromisso do Clima. Signatários como Best Buy, IBM, Infosys, Mercedes-Benz, Microsoft, Siemens e Verizon concordaram em atingir zero carbono nos seus negócios globais em 2040, 10 anos antes do alvo dos Acordos de Paris. O Compromisso exige também a monitorização regular da emissão de gases de estufa; a implementação de estratégias de descarbonização por via da inovação; e a neutralização de quaisquer emissões remanescentes através de medidas compensatórias permanentes, reais e quantificáveis. Estas medidas compensatórias são preciosas e devemos reservá-las para as atividades económicas onde não existem alternativas de carbono reduzido.
Os signatários do Compromisso do Clima estão a implementar planos significativos, tangíveis e ambiciosos. A Uber tem o objetivo de operar como uma plataforma livre de carbono no Canadá, Europa e Estados Unidos até 2030 e a Henkel planeia utilizar, na sua atividade, apenas eletricidade de fontes renováveis. A Amazon está a fazer progressos no seu objetivo de 100% de energia renovável em 2025, cinco anos mais cedo que o nosso objetivo inicial de 2030. A Amazon é o maior comprador empresarial de energia renovável no mundo. Temos 62 projetos eólicos e solares e 125 telhados solares em armazéns e centros pelo mundo inteiro. Estes projetos têm a capacidade de gerar mais de 6,9 gigawatts de energia e de fornecer mais de 20 milhões de megawatts/hora anualmente.
Transporte é um dos principais componentes das operações da Amazon e a parte mais dura do nosso plano de atingir zero carbono em 2040. Para ajudar a acelerar rapidamente o mercado da tecnologia de veículos elétricos, e para ajudar todas as empresas na transição para tecnologias mais verdes, investimos mais de 1 bilião de dólares em Rivian - e encomendámos 100 mil carrinhas elétricas desta empresa. Iniciámos também parcerias com Mahindra na Índia e com Mercedes-Benz na Europa. Estas carrinhas de entrega elétricas da Rivian estão já operacionais e já estão na estrada em Los Angeles desde fevereiro passado. Dez mil novos veículos entrarão em ação no próximo ano e todos os 100 mil estarão na estrada até 2030 - poupando milhões de toneladas de carbono. Uma forte razão pela qual queremos que as empresas se juntem ao Compromisso do Clima é sinalizar ao mercado que deve começar a inventar e a desenvolver as tecnologias que os signatários necessitam para cumprir o Compromisso. A nossa aquisição de 100 mil carrinhas elétricas Rivian é um exemplo perfeito.
Com o objetivo de acelerar ainda mais o investimento em novas tecnologias necessárias para a construção de uma economia zero carbono, apresentámos, em junho passado, o Fundo Compromisso do Clima (Climate Pledge Fund). Este programa de investimento arrancou com 2 biliões de dólares para investir em empresas visionárias cujo objetivo é ajudar a facilitar a transição para uma economia de carbono reduzido. A Amazon já anunciou investimentos em CarbonCure Technologies, Pachama, Redwood Materials, Rivian, Turntide Technologies, ZeroAvia e Infinium - e estas são apenas algumas das empresas inovadoras que, esperamos, irão construir a economia zero carbono do futuro.
Aloquei pessoalmente 10 biliões de dólares para conceder bolsas para ajudar a catalizar a mudança sistémica de que necessitaremos na próxima década. Financiaremos também cientistas, ativistas, ONGs, organizações de justiça ambiental e outros que trabalham no combate às alterações climáticas e na proteção do mundo natural. No final do ano passado, concedi a primeira ronda de bolsas a 16 organizações que trabalham em soluções inovadoras. Vai ser necessária ação coletiva das grandes empresas, pequenas empresas, estados, organizações globais e indivíduos e estou muito entusiasmado por fazer parte desta viagem e estou muito otimista que a humanidade se consiga unir para resolver este desafio.
A Diferenciação é Sobrevivência e o Universo quer que Sejamos Típicos
Esta é a minha última carta como CEO da Amazon e tenho uma última coisa que me sinto impelido a partilhar. Espero que todos os Amazonianos levem isto muito a sério.
Eis um excerto do livro extraordinário de Richard Dawkins, "The Blind Watchmaker". É acerca de um facto básico da biologia.
"Combater a morte é algo que exige trabalho. Deixado à sua sorte - que é o que acontece após a morte - o corpo tende a reverter para um estado de equilíbrio com o seu ambiente. Se medirmos a temperatura, acidez, teor de água ou o potencial elétrico de um corpo vivo, concluiremos que, tipicamente, essas medições são marcadamente distintas das medições correspondentes do ambiente circundante. Os nossos corpos, por exemplo, são habitualmente mais quentes que o ambiente e, nos climas mais frios, temos que nos esforçar para manter o diferencial. Quando morremos, o trabalho para; o diferencial de temperatura começa a desaparecer e acabamos com a mesma temperatura do ambiente que nos rodeia. Nem todos os animais trabalham com tanto afinco para evitar entrar em equilíbrio com a temperatura circundante, mas todos os animais fazem algum trabalho comparável. Por exemplo, numa região seca, os animais e plantas trabalham para manter o conteúdo fluido das suas células, trabalham contra a tendência natural para a água fluir deles para o mundo exterior seco. Se falharem, morrem. De uma forma mais geral, se os seres vivos não trabalhassem ativamente para o impedir, fundir-se-iam eventualmente com o ambiente circundante e cessariam de existir como seres autónomos. Isto é o que acontece quando morrem."
Embora esta passagem não o pretenda ser, é ainda assim, uma metáfora fantástica, e muito relevante para a Amazon. Defendo até que é relevante para todas as empresas e instituições e até para as nossas vidas individuais. De que formas é que o mundo nos pressiona a ser "normais"? Quanto trabalho é necessário para manter a nossa singularidade? Para manter vivas as coisas que nos fazem especiais?
Conheço um casal, com um casamento feliz, que tem um costume engraçado. De vez em quando, o marido olha para a esposa com desespero fingido e pergunta, "não podes ser normal?". Ambos sorriem e soltam uma gargalhada e, obviamente, a verdade é que a sua singularidade é aquilo que ele adora. Mas, ao mesmo tempo, também é verdade que as coisas seriam mais fáceis - tomariam menos energia - se fossemos todos um pouco mais normais.
Este fenómeno acontece a todos os níveis. As democracias não são normais. A tirania é o normal histórico. Se deixássemos de fazer continuadamente o duro trabalho necessário para manter esta singularidade, rapidamente regressaríamos ao equilíbrio com a tirania.
Sabemos bem que a singularidade - originalidade - é valiosa. Todos fomos ensinados a ser "nós mesmos". O que estou aqui a pedir é que abrace e seja realista acerca da energia necessária para manter essa originalidade. O mundo quer que sejamos típicos - de mil maneiras força-nos a isso. Não permita que isso aconteça.
Temos que pagar um preço por essa originalidade e vale a pena. A versão conto de fadas do "ser nós mesmos" é que a dor para assim que permitimos que a nossa originalidade brilhe. Esta versão é enganadora. "Ser nós mesmos" vale a pena, mas não espere que seja fácil ou gratuito. Temos que dedicar energia a esta tarefa continuamente.
O mundo tentará constantemente tornar a Amazon mais típica - tentará trazer-nos para o equilíbrio com o nosso ambiente circundante. Vai ser necessário um esforço contínuo, mas somos capazes e temos que ser melhores que isto.
Tal como sempre, anexo a nossa carta aos acionistas de 1997 que concluía desta forma: "Nós, na Amazon, estamos gratos aos nossos clientes pelo seu negócio e pela sua confiança, a cada um de nós pelo trabalho árduo e aos nossos acionistas pelo seu apoio e encorajamento." Isto não mudou em nada. Quero agradecer especialmente a Andy Jassy por concordar em assumir o papel de CEO. É um trabalho duro com muita responsabilidade. Andy é brilhante e tem os mais altos padrões de exigência. Garanto-vos que Andy não permitirá que o universo nos torne típicos. Ele reunirá a energia necessária para manter vivo em nós aquilo que nos torna especiais. Não será fácil, mas é essencial. Prevejo também que será gratificante e muitas vezes divertido. Obrigado, Andy.
A todos vós: sejam gentis, sejam originais, criem mais do que consomem e nunca, nunca, mas nunca deixem que o universo vos confunda com o que vos rodeia. Continua a ser o Dia 1.
Sinceramente,
Jeff Bezos
Fundador e CEO
Amazon.com Inc.
Publicado no blog Collaborative Fund a 22 de abril de 2021 por Morgan Housel
O espectro do otimismo e do pessimismo
Num extremo, temos o otimista puro. Ele acredita que está tudo bem, sempre estará bem e encara a negatividade como uma falha de caráter. Parte disto está enraizada no seu ego: o otimista puro tem tanta confiança em si próprio que não consegue imaginar que alguma coisa corra mal.
Depois, temos as pessoas extremamente otimistas que aceitam que, ocasionalmente, acontecem coisas más às outras pessoas. Elas leem as más notícias com um fascínio distante, mas encaram o seu próprio futuro como um mar de rosas e não conseguem imaginar algo de diferente.
De seguida, estão os otimistas que conseguem ser céticos relativamente ao otimismo das outras pessoas. Eles veem o seu futuro como imaculado, mas possuem um detetor de "treta" de baixo calibre, e pressentem quando o otimismo é, na realidade, um argumento de venda.
Um degrau abaixo estão os otimistas, totalmente confiantes em si próprios, mas igualmente pessimistas acerca dos outros. É fácil confundi-los com pessimistas, mas, na realidade, eles veem o seu próprio futuro como perfeito.
Depois, temos uma espécie especial: o otimista que encara o futuro de todos como sombrio apenas e só porque algumas coisas, ou algumas pessoas, se atravessam no caminho. Eles são pessimistas, com um único problema, que, de outra forma, seriam. São infelizes, porque o mundo perfeito está simultaneamente tão próximo e tão distante.
A seguir, vêm as pessoas pessimistas com as palavras, mas otimistas com as ações. Elas são atraídas pelo pessimismo porque é intelectualmente sedutor e chama a atenção das pessoas. Mas os seus portfólios de investimento estão claramente desenhados para um mundo onde as coisas melhoram. Muitos comentadores cabem nesta categoria.
No meio, temos os chamados otimistas razoáveis: aqueles que reconhecem que a história é uma sequência constante de problemas, deceções e contratempos, mas que se mantêm otimistas porque sabem que os contratempos não impedirão o eventual progresso. Eles parecem hipócritas e indecisos, mas, muitas vezes, estão apenas a olhar mais longe do que os outros.
Em seguida, vêm os probabilistas. Eles sabem que o progresso é provável, mas consideram tudo como uma questão de apostar nas probabilidades. "Não sou otimista", disse certa vez Hans Rosling. "Eu sou um possibilista muito sério."
Agora entramos nos pessimistas encapotados: aqueles que veem o progresso histórico como um acaso único, mas acreditam que no futuro, o mais provável será um crescimento reduzido estagnação. Eles têm orgulho no que conquistamos, mas duvidam que possa continuar.
Mais adiante vêm os céticos. Eles não discordam de que o progresso é possível, até mesmo provável. Mas as evidências que exigem para provar esse progresso são tão rigorosas que só as observações retrospetivas são convincentes - e mesmo assim, questionam-se se os dados são precisos ou se há algo mais que não estamos a ver. Eles são boas pessoas, mas torturam-se, porque sabem que o progresso está a acontecer, mas em vez de o apreciar, lutam para negá-lo.
Entramos agora na primeira camada dos verdadeiros pessimistas. Eles sabem que o mundo vai melhorar, as coisas vão melhorar, os negócios tornar-se-ão mais produtivos - mas acreditam que pessoalmente não farão parte do progresso.
Depois, estão aqueles que acreditam que o progresso só beneficia pequenos grupos de pessoas, enquanto que o bem-estar da maioria estagna ou diminui à medida que são explorados por esse pequeno grupo de vencedores. (Talvez o grupo mais razoável de pessimistas).
Um nível abaixo, estão aqueles que torcem silenciosamente pelo declínio, habitualmente para beneficiar os seus investimentos. Costumam dizer coisas como "Espero que a minha previsão não esteja certa", mas nada os deixa mais felizes do que sinais de uma nova recessão, uma crise financeira ou o aumento da inflação.
Entramos agora na escuridão a sério: pessoas que acreditam que as evidências do progresso passado são enganadoras, incompletas ou manipuladas para pintar um quadro cor de rosa. Segundo eles, a realidade é que a vida é tão difícil e ineficiente hoje como o tem sido desde há muito tempo e continuará assim no futuro.
De seguida, vêm os cínicos, que veem qualquer pessoa que promova o progresso como sendo secretamente motivada pelo poder e alimentada pela corrupção.
E, finalmente, o pessimista puro. Ele acredita que tudo é terrível, será sempre terrível e encara positividade como uma falha de caráter. Parte disto está enraizada no seu ego: o pessimista puro tem tão pouca confiança em si próprio que não consegue imaginar que alguma coisa corra bem. Ele é o total oposto do otimista puro, e, como ele, está completamente desligado da realidade.
Artigo publicado originalmente no blog The Better Letter.
O Poder do Juro Composto
Eis o meu mais importante conselho sobre investimentos. Dei-o aos meus filhos e netos: Comecem a poupar e a investir o mais cedo possível.
Einstein pode nunca o ter dito (como se alega), mas o juro composto é uma maravilha do mundo. E qualquer pessoa pode tirar dele partido -- é absolutamente igualitário. Se não fizer mais nada pela sua reforma, comece, pelo menos, a poupar e a investir cedo. Devemos também poupar muito (cerca de 15 por cento faz sentido) e mantermo-nos livres de dívidas, mas vou limitar-me a um único conselho.
Eis tudo o que precisamos para tirar proveito deste sábio ensinamento:
1. Inteligência para saber o que estamos a fazer e porquê;
2. A paciência e o compromisso para mantermos o rumo; e
3. Tempo
É só isto.
Quer provas?
Imaginemos que a Ginny subscreveu um PPR aos 19 anos com 1000 dólares e, durante sete anos consecutivos, fez reforços de 200 dólares por mês e conseguiu um retorno anual médio de 10% (já sei que parece elevado para os mercados de hoje, mas vamos assumir este pressuposto para efeitos ilustrativos). Vamos supor também que, depois desses sete anos, a Ginny não põe nem mais um tostão nesse PPR.
Vamos agora imaginar que o Bob não é tão esperto como a Ginny e que só subscreve o seu PPR, também com 1000 dólares, aos 26 anos (a idade com que a Ginny parou de fazer reforços). No entanto, daí em diante, o Bob reforça com 200 dólares todos os meses até aos 65 anos e consegue o mesmo retorno médio de 10% ao ano ao longo desse período.
Uma vez feitas as contas, os resultados parecem impossíveis.
A Ginny, que fez contribuições durante sete anos (17.800 dólares no total), mas começou mais cedo, acaba com mais dinheiro aos 65 anos do que o Bob, que fez entregas durante 40 anos (97.000 dólares no total), mas começou mais tarde. O Bob acabou com 1.318.518 dólares, que é uma soma respeitável para quem fez contribuições totais de apenas 97.000 dólares. Mas a Ginny acabou com 1.406.849 dólares, apesar de ter feito muito menos entregas com um valor total muito inferior.
A chave, claro, é que a Ginny começou a compor juros sete anos mais cedo do que o Bob.
Aqueles sete anos de avanço valeram mais do que todos os 33 anos adicionais de contribuições do Bob. Devido ao tempo, à paciência, e à magia do juro composto, os 17.800 dólares da Ginny transformaram-se em mais de 1,4 milhões.
Se não seguir mais nenhum dos meus conselhos sobre poupança e investimento, por favor comece cedo. E seja qual for a sua idade, comece a poupar ou poupe mais, imediatamente. Por favor. O tempo é crucial.
Ao longo de períodos alargados de tempo, até uma pequena mudança nos nossos hábitos pode fazer uma diferença significativa.
Há uma abundância de artigos que sugerem algo do género de ser possível reformarmo-nos se deixarmos de ir ao Starbucks (a ideia teve origem aqui). Esta ideia está, obviamente, incompleta, mas é notável como consegue ilustrar o poder do juro composto.
Vamos imaginar que íamos ao Starbucks todos os dias úteis e comprávamos um latte por 5 dólares. Decidimos parar de o fazer e investir esse dinheiro. No primeiro mês, juntámos 100 dólares (20 dias úteis de lattes a 5 dólares) e continuamos a investir 25 dólares por semana (um latte por cada dia útil) durante 30 anos. Assumindo 10% de retorno anual sobre o dinheiro investido, no final desses 30 anos, teremos 250.000,00 dólares (mais exatamente, 249.364,00 dólares).
Esse montante de 250.000,00 dólares é antes de impostos, obviamente, e - devido à inflação - não é provável que daqui a 30 anos pareça, nem de perto, o mesmo dinheiro. Este cenário pressupõe também a não existência de quaisquer circunstâncias pessoais que exijam o uso do dinheiro (na realidade, imaginamos emergências com muito maior frequência do que elas realmente acontecem - "necessidade" é uma palavra muito forte). Mas 250.000,00 dólares, ou até metade, ainda é significativo e serve para recordarmos que a nossa taxa de poupança, quando as poupanças são bem investidas, é muito mais importante para o nosso futuro financeiro do que a taxa de retorno que conseguimos nessas poupanças.
Tal como Tolstoy escreveu e a nossa experiência confirma, "os dois guerreiros mais poderosos são a paciência e o tempo."
Estes guerreiros funcionam noutros contextos e de forma muito mais ampla. Como escrevi antes, tal como o juro composto, o sucesso é sequencial. É preciso tempo para que as boas escolhas acumulem até que expludam exponencialmente. Todas as melhores coisas nas nossas vidas oferecem benefícios que proporcionam um retorno composto. Os nossos investimentos financeiros fazem isso, assim como os nossos investimentos pessoais e familiares. A generosidade e o serviço aos outros também. E uma vida saudável e a educação e o conhecimento também.
O amor é o mais poderoso acumulador de retorno composto de todos.
Concentremos aí os propósitos da sua vida. Nós não controlamos completamente os nossos destinos ou os nossos legados. Mas se investirmos bem -- financeiramente e não só -- os nossos legados podem ser profundos.
Tal como os nossos investimentos precisam de ser avaliados em função de um benchmark, também as nossas vidas precisam. Não importa o que digamos, mostramos o que amamos pela forma como investimos o nosso tempo, os nossos talentos, e o nosso tesouro. Revelamos as nossas motivações com o nosso amor. Os nossos objetivos funcionam como benchmarks para o retorno composto das escolhas da nossa vida.
Que tal nos estamos a sair?
Artigo publicado originalmente no blog A Wealth of Common Sense
O Mercado de Ações É Mais Esperto Que Nós
Na sequência de uma recuperação brutal após os mínimos de março, os investidores passaram grande parte da primavera e do verão a debater as razões pelas quais o mercado estava a subir e quando voltaria a cair e ultrapassar aqueles mínimos novamente.
Tinha que ser um dead cat bounce, certo? (Até um gato morto salta se o atiramos de uma grande altura) Como seria possível que o mercado de ações continuasse a subir em face de uma pandemia, com milhões desempregados e negócios fechados?
Não podemos levar a mal que as pessoas pensem assim. Ninguém sabia o que esperar numa crise como esta. Tem sido uma provação assustadora, emocional e implacável.
Mas o mercado acionista não se importa com sentimentos. Limita-se a seguir em frente, descontando o futuro. E nesta crise, na maior queda trimestral da atividade económica na história do nosso país, a bolsa olhou para o outro lado do vale.
Sim, houve alguma ajuda do governo, mas poucos, se é que alguém, previram quão melhores as coisas se tornariam. O mercado de ações foi um deles.
O mercado já estava a bater novos máximos históricos quando a vacina chegou aos cabeçalhos. O mercado previu a vacina!
Pense nalguns dos títulos que têm tido variações loucas ao longo da maior parte do último ano.
A Live Nation vende bilhetes para concerto ao vivo. Não fazemos ideia quando os concertos vão regressar, mas eventualmente isso vai acontecer. E adivinhe? O mercado de ações não quer saber:
Já está a refletir no preço aqueles concertos a que as pessoas estão ansiosas por voltar. Novos máximos.
Então e os Hotéis Hilton? Sim, claro, as pessoas estão a começar a viajar mais. Mas a bolsa está a refletir no preço toda a gente a viajar novamente:
Novos máximos.
A Disney fez uma das maiores viragens de todos os tempos para uma organização enorme, ao iniciar o negócio de streaming, mas é também conhecida pelos seus parques temáticos, navios de cruzeiro e resorts, todos encerrados ou a operar com capacidade mínima durante a maior parte do último ano.
O mercado de ações já refletiu no preço a reabertura e mais do que isso:
Novos máximos para a criação de Walt Disney.
O mesmo para o Sea World:
E conseguimos ver que estas empresas começaram a refletir estas coisas no preço muito antes de os resultados da vacina terem sido verificados e aprovados. Na realidade, não sabíamos quanto tempo isto iria durar ou quando melhoraria, mas o mercado de ações não ficou à espera que descobríssemos.
Pode parecer que o mercado de ações está a tornar-se cada vez mais desligado da realidade económica para a maioria das pessoas, mas, na verdade, o mercado nunca teve coração.
Em Wealth, War and Wisdom, Barton Biggs escreve sobre dois dos meus tópicos históricos favoritos: (1) a Segunda Guerra Mundial e (2) o mercado de ações.
Biggs faz uma descrição cronológica pormenorizada de muitos dos momentos de viragem na Guerra através da lente dos mercados acionistas de vários países.
Muitos desses movimentos de mercado parecem completamente contraintuitivos:
No dia 1 de setembro de 1939, Hitler invadiu a Polónia e o primeiro-ministro Neville Chamberlain, com a voz trémula, anunciou que a Grã-Bretanha acabava de declarar guerra à Alemanha. No dia seguinte, a Bolsa de Nova Iorque passou por um mini-frenesim de compra de três dias, com um ganho de 20 pontos ou 7% no Dow . O volume de transações foi o mais elevado num período de dois anos porque os investidores anteciparam que as encomendas para a defesa criariam um boom económico.
Estávamos na iminência de uma segunda guerra mundial em 20 anos e ainda assim os investidores permaneciam otimistas.
A Bolsa de Londres previu, mais ou menos, que os Estados Unidos viriam em auxílio dos exércitos europeus antes que fosse tarde de mais:
A Bolsa de Londres deduziu no início do verão de 1940, até mesmo antes da Batalha da Grã-Bretanha, numa altura em que o mundo e mesmo muitos ingleses desesperavam, que a Grã-Bretanha não seria conquistada. As ações atingiram um mínimo para a História no início de junho, embora não fosse evidente até outubro que não haveria qualquer invasão alemã em 1940 e até Pearl Harbor, 18 meses depois, que a Grã-Bretanha iria prevalecer.
Quase parece que, ao longo de 1941, a Bolsa de Londres intuitivamente pressentiu e reagiu à crescente e cada vez mais profunda aliança entre a Grã-Bretanha e os Estados Unidos. O mercado acionista estava mais confiante na entrada da América na Guerra do que o próprio Churchill. Não havia, na verdade, quaisquer boas notícias, no que diz respeito à Guerra, para celebrar porque a Grã-Bretanha sofria derrota após derrota.
Até a Bolsa Alemã se adiantou ao facto de que a maré estava a virar contra Hitler:
Similarmente, a Bolsa Alemã, ainda que nas garras de um estado policial, de alguma forma compreendeu, em outubro de 1941, que o pico da conquista alemã fora atingido. Foi de um discernimento incrível. Nessa altura, o exército alemão parecia invencível. Nunca perdera uma batalha; nunca fora forçado a retirar. Não havia ainda qualquer sinal de que a triunfante ofensiva sobre a União Soviética estava a falhar. Na realidade, no início de dezembro, uma patrulha alemã teve mesmo um vislumbre passageiro dos pináculos de Moscovo e, na altura, a Alemanha dominava mais Europa do que o Império Romano. Mais ninguém se apercebeu de que este era o ponto de inflexão.
A Guerra não terminou antes de 1945, mas o Dow atingiu os mínimos na primavera de 1942 e nunca mais olhou para trás:
Biggs explica o quão presciente o mercado de ações foi ao prever isto:
A Bolsa de Nova Iorque reconheceu que as vitórias nas batalhas do Mar de Coral e de Midway em maio e junho de 1942 mudaram o curso dos eventos no Pacífico e, desde os mínimos dessa primavera, não mais olhou para trás, mas eu não consigo encontrar tais pensamentos nos jornais ou especialistas militares desse tempo. Um fogo cerrado de derrotas e rendições causara intensas críticas à gestão da guerra e dos comandantes no terreno. Os sábios homens dos media estavam tão ocupados a torcer as mãos de preocupação que não perceberam a real importância das batalhas do Mar de Coral e de Midway como a marca de água alta dos desígnios de império do Japão e do seu ataque aos Estados Unidos.
Na verdade, o mínimo que as ações americanas atingiram no segundo trimestre de 1942 foi na realidade o fim do grande bear market secular que começou in 1929. Um novo bull market secular nasceu nessa primavera, que duraria quase 20 anos e levaria as ações americanas a novos máximos inimagináveis no dealbar da prosperidade do pós-guerra. Claro que existiriam bear markets cíclicos intermitentes, mas só o grande, mudo, e trapalhão mercado de ações vislumbrou que o longo bear market terminara e que uma nova era começara.
Em The Wisdom of the Crowds, James Surowiecki escreve: "A ideia da sabedoria das multidões não é que um grupo terá sempre a resposta correta, mas que, em média, encontrará consistentemente uma melhor resposta do que qualquer indivíduo conseguiria apresentar.".
O mesmo é verdade para o mercado de ações.
O mercado de ações não está sempre certo, mas é espantoso quantas mais vezes está certo do que errado.
Artigo publicado originalmente no blog Collaborative Fund a 2 de abril de 2021.
As Grandes Lições do Ano Passado
A história é uma coisa atrás da outra. Uma guerra acaba, segue-se um boom, depois um crash, depois uma revolta, depois uma pandemia, uma grande inovação, um novo boom, uma nova guerra. E assim sucessivamente, da agonia ao assombro.
Uma pergunta que surge sempre após um evento terrível é porque é que não aprendemos a lição?
As crises financeiras continuam a acontecer, uma e outra vez. Há centenas de anos que as pessoas cometem os mesmos erros nos investimentos. Os mesmos erros militares, sem parar. As personagens mudam, mas o enredo mantém-se.
Jason Zweig explicou há anos que parte da razão pela qual os mesmos erros se repetem não é porque as pessoas não aprenderam a lição; é porque as pessoas "são demasiado boas a aprender lições, e aprendem lições excessivamente detalhadas."
Uma boa lição da crise económica da dot-com foram os perigos do excesso de confiança. Mas a lição que a maioria das pessoas levou consigo foi "o mercado de ações fica sobrevalorizado quando transaciona com um PER superior a 30". Foi hiper-específico, por isso muitos dos mesmos investidores, que perderam a camisa em 2002, levantaram-se e foram direitos à bolha imobiliária, onde perderam outra vez.
As lições mais importantes a tirar de um grande evento são habitualmente as conclusões mais abrangentes. São estas que têm uma maior probabilidade de se aplicarem à seguinte iteração da crise.
O Covid-19 está longe de ter acabado, mas já estamos há mais de um ano nesta confusão trágica. Já aconteceu o suficiente para começarmos a perguntar-nos "que lições aprendemos?". Se é um médico ou regulador de saúde, algumas dessas lições são hiperespecíficas. Mas para a maioria de nós, as maiores lições são abrangentes.
Algumas que se destacam:
1. Os grandes riscos são fáceis de subestimar porque têm origem em pequenos riscos que se multiplicam.
Se nos perguntarem "Qual é a probabilidade de um grupo de maltrapilhos infligir danos massivos à nação mais forte e mais militarizada do mundo?", poderemos com razoabilidade responder, "muito baixa". Talvez até zero.
Mas se nos perguntarem, "Qual é a probabilidade de um grupo de maltrapilhos ser radicalizado por um maníaco carismático (muito elevada), conseguir passar x-atos pela segurança do aeroporto (não é difícil), utilizá-los para matar os pilotos (fácil), assumir o controlo de um avião (razoavelmente fácil) e fazer chocar o avião contra um edifício (inevitável neste ponto), a nossa resposta poderá ser, "Como é que não conseguimos ver isto?"
É fácil ignorar os grandes riscos porque eles são apenas uma reação em cadeia de pequenos eventos, cada um deles facilmente desdramatizável. Um conjunto de coisas mundanas acontece na altura certa, na ordem correta e multiplicam-se transformando-se num evento que poderá parecer impossível, se virmos apenas o resultado final. A matemática é dura, mas a matemática exponencial é enganadora.
O mesmo acontece com o Covid.
A possibilidade de um vírus paralizar a economia global e matar milhões de pessoas parecia suficientemente remota para nem sequer ser contemplada pela maioria das pessoas. Antes de há um ano atrás, parecia o tipo de acidente imprevisível um-em-biliões que só vemos nos filmes.
Mas vamos decompor o último ano em peças mais pequenas.
Um vírus que passa de um animal para um humano (acontece desde sempre) e aquele humano interage com outros (claro). Durante algum tempo, foi um mistério (compreensível) e aparentemente as más notícias foram suprimidas (incentivos políticos, não grite fogo num teatro). Outros países pensaram que seria contido (excecionalismo, negação padrão) e não agiram suficientemente depressa (burocracia, falta de liderança). Não estávamos preparados (excesso de otimismo comum) e a reação às máscaras e aos confinamentos foi negativa (claro) o que tornou a sua aplicação esporádica (diversidade, o mesmo de sempre). Os sentimentos tornaram-se tribais (o padrão durante um ano de eleições) e a pressa de regressar à normalidade conduziu a reaberturas prematuras (negação padrão, a inevitabilidade de diferentes pessoas viverem realidades diferentes).
Cada um destes eventos isolado parece óbvio, até comum. Mas quando se multiplicam uns pelos outros, temos algo de surpreendente, até sem precedentes.
Os grandes riscos são sempre assim, o que faz com que seja demasiado fácil subestimá-los. Ao longo do último ano, fomos claramente recordados disto.
2. Muito do pessimismo injustificado resulta de subestimarmos a rapidez e firmeza com que as pessoas se adaptam.
Desde 1900, o PIB real per capita aumentou 9,3 vezes.
Imagine que estamos em 1900 e um viajante no tempo, vindo de 2021, diz, "Grandes notícias. Os vossos bisnetos serão, em média, 9,3 vezes mais ricos do que vós sois hoje."
Ficariam em êxtase - esse tipo de riqueza deveria parecer inimaginável. Assumiriam que os seus bisnetos serão bolas de êxtase andantes, que acordam todas as manhãs estupefactos com quão ricos são.
Isto, obviamente, não descreve virtualmente ninguém em 2021.
As pessoas são espantosamente boas a adaptar-se. Ao pensar na mudança, é tentador desenhar uma linha reta e assumir que uma mudança de circunstâncias leva a uma igual mudança em como nos sentimos. Mas nunca é assim. Quando confrontadas com uma mudança, as pessoas rapidamente dizem, "OK, este é o novo ponto de partida. As nossas expectativas agora começam ali." Em parte, é por isso que somos tão maus a fazer previsões.
E o mesmo pode acontecer ao contrário.
Se regressássemos a janeiro passado e nos perguntássemos, "que aspeto terá o mundo se ninguém puder ir para o escritório, a interação cara-a-cara acabar, todas as escolas forem fechadas, meio mundo estiver em confinamento esporádico e as pessoas proibidas de sair de sua casa, e continuar assim durante um ano inteiro?".
Acho que teríamos exclamado, "meu deus, isto é o fim do mundo. Vai ser 10 vezes pior do que a Grande Depressão."
O que - sem minimizar quantos empregos se perderam e negócios fecharam - na generalidade, não foi. Nem de perto. E não estou a falar apenas do mercado acionista: Os rendimentos estão em máximos de sempre.
É demasiado fácil assumir que, quando confrontadas com circunstâncias terríveis, as pessoas só conseguirão "ter" uma resposta normal. Mas nunca é assim. As expetativas são reconfiguradas, os instintos de sobrevivência libertam novos fluidos criativos, e as pessoas começam a pensar e agir de formas que não teriam considerado antes da crise.
Parte da razão pela qual as cadeias de fornecimento globais estão neste momento quebradas é porque há um ano os fabricantes avaliaram razoavelmente o estado de coisas no mundo e disseram, "bem, lá se vai tudo". A produção foi suprimida. Mas a procura regressou mais depressa do que quase toda a gente imaginou possível.
Muita dessa procura veio de estímulos, mas aqui encontramos a mesma conclusão: seis triliões de dólares em estímulos teria parecido incompreensível há 13 meses, mas, perante um verdadeiro desastre, passaram sem grande espalhafato. Os decisores políticos adaptam-se ao que estão dispostos a fazer; os eleitores adaptam as suas expetativas.
Os negócios adaptam-se de uma forma própria. É impressionante: 2020 tornou-se naquilo que as pessoas no início dos anos 90 assumiam que iria ser o mundo em 2000:
Hoje quase todos os negócios operam num novo mundo - um mundo que era difícil de imaginar há um ano atrás.
Difícil de imaginar é o ponto chave. No último ano, fecharam muitos restaurantes, mas foram muitos mais aqueles que assumiram que teriam de fechar. No entanto, conseguiram sobreviver vendendo take away. Isto nunca tinha sido sequer opção porque não havia procura suficiente por parte do consumidor para take away até aparecer o Covid.
A história do pessimismo é tão longa quanto a do progresso, e penso que parte da razão tem a ver com o facto de ser tão fácil subestimar a forma como as pessoas se adaptam às adversidades.
3. A história só é interessante porque nada é inevitável.
Carl Richards diz "Risco é o que sobra quando achamos que já pensamos em tudo".
Nunca encontrei uma definição melhor.
A indústria financeira passou uma década a debater qual seria o maior risco para a economia. Eram os aumentos de impostos? Impressão de dinheiro? Défices orçamentais? Guerras comerciais? Fixar as taxas de juro em 0,5% quando a taxa adequada teria sido 0,75%?
E claro que a resposta não foi nenhuma destas. Foi um vírus.
Normalmente é assim que funciona. Se olharmos para praticamente qualquer década, veremos que a notícia mais importante de todas foi algo de que ninguém falava até ao momento em que aconteceu.
Se alguma coisa aparece nas notícias, as pessoas estão a pensar sobre isso. Se estão a pensar sobre isso, estão pelo menos parcialmente preparadas para isso. E se estão preparadas para isso, o estrago que causa é mitigado quando chega. São as coisas surpreendentes que realmente movem a agulha e se tornam num dos poucos eventos em que podemos olhar para trás e dizer, "só aquilo importava". Pearl Harbor, 11 de Setembro, Covid-19. O denominador comum mais importante daqueles eventos não é terem sido grandes; é terem sido surpresas.
Fosse qual fosse a nossa visão do mundo há um ano, hoje é diferente. Talvez a maior lição do Covid será aceitar o quão verdade isto será daqui para a frente, também.
Daniel Kahneman diz que quando experienciamos uma surpresa, a lição correta que devemos tirar daí não é assumir que o evento voltará a acontecer; é aceitar que o mundo é surpreendente. A grande lição é darmo-nos conta que voltaremos a ser afetados por coisas que não antecipávamos, de que ninguém falava, e que deslocarão a agulha mais do que a combinação de todas as coisas que tínhamos a expetativa de que viessem a acontecer.
Simplesmente, uma coisa atrás da outra.
Em “The Little Book that Still Beats the Market”, Joel Greenblatt apresenta a sua fórmula magica para ter sucesso no investimento: comprar negócios excecionais quando estão baratos.Esta abordagem requer disciplina e tempo para esperar que o mercado reconheça o seu verdadeiro valor.
“No curto prazo, o Sr. Mercado determina o preço de uma ação baseado nas suas emoções, mas no longo prazo o que realmente importa é o valor intrínseco do negócio”
No livro, “The Little Book That Builds Wealth” (2008), Pat Dorsey explica-nos o que são vantagens competitivas e porque são determinantes para ter retornos no investimento a longo prazo.
“A menos que uma empresa tenha um fosso económico que proteja o seu negócio, a concorrência depressa chegará aos seus portões e corroerá os seus lucros. Wall Street está repleta de carcaças de empresas que foram de bestiais a bestas num piscar de olhos.”
Pensamento predatório significa ser mais esperto que o problema. Quando um pensador predatório encontra um problema que não consegue resolver, ele altera o contexto do problema e transforma-o em algo que consegue resolver. Desmantela o problema num conjunto de problemas mais pequenos. Encontra o elo mais fraco. A parte do problema que consegue mudar. Essa mudança, por sua vez, altera todos os outros problemas.Dave Trott utiliza histórias reais para demonstrar como os pensadores predatórios fizeram exatamente isto. Este não é um livro teórico que destila 10 fórmulas ou receitas milagrosas. Trott conta as suas histórias e cabe ao leitor fazer o resto do trabalho, cabe ao leitor aplicar os princípios aos seus problemas. Predatory Thinking prova que não é difícil pensar ou abordar os problemas de forma diferente. O hábito de o fazer é que é difícil de entranhar.Apesar de a maior parte das histórias terem origem no mundo da publicidade, este livro é dirigido a todos aqueles que querem ou precisam de pensar fora da caixa. Todos nós.
Readers of Warren Buffett?s letters to Berkshire Hathaway shareholders have gained an enormously valuable informal education in the art of investing. Broad in scope and long on wisdom, Buffett?s letters explain his principles on sound investing, selecting managers, valuing businesses, using financial information profitably, and other vital topics for investors.This newly updated Fourth Edition includes Buffett?s latest wisdom on such topics as the financial crisis, the housing bubble, corporate governance, Berkshire Hathaway?s acquisition of Burlington Northern Santa Fe, the role of oversight in heavily regulated industries, today?s best investing opportunities, and the weaknesses of popular option valuation models.Features investing advice in plain English from one of the world?s most legendary investorsIncludes Buffett?s insights on the current financial crisis and recessionOffers new and potent insight on good corporate governance and other issues vital to executives and managersFor investors, corporate executives, managers, and Buffett fans, The Essays of Warren Buffett, Fourth Edition features the kind of wisdom on investing, finance, and leadership that can be found nowhere else.
Daniel Kahneman, psicólogo israelita galardoado com o Nobel da Economia de 2002, condensa o trabalho de toda a sua carreira neste livro.Thinking, Fast and Slow é, acima de tudo, sobre a facilidade com que, sem nos darmos conta disso, tomamos decisões pouco racionais. Ao contrário do que defende a teoria económica tradicional, o ser humano não toma sempre a decisão que melhor serve o seu interesse. Na realidade, as pessoas cometem erros sistemáticos de julgamento.Kahneman explica porquê e lança pistas para tentarmos evitar estas armadilhas mentais ou, pelo menos, conseguirmos identificá-las quando somos nelas apanhados.Em Thinking, Fast and Slow, Kahneman demonstra que não somos os paradigmas da razão que pensávamos ser.
Guy Spier estudou em Oxford e Harvard. Iniciou a sua carreira na banca de investimentos convencido que iria ter sucesso e que iria ser feliz. Desiludido com o ambiente que o rodeava, despediu-se. Vive agora na Suíça, feliz e em paz e gere milhões de dólares segundo os princípios do Investimento em Valor.Este livro conta a história de Guy Spier. Na realidade, este livro não se debruça particularmente sobre as regras do Investimento em Valor mas sim sobre o desenvolvimento do temperamento do investidor.Warren Buffett diz que não é preciso ter um QI de 160 para ter sucesso no investimento. É preciso, isso sim, ter o temperamento adequado. É essa a história de A Educação de um Investidor em Valor.
«As crises, como a da economia portuguesa, que resultam de diminuições da poupança tendem a originar recessões mais graves e recuperações mais lentas do que as crises em que o endividamento resultou de aumentos do investimento.Neste livro, Fernando Alexandre, Luís Aguiar-Conraria, Pedro Bação e Miguel Portela mostram a evolução das grandes tendências da poupança e investimento, desde a evolução dos fluxos globais de poupança até aos dados para a economia portuguesa. A sua publicação constitui um excelente contributo para a sistematização destes temas, fulcrais para a evolução económica.O retrato traçado é de um país com uma baixa taxa de poupança e excesso de endividamento, em particular no Estado e nas Empresas, o que constitui um obstáculo ao crescimento e à estabilidade financeira. Todos os agentes económicos acabaram por ter um papel na acumulação do endividamento externo que provocou a necessidade da entrada da troika e de um plano de intervenção externo. Vários fatores conduziram a esse comportamento, em particular as descidas das taxas de inflação e das taxas de juro em simultâneo a um maior acesso ao crédito.Na análise efetuada da composição do património das famílias, percebe-se uma grande concentração da riqueza na habitação e nos depósitos bancários. Apesar da riqueza financeira estar concentrada nos grupos com mais altos rendimentos, observa-se um grande conservadorismo nessas aplicações (74% dos ativos financeiros estão aplicados em depósitos à ordem e depósitos a prazo).O livro conclui com propostas de promoção da poupança, objetivo fulcral para superar os desafios que a economia nacional vai enfrentar nas próximas décadas, em especial com as alterações demográficas que se perspetivam.
Publicada em 2002, no rescaldo do crash das empresas dotcom, The New Buffettology é um guia para a filosofia de investimento de Warren Buffett, o Investimento em Valor.The New Buffettology ensina os investidores a decifrar e a utilizar a informação financeira disponível publicamente tal como Buffett o faz. Passo a passo, guia os investidores através das equações e fórmulas que Warren Buffett utiliza para determinar em que empresas investir e, mais importante, quando.Os autores Mary Buffett e David Clark exploram detalhadamente alguns dos investimentos de Warren Buffett e provam mais uma vez que o Investimento em Valor funciona: consegue rentabilidades acima da média com risco limitado
Widely respected and admired, Philip Fisher is among the most influential investors of all time. His investment philosophies, introduced almost forty years ago, are not only studied and applied by today?s financiers and investors, but are also regarded by many as gospel. This book is invaluable reading and has been since it was first published in 1958. The updated paperback retains the investment wisdom of the original edition and includes the perspectives of the author?s son Ken Fisher, an investment guru in his own right in an expanded preface and introduction."I sought out Phil Fisher after reading his Common Stocks and Uncommon Profits...A thorough understanding of the business, obtained by using Phil?s techniques...enables one to make intelligent investment commitments."Warren Buffet
A propósito deste livro, John Bogle, fundador da Vanguard, escreveu estas palavras: "Este livro mostra-nos o que correu mal com as nossas instituições financeiras e mercados. Neste apelo à ação - aos investidores que coletivamente são donos das empresas americanas - os autores sugerem passos claros para que possamos construir um mundo empresarial que sirva os nossos interesses e não os de Wall Street." Sem compromissos na crítica, mas otimistas na sua visão, Stephen Davis, Jon Lukomnik e Davis Pitt-Watson oferecem uma análise clara dos problemas do sistema financeiro e adiantam soluções práticas que podem mudar o mundo para melhor.
Qual é a taxa de retorno de longo prazo das acções e obrigações? Antes da publicação de "O Triunfo dos Optimistas", era surpreendentemente difícil responder a esta pergunta. Em pouco mais de 300 páginas, este livro fornece a resposta definitiva.Os investidores dão frequentemente demasiada importância à experiência mais recente. Nos anos 50, quem sonharia, a não ser o maior optimista, que, nos 50 anos seguintes, as acções renderiam cerca de 9% ao ano? No entanto, foi o que aconteceu nos Estados Unidos. Os optimistas triunfaram!Os autores desta obra, Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton, apresentam uma análise rigorosa e consistente dos retornos do investimento em acções, obrigações e notas do Tesouro, assim como câmbios e taxa de inflação, em dezasseis países desde o fim do Séc. XIX até ao início do séc. XXI. Esta informação é apresentada de uma forma clara e simples com mais de 130 diagramas que facilitam a comparação.Não restam quaisquer dúvidas, as acções são a classe de activos que melhor remunera o investidor no longo prazo.
Não existe ninguém mais qualificado que John Bogle, fundador e ex CEO dos fundos Vanguard, para denunciar as falhas do sistema financeiro americano e os abusos que aconteceram nos últimos anos. Zeloso defensor do pequeno investidor há mais de 50 anos, Bogle defende a restauração da integridade nas práticas da indústria financeira.Segundo Bogle, um sistema financeiro transparente e confiável é essencial ao progresso económico e social.Este livro não nos conta apenas a história de como tudo correu mal. Explica também o porquê e o que devemos fazer para corrigir o rumo. Para Bogle, a solução é o regresso a um capitalismo dos donos, isto é, o controlo das empresas deverá ser devolvido aos accionistas e retirado dos gestores com as suas stock options e remunerações obscenas.Este é um livro obrigatório para qualquer investidor, analista, legislador, regulador ou empresário.
Como pode uma empresa que nunca apresentou lucros ter uma avaliação de vários biliões de dólares? Por que razão algumas start-ups atraem investimentos milionários e outras não?Aswath Damodaran, professor de finanças e investidor experimentado, argumenta que o poder da história impulsiona o valor da empresa, acrescentando substância aos números e convencendo até os investidores mais cautelosos a correr riscos. Nos negócios, existem os contadores de histórias, que tecem narrativas irresistíveis, e os mastigadores de números, que constroem modelos e fazem contas. Ambos são essenciais para o sucesso, mas só combinando os dois, defende Damodaran, é que um negócio consegue criar e suster valor.Com o auxílio de um conjunto de casos de estudo, Narrative and Numbers descreve como os contadores de histórias podem incorporar e narrar números e como os mastigadores de números podem calcular modelos mais imaginativos e mais resistentes ao escrutínio. Damodaran analisa a origem da Uber e a forma como a narrativa desempenha um papel chave na compreensão de diferentes avaliações. Ele investiga por que o Twitter e o Facebook eram avaliados em biliões de dólares nas suas OPVs e por que um (Twitter) estagnou enquanto que o outro (Facebook) cresceu. Damodaran analisa também modelos de negócio já estabelecidos, tais como a Apple e a Amazon, para demonstrar como a história de uma empresa pode enriquecer ou constranger a sua narrativa. E, através da Vale, uma empresa mineira global, sediada no Brasil, demonstra a influência da narrativa externa e como um país, uma matéria prima ou uma moeda podem influenciar a história de uma empresa.Narrative and Numbers revela os benefícios, os desafios e as armadilhas de tecer narrativas à volta de números e como podemos melhor testar a plausibilidade de uma história.
Richard Thaler, autor de Misbehaving, foi galardoado pela Academia Real das Ciências da Suécia com o Nobel da Economia de 2017.Thaler, professor de economia na Universidade de Chicago, passou a maior parte dos últimos 40 anos a chamar a atenção para o facto de que as pessoas não se comportam como os economistas dizem que se deveriam comportar. As pessoas, ao contrário do que as teorias económicas defendem, não são racionais, não tomam sempre as melhores decisões financeiras e não agem sempre no seu melhor interesse.Este livro - Misbehaving - abre-nos a porta ao campo da economia comportamental. Robert Schiller, também galardoado com o Nobel da economia, declara, "Thaler está na vanguarda da mais importante revolução na economia dos últimos 30 anos. Neste cativante livro, Thaler apresenta os argumentos a favor da economia comportamental e explica porque ainda existe tanta resistência"Ler os livros de Richard Thaler torna-nos melhores investidores.
Por vezes um problema profundamente complexo tem uma solução enganadoramente simples. Esta é a mensagem de The Checklist Manifesto, de Atul Gawande, que explica como uma simples checklist uma lista de tarefas ou procedimentos pode reduzir dramaticamente as probabilidades de erro em situações de vida ou morte.Gawande, ele próprio um cirurgião, defende que a medicina se tornou demasiadamente sofisticada para o seu próprio bem. O volume e complexidade daquilo que agora sabemos excedeu a nossa capacidade individual de aproveitar os seus benefícios de forma correta, segura e fiável. O conhecimento salva-nos e simultaneamente oprime-nos.Gawande compila vários estudos que demonstram quedas dramáticas nas taxas de infeção morte após determinados procedimentos cirúrgicos. A causa destas quedas dramáticas? A implementação de simples checklists.Este livro pode ser resumido em três frases:As checklists protegem-nos de erros;As checklists estabelecem um padrão superior de performance;No fim de contas, uma checklist não é mais que uma ferramenta. Se não ajudar, algo está errado.As checklists podem ser aplicadas em todas áreas da atividade humana, na aviação, arquitetura e até nos investimentos.Warren Buffett e Charlie Munger utilizam uma checklist muito simples:Compreendo o negócio?É um negócio excelente (tem vantagens competitivas, altos retornos no capital, etc.)?Os gestores são capazes e honestos?O preço é atrativo?Se a alguma das questões acima respondemos não, provavelmente não devemos investir. Revisitando a história recente da bolsa portuguesa, muito valor poderia ter sido salvo se esta checklist tivesse sido aplicada.Atul Gawande foi recentemente nomeado CEO da empresa de cuidados médicos criada por Warren Buffett, Jeff Bezos e Jamie Dimon - três referências mais do que suficientes para prestar atenção ao que Gawande escreve.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de outubro, partilhamos a sugestão de António Murta, CEO da Pathena e Administrador Não-Executivo da Casa de Investimentos (Ver Nota Biográfica António Murta).Memórias de Adriano"Porquê recomendar um livro de literatura a investidores / gestores profissionais? Porque é o melhor livro que eu conheço sobre liderança. É uma quase-biografia de um homem extraordinário (o Imperador Adriano), que geriu um Império (Romano).Marguerite Yourcenar retrata, de um modo romanceado é certo, mas extraordinariamente vívido a vida de um homem, as suas escolhas e as escolhas dos homens de confiança que o haviam de rodear. É para mim o melhor livro de Marguerite Yourcenar e isso já é dizer muito quando se escreveu também A Obra ao Negro, O Tempo esse grande Escultor entre outros.Recomendação de leitura por António Murta, Managing Partner, Co-Fundador e CEO da Pathena e Administrador Não-Executivo da Casa de Investimentos.
Quando questionados acerca das tendências globais: - que percentagem da população mundial vive em pobreza extrema?- por que motivo aumenta a população mundial?- quantas meninas completam o ensino básico? - erramos sistematicamente as respostas.Erramos de uma forma tão enfática que um chimpanzé, escolhendo as respostas aleatoriamente, consegue, de forma consistente, melhores resultados que jornalistas, prémios Nobel e banqueiros.Afinal, o mundo está em muito melhor estado do que julgamos. Quando nos preocupamos com tudo a toda a hora e não adotamos uma perspetiva global baseada nos factos, perdemos a capacidade de nos concentrarmos naquilo que realmente nos ameaça.Em Factfulness, Hans Rosling, o Professor de Saúde Internacional famoso pelas suas TED Talks, oferece-nos uma explicação radical para este fenómeno e revela os dez instintos que distorcem a nossa perspetiva.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de novembro, partilhamos a sugestão de Fernando Alexandre, Professor Universitário na Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho.Enlightenment NowA percepção da maioria da população, em muitos países desenvolvidos, é que o mundo está cada vez pior e que não está no bom caminho. Não podemos ignorar as guerras que persistem, a pobreza que convive ao lado da mais absoluta riqueza ou as doenças que continuam a tornar tão difícil a vida de tantas pessoas. No entanto, contra a percepção da maioria, os factos mostram que o mundo registou um extraordinário progresso nos últimos três séculos, proporcionando mais rendimento e mais qualidade de vida a cada vez mais pessoas e reduzindo o número das que vivem em situação de pobreza, situação de guerra, expostas ao crime e insegurança ou que morrem prematuramente, para valores que, apenas há algumas décadas, eram impensáveis.Steven Pinker, professor na Universidade de Harvard, escreveu o livro Enlighenment Now como um manifesto em defesa das instituições do Iluminismo, que estiveram na origem daquele extraordinário progresso da humanidade e que estão hoje sob ataque de movimentos populistas. Estes movimentos preferem o nacionalismo ao cosmopolitismo, o autoritarismo à democracia, desvalorizam o conhecimento científico e, mais do que um futuro melhor, procuram um passado idílico, que nunca existiu.Pinker lembra que as instituições refletem formas de cooperação que as sociedades foram aperfeiçoando ao longo do tempo e que permitem que o bem universal se sobreponha aos egoísmos individuais e de grupos de interesse. Entre as regras que favorecem o progresso estão a abertura à crítica, a liberdade de expressão, a cooperação, o cosmopolitismo, os direitos humanos, o reconhecimento da falibilidade do ser humano. Entre as instituições que promovem o progresso estão a ciência, a educação, os media, os governos democráticos, as organizações internacionais e os mercados. Apresentando um manancial de dados sobre o progresso e os seus benefícios para o bem-estar da humanidade, Pinker mostra por que é que hoje, mais do que nunca, é essencial preservar as instituições que herdámos do Iluminismo. Utilizando a razão, a ciência e os princípios do humanismo será mais fácil ultrapassar os problemas que se colocam à sociedade, evitando retrocessos civilizacionais e o regresso da barbárie, que, como sabemos, está sempre à porta.Recomendação de leitura por Fernando Alexandre, Doutorado em Economia pela Universidade de Londres - Birkbeck College. Professor Associado da UMinho, consultor da área de estudos económicos da Fundação Francisco Manuel dos Santos e Presidente do Conselho de Administração da SBS Startup Braga Investimentos em Startups, SA. Foi Pró-Reitor da UMinho para a Valorização do Conhecimento e Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna no XIX Governo Constitucional. É autor e coordenador de quatro livros sobre a economia portuguesa. Prestou serviços de consultoria para entidades como a Fundação Calouste Gulbenkian, o Tribunal de Contas, o Governo português, a Associação Portuguesa de Seguradores ou a Associação Comercial do Porto.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de dezembro, partilhamos a sugestão de Luísa Anacoreta, Professora Auxiliar da Universidade Católica Portuguesa, Administradora não executiva dos CTT, Impresa e Sonaegest.Elogio da SombraO Japão é um país fascinante. Reconhecido pela sua capacidade de desenvolvimento e afirmação tecnológica, económica e, receio, também social, é para alguns difícil concebê-lo abstratamente nos conceitos tradicionais de leveza, suavidade, paz, calma e beleza. Ler o Elogio da Sombra permite deliciarmo-nos com as raízes de um país riquíssimo em história, cultura e primor estético. É um livro obrigatório para quem quer visitar o Japão, porque toda a sua visita fará muito mais sentido. Mas também essencial para quem apenas tem curiosidade sobre o país e sobre aquela cultura oriental.Mas, o Elogio da Sombra é lido com muito prazer também por aqueles que apenas querem ler quem escreve bem, e refletir sobre o que a todos um pouco interessa. Tanizaki faz-nos pensar sobre arquitetura, cosméticos, mobiliário, comida, sobre o que carateriza a evolução dos tempos, sobre contrastes entre hoje e ontem, ou amanhã e antes de ontem, sobre feio e bonito, ou atraente e repelente ou ainda sobre Ocidente e Oriente.Junichiró Tanizaki nasceu no centro de Tóquio em 1886 e fez-se o mais célebre contador de histórias do seu país. Da leitura das suas páginas vamos sentindo uma escrita suave, reveladora de uma grande sensibilidade. O tema é a estética, e portanto a beleza, mas o que se sente é uma forte nostalgia. Como se Tanizaki nos quisesse avisar que na sombra do que é belo há de estar sempre uma recordação.Confesso que procuro evitar nostalgias. Gosto do futuro e de o desenhar. Olhar para trás é perda de tempo. Mas ler Tanizaki a descrever as casas japonesas, a luz quente filtrada pelos shoji, o jogo de luz e sombra das toko no ma, e a irradiação misteriosa do papel dourado não é olhar para atrás. É ler a beleza, ler a paz, e transportarmo-nos para um espaço singular, sem dúvida penetrante e atraente.O Elogio da Sombra, sendo um ensaio sobre estética e não um romance, é um livro atípico de um dos maiores escritores japoneses. Foi escrito em 1933 mas para mim é intemporal. Deliciei-me a lê-lo. Recomendo-o a muitos e esses também se deliciam.Recomendação de leitura por Luísa Anacoreta, Doutorada em Gestão, com especialização em Contabilidade, pelo ISCTE. Professora Auxiliar da Universidade Católica Portuguesa. Administradora não executiva dos CTT, Impresa e Sonaegest. Presidente da Comissão de Auditoria dos CTT e vogal da Comissão de Auditoria da Impresa. Presidente do Conselho Fiscal do Centro Hospitalar de São João e da Sogrape. Vogal do Conselho Diretivo da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas. Membro da Comissão Executiva da Comissão de Normalização Contabilística. Árbitro fiscal no CAAD. Autora de livros e outras publicações na área contabilístico-fiscal.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de setembro, em que damos um novo cunho a esta rubrica, temos o privilégio de partilhar a sugestão do Professor António Cunha, ex-Reitor da Universidade do Minho e Presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Casa de Investimentos (Ver Nota Biográfica António Cunha).Tecnologia versus Humanidade"Vivemos tempos muito particulares, marcados por uma revolução digital que está a introduzir transformações profundas nos nossos modos de vida, de trabalho e de organização das nossas sociedades. Assistimos igualmente a uma revolução biológica, em grande parte induzida por desenvolvimentos ao nível computacional, e ao limiar de uma era que será marcada por uma interação sem precedentes entre o tecnológico e o humano.Este tempo novo é descrito e analisado por Gerd Leonhard no livro Tecnologia vs. Humanidade, editado em Portugal pela Gradiva em 2017.Assumindo e consubstanciando a ideia de que estamos a protagonizar uma revolução sem precedentes e com impactos muito maiores do que os que resultaram da invenção da máquina a vapor ou da introdução dos computadores, Leonhard descreve a natureza exponencial, combinatória e recursiva das transformações em curso, que irão alterar radicalmente as interações entre humanos e máquinas. Para alem da partilha com robôs de operações e tarefas que sempre associamos a pessoas, partilharemos conhecimento e inteligência com máquinas que, cada vez mais, tomarão decisões.Leonhard analisa igualmente, de modo muito lúcido e de fácil leitura, as implicações destes desenvolvimentos e nossos atuais conceitos civilizacionais e levanta pertinentes interrogações sobre os seus limites. De facto, a humanidade, confronta-se com a necessidade imperiosa de refletir e fazer balanços sobre o seu futuro, decidir como avançar na procura de caminhos seguros no sentido de um aparentemente irrecusável mundo novo, marcado pelo aumento da longevidade humana e pela tendencial eliminação de trabalho físico, repetitivo ou perigoso.É para este debate que o capítulo final deste livro A hora de decidir introduz sugestões importantes para uma reflexão estruturada."Recomendação de leitura por António Cunha, Professor Catedrático, ex-Reitor da Universidade do Minho e Presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Casa de Investimentos.
Até 1999, os Estados Unidos não incluíam o software nos cálculos do PIB. Em 2006, a Microsoft era a empresa mais valiosa do mundo, com uma capitalização bolsista de 250 biliões de dólares. No seu balanço, constavam 3 biliões de dólares de ativos tradicionais, pouco mais de 1% do seu valor de mercado. O valor restante era justificado pelo design de produtos, ideias geradas pelo seu programa de Investigação & Desenvolvimento (I&D), a sua marca, a cadeia de fornecimento global, estruturas internas e o capital humano criado com a formação interna.Atualmente, o PIB americano ainda não inclui investimentos em pesquisas de mercado, branding e formação - ativos intangíveis em que as empresas investem biliões todos os anos. Esta é a nova economia e a percentagem destes investimentos na economia mundial não para de crescer.O livro Capitalism without Capital: The Rise of the Intangible Economy, de Jonathan Haskel e Stian Westlake, explica as diferenças fundamentais do investimento intangível e a sua importância. Os autores começam por definir ativos intangíveis como qualquer coisa em que não podemos tocar. A grande diferença, quando comparadas com a velha economia, é que as indústrias intangíveis têm dinâmicas muito diferentes em termos de velocidade de mudança, risco e competição e estes fatores são determinantes na forma como se avaliam estes negócios.O núcleo do livro é uma explicação dos Quatro S que diferenciam os investimentos intangíveis: scalability (capacidade de escalar o negócio), sunkenness (incapacidade de recuperar os custos), spillovers (efeitos de repercussão) e sinergias.Estas quatro propriedades aliam-se para criar duas características gerais adicionais. Em primeiro lugar, há uma maior incerteza quanto ao valor do investimento intangível relativamente ao investimento tangível. A combinação de sunkenness e spillovers pode significar que o investimento não terá retorno. Em alternativa, a combinação de sinergias e escala pode levar a sucessos inesperados que criam valor para os donos dos ativos intangíveis.Em segundo lugar, os intangíveis tendem a ser contestados. Tal como os autores explicam, as pessoas e negócios frequentemente disputam quem os controla, os possui ou beneficia com eles.Capitalism without Capital descreve também a ligação entre o aumento dos intangíveis e outros desafios estagnação, desigualdades crescentes e o impacto da alteração dos padrões de investimento nas políticas públicas. O livro reforça a necessidade de atuação dos legisladores para que se ajustem as políticas económicas de forma a refletir estas novas realidades, políticas de concorrência e questões fiscais.Os autores apresentam três cenários possíveis para o que poderá ser o mundo intangível do futuro e sugerem de que forma os gestores, investidores e políticos podem explorar as características de uma era intangível para potenciar os seus negócios, portefólios e economias.Este livro não é de leitura difícil, mas interpretar as suas muitas lições pode ser um desafio um desafio altamente recomendável para quem é investidor ou se interessa por o que pode ser o futuro.
Gestão descontraída, mas Profissional é o meu primeiro livro. Não é mais um livro sobre gestão, é uma obra a pensar nas PME portuguesas. Nele, revelo muitas das práticas que estão na base do sucesso da PHC Software.Ao longo da obra, explico tudo o que gostava de ter aprendido na faculdade, mas que fui aprendendo com a experiência na prática.Este é um livro a pensar nos gestores portugueses, com exemplos práticos, baseados em conhecimento de gestão comprovado e que podem ser facilmente aplicados no tecido empresarial português.Na introdução da obra afirmo que A gestão é acima de tudo uma ciência prática que pode ser aprendida através do erro ou pela partilha de conhecimento da experiência e completo afirmando que Este é o livro que gostava de ter lido quando comecei a empresa e que evitava muitos erros que fui cometendo.Ao longo de nove capítulos, este meu livro é uma viagem de gestão para os gestores que procuram exemplos para melhorar as suas empresas e divide-se em três partes: a gestão do próprio indivíduo, a gestão da equipa e a gestão da empresa. Lembre-se que as práticas internas da gestão da empresa, agora tornadas públicas, estão na base do sucesso da PHC Software, que nasceu há trinta anos por dois amigos de faculdade e que é hoje uma multinacional que bate recordes de venda há vários anos consecutivos e que tem sido distinguida e ganho prémios pelas suas boas práticas.____Ricardo Parreira é CEO da PHC Software. Licenciado em gestão e com MBA em marketing, ambos pela Universidade Católica. Destaca-se por ser um líder que inspira boas práticas de gestão e a atitude para a felicidade no local de trabalho, características que têm permitido à PHC crescer de forma sustentável. Tem criado na PHC um ecossistema focado na best experience at work. Um conceito que procura construir empresas com pessoas mais felizes, motivadas e consequentemente mais produtivas.
No livro Only the Best Will Do, o investidor Peter Seilern revela o que é necessário para investir em empresas de qualidade incontestável (Quality Growth): empresas que retornam aos seus acionistas, de forma confiável, um crescimento sólido e estável no longo prazo.Os negócios de Quality Growth são os ativos preferenciais para os investidores que desejam investir para o longo prazo, minimizando o risco de perda permanente de capital. Segundo Seilern, tudo o que o investimento em Quality Growth exige é paciência, pensamento independente e as 10 regras de ouro - reveladas em detalhe no livro - para encontrar as melhores empresas do mundo.Tal como Warren Buffett declarou: É melhor comprar empresas excelentes a preços razoáveis do que empresas razoáveis a preços excelentes
Novas Lições de Liderança de CEO Portuguesas, de que eu e Maria Serina somos autoras, é a destilação de dez extensas e aprofundadas entrevistas com Carla Rebelo, diretora geral do Adecco Group, Carmo Sousa Machado, chairman da Abreu Advogados, Clara Raposo, presidente do ISEG, Cristina Campos, presidente do Grupo Novartis, Cristina Rodrigues, administradora delegada da Capgemini, Dulce Mota, CEO do Montepio, Marta Carvalho Araújo, CEO da Castelbel, Paula Panarra, country manager da Microsoft, Ruth Breitenfeld, vice-presidente da Cepsa, e Vera Pinto Pereira, administradora executiva do Grupo EDP. Estas 10 executivas lideram em diferentes setores de atividade (banca, tecnologia, consultoria, energia, academia, indústria, recursos humanos, advocacia e consumo) e têm percursos muito diversificados. Em entrevistas francas, partilham como chegaram aos lugares que hoje ocupam, os principais desafios que enfrentaram, as conquistas que alcançaram, os receios que sentiram, os erros que cometeram e as principais aprendizagens que fizeram. Este livro surge na senda de Lições de Liderança de CEO Portuguesas, publicado em 2016,com edição esgotada, para dar palco a outras dez mulheres que lideram importantes empresas em Portugal, com o objetivo de inspirar as novas gerações de líderes. São testemunhos muito valiosos para todas as mulheres que ambicionam construir uma carreira de sucesso. Mais do que isso, são lições de liderança úteis a homens e mulheres, porque a boa liderança não tem género. Isabel Canha, jornalista, é co-fundadora e directora da Executiva.pt, depois de perto 30 anos de jornalismo na área dos negócios, em que se inclui a direcção da revista Exame (de Setembro de 2003 a Dezembro de 2012). É autora dos livros As Mulheres Normais têm Qualquer Coisa de Excepcional; António Champalimaud Construtor de Impérios (com Filipe S. Fernandes); e Memórias de Executivas, Lições de Liderança de CEO Portuguesas, Como Chegar a Líder (coordenação), O Sucesso Não Cai do Céu e Novas Lições de Liderança de CEO Portuguesas (todos com Maria Serina). Foi organizadora licenciada da TEDxBelémWomen (em 2013) e oradora na TEDxFCT-UNL 2013 com o tema Telhado de Vidro. Será oradora na TEDxPorto, em Março de 2020. Licenciada em Direito pela Faculdade de Direito de Lisboa, tem extensa formação complementar em Gestão, Finanças, Marketing, Liderança e Jornalismo. Nos tempos livres, dança tango.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de janeiro, interrompemos excecionalmente este "roteiro" para recuperar "The Battle For The Soul Of Capitalism", assinalando desta forma a vida do extraordinário Investidor, Fundador e ex-CEO dos Fundos Vanguard, John Bogle, que faleceu no passado dia 16.A Batalha pela Alma do CapitalismoNeste livro, publicado em 2005, ainda antes da grande crise financeira de 2008, Bogle é extremamente crítico dos gestores de grandes empresas e aponta o dedo ao sistema financeiro. Para si, a grande dispersão do capital das grandes multinacionais em bolsa faz com que não haja um dono responsável. Os investidores grandes institucionais ou particulares não assacam responsabilidades aos gestores. Os grandes institucionais que detêm grande parte das ações e na maioria dos casos são detidos por grandes bancos gerem os fundos de pensões destas grandes multinacionais e são contratados para as operações de banca de investimento, que proporcionam comissões extraordinárias. Ora, não têm liberdade para questionar as remunerações de gestores, as políticas de aquisições ou a falta de estratégia de criação de riqueza para os acionistas a longo prazo. Os pequenos investidores são estimulados a olhar para o curto prazo e as ações são papel para trocar de mãos todos os dias, permitindo elevadas comissões de transação. Os auditores, que deveriam vigiar a atividade dos gestores para minorar conflitos de interesses, são, eles próprios, contratados por aqueles que terão que avaliar.Através de inúmeros exemplos com factos concretos e nomes, Bogle escreve que assistimos a uma enorme transferência de riqueza dos acionistas para os gestores de grandes multinacionais, financeiras ou não, que pagam a si próprios compensações extravagantes. Nas instituições financeiras, esta transferência acontece, não só de acionistas, mas também de clientes para administrações e gestores. Entre 1997 e 2002, o total de comissões pagas pelos investidores norte americanos aos bancos, corretoras e fundos de investimentos excedeu os 1,275 triliões de dólares.Segundo Bogle, um sistema financeiro transparente e confiável é essencial ao progresso económico e social. Este livro não nos conta apenas a história de como tudo correu mal. Explica também o porquê e o que devemos fazer para corrigir o rumo. Aponta uma variedade de causas para se ter chegado aqui, cada uma interagindo com e reforçando as outras: a ascensão do CEO imperial; os truques da engenharia financeira no reporte de resultados; o falhanço dos nossos guardiões auditores, reguladores, gestores de investimentos e conselhos de administração que se esqueceram a quem deviam lealdade; as instituições financeiras que passaram a ser traders de ações ao invés de se comportarem como donos de ações; a hipérbole promocional de Wall Street; a vontade dos analistas em pôr de lado o seu cepticismo; a excitação frenética dos media; e, obviamente, os membros do público investidor que festejam sempre o lucro fácil. Foi esta conspiração entre todas as partes interessadas, que baixou os padrões do negócio. Conclui, que este é o capitalismo dos gestores e não o dos donos, como deveria ser.
Como alocadores de capital, o nosso trabalho é encontrar negócios com grandes vantagens competitivas e elevada probabilidade de as manter por largos anos. Mais importante do que comprar um negócio razoável em saldo, é comprar um negócio excecional a preços sensatos. O que torna um negócio excecional é o seu poder de criar valor para os acionistas da empresa (através de lucros sólidos e crescentes para o futuro) e para os clientes (através da oferta de valor presente nos serviços e produtos que vende).
Quando um gestor com uma reputação brilhante assume a gestão de um negócio com uma má reputação económica, é a reputação do negócio que se mantém intacta.
-- Warren Buffett
O capital procura sempre as áreas com maior retorno esperado. Os investidores avaliam as empresas pelo seu crescimento e capacidade para aumentar os seus lucros e, quase sempre, assumem que esta tendência se manterá para o futuro. Muitas vezes, as empresas que parecem fantásticas no espelho retrovisor, acabam por ter performances mais fracas no futuro. A natureza básica de qualquer mercado livre é que, quanto maiores forem os lucros, mais forte será a concorrência.
O conceito de vantagens competitivas, ou fossos económicos, é crucial para a forma como aferimos o valor de uma empresa. Michael Porter, professor de Harvard, e Warren Buffett foram os pioneiros a estabelecer os princípios da análise da estratégia competitiva e dos fossos económicos.
Porter diz que "vantagem competitiva é o coração da performance da empresa em mercados livres. O seu trabalho pretende mostrar como uma empresa pode criar e manter as vantagens competitivas na sua indústria e como pode implementar estratégias que as fortaleçam para o futuro.
Buffett explica as vantagens competitivas como os atributos que a empresa tem que lhe permitem manter os concorrentes à margem. A este conjunto de vantagens competitivas chama-lhe moat, ou fosso, como os que existiam à volta dos castelos medievais para os proteger dos inimigos. Ou seja, a empresa cria à sua volta um fosso que lhe permite manter os concorrentes afastados e continuar a beneficiar de lucros acima da média do setor. Certamente que os concorrentes tentarão sempre obter uma parte desses lucros e, na realidade, a maior parte das vezes, conseguem-no reduzindo as rentabilidades do negócio.
Como alocadores de capital, o nosso trabalho é encontrar negócios com grandes vantagens competitivas e elevada probabilidade de as manter por largos anos. Mais importante do que comprar um negócio razoável em saldo, é comprar um negócio excecional a preços sensatos.
O que torna um negócio excecional é o seu poder de criar valor para os acionistas da empresa (através de lucros sólidos e crescentes para o futuro) e para os clientes (através da oferta de valor presente nos serviços e produtos que vende).
Warren Buffett diz que demorou quase 20 anos a compreender este facto: um negócio excecional comporá sempre os retornos, ano a ano, a taxas excecionais. Um negócio razoável pode ser comprado barato, mas continuará a compor retornos a taxas medíocres e rapidamente será ultrapassado pelo primeiro.
Como podemos avaliar as vantagens competitivas e a sua durabilidade?
Analisamos os últimos 10 anos da atividade da empresa:
Primeiro, os lucros históricos para determinar se a empresa tem sido capaz de gerar retornos sólidos nos seus ativos e nos seus capitais próprios. O objetivo é determinar se a empresa conseguiu construir o fosso à volta do seu negócio.
Segundo, a origem dos lucros: se a empresa conseguiu retornos sólidos e lucros consistentes, o que impede os concorrentes de lhe "roubar" os lucros?
Terceiro, devemos estimar quanto tempo poderão durar estas vantagens competitivas: algumas empresas conseguirão fazê-lo durante anos, outras conseguem fazê-lo décadas.
Quarto, a estrutura competitiva da indústria. Como competem entre si as empresas desta indústria? A indústria é atrativa? Tem muitas empresas lucrativas ou lutam pela sobrevivência?
Analisar as vantagens competitivas é uma atividade complexa. O que procuramos são empresas que conseguem lucros em excesso do seu custo de capital - empresas que conseguem gerar substanciais somas de dinheiro relativamente aos investimentos feitos. Para o fazer, usamos algumas métricas, ou atalhos, que permitem fazer o trabalho de identificação das empresas que têm realmente vantagens competitivas:
1- A empresa gera free cash flow? Se sim, quanto? Às empresas que geram free cash flow sobra dinheiro depois de reinvestirem o que é necessário para manter o negócio a funcionar. Ou seja, este é o dinheiro que pode ser retirado todos os anos da empresa sem danificar o negócio. Se dividirmos o free cash flow pelas vendas (ou receitas) isto diz-nos qual é a proporção de cada euro, ou dólar, em vendas que a empresa é capaz de converter em lucros em excesso. Se este quociente resultar em 5% ou mais, é muito provável que tenhamos encontrado uma máquina de fazer dinheiro e é um excelente sinal de que a empresa tem fosso económico.
2 - Quais as margens líquidas da empresa? A margem líquida é resultado líquido em relação às vendas e diz-nos quantos lucros a empresa gera por euro de vendas. Empresas que conseguem 15% ou mais estão a fazer um bom trabalho.
3 - Que retornos tem no capital próprio (Return on Equity, ROE)? São os resultados líquidos em relação aos capitais próprios e mede os lucros relativamente a cada dólar de capital que os acionistas investiram na empresa. Embora com algumas falhas, esta medida é útil como ferramenta para avaliar os lucros globais. As empresas que consistentemente geram 15% ou mais, estão a gerar retornos sólidos com o dinheiro dos acionistas.
4 - Quais são os retornos nos ativos, (Return on Assets, ROA)? São os resultados líquidos em relação aos ativos da empresa e mede a eficiência com que a empresa transforma os seus ativos em lucros. Se a empresa consegue um valor superior a 6 a 7%, poderá ter uma vantagem competitiva face aos concorrentes.
As empresas apresentadas na tabela são exemplos de negócios com vantagens competitivas e que nos últimos cerca de 30 anos remuneraram generosamente os seus acionistas. Nunca devemos esquecer, no entanto que, por muito boa que seja uma empresa, não vale um preço infinito.
Na análise da empresa e destas métricas, a consistência é essencial, uma vez que é a capacidade de manter os concorrentes afastados durante um longo período de tempo que torna a empresa valiosa. Depois de olhar para 20 ou 30 anos de resultados, é essencial analisar profundamente a consistência dos últimos.
Na Casa de Investimentos, focamo-nos num conjunto limitado de boas empresas cujos negócios subjacentes tenham fundamentos económicos soberbos, que sejam geridas por gestores capazes, honestos e com história de criação de valor para os acionistas. Analisamos estes negócios e estimamos, conservadoramente, o seu valor intrínseco. Este é o valor que nos permitirá tomar a decisão sobre o preço a que devemos comprar. Independentemente da qualidade do ativo e da excelente equipa de gestão, só compramos quando a sua cotação de mercado é substancialmente inferior ao valor que determinámos. Este é o conceito mais importante do investimento: margem de segurança.
Na realidade, não existem muitas centenas de negócios extraordinários e muitos deles transacionam normalmente a prémio. Só em circunstâncias extraordinárias, estes negócios vêm cotar preços que julgamos baratos. É nessas circunstâncias que estamos compradores.
Ao prestar grande atenção à avaliação das empresas, estamos a maximizar o impacto de algo que conseguimos prever - a performance operacional e financeira da empresa) - nos nossos retornos de investimento e a minimizar aquilo que não conseguimos adivinhar - o entusiasmo ou pessimismo de grande parte do mercado.
É comum ouvimos dizer que um ativo vale aquilo que pagam por ele. Não é verdade. Com frequência os ativos cotam preços muito diferentes do seu valor. Uma empresa vale o valor presente de todo o dinheiro que vai ganhar no futuro.
Charlie Munger, sócio de Warren Buffett, aconselha:
"Procure mais valor, em termos de cash flow futuro, do que o que está a pagar. Aja apenas quando tiver uma vantagem. É muito básico. Tem que compreender as probabilidades e ter a disciplina de só investir quando as estas estão a seu favor".
Artigo originalmente escrito por Emília Vieira para a Vida Económica, em julho de 2015, e atualizado em 16/07/2018.
A parábola do Touro de John Kay, reputado economista escocês, retrata com humor como funciona o sistema financeiro. Relembramos assim a crise financeira de 2008.
A Parábola do Touro de John Kay, reputado economista escocês, retrata com humor como funciona o sistema financeiro. Relembramos assim a crise financeira de 2008.
Há uns anos, John Kay, reputado economista escocês e colunista durante mais de 12 no Financial Times, relatava num artigo de opinião a parábola do Touro que transcrevo:
"Em 1906, o grande estatístico Francis Galton assistiu, numa feira rural, a um concurso onde se tentava adivinhar o peso de um touro. Participaram oito centenas de pessoas. Galton, como estatístico que era, fez testes estatísticos sobre os números. Descobriu que a estimativa média era extremamente próxima do peso real do touro. Esta história foi contada por James Surowiecki, no livro "The Wisdom of Crowds".
Poucas pessoas sabem o que se passou de seguida. Alguns anos mais tarde, a balança do concurso parecia estar a ficar cada vez menos fiável. A reparação seria muito dispendiosa; no entanto, o organizador da feira teve uma ideia brilhante. Uma vez que os concorrentes eram tão bons na estimativa do peso do touro, era desnecessário reparar a balança. O organizador simplesmente recolheria as estimativas de todos os concorrentes e calcularia a média.
Surgiu, no entanto, um novo problema. Uma vez que estes concursos eram cada vez mais populares, alguns participantes tentavam fazer batota, ao ponto de procurarem conseguir informações privilegiadas do agricultor que tinha criado o touro. Temia-se que, se algumas pessoas tivessem essa vantagem, as outras se recusariam a participar no concurso de adivinhação do peso. Com apenas alguns participantes, não se poderia confiar na sabedoria da multidão. O processo de descoberta do peso poderia ficar comprometido.
Decidiu-se então introduzir regras rigorosas. O agricultor foi convidado a preparar boletins trimestrais sobre o desenvolvimento do seu touro. Estes boletins eram publicados nos portões do mercado para que todos pudessem ler. Se o agricultor partilhasse com amigos qualquer outra informação relevante sobre o animal, esta deveria ser também publicada nos portões do mercado. Qualquer pessoa que participasse no concurso com conhecimento, sobre o touro, que não estava disponível para todos, seria expulso do mercado. Desta forma, seria mantida a integridade do processo de adivinhação do peso.
O conteúdo destes anúncios regulatórios era escrutinado por analistas profissionais que aconselhavam os seus clientes sobre as suas implicações. Pagavam almoços e jantares aos agricultores; mas, a partir do momento em que os agricultores foram obrigados a ter cuidado com as informações que divulgavam, essas refeições tornaram-se menos frutíferas.
Alguns analistas mais inteligentes perceberam que a informação sobre a nutrição e a saúde do touro não era assim tão útil. Uma vez que já não se pesava o touro, a chave para o sucesso não era adivinhar corretamente o seu peso, mas sim adivinhar corretamente o que as outras pessoas iriam adivinhar. Ou o que os outros imaginariam que os outros iriam adivinhar. E assim por diante.
Algumas pessoas, como o velho agricultor Buffett, tentaram chamar a atenção para o facto de que os resultados deste processo estarem cada vez mais divorciados da realidade da criação de touros. Foi completamente ignorado. A verdade é que os animais do agricultor Buffett pareciam saudáveis e bem alimentados e a sua situação financeira era cada vez mais próspera; mas Buffett era um simples camponês que não compreendia como os mercados funcionavam.
Foram criados organismos internacionais para definir as regras de avaliação do peso do touro. Havia dois padrões concorrentes - Os Princípios de Pesagem do Touro Geralmente Aceites e os Padrões Internacionais de Pesagem do Touro. Ambos concordam, no entanto, com um princípio fundamental, consequência da necessidade de eliminar o papel da subjetividade individual. O peso do touro foi definido oficialmente como a média de todas as estimativas.
Por vezes, havia poucas ou mesmo nenhumas estimativas do peso do touro. Mas rapidamente se resolveu esse problema. Matemáticos da Universidade de Chicago desenvolveram modelos a partir dos quais era possível calcular a média das estimativas, se essas estimativas tivessem sido levadas a cabo. Deixou de ser necessário qualquer conhecimento de pecuária, apenas era preciso um computador potente.
Por esta altura, havia já uma enorme indústria de adivinhadores de peso profissionais, organizadores de concursos de adivinhação de peso e consultores que ajudavam, a troco de uma comissão, as pessoas a refinar as suas estimativas. Algumas pessoas sugeriram que seria mais barato reparar a balança. Foram, no entanto, ridicularizadas. Porque motivo se regressaria a um tempo em que se dependia apenas de uma pessoa quando podemos beneficiar da sabedoria agregada de tantas pessoas inteligentes?
Entretanto, o touro morreu. No meio de toda esta atividade, ninguém se lembrou de o alimentar".
A importância da balança
John Kay ilustra com esta parábola a complexidade - totalmente desnecessária - dos mercados financeiros. O resultado final para os investidores é negativo.
A melhor fundação para qualquer investimento é o valor e o que se poderá extrair do bem. Para isso, temos que ter uma ideia sólida do que vale aquilo que estamos a comprar. Esta é a "balança" que nos permite aferir quanto vale.
Saber quanto vale é determinante no investimento porque nos dá a disciplina necessária para realizar lucros num ativo altamente valorizado que todos acham que vai continuar a subir ou para manter em carteira e comprar mais durante uma crise mesmo que os preços caiam todos os dias. Obviamente, para que estes esforços deem fruto, a nossa estimativa de valor não precisa de ser um número exato. Um cálculo aproximado permite-nos definir a margem de segurança que precisamos para decidir a que preço comprar. A diferença entre preço e valor - a margem de segurança - guarda a chave para o sucesso no investimento.
Para além da Balança
A relação entre preço e valor é influenciada pela psicologia e fatores técnicos, forças que podem dominar os fundamentais no curto prazo. As variações extremas nos preços devidas a estes fatores, fornecem oportunidades para grandes lucros ou grandes erros. As economias e os mercados têm ciclos positivos e negativos. Qualquer que seja a direção que tomam em determinado momento, as pessoas acreditam que essa direção será eterna. Esta forma de pensar é muito perigosa uma vez que envenena os mercados, causa avaliações extremadas e inflaciona bolhas e pânicos aos quais muitos investidores não resistem.
No investimento como em tantas outras áreas, é mais confortável seguir a multidão. A maioria dos investidores movimenta-se num padrão regular, tal como um pêndulo: do otimismo ao pessimismo; da credulidade para o ceticismo; do medo de perder oportunidades ao medo de perder dinheiro; da vontade de comprar à urgência em vender. O balançar do pêndulo faz com que grande parte das pessoas compre a preços altos e venda a preços baixos. Esta é a receita para o desastre enquanto que remar contra a maré, nos extremos do mercado, ajuda a evitar perdas e é determinante para o sucesso.
O conforto de ser investidor em valor
Para a maioria dos gestores profissionais de fundos, prisioneiros da medição trimestral da performance - e de todo o sistema evidenciado na parábola do touro - o valor de um ativo é aquilo que alguém está disposto a pagar por ele.
Para nós, investidores em valor, um ativo vale o mais alto do seu valor fundamental e do seu valor de mercado: se o preço de mercado é superior ao valor fundamental, o investidor em valor pode vender ao preço de mercado e procurar alternativas. Se o preço de mercado é inferior ao valor fundamental, o investidor em valor pode continuar a manter o ativo em carteira e beneficiar dos retornos dos cash flows futuros.
A volatilidade do Mercado - que por vezes está disposto a comprar coisas por mais do que elas valem ou vendê-las por menos do seu valor - é nossa amiga. O investidor em valor tem uma vantagem no que diz respeito ao valor fundamental porque faz uso da "balança", dispensa as opiniões da maioria, os consultores desnecessários, os analistas adivinhos e atua baseado no valor do bem.
No curto prazo, o mercado é uma máquina de votar - refletindo um "recenseamento" que requer apenas dinheiro e não inteligência ou estabilidade emocional - mas no longo prazo, o mercado é uma máquina de pesar - uma balança. -- Benjamin Graham
Artigo originalmente escrito por Emília Vieira para a Vida Económica, em dezembro de 2016, e atualizado em 18/09/2018, por ocasião dos 10 anos da crise financeira de 2008.
Em 1980, 5% dos americanos detinham 50% da riqueza do país. No final de 2012, detinham já cerca de 67%. O crescimento da desigualdade verificou- se por todo o mundo. Porque está a riqueza tão concentrada no topo?
Em 1980, 5% dos americanos detinham 50% da riqueza do país. No final de 2012, detinham já cerca de 67%. O crescimento da desigualdade verificou- se por todo o mundo. Porque está a riqueza tão concentrada no topo?
Várias razões contribuem para o aumento da desigualdade. Primeiro, a desigualdade nos rendimentos: as pessoas que ganham mais conseguem também poupar mais e, consequentemente, investir mais, criando mais riqueza ao longo do tempo, aumentando o fosso entre as taxas a que conseguem criar riqueza face à classe média. Segundo, mais importante e muitas vezes ignorado, é o tipo de activos em que investem o rendimento que não é consumido: as pessoas mais ricas tendem a deter a maioria das acções da economia e colhem benefícios desproporcionados face à classe média, que investe uma proporção muito maior da sua riqueza em imobiliário.
Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton, autores do famoso livro "Triumph of the Optimists", apresentam no livro "Financial Market History- Reflections on the past for investors today" os retornos conseguidos nas diferentes classes de activos ao longo dos últimos 116 anos em 21 países. Segundo os autores, a classe de activos que melhor remunerou o capital neste período foi, por larga margem, a das acções. Mas os três economistas chegaram a mais conclusões. Revelaram que o retorno do investimento em acções foi positivo em todos os países, com ganhos entre 3% a 6% por ano, e as acções mostraram-se como sendo a classe com melhores retornos em todas as geografias.
A análise de Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton mostra ainda como os EUA tiveram uma boa performance, conseguindo o terceiro lugar para as acções e sexto para obrigações (ver no gráfico). O retorno real das acções americanas de 6,4% contrasta com o retorno real em dólares de 4,3% no World Index ex-EUA. Embora as acções, vistas como classe de activos arriscada, tenham tido melhor performance do que as menos voláteis obrigações e bilhetes do tesouro, os investidores nas acções não beneficiaram do investimento em mercados mais voláteis em comparação com mercados mais estáveis: os EUA tiveram um desvio padrão de retornos de 20,1%, o sexto país com menos risco atrás de países como o Canadá (17%), a Austrália (19,4%) ou o Reino Unido (17,7%).
Os autores de "Financial Market History - Reflections on the past for investors today" destacam a importância da inflação, a que chamam uma força muito poderosa no séc. xx, dando o exemplo dos EUA, com inflação anualizada de 2,9% e o Reino Unido com 3,7%. A diferença, aparentemente pequena entre os dois, significa que, desde 1900, os preços aumentaram 27 vezes nos EUA enquanto que no Reino Unido aumentaram 69 vezes. Nos últimos 166 anos, sete países sofreram particularmente com a inflação: Alemanha, Áustria, Portugal, Finlândia, França, Japão e Espanha. Os investidores devem ter a preocupação de conseguir, nos seus investimentos, ganhos de poder de compra a longo prazo.
INVESTIMENTOS EM HABITAÇÃO
A mais conhecida série de preços reais de casas foi criada por Robert Shiller e Karl Case, que estudaram o mercado imobiliário desde 1890. O resultado deste estudo mostra que os preços das casas acompanharam por pouco a inflação. Ou seja, a valorização das casas foi mínima neste período de 120 anos (0,3% anuais) e se excluíssemos os dois rallies - no final dos anos 40 e no início da década de 2000 - a variação poderia ter sido negativa. O retorno médio conseguido (valorização e rendas) foi inferior a 1,7% ao ano acima da inflação (devido a comissões, custos de manutenção e impostos).
Dois estudos recentes realçam este facto importante. O primeiro, de Laurent Bach, Laurent Calvet e Paolo Sodini, debruça-se sobre a Suécia. A análise do período 2000-2007, permite concluir que existe uma grande razão pela qual os ricos acabam por ficar mais ricos: em vez de acções, a classe média investe mais em imobiliário residencial. As casas tendem a conseguir retornos inferiores às acções. O segundo estudo, de Edward Wolff, da New York University, confirma que este padrão se repete nos Estados Unidos, onde os mais ricos têm relativamente menos dinheiro em casas e mais em acções e outros activos financeiros. Independentemente da geografia, os ricos detêm o potencial da economia na forma de acções enquanto que os retornos da classe média estão limitados pelo lento crescimento da riqueza imobiliária. Wolff conclui que o colapso da bolha imobiliária também contribuiu para a desigualdade, uma vez que as acções recuperaram mais rapidamente que o imobiliário.
Portanto, a concentração da propriedade de acções é o factor mais determinante no aumento da desigualdade na distribuição da riqueza e a razão pela qual os ricos ficam mais ricos. A melhor forma de reduzir este gap é encorajar a classe média a investir uma maior percentagem do seu património no mercado de acções e menos no imobiliário.
A APOSTA NO ENGENHO HUMANO
No início do séc. xx, praticamente ninguém tinha conduzido um carro, utilizado um telefone, ligado uma lâmpada eléctrica, ouvido música gravada ou visto um filme; ninguém tinha voado num avião, ouvido rádio, visto televisão, utilizado um computador, enviado um e-mail ou imaginado um smartphone. Não existiam radiografias, ecografias, testes de ADN ou transplantes; ninguém tinha tomado antibióticos e, como resultado, muitos morreriam jovens.
A humanidade tem beneficiado de uma vaga de inovação com a transformação e criação de novas indústrias: electricidade e geração de energia, automóveis, indústria aeroespacial, companhias aéreas, telecomunicações, petróleo e gás, farmacêuticas e biotecnologia, computadores, tecnologias de informação, media e entretenimento. É certo que pelo caminho ficaram os fabricantes de carruagens e carroças, locomotivas a vapor, velas e muitas outras. Aconteceram enormes mudanças no que é produzido, como é fabricado e na forma como as pessoas vivem e trabalham.
No entanto, destaco uma ideia sustentada pelos autores de "O Triunfo dos Optimistas": ao longo da história foram estes os vencedores - os optimistas que acreditaram no engenho humano e na sua capacidade produtiva. Esta é, provavelmente, uma lei fundamental da economia: enquanto os seres humanos continuarem a encontrar formas produtivas de utilizar recursos, incorporarem os avanços tecnológicos e conquistarem ganhos de produtividade, conseguindo produzir mais com menos, as empresas continuarão a ganhar mais valor em comparação com a terra ou outros recursos naturais. No longo prazo, o engenho humano vencerá sempre. Porque tenho este livro - e os seus autores - como uma referência na minha actividade, não posso terminar este artigo sem referir que Elroy Dimson estará no dia 15 de Novembro no CCB, em Lisboa, e no dia 16 na Universidade do Minho, em Braga, para emprestar o título do seu livro à conferência que a Casa de Investimentos está a promover. Convido-vos, por isso, a fazer parte d'O Triunfo dos Optimistas.
A Tesla, fabricante automóvel norte-americana liderada por Elon Musk, teve no último ano prejuízos de mais de 1.800 milhões de dólares, vendas de 11,7 mil milhões (101 mil veículos) e a sua capitalização bolsista ultrapassa os 61 mil milhões de dólares.
*Artigo originalmente escrito por Emília O. Vieira para a edição de maio de 2017 da Revista Forbes. Revisto e atualizado para a edição de junho/2018 da newsletter da Casa de Investimentos.
A Tesla, fabricante automóvel norte-americana liderada por Elon Musk, teve no último ano prejuízos de mais de 1.800 milhões de dólares, vendas de 11,7 mil milhões (101 mil veículos) e a sua capitalização bolsista ultrapassa os 61 mil milhões de dólares.
A General Motors (GM), lendária construtora de Detroit, teve lucros de 10,5 mil milhões, vendas de 146 mil milhões (9,6 milhões de automóveis) e a capitalização bolsista é de 61 mil milhões de dólares.
A Ford, outra histórica construtora norte-americana, teve lucros de 6,4 mil milhões, vendas de 157 mil milhões (6,6 milhões de veículos) e a capitalização bolsista é de 47,3 mil milhões. Mas ao contrário da Tesla, cujas ações estão a subir 67,4% desde o início de 2017, as ações da GM e da Ford têm valorizações bastante mais modestas, com receio que as vendas de automóveis terão atingido um máximo cíclico.
O "Sr. Mercado" considera que a Tesla vale o mesmo que a GM e mais 30% do que a Ford, apesar dos números reportados em 2016 e 2017. No entanto, a Tesla continua a aumentar os seus prejuízos de 700 milhões em 2016 para 1,8 mil milhões em 2017.
"É uma loucura", declara Bruce Greenwald, professor da Columbia Business School, acerca da cotação das ações da Tesla, "os investidores acreditam que a Tesla vai dominar um mercado que nenhuma empresa alguma vez dominou".
A Tesla é um exemplo clássico das chamadas story stocks, empresas que enfeitiçaram de tal forma os investidores que o preço das suas ações se torna impermeável a qualquer das medidas tradicionais de avaliação. A história é boa demais para não ser verdade.
Recordam-se da bolha dot-com?
A Tesla promete veículos eléctricos autónomos, potentes, fiáveis e seguros, impulsionados por baterias que não prejudicam o ambiente. A nova tecnologia de condução autónoma reduzirá drasticamente ferimentos e mortes de ocupantes e peões. A Tesla salva vidas!
Mais, a Tesla, com a sua tecnologia solar e de baterias, "está a reinventar a rede eléctrica". "Esta é uma oportunidade ainda maior que os carros", proclama Ron Baron, dono de 1,6 milhões de acções da Tesla.
A atração pelas histórias
Durante séculos, o conhecimento era transmitido de geração em geração através de histórias, contadas e recontadas, talvez ganhando uns pontos e perdendo outros.
Yuval Harari, autor de "Sapiens: Uma breve história da humanidade", argumenta que a razão pela qual as histórias têm tanto poder sobre nós, é que ajudam a ligarmo-nos uns aos outros e são muito mais memoráveis do que os números.
Uma vez que as histórias apelam à emoção, mais do que à razão, podem incentivar a irracionalidade e levar-nos a fazer coisas que não fazem sentido, mas nos fazem sentir bem.
No seu livro "Thinking, Fast and Slow", Daniel Kahneman, psicólogo, professor e Prémio Nobel da Economia em 2002, apresenta vários estudos e demonstra que as histórias têm muito mais poder sobre as pessoas se estas tiverem que fazer inferências e ligações. Surpreendentemente, quanto menos informação têm sobre determinado assunto, mais facilmente constroem uma história coerente e a memorizam. As ligações que fazem podem muito bem ser aquelas que "o contador da história" quer que façam. Os estudos concluem que quanto maior for a ligação emocional entre o "contador da história" e os "ouvintes", mais tempo a história é lembrada e mais forte é o impulso para agir.
Não admira que "os contadores de histórias" as "desenhem" para encorajar os investidores a atribuir maior valor aos negócios.
Encanto pelos números
Ao longo da história o uso dos números era limitado. Recolher e guardar grandes quantidades de dados era muito intensivo em termos de mão de obra e a sua análise difícil e cara. Hoje, o mundo da "Big Data" permite aceder a dados que qualquer um pode analisar.
Num mundo de incertezas, os números oferecem-nos uma sensação de precisão e objetividade e servem de contrapeso às histórias. No entanto, muitas vezes, essa precisão é ilusória e existem incontáveis formas pelas quais os números encondem viezes.
Os cientistas comportamentais concluem que a sobrecarga de informação a que somos sujeitos todos os dias e que nos puxa muitas vezes em direções opostas faz com que, ironicamente, o nosso processo de decisão seja cada vez mais simplista e irracional.
Somos atraídos por histórias que podem levar-nos à fantasia, o que é um problema quando investimos. Por outro lado, os números permitem-nos ser disciplinados nas apreciações mas, sem as histórias por trás, podem tornar-se fonte de enviezamento.
É crucial aliar os números e as histórias no investimento e nos negócios. A avaliação é a ponte que os une, que obriga a que cada lado exija mais do outro: força os contadores de histórias a rever as partes que são improváveis ou pouco plausíveis e força os adeptos dos números a reconhecer quando os seus cálculos geram uma história que não faz sentido ou não é credível.
O que fazer?
Começamos por conhecer a história da empresa que estamos a avaliar, o negócio em que opera, a concorrência, as vantagens competitivas da empresa e a capacidade de as manter a prazo. O Professor de avaliação de empresas da New York Stern School of Business, Aswath Damodaran, advoga no seu livro "Narrative and Numbers", que é preciso responder a algumas perguntas sobre a história, tais como: é possível? é plausível? é provável? Nem todas as histórias que são possíveis são plausíveis e de todas as histórias plausíveis apenas um punhado são prováveis.
O passo seguinte é ligar a história aos números que determinarão o valor da empresa. São os números que nos guiarão até à avaliação do negócio em que baseamos as decisões de investimento.
Há, no entanto, um perigo. É natural que fiquemos ligados à nossa história e que encaremos qualquer crítica como uma afronta pessoal. Embora seja importante podermos defender a nossa história, é essencial manter a mente aberta a questões, comentários e críticas e as utilizemos para modificar, adaptar ou alterar a nossa história.
Desde muito cedo obrigam-nos a escolher letras ou números. A especialização leva-nos a adquirir cada vez mais competências numa das áreas e a ignorarmos a outra. Nas palavras de Damodaran, se o lado esquerdo do cérebro comanda a lógica e os números e o lado direito controla a intuição, imaginação e criatividade, isso significa que passamos a vida a utilizar apenas metade dos nossos cérebros.
O Investidor em Valor usa as duas metades.
É fundamental ter o temperamento adequado para lidar com a volatilidade dos mercados, com as opiniões contrárias e com o excesso de informação. O melhor investidor é aquele que reconhece as suas limitações e se prepara para as evitar.
Segundo Warren Buffett, "O Investidor Inteligente" é o melhor livro alguma vez escrito sobre investimento. O autor é Benjamim Graham, o fundador da filosofia de investimento em valor - praticada pela Casa de Investimentos. Parece-me, por isso, uma boa recomendação para fechar esta colaboração de quase seis anos com a Vida Económica.
Muitos investidores questionam-se há vários anos se não será uma boa altura para "encaixar ganhos e esperar por uma grande correção para entrarem nos mercados acionistas". Somos de opinião diferente por três grandes motivos:
- não sabemos fazer o timing do mercado e não conhecemos quem o faça de forma consistente. É impossível prever quanto tempo durará a subida do mercado ou quando é que este irá corrigir. Aqueles que o tentam fazer alcançam resultados bastante aquém dos que se focam na avaliação de negócios a longo prazo;
- as empresas que temos em carteira estão consideravelmente mais baratas do que o mercado. O principal índice S&P cota com um múltiplo de 20 vezes os resultados estimados para o ano corrente, ao passo que a nossa carteira tem um múltiplo médio de cerca de 12,2 vezes os resultados e é composta por negócios mais rentáveis e com balanços menos endividados;
- embora seja mais difícil encontrar pechinchas, continuamos a identificar boas oportunidades de investimento. Existem bons negócios a ser vendidos a preços bastante abaixo do seu valor intrínseco.
O investidor em valor é avesso ao risco e por isso, o princípio fundamental é comprar bem, comprar com um desconto tal que uma venda mediana produza um bom resultado. Da mesma forma, não se preocupa em adivinhar o máximo que o título fará. Assim que o preço da ação atinja o valor justo estimado, e caso a empresa não demonstre razões fundamentais para que este valor seja revisto em alta, vende. Esta postura envolverá tomar decisões de venda de investimentos para os quais o mercado revela desmesurado otimismo, o que, mais uma vez, implica agir contra a opinião da maioria.
Ao executarmos com disciplina esta filosofia, tendemos a estar muito investidos quando o mercado está barato e ir vendendo quando o mercado está caro, como hoje acontece, aguardando que as correções surjam e aí alocamos capital.
Embora o nosso trabalho não seja ter dinheiro parado, não temos problemas em fazê-lo se as oportunidades de valor escassearem. Aguardamos pacientemente pelas correções e gostamos de ter munições para as aproveitar. Será nos momentos de maior incerteza e pessimismo que seremos mais gananciosos e aproveitaremos para comprar muito valor por pouco dinheiro.
COMO ANALISAMOS A QUALIDADE DOS NEGÓCIOS
Procuramos entender o que faz a empresa, em que setor se insere e como ganha dinheiro. Analisamos os relatórios e contas da empresa, procurando perceber a lógica do negócio, quem são os seus clientes e quais as fontes de receitas e de lucros. A análise detalhada do Balanço, Demonstração de Resultados, Demonstração de Fluxos de Caixa e Notas Anexas ajuda-nos a perceber a estrutura da empresa e como opera. Gostamos que as políticas contabilísticas utilizadas pela empresa sejam simples, conservadoras e fáceis de compreender.
As vantagens competitivas
Dedicamos grande parte do tempo a analisar quais e quão fortes são as vantagens competitivas das empresas e dos seus negócios. Michael Mauboussin e Kristen Bartholdson escrevem sobre este tema num extraordinário estudo, publicado pelo Credit Suisse em 2013, intitulado "Measuring the Moat". Explicam que as vantagens competitivas duradouras têm três origens possíveis: vantagens produtivas, vantagens de consumo e vantagens externas - de cariz regulatório ou fiscal.
A capacidade de a empresa produzir um bem ou serviço a um custo inferior ao dos concorrentes confere-lhe uma vantagem produtiva. Por exemplo, uma empresa que opera num setor que acarreta um investimento fixo inicial bastante elevado, à medida que aumenta a sua produção, consegue obter economias de escala que lhe permitem produzir com custos unitários cada vez mais baixos.
As vantagens de consumo refletem a capacidade da empresa de produzir um produto ou serviço que satisfaça uma necessidade do consumidor de melhor forma do que a concorrência. A maioria das vezes isto deve-se ao facto do produto ou serviço ser objetivamente melhor. Noutros casos, a preferência dos consumidores assenta na marca, que permite ostentar um determinado estilo de vida ou característica apreciada pela sociedade. No geral, este tipo de vantagens "prende" os clientes, permitindo às empresas evitar a concorrência pelo preço, passar a inflação dos custos para os consumidores e manter margens de rentabilidade elevadas.
Por último, as vantagens competitivas externas têm origem, na grande maioria dos casos, num ambiente regulatório que limita a concorrência ou incentiva os players através de subsídios. O exemplo mais premente é o da atribuição de patentes de propriedade intelectual, que permite a uma empresa que desenvolve uma nova tecnologia, composto químico ou outro, desfrutar de um período de vários anos de monopólio de vendas - as empresas farmacêuticas são um bom exemplo.
Identificar este tipo de características exige um estudo intensivo do negócio, da empresa e do setor de atividade.
Procuramos compreender a capacidade de a empresa manter estas vantagens competitivas por longos e bons anos. Inevitavelmente, surgirão outras empresas que procurarão disputar estes lucros acima da média. Só as empresas que dispõem de fortes vantagens competitivas conseguirão manter a concorrência ao largo e ganhar retornos acima da média. São estas as verdadeiras máquinas de capitalizar retornos a longo prazo que queremos colecionar para os nossos clientes.
Retorno sobre o Capital Investido
Analisar a capacidade de uma empresa gerar retornos sobre o capital investido - ROIC (Return on Invested Capital) - superiores ao seu custo de capital tem por base a simples lógica que as empresas geram valor, para os detentores do seu capital, se forem capazes de investir o seu dinheiro, no presente, de forma a gerar mais dinheiro, no futuro, que compense os riscos assumidos.
Outros intervenientes do mercado rapidamente se apercebem destas rentabilidades. Caso tenham capacidade de se financiar e montar um processo produtivo idêntico com o mesmo custo, fazem concorrência com preços cada vez mais baixos até que que nenhum interveniente é capaz de gerar valor adicional para os seus donos.
Este cenário só será evitado caso a empresa incumbente disponha de vantagens competitivas de tal forma fortes e enraizadas que minimizem o efeito nefasto da concorrência. Por isso, procuramos empresas com um histórico longo de ROICs consistentemente superiores ao seu custo de capital.
Geração de Free Cash Flow e solidez do Balanço
Outra característica fundamental é a capacidade de geração de dinheiro. Uma vez que os resultados líquidos são facilmente manipuláveis, queremos perceber quanto desse resultado é transformado em Free Cash Flow (FCF), fluxo de caixa excedentário que pode ser distribuído pelos tomadores de capital. Favorecemos empresas com muita liquidez no balanço, ou pouco endividadas. Num ciclo económico negativo, são estas empresas que têm capacidade para comprar outros negócios baratos e fortalecer as suas vantagens competitivas.
Avaliamos cuidadosamente os gestores e a sua capacidade de alocação de capital, quais os objetivos estipulados para receberem prémios e ações da empresa e em que alturas recompram ações próprias. Em suma, gostamos de gestores capazes e honestos que comunicam de forma absolutamente transparente com os acionistas.
O COMPORTAMENTO DO INVESTIDOR EM VALOR
O fator comportamental é decisivo para o sucesso do investidor. Inúmeras vezes, o investidor verá argumentos racionais serem toldados por vieses psicológicos característicos do ser humano. Nessas alturas, é fundamental ter o temperamento adequado para lidar com a volatilidade dos mercados, com as opiniões contrárias e com o excesso de informação. O melhor investidor é aquele que reconhece as suas limitações e se prepara para as evitar.
Saber estar "parado"
O investidor deve resistir à tentação de estar constantemente a comprar e vender ações ou outros ativos. Isto é bastante mais difícil do que se julga. Perante a quantidade avassaladora de notícias diárias, decidir não fazer nada vai contra os nossos instintos primários. No entanto, é precisamente isso que devemos fazer: a grande maioria das notícias, embora possam ter impacto no curtíssimo prazo, revelam-se pouco importantes a prazo. Além disso, comprar e vender com frequência aumenta consideravelmente os custos e prejudica as rentabilidades.
Investir a longo prazo
Um investimento necessita de um período alargado de tempo para dar frutos. Com certeza que preferiríamos ganhos rápidos, mas isto é simplesmente impossível de alcançar de forma consistente. Se o investidor fez a sua análise corretamente e encontrou um negócio verdadeiramente excelente a um preço barato, deve dar tempo para que o potencial de valorização seja realizado.
Esta é a essência de um investimento de qualquer natureza: o empresário que inicia a sua atividade coloca-se numa posição extremamente desconfortável, cheia de riscos e incertezas. Mas é a capacidade de suportar essa incerteza que lhe permitirá, com análise cuidada e esforço, colher os frutos da oportunidade que outros não foram capazes de aproveitar.
No investimento, o mais importante é manter o foco no valor subjacente a cada investimento. O investidor individual, que pode ter um horizonte de investimento de décadas, deve deixar que a qualidade dos ativos que tem em carteira e o tempo trabalhem a seu favor.
A conclusão mais robusta da psicologia do julgamento é que as pessoas têm excesso de confiança. Na verdade, o excesso de confiança é um estado humano natural. Todos nós gostamos de acreditar que somos melhores e temos capacidades excepcionais.
Segundo Richard Thaler, Nobel da Economia em 2017, e Werner DeBondt, "a conclusão mais robusta da psicologia do julgamento é que as pessoas têm excesso de confiança". Na verdade, o excesso de confiança é um estado humano natural. Todos nós gostamos de acreditar que somos melhores e temos capacidades excepcionais. Peter Bevelin escreve em "À Procura de Sabedoria" (Seeking Wisdom) que "a maioria de nós acredita que somos melhores, mais honestos e mais inteligentes, temos um melhor futuro, um casamento mais feliz, somos menos vulneráveis que a média. Mas é impossível que todos estejamos acima da média."
A maior parte das pessoas subestima os riscos que correm na condução, na saúde ou nas finanças. Inúmeros estudos com amostras de diversos países, idades, género, habilitações académicas e grupos ocupacionais, demonstram a universalidade deste fenómeno. O excesso de confiança é especialmente elevado quando projectamos as nossas crenças no futuro. As pessoas tendem a considerar mais prováveis os desfechos desejados e a ignorar a possibilidade de que algo desagradável pode acontecer.
O viés do excesso de confiança é particularmente insidioso, uma vez que é influenciado por factores emocionais, cognitivos e sociais. Emocionais porque admitir coisas más acerca de nós próprios e das nossas capacidades é extremamente doloroso. As pessoas que têm informação acerca de um caso individual raramente sentem a necessidade de saber as estatísticas da classe à qual o caso pertence. Por outras palavras, extrapolamos para o geral o nosso caso particular. Conhecemos alguém que foi mal atendido num hospital. Concluímos imediatamente que o hospital é mal gerido mesmo que esse estabelecimento tenha sido premiado por boas práticas. O excesso de confiança na nossa primeira avaliação não nos permite corrigi-la apesar da evidência em contrário. A distorção cognitiva e emocional que está na base do excesso de confiança é reforçada por sucessos passados. Roger Lowenstein, no seu livro, "Quando os Génios Falham" (When Genius Failed), escreve que "não há nada como o sucesso para nos cegar quanto à possibilidade de fracasso".
Os presidentes-executivos das grandes empresas adoram fusões e aquisições apesar de mais de 60% destas não trazerem qualquer ganho de valor para os accionistas. Então, o que faz com que os CEO inflacionem os preços que pagam pelas aquisições? Segundo Peter Bevelin, existem três motivos: sucessos recentes que reforçam a confiança; um sentido de auto-importância (a crença que o salário mais elevado equivale a maior habilidade ou capacidade; a valorização da cobertura mediática - os media tendem a glorificar o papel do CEO e atribuir o sucesso da empresa exclusivamente a este e não a outros factores ou pessoas. Isto faz com que o CEO se torne ainda mais confiante nas suas capacidades. Este círculo vicioso não está confinado à alta finança e aos cargos mais elevados das empresas. Acontece todos os dias em todos os aspectos da nossa vida.
A nossa sociedade reforça e incentiva o excesso de confiança. Daniel Kahneman, no seu livro, "Pensar Depressa e Devagar" (Thinking Fast and Slow), aborda a pressão social sobre os médicos: "De uma forma geral, a indecisão é considerada uma fraqueza e um sinal de vulnerabilidade para os médicos. A confiança é mais valorizada que a incerteza e os médicos são censurados quando revelam incerteza aos pacientes.
A apreciação objectiva da incerteza é um dos alicerces da racionalidade - mas isso não é o que as organizações e as pessoas querem. A incerteza extrema é paralisante em circunstâncias perigosas e a admissão de que estamos apenas a adivinhar é inaceitável quando está em jogo a saúde. Agir com base em conhecimento fingido é frequentemente a solução escolhida". Kahneman conclui que "os peritos que reconhecem a verdadeira extensão da sua ignorância são substituídos por concorrentes mais confiantes, que conseguem conquistar a confiança dos clientes".
Previsões e Peritos
Ao longo de vários anos, professores da Duke University levaram a cabo um estudo em que pediam aos administradores financeiros de grandes empresas que estimassem os retornos do S&P 500 no ano seguinte. Foram compiladas mais de 11 600 previsões e a sua precisão foi analisada. A conclusão é clara: os administradores financeiros das grandes empresas não fazem a mínima ideia do futuro de curto prazo do mercado accionista; a correlação entre as suas estimativas e o valor real é ligeiramente abaixo de zero; e a verdadeira má notícia é que estes aparentam não saber que as suas previsões são inúteis.
Frequentemente interagimos com peritos que exercem o seu julgamento com evidente confiança e com orgulho no poder da sua intuição.
Como conseguimos distinguir a confiança justificada dos verdadeiros peritos do excesso de confiança daqueles que nem têm consciência da sua própria ignorância?
A maioria encara o mundo como sendo mais benigno do que realmente é. Subestimamos a probabilidade de adoecermos e sobrestimamos a probabilidade de nos acontecer algo de bom - isto explica os jackpots milionários do Euromilhões.
A nossa natureza optimista é reforçada por outros factores. Acreditamos que mais informação leva a melhores previsões. Os investidores são hoje bombardeados com informação que os encoraja a fazer alterações frequentes à sua carteira de investimentos. Esta ilusão de controlo, a tendência para sobrestimar a nossa capacidade de controlar factores sobre os quais não temos qualquer controlo, leva a um excesso de custos de transacção e a retornos medíocres.
Extrapolando a experiência recente para o futuro, fazemos de forma regular previsões que vêm a mostrar-se erradas. O excesso de confiança é particularmente problemático quando os mercados estão caros e em períodos de estabilidade sustentada. É nestas alturas que começamos a acreditar que as condições existentes actualmente se irão prolongar indefinidamente e que os activos mais arriscados já não parecem tão arriscados. É esta nossa confiança colectiva em excesso que semeia as crises futuras.
O famoso economista Hyman Minsky observou que a estabilidade gera instabilidade. A sua teoria da instabilidade financeira sugere que as pessoas tendem a correr riscos maiores em alturas de estabilidade. Em 2007, quem investia no mercado subprime, através de instrumentos financeiros cada vez mais complexos e opacos, estava firmemente convicto que nada poderia correr mal. Afinal, estava tudo a correr tão bem há já algum tempo.
O excesso de confiança, segundo Bevelin, pode causar expectativas irreais e tornar-nos mais vulneráveis ao falhanço. O que devemos fazer para evitar este comportamento é focarmo-nos no que pode correr mal e nas respectivas consequências. Elroy Dimson define risco como "a possibilidade de acontecerem mais coisas do que realmente acontecem". Devemos prestar mais atenção ao que pode correr mal e avaliar todos os riscos possíveis.
A tomada de decisões, em qualquer aspecto das nossas vidas - no trânsito, na saúde, nos investimentos - deve, por isso, basear-se num princípio fundamental: a margem de segurança.
Um investidor individual tem a tarefa muito dificultada para tomar decisões de investimento no seu melhor interesse. Ouve muitas opiniões contraditórias - sobre a evolução da economia, notícias das empresas, eventos políticos, possíveis conflitos regionais, todo o tipo de informação sobre acções, níveis de mercado e outras e facilmente se desvia de uma estratégia de valor a prazo.
Um investidor individual tem a tarefa muito dificultada para tomar decisões de investimento no seu melhor interesse. Ouve muitas opiniões contraditórias - sobre a evolução da economia, notícias das empresas, eventos políticos, possíveis conflitos regionais, todo o tipo de informação sobre acções, níveis de mercado e outras - e facilmente se desvia de uma estratégia de valor a prazo.
As recomendações diárias de alternativas de investimento e os preços-alvo para as acções emitidos pela banca apontam sempre uma cotação objectivo a 12 meses - prazo reduzido para que os fundamentais de longo prazo de um negócio possam ser reflectidos na cotação das acções. Estas análises estão enviesadas para o curto prazo atribuindo maior importância às cotações e notícias do momento: quando as notícias são negativas, revêem os preços-alvo em baixa, quando são positivas, revêem-nos em alta.
Desde início de 2011 a finais de 2012, a Orange - à data France Telecom - desvalorizou cerca de 50%. As notícias eram muito negativas: um novo concorrente no mercado francês - Iliad - estava a ganhar quota de mercado aos restantes operadores e as alterações regulatórias a nível europeu reduziram a rentabilidade de alguns negócios. As vendas não cresciam e as estimativas para os resultados futuros eram fracas. No entanto, a Orange não tinha apenas operações em França: tinha negócios em Inglaterra, Espanha, Polónia e outros países europeus e, também, no Médio Oriente e África. Estas operações, juntamente com o negócio empresarial, representavam cerca de 50% das suas receitas.
Na altura em que avaliámos a Orange, apesar da média dos resultados dos últimos cinco anos ter sido de 1,61 euros por acção, a empresa reduziu as previsões de geração de cash flow operacional para 2013, o que se traduziria numa queda dos resultados líquidos esperados. Na nossa análise conservadora do que poderiam ser os resultados nos cinco anos seguintes, previmos que o resultado médio caísse para um valor entre 1 a 1,10 euros por acção.
Ao fazer a actualização dos resultados que estimávamos para os anos subsequentes - com base numa taxa de desconto conservadora - obtivemos uma estimativa de valor justo de 15 euros por acção, ou seja, cerca de 15 vezes as nossas previsões de lucro médio por acção. O resumo da análise da Casa de Investimentos esteve em destaque, durante uma semana, na primeira página do SUMZERO (site mundial que congrega mais de nove mil analistas financeiros), realçando a qualidade do trabalho levado a cabo pela nossa equipa de gestão de activos.
MANTER O RUMO
As telecomunicações são essenciais para o eficiente funcionamento de qualquer economia e as suas vendas são relativamente estáveis. Este sector transacciona habitualmente com múltiplos elevados. Apesar dos desafios, sempre presentes, considerámos na altura que a nossa estimativa de valor era conservadora e a empresa era, no seu sector, das menos alavancadas a nível europeu.
Ao contrário de muitas das suas congéneres, tinha uma política de pagamento de dividendos sustentável, distribuindo 70% a 80% dos resultados gerados, o que representava, à data, 10% da cotação. No final de 2012, iniciámos o investimento na Orange, que se prolongou ao longo de vários meses enquanto a cotação da acção nos garantia uma grande margem de segurança face ao valor justo da empresa.
OLHAR PARA O FUTURO E NÃO PARA O PASSADO
Apesar da forte desvalorização, ao avaliarmos a empresa e o seu sector, constatamos que dois dos mais importantes indicadores financeiros revelavam uma boa oportunidade de investimento para o longo prazo:
Na altura, fomos confrontados com um research de um grande banco suíço, que recomendava a venda das acções da empresa com um preço-alvo de 6,8 euros (havíamos comprado entre 7,35 e 8,10 euros). O banco justificava a recomendação com o corte de estimativas de resultados e o mau momento do sector em França, motivado pelo intenso ambiente concorrencial. Contudo, verificámos que as estimativas de resultados do analista daquele banco para os anos seguintes não diferiam muito das que havíamos assumido na nossa avaliação. Para a definição do preço da acção a um ano, atribuíram muito maior relevância às notícias de curto prazo e à cotação do mercado.
ANÁLISE PROFUNDA, DISCIPLINA E PACIÊNCIA
Estamos, contudo, convictos que actuando desta forma - comprando e vendendo na busca de ganhos de curto prazo - não se obtêm resultados consistentes, por motivos de natureza diversa: não é possível adivinhar os movimentos de curto prazo do mercado, os investidores incorrem em
custos de transacção elevados e, por fim, perdem o rumo, entrando numa atitude especulativa, sem qualquer convicção.
No caso da Orange - à semelhança de tantos outros investimentos realizados - a qualidade da empresa e a sua capacidade para gerar bons resultados no futuro dava-nos a confiança de que, a prazo, a cotação de mercado tenderia para o seu valor justo. Isso traduzir-se-ia em ganhos de capital significativos para os seus accionistas.
Por essa razão, mantivemos a nossa atenção focada no trabalho que a administração da empresa estava a levar a cabo e no sucesso do seu plano de redução de custos. As acções continuavam abaixo do seu valor justo e este era um activo para manter. Por que razão venderíamos um activo barato?
Simultaneamente à nossa avaliação, este período foi também marcado pela venda de alguns activos não estratégicos por parte da Orange e pelo regresso das operações de fusões e aquisições ao sector, que fez brilhar os activos das empresas de telecomunicações e reforçou as suas estimativas de resultados futuros.
Em Dezembro de 2014, vendemos a totalidade das acções que tínhamos em carteira a 14,85 euros, com um ganho médio acumulado de 92,53%, incluindo dividendos de 1,20 euros por acção.
IGNORAR A MULTIDÃO
Desde finais de 2012 até ao final de 2014, a cotação da Orange teve uma valorização muito expressiva. Esta recuperação não se fez, no entanto, sem grandes solavancos. Por várias ocasiões, o temperamento dos investidores e a sua convicção no valor do negócio foram testados: nesse período, assistimos a quedas nas acções de 18% a 20%. Estas variações tão amplas incentivam os "investidores" a agir, a tentar adivinhar o melhor ponto para sair e esperar pela queda para voltar a entrar.
Na altura em que vendemos, analisámos a evolução das recomendações do banco suíço sobre a Orange e verificámos que os preços-alvo foram sendo ajustados para acompanhar a cotação das acções no mercado. Casos como este repetem-se frequentemente.
É, por isso, fundamental ter sempre presente que uma estratégia de salvaguarda do património e criação de riqueza com consistência exige que o investidor se concentre no valor dos negócios e na sua capacidade de gerar lucros a prazo. O investimento em valor permite ganhos de arbitragem de longo prazo entre o que o mercado está a cotar hoje e o real valor da empresa e dos seus cash flows futuros.
Ao alargarmos o horizonte temporal, o processo de investimento é mais consistente, baseia-se na informação fundamental e na qualidade intrínseca dos negócios. No investimento, o mais importante é o Valor.
Na Grã-Bretanha dos Séc. XVIII e inícios do Séc. XIX, uma porção significativa da economia era controlada pelos Quakers. Os Quakers detinham metade das fundições do país, eram protagonistas chave na banca (o Barclays e o Lloyds eram seus) e foram instrumentais na indústria e no comércio entre a Grã-Bretanha e as Américas.
A prosperidade dos Quakers não passou despercebida ao mundo exterior. Eram famosos pela ênfase na honestidade absoluta e pelo rigor e cuidado nos registos comerciais. Introduziram inovações como os preços fixos, o que reforçava a transparência em detrimento de um regatear agressivo. Esta reputação tornou-os parceiros de negócio apetecíveis para fornecedores e vendedores. À medida que a prosperidade dos Quakers crescia, as pessoas faziam a ligação entre essa prosperidade e a reputação de confiança e fiabilidade. No longo prazo, os negociantes astutos concluíram que ser de confiança é mais lucrativo. A honestidade é a melhor política.
Ao longo dos tempos, a evolução do capitalismo foi na direção de maior confiança e transparência e de um comportamento menos egoísta; não é coincidência que esta evolução tenha trazido consigo mais produtividade e crescimento económico. Esta evolução aconteceu porque os benefícios da confiança - isto é, de confiar e de ser de confiança - são potencialmente imensos e porque um sistema de mercado com sucesso ensina as pessoas a reconhecerem esses benefícios. Está comprovado que as economias de sucesso exigem uma saudável dose de confiança na fiabilidade e justiça das transações quotidianas.
Se assumirmos que todos os negócios potenciais são um roubo ou que os produtos/serviços que estamos a comprar/contratar não prestam, far-se-ão muito poucos negócios. Mais importante, os custos de transação serão enormes uma vez que teremos que investigar a fundo cada negócio e que usar constantemente ameaças legais para que os contratos sejam respeitados.
O princípio regulador da mão invisível de Adam Smith, em "A Riqueza das Nações", assegura que a prossecução do interesse individual promove o benefício global da sociedade:
"Cada indivíduo (...) não tem intenção de promover o interesse público, nem sabe o quanto o promove (...). Pretende apenas a sua própria segurança; ao liderar uma indústria de forma a que o produto tenha o maior valor, tem como objetivo o seu próprio ganho. Assim, como em muitos outros casos, guiado por uma mão invisível, promove um objetivo que não fazia parte da sua intenção."
Acrescenta ainda, "(...) quando a maior parte das pessoas são comerciantes, trazem sempre probidade e pontualidade para a moda".
A corroborar a tese de Adam Smith, Daniel Defoe escreveu:
"um comerciante honesto é uma jóia, prezada onde quer que se encontre."
No entanto, foi apenas no Séc. XIX - e não coincidentemente, o momento em que o capitalismo floresceu - que a confiança se institucionalizou. O historiador Richard Tilly, ao estudar as práticas de negócio na Grã-Bretanha e Alemanha, demonstrou que foi durante os anos 1800 que os homens de negócios concluíram que a honestidade poderia ser lucrativa. Na América, no final do Séc. XIX criaram-se instituições independentes, tal como Underwriters Laboratory e o Better Business Bureau, com vista à promoção de um clima geral de confiança nas transações quotidianas.
Estabelecer essa confiança tem sido, assim, uma parte fundamental da história do capitalismo.
No centro desta mudança estava uma maior ênfase na acumulação de capital no longo prazo em oposição a meros lucros de curto prazo; uma ênfase que é uma característica essencial do capitalismo moderno.
Se a nossa prosperidade no longo prazo depende de múltiplos negócios, recomendações boca-a-boca e relações continuadas com clientes e parceiros, o valor do negócio justo aumenta. A lubrificação do comércio que a confiança fornece torna-se muito mais que desejável, torna-se a sua essência.
Um novo tipo de capitalismo - o que correu mal?
Segundo John Bogle - fundador da gestora de fundos Vangard - no Livro "The Battle for the Soul of Capitalism" ("A Batalha pela Alma do Capitalismo"), a mudança do tradicional capitalismo dos donos para o novo capitalismo dos gestores está no centro do que correu mal na América. A riqueza foi transferida dos investidores particulares para os insiders e intermediários financeiros. A remuneração dos gestores atingiu níveis extravagantes, principalmente através de stock options, apesar da produção de lucros, quando comparada com o crescimento da economia, ser menos do que ordinária.
Nas últimas décadas, a ideia de que a fiabilidade e o sucesso nos negócios andam de mão dada parece quase dolorosamente ingénua, principalmente no sistema financeiro e nas grandes empresas mundiais.
Estamos agora habituados ao espetáculo de CEOs que saqueiam empresas e as abandonam com indemnizações de dezenas e centenas de milhões enquanto que os acionistas, colaboradores e credores ficam de mãos a abanar. Esta ideia ganhou raízes: as Enron e WorldCom não são aberrações. São, isso sim, o resultado inevitável de um sistema que incentiva os piores impulsos das pessoas: ganância, cinismo e egoísmo. A grande crise financeira de 2008 revelou que estas práticas estavam muito mais generalizadas e o sistema financeiro demonstrou ser o seu epicentro.
O mercado português é pródigo em exemplos de gestores de empresas cotadas que olharam mais para os seus interesses do que para os interesses dos acionistas que lhes pagavam o salário. Este comportamento teve como consequência a perda de milhares de milhões de euros para grandes e pequenos investidores e, mais importante ainda, a perda de confiança num sistema económico que os devia proteger e defender.
O Governo das Empresas
Os melhores gestores são verdadeiros guardiões dos interesses dos acionistas, pensam como donos quando tomam decisões na gestão dos negócios e protegem os seus interesses no longo prazo.
Warren Buffett defende a candura e transparência na comunicação com os acionistas. O Relatório Anual da Berkshire é composto por palavras e números que qualquer pessoa pode entender e todos os investidores recebem a mesma informação ao mesmo tempo. Buffett evita fazer previsões, um mau hábito de gestão que, frequentemente, leva outros gestores a maquilhar os seus relatórios financeiros.
Para além disto, Buffett dispensa fórmulas complexas de organização hierárquica nas suas empresas. O mais importante, segundo ele, é selecionar pessoas que são capazes, honestas e trabalhadoras.
Um princípio orientador esteve na origem da fundação da Casa de Investimentos: o alinhamento de interesses com os Clientes, com o objetivo de implementar uma estratégia de criação de riqueza a longo prazo. É nossa opinião que seguir a filosofia de Investimento em Valor é a chave para criar essa confiança e investir com Margem de Segurança. Investimos o nosso dinheiro juntamente com o dos Clientes. Fazemo-lo de forma transparente, confiável e com risco limitado.
Comprometemo-nos ainda, com a "educação financeira" dentro e para fora da CASA. Na nossa opinião, a transparência e a fiabilidade criam laços de longo prazo, enquanto o conhecimento cria competências e prepara-nos para defender melhor os interesses de todas as partes envolvidas: Clientes, Colaboradores e Acionistas, que, na CASA, são, também, os seus gestores.
Por isso, nos nossos Relatórios e Contas procuramos seguir também os princípios de Warren Buffett: dizemos as coisas como elas são, assumimos o que fazemos bem e o que fazemos menos bem. Explicamos os princípios subjacentes à filosofia de investimento, os investimentos que fazemos e o que nos motiva quando vendemos.
Estamos conscientes do dever fiduciário que recai sobre nós e continuaremos a trabalhar para merecer a confiança de um público investidor que partilha destes princípios. Temos merecido dos nossos Clientes este reconhecimento. Tal como refere David Swensen - gestor do Endowment da Universidade de Yale - no seu livro "Unconventional Success - A Fundamental Approach to Personal Investment", o caminho menos percorrido é o que conduz ao sucesso.
O Capitalismo saudável teve sempre como base a confiança, a honestidade e a decência. É esta a única forma de assegurar o bem comum.
Emília O. Vieira
Presidente do Conselho de Administração
Warren Buffett diz que é melhor investidor porque é empresário; e que é melhor empresário porque é investidor. Justifica esta afirmação por considerar que o trabalho de alocação de capital não é apenas o mais importante para qualquer investidor, mas é a base dos negócios e o trabalho número um de qualquer CEO.
Warren Buffett diz que é melhor investidor porque é empresário; e que é melhor empresário porque é investidor. Justifica esta afirmação por considerar que o trabalho de alocação de capital não é apenas o mais importante para qualquer investidor, mas é a base dos negócios e o trabalho número um de qualquer CEO.
A alocação de capital é a correia de transmissão entre o valor gerado pelo negócio e o valor gerado para os accionistas. Uma empresa pode ter um negócio excelente, pleno de vantagens competitivas e gerador de grandes fluxos de caixa, mas, se for dirigida por maus alocadores de capital, o retorno para os accionistas acaba por ser destruído no processo de reinvestimento. O cerne desta decisão consiste em manter o capital gerado dentro da empresa ou distribuí-lo ao accionista. Se a gestão entender que deve distribuir os lucros, terá de optar entre pagar dividendos ou recomprar acções próprias. Se decidir manter esses recursos, poderá manter liquidez, reduzir a dívida, investir em novos projetos ou em aquisições de empresas.
O pecado mais comum a que assistimos é ver empresas dirigidas por gestores obcecados pelo crescimento para quem distribuir o dinheiro aos accionistas é assumir um fracasso. Nada podia estar mais errado. Se as alternativas de investimento não são suficientemente interessantes e a melhor opção é pagar o dinheiro aos accionistas, essa é a opção que cria ou mantém o seu valor.
Grande parte das empresas norte-americanas utiliza o processo de recompra de acções para distribuir lucros aos accionistas: nos últimos anos, esse valor tem oscilado entre 500 mil milhões e 600 mil milhões de dólares nas empresas do S&P500, a superar os 400 mil milhões de dólares pagos em dividendos. Ao retirar acções do mercado, a empresa está, à partida, a potenciar o resultado por acção para o futuro. Contudo, quando as recompras são feitas a preços acima do seu valor intrínseco, destrói-se valor aos accionistas.
A Aercap, empresa de leasing de aviões, é um exemplo de bons alocadores de capital. As acções da empresa têm negociado nos últimos dois anos a desconto do seu valor contabilístico. Os gestores venderam no mercado de usados vários aviões a cerca de 10% a 15% acima do valor de balanço e recompraram acções próprias a 85% do seu valor contabilístico. No total, retiraram do mercado 18% do capital da empresa. Geraram mais valor para os seus accionistas de uma forma muito simples: compraram aviões a 85 (os seus próprios aviões que estão no seu balanço) e venderam-nos a 110 / 115.
O livro "The Outsiders: Eight Unconventional CEOs and Their Radically Rational Blueprint for Success" de William Thorndike Jr. retrata o perfil de alguns dos CEO que se distinguiram na tarefa e ilustra de forma excepcional a questão com um extrato da carta de Warren Buffett aos accionistas, de 1987: "a maioria dos CEO chega ao topo porque teve grande sucesso em áreas como marketing, produção, engenharia, administração e, por vezes, política institucional.
A melhor maneira de aprender a alocar capital de uma forma sensata é realmente alocar capital e receber feedback do mercado acerca dessas decisões. Alocar capital exige bom julgamento e a melhor forma de adquirir essa competência é sofrer os efeitos de um mau julgamento".
Se um investidor ou CEO se concentrar na alocação sensata de capital e no valor de longo prazo, o preço da acção tomará conta de si próprio.
A Tesla, fabricante automóvel norte-americana liderada por Elon Musk, teve no último ano prejuízos de quase 700 milhões de dólares, vendas de 7 mil milhões (70 mil veículos) e a sua capitalização bolsista ultrapassa os 51 mil milhões de dólares.
A General Motors (GM), lendária construtora de Detroit, teve lucros de 9,7 mil milhões, vendas de 166,4 mil milhões (10 milhões de automóveis) e a capitalização bolsista é de 50 mil milhões de dólares.
A Ford, outra histórica construtora norte-americana, teve lucros de 4,6 mil milhões, vendas de 151,8 mil milhões (6,6 milhões de veículos) e a capitalização bolsista é de 45 mil milhões. Mas ao contrário da Tesla, cujas ações estão a subir cerca de 40% desde o início do ano, as acções da GM e da Ford caíram recentemente com receios que as vendas de automóveis terão atingido um máximo cíclico.
O "Sr. Mercado" considera que a Tesla vale mais que a GM e a Ford, apesar dos números reportados em 2016.
"É uma loucura", declara Bruce Greenwald, professor da Columbia Business School, acerca da cotação das ações da Tesla, "os investidores acreditam que a Tesla vai dominar um mercado que nenhuma empresa alguma vez dominou".
A Tesla é um exemplo clássico das chamadas story stocks, empresas que enfeitiçaram de tal forma os investidores que o preço das suas acções se torna impermeável a qualquer das medidas tradicionais de avaliação. A história é boa demais para não ser verdade.
Recordam-se da bolha dot-com?
A Tesla promete veículos eléctricos autónomos, potentes, fiáveis e seguros, impulsionados por baterias que não prejudicam o ambiente. A nova tecnologia de condução autónoma reduzirá drasticamente ferimentos e mortes de ocupantes e peões. A Tesla salva vidas!
Mais, a Tesla, com a sua tecnologia solar e de baterias, "está a reinventar a rede eléctrica". "Esta é uma oportunidade ainda maior que os carros", proclama Ron Baron, dono de 1,6 milhões de acções da Tesla.
A atracção pelas histórias
Durante séculos, o conhecimento era transmitido de geração em geração através de histórias, contadas e recontadas, talvez ganhando uns pontos e perdendo outros. Yuval Harari, autor de "Sapiens: Uma breve história da humanidade", argumenta que a razão pela qual as histórias têm tanto poder sobre nós, é que ajudam a ligarmo-nos uns aos outros e são muito mais memoráveis do que os números.
Uma boa história pode fazer uma diferença brutal no sucesso de uma empresa, particularmente no início da sua vida. Os seus fundadores ou gestores sabem que, para construírem um negócio de sucesso, para além do produto ou serviço, é fundamental contar uma história convincente de como a empresa vai conquistar o "mundo": convencer investidores (para angariar capital), convencer consumidores (para ganhar mercados e lucros) e convencer trabalhadores (para extrair o máximo potencial).
Uma vez que as histórias apelam à emoção, mais do que à razão, podem incentivar a irracionalidade e levar-nos a fazer coisas que não fazem sentido, mas nos fazem sentir bem.
No seu livro "Thinking, Fast and Slow", Daniel Kahneman, psicólogo, professor e Prémio Nobel da Economia em 2002, apresenta vários estudos e demonstra que as histórias têm muito mais poder sobre as pessoas se estas tiverem que fazer inferências e ligações. Surpreendentemente, quanto menos informação têm sobre determinado assunto, mais facilmente constroem uma história coerente e a memorizam. As ligações que fazem podem muito bem ser aquelas que "o contador da história" quer que façam. Os estudos concluem que quanto maior for a ligação emocional entre o "contador da história" e os "ouvintes", mais tempo a história é lembrada por mais tempo e mais forte é o impulso para agir.
Não admira que "os contadores de histórias" as "desenhem" para encorajar os investidores a atribuir maior valor aos negócios.
Encanto pelos números
Ao longo da história o uso dos números era limitado. Recolher e guardar grandes quantidades de dados era muito intensivo em termos de mão de obra e a sua análise difícil e cara. Hoje, o mundo da "Big Data" permite aceder a dados que qualquer um pode analisar.
Num mundo de incertezas, os números oferecem-nos uma sensação de precisão e objectividade e servem de contrapeso às histórias. No entanto, muitas vezes, essa precisão é ilusória e existem incontáveis formas pelas quais os números encondem viezes.
Os cientistas comportamentais concluem que a sobrecarga de informação a que somos sujeitos todos os dias e que nos puxa muitas vezes em direcções opostas faz com que, ironicamente, o nosso processo de decisão seja cada vez mais simplista e irracional.
Somos atraídos por histórias que podem levar-nos à fantasia, o que é um problema quando investimos. Por outro lado, os números permitem-nos ser disciplinados nas apreciações mas, sem as histórias por trás, podem tornar-se fonte de enviezamento.
É crucial aliar os números e as histórias no investimento e nos negócios. A avaliação é a ponte que os une, que obriga a que cada lado exija mais do outro: força os contadores de histórias a rever as partes que são improváveis ou pouco plausíveis e força os adeptos dos números a reconhecer quando os seus cálculos geram uma história que não faz sentido ou não é credível.
O que fazer?
Começamos por conhecer a história da empresa que estamos a avaliar, o negócio em que opera, a concorrência, as vantagens competitivas da empresa e a capacidade de as manter a prazo. O Professor de avaliação de empresas da New York Stern School of Business, Aswath Damodaran, advoga no seu livro "Narrative and Numbers", que é preciso responder a algumas perguntas sobre a história, tais como: é possível?, é plausível? é provável? Nem todas as histórias que são possíveis são plausíveis e de todas as histórias plausíveis apenas um punhado são prováveis.
O passo seguinte é ligar a história aos números que determinarão o valor da empresa. São os números que nos guiarão até à avaliação do negócio em que baseamos as decisões de investimento.
Há, no entanto, um perigo. É natural que fiquemos ligados à nossa história e que encaremos qualquer crítica como uma afronta pessoal. Embora seja importante podermos defender a nossa história, é essencial manter a mente aberta a questões, comentários e críticas e as utilizemos para modificar, adaptar ou alterar a nossa história.
Desde muito cedo obrigam-nos a escolher letras ou números. A especialização leva-nos a adquirir cada vez mais competências numa das áreas e a ignorarmos a outra. Nas palavras de Damodaran, se o lado esquerdo do cérebro comanda a lógica e os números e o lado direito controla a intuição, imaginação e criatividade, isso significa que passamos a vida a utilizar apenas metade dos nossos cérebros.
O Investidor em Valor usa as duas metades.
É quase impossível à maioria dos investidores ter conhecimento do tipo de riscos cambiais a que estão expostos nas suas carteiras de investimento.
É quase impossível à maioria dos investidores ter conhecimento do tipo de riscos cambiais a que estão expostos nas suas carteiras de investimento.
As instituições financeiras são um enorme supermercado de produtos: centenas de fundos de investimento - sobre todo o tipo de activos -, fundos de fundos, produtos estruturados e outros, que a engenharia financeira mundial inventa e vende todos os dias. É quase impossível à maioria dos investidores ter conhecimento do tipo de riscos cambiais a que estão expostos nas suas carteiras de investimento. No entanto, estes podem ser parte relevante das suas perdas ou ganhos.
A erosão monetária
A história das principais moedas mundiais é caracterizada pela constante desvalorização do seu poder de compra, com menor amplitude nos períodos em que vigoravam os regimes de câmbios fixos e equivalência com o ouro e com acentuada perda de valor a partir do momento em que essa relação desapareceu. Nos últimos 100 anos, o dólar americano perdeu 95% do seu poder de compra. O euro, que entrou em circulação a 1 de Janeiro de 2002, desvalorizou cerca de 30%. Imagina-se, portanto, que em economias menos desenvolvidas, seja muito pior.
As reservas mundiais de moeda
O dólar americano continua a ser a moeda de referência, com 64% do total das reservas mundiais, o euro com 20,3%, a libra esterlina com 4,7% e o iene japonês com 3,8%. As restantes moedas representam pouco mais de 7%.
Previsão de taxas de câmbio
Os métodos mais importantes de previsão da evolução das taxas de câmbio são:
o Paridades do Poder de Compra (PPP): defendem que os países com menores níveis de inflação deverão registar a prazo a valorização da sua moeda;
o Abordagem da Força Económica Relativa: sustenta que o país com melhor performance económica e nível de taxas de juro atrairá mais investimento estrangeiro e verá a sua moeda apreciar;
o Modelos Econométricos: podem incluir diversos factores de previsão;
o Modelo de Séries Temporais: procura prever o futuro com base no que aconteceu no passado.
Factores políticos e sociais podem também ter impacto na procura de moeda de cada país, uma vez que afectam as expectativas dos investidores em relação a cada uma das economias.
No entanto, é muito difícil prever, com sucesso e consistência, as taxas de câmbio, uma vez que são afectadas por inúmeras variáveis e não existe consenso sobre a supremacia de um método face a outro. Muitos investidores procuram entender as diferentes variáveis e perceber o seu impacto nos movimentos das taxas de câmbio entre as principais moedas. Outros decidem simplesmente fazer ou não a cobertura do risco cambial. O mais importante, no longo prazo, não é a decisão de fazer ou não cobertura cambial, mas sim optar por uma das abordagens e mantê-la. Caso contrário, o investidor pode incorrer em perdas consideráveis ao aplicar/retirar coberturas cambiais em momentos errados. Há, no entanto, uma diferença significativa a realçar:
o Activos de taxa fixa (depósitos e obrigações): tendo em conta que as moedas são mais voláteis, faz sentido efectuar cobertura cambial para os investimentos em taxa fixa, uma vez que estes representam um fluxo nominal de cash flows na moeda local, cujos montantes, datas de pagamento do rendimento e maturidade são definidos no momento do investimento.
o Activos de taxa variável (acções): para nós, investidores em valor e, por isso, comprometidos com o longo prazo, investimos com o objectivo de construir portefólios de acções globais diversificados, capazes de captar as dinâmicas do crescimento da economia mundial. Neste caso, estamos a considerar activos com cash flows variáveis e com capacidade de se adaptarem melhor a alterações cambiais, inflação e concorrência. Na era da globalização, a maior parte das empresas em que investimos têm custos e receitas em múltiplas moedas; shortar (vender sem ter o activo) a moeda local do investimento em acções não cobre a exposição cambial; adiciona, isso sim, uma nova camada de risco ao investimento.
Focamos o nosso trabalho na avaliação das qualidades dos negócios em que investimos, porque acreditamos que estas são as determinantes fundamentais para a produção de retornos a longo prazo. Estamos a investir em negócios reais que vendem em todo o mundo. Qualquer variação cambial será contrabalançada pelo efeito contrário nos lucros gerados internacionalmente.
deverá o investidor fazer a cobertura cambial?
Do estudo que fizemos, fundamentado na teoria financeira e na prática de como os melhores investidores em valor do mundo lidam com esta questão, realçamos:
1. A probabilidade de um investidor particular ou profissional efectuar operações cambiais com sucesso no médio e longo prazo é praticamente nula;
2. No longo prazo, a melhor protecção que um investidor pode ter advém da diversificação de posições, por sectores, por geografias e investindo em empresas que vendem os seus produtos e serviços em todo o mundo e consolidam os seus balanços em inúmeras moedas;
3. A experiência de excelentes gestores, para longos períodos de tempo, demonstra que os retornos, com ou sem cobertura cambial, tendem a convergir.
Do nosso estudo concluímos também que, num período alargado de tempo, as variações cambiais tendem a anular-se e o seu impacto no desempenho de uma carteira de acções é muito reduzido. Os câmbios entre economias desenvolvidas tendem para médias de longo prazo.
Importa salientar que quando investimos num activo, cuja moeda em que transacciona é mais instável, procuramos reforçar a margem de segurança que exigimos, ou seja, o preço a que compramos tem que ter um desconto maior face ao valor que estimamos para esse activo. Esta será a "almofada" para acomodar uma variação menos favorável do câmbio.
O que deve ser claro para os investidores é que o factor determinante nos retornos conseguidos no investimento advém da capacidade de seleccionarmos activos de qualidade superior e de estarmos investidos para o longo prazo.
Emília O. Vieira
Presidente do Conselho de Administração
No passado dia 23 de março, enquadrada nas "Inspiring Sessions" promovidas pela Primavera BSS, na sua sede em Braga, assisti à conferência com o tema "ASPECTOS DO POPULISMO", cujo orador foi o filósofo, ensaísta e professor José Gil. Depois de uma extraordinária apresentação, chegou o momento das perguntas e respostas. Da audiência veio uma questão que terminava: "o que pensa o Sr. Professor sobre o assunto?" A resposta do Professor foi, simultaneamente, simples e profunda:
"Sobre esse assunto, penso pouco porque é preciso pensar muito."
A atividade de gestão de dinheiro - mais ainda quando é o dinheiro dos outros - também deveria exigir a quem a pratica que pense muito, que tenha um conhecimento profundo do que se está a fazer e que não seja esquecido o dever de fidúcia.
Os tempos em que vivemos exigem ainda mais de quem investe e de quem tem os recursos para o fazer. Esta é sem dúvida uma crise de baixos retornos.
OS DESAFIOS À POUPANÇA
A erosão do poder de compra da moeda é uma constante ao longo da história e particularmente nítida no último século. A economia dos EUA teve nos últimos 100 anos uma inflação média de cerca de 3% ao ano. Esta evolução dos preços corresponde a uma perda de 95% do poder de compra no espaço de um século. Isto significa que um cabaz de produtos que custava um dólar em 1916 custa atualmente cerca de 20 dólares. Este processo de erosão monetária foi acelerado desde que se abandonou o padrão ouro, deixando os bancos centrais com maior flexibilidade na condução da política monetária. O gráfico abaixo mostra como a perda de poder de compra foi estarrecedora (clique para expandir):
Este não é apenas o caso do dólar, mas antes, um acontecimento generalizado nas economias desenvolvidas e ainda mais acentuado nos países emergentes e economias mais débeis.
Isto significa, que os ativos indexados à moeda como os depósitos à ordem ou prazo, as obrigações ou certificados de depósito são ativos que, no nível de taxas em que vivemos, não preservam a riqueza.
Este é o problema maior dos investidores/aforradores que têm uma grande preferência por ativos que lhe permitem ter um rendimento certo, pago em data fixada no início do investimento e no final do prazo recebem o seu dinheiro de volta. Estes são, no entanto, ativos muito arriscados. A maioria das pessoas é que não tem essa perceção.
A injeção de liquidez feita pelos bancos centrais
Desde a crise financeira, os bancos centrais viram-se obrigados a injetar liquidez no sistema monetário para impedir um seu colapso, suportar as economias e ajudá-las a crescer. Esta prática, chamada de Quantitative Easing, resume-se ao esforço dos bancos centrais de ajudar a estimular as economias aumentando a oferta de moeda para por ao dispor do sistema financeiro mais dinheiro para emprestar aos agentes económicos.
O processo foi-se agravando nos últimos anos com os vários pacotes de Quantitative Easing, traduzidos em compras de títulos de dívida do governo e das empresas pelos bancos centrais. No início deste século, os ativos dos três principais bancos centrais (Reserva Federal dos EUA, Banco Central Europeu e Banco do Japão) totalizavam 2,3 biliões de dólares (os chamados triliões para os americanos). No final de 2016, tinham mais do que quintuplicado, atingindo 12,4 biliões de dólares. Recorde-se que estas 3 moedas representam cerca de 88% das reservas mundiais de moeda.
Um banco central é a única entidade que pode aumentar os seus ativos imprimindo dinheiro (físico ou eletrónico). Os bancos centrais, instituições independentes de Governos e responsáveis pela política monetária, têm-no feito de forma sistemática ao longo dos últimos anos. O que normalmente acontece é que quando a oferta de dinheiro aumenta demasiado depressa, é natural que traga consigo a inflação, o imposto escondido que corrói a riqueza, sobretudo os investimentos feitos em ativos monetários.
Como podem os investidores confiar nestes ativos quando continuam a ver os bancos centrais a imprimir moeda?
A título de exemplo, refira-se um investimento numa obrigação a dois anos do governo alemão: ao emprestarmos o nosso dinheiro estaremos a perder quase 1% ao ano (ou seja, a pagar) para que este valor esteja num título considerado muito seguro. Ninguém imagina que daqui a dois anos a Alemanha não pague de volta aos seus credores. Por outro lado, se decidirmos investir numa obrigação do Estado português, obtemos um rendimento substancialmente mais elevado, mas sabemos que o risco é considerável. Num país gerido sem margem de segurança, uma próxima crise, encarregar-se-á de demonstrar que a pilha enorme de dívida do Estado terá que ser reestruturada e que os obrigacionistas poderão perder parte do seu dinheiro e/ou ter que esperar bastante mais tempo para o receber.
COMO INVESTEM OS PORTUGUESES?
O livro "POUPANÇA E FINANCIAMENTO DA ECONOMIA PORTUGUESA", da autoria dos Professores Fernando Alexandre, Luís Aguiar-Conraria, Pedro Bação, da Universidade de Minho, e do Professor Miguel Portela, da Universidade de Coimbra, publicado há dias pela APS e pela Imprensa Nacional, faz uma interessante análise às componentes da poupança e investimento, fonte dos desequilíbrios que conduziram à rutura financeira e respetiva entrada da troika em Portugal.
Poupança e Investimento são pilares fundamentais do funcionamento da economia: por definição só se pode investir aquilo que se poupa. E só o investimento é que permite aumentar a capacidade produtiva. Do lado da poupança, a decomposição das aplicações financeiras das famílias em Portugal mostra que 74% dos ativos financeiros de particulares estavam em 2010 em depósitos à ordem e a prazo.
Considerando os dados mais recentes publicados no "Household Finance and Consumption Survey" do BCE de dezembro de 2016, percebemos que essa percentagem tem vindo a cair, mas ainda se mantém em cerca de 67%. Compare-se, por exemplo, com a Espanha que apresenta um peso muito menor de depósitos na composição das carteiras de ativos financeiros: 41%.
No momento atual, estas aplicações estão a render taxas de juro reais negativas e expostas à desvalorização monetária. Na prática, estão a contribuir para a estagnação e empobrecimento do património financeiro das famílias portuguesas.
Se no caso do pequeno aforro, é compreensível que as famílias possam querer ter o dinheiro mais disponível num pequeno pé-de-meia que pouparam, não se compreende é que a maior parte dos depósitos a prazo sejam ainda assim das famílias com mais recursos.
Da análise feita pelos autores, o quintil mais rico da população portuguesa que detém 65% dos ativos financeiros detém também 65% dos depósitos a prazo e mostra a mesma apetência que o resto da população por esta classe de aplicação financeira hoje sem retorno, mas apesar de tudo com riscos consideráveis (com a entrada em vigor da legislação em janeiro de 2016, em que os depósitos do banco poderão em caso de insuficiência de capitais, ser também chamados a assumir perdas).
Seguramente, não é por necessidade que 65% da poupança nacional está aplicada num ativo que lhe vai lentamente corroendo o valor. Uma boa parte desses montantes tem o potencial para estar aplicado não só numa ótica de proteção de capital, mas sobretudo numa ótica de proteger o poder de compra e de fazer crescer o património financeiro para os seus detentores e para as gerações futuras.
No seu livro "A Batalha pela Alma do Capitalismo" John Bogle, fundador da Vanguard e considerado, pela Revista Time, um dos 4 "gigantes financeiros" do Sec. XX, relata que a verdadeira razão pela qual a América é a maior potência mundial é que, desde muito cedo, as famílias investiram grande parte das suas poupanças na bolsa, podendo assim partilhar as maravilhas do capitalismo e enriquecer, criar também os seus negócios e prosperar. Ou seja, o verdadeiro círculo virtuoso de que fala Adam Smith na Riqueza das Nações.
"O controlo do risco é a melhor forma de evitar perdas. Evitar riscos, por outro lado, é provavelmente a melhor forma de evitar retornos"
Esta frase proferida por Howard Marks, fundador da Oakmark e reputado investidor em valor, clarifica o que o investimento deve ser. A melhor alternativa hoje continua a ser investir uma parte significativa do património financeiro em ações de boas empresas que estejam a cotar a preços sensatos.
A primeira grande vantagem do investidor em valor é que não precisa que todo o mercado esteja barato. A segunda é que é um investidor paciente e as oportunidades de valor aparecerão.
Ou seja, comprar pequenas fatias de negócios maravilhosos que nos permitirão o rendimento dos seus dividendos e participar no crescimento da empresa a longo prazo. Além disso, se comprarmos estas pequenas fatias de empresas quando estão baratas, ainda conseguiremos ganhos de capital com significado.
As questões que muito investidores colocam hoje são:
1. Com os mercados americanos em máximos não é melhor nesta altura estar fora do mercado?
2. A Europa está uma confusão, com vários acontecimentos políticos relevantes e a crescer mais lentamente que a economia americana. Não é melhor aguardar que as coisas estejam mais claras?
3. Talvez não seja má altura para investir nos mercados emergentes? Mas, por outro lado, as suas ações e fluxos de capitais são os mais voláteis e quando os mercados mundiais recuam estes são os que mais sofrem.
4. Porque não investir em obrigações? Nem pensar, as taxas de juro estão muito baixas e quando subirem os investidores vão perder dinheiro. Para além disso, muitos emitentes não terão condições de reembolsar quem investiu nestas obrigações.
5. E se mantiver o dinheiro a prazo? Nem pensar, perde dinheiro para a inflação.
Estes investidores estão hoje com os pés presos ao cimento.
Eventualmente espera-se que aprendam a viver com a inevitável incerteza e investir em ativos que, no curto prazo podem ser arriscados (e terem mais volatilidade de preço) mas, no longo prazo, o seu risco é muito limitado e o seu potencial de criar valor é, nalgumas destas superestrelas, extraordinário.
Investir é difícil e, por isso, é preciso pensar muito. Pode ser emocionalmente cansativo tentar investir o nosso dinheiro e simultaneamente tentar levar em conta todas as variáveis que poderão ter impacto nesse investimento. Investir pode ser intimidante e na maioria dos casos resulta em duas posturas: deixar estar parado a prazo ou "jogar" seguindo o tal conselho menos avisado ou palpite. Nem uma nem outra são abordagens de bom senso.
Há anos um conhecido dizia-me que, seguindo um conselho de um amigo que trabalhava no sector financeiro em Nova York e era um craque, estava fora do mercado há muito tempo. Estava muito chateado porque estava a ver o mercado a subir há muito tempo à espera de uma correção. Por isso, continua à espera do melhor ponto para entrar.
O que devo fazer agora? Na verdade, esta tem sido uma questão recorrente desde a fundação da Casa de Investimentos. A verdade é que existiram já muitas correções; quase 20% em julho de 2011, várias de 10 a 12% e em muitas ações individuais verificámos correções de mais de 50%. Nesses momentos, enquanto os meios de comunicação assustavam os investidores, aproveitámos para comprar excelentes negócios a bons preços para os nossos clientes.
"Tentar adivinhar o mercado é meio caminho andado para ficar viciado em dinheiro". Este é um dos maiores problemas dos investidores quando decidem ficar em dinheiro: existem sempre boas razões para estar em dinheiro e esperar por uma melhor oportunidade de compra. Quando as ações sobem, este tipo de investidor convence-se que há boas razões para esperar por um preço melhor. No entanto, quando o mercado cai, como fez no início do ano passado ou em 24 de agosto de 2015, estes investidores convencem-se a esperar que caia mais. Resultado, continuam em liquidez ou a entrar e sair do mercado como quem tenta passar por entre os pingos da chuva e chegar a casa seco.
É fácil olhar para trás e dizer: que belíssimo negócio seria investir no início de 2009, mas, nessa altura, não havia muita gente disposta a investir. Desde que a recuperação teve início, as pessoas duvidavam da sua legitimidade, os comentadores assustavam as pessoas com previsões, hiperinflação e com o possível colapso do dólar.
Hoje é porque os mercados estão em máximos, o Trump é presidente dos Estados Unidos, a Europa está instável... As estrelas nunca estão todas alinhadas. Se assim fosse, era fácil. Entretanto, o homem mais rico do mundo, Warren Buffett, já investiu 20 mil milhões de dólares desde que Trump foi eleito.
Senhor investidor, note bem, os consultores de investimento - a que o Sr. Warren Buffett chama os ajudantes que só se ajudam a si próprios - quando o aconselham, fazem parecer que entrou num supermercado onde pode encontrar milhares de fundos de investimento para todos os gostos. Muitos destes fundos são geridos por boas equipas, pessoas inteligentes, que não sabem para quem estão a trabalhar. O que vai motivar estes consultores a escolhê-los hoje, para os vender daqui a um mês, vai ser a performance de curto prazo. Do mesmo modo, milhares de obrigações, centenas de ETF´s... etc. Querem garantir que lhe prendem o dinheiro e a diversificar numa tentativa de estar sempre a ganhar. E se o estiverem a fazer mal? Nos ativos errados?
O grande problema para si é que não lhe apresentarão uma estratégia de médio e longo prazo consistente para criar riqueza e os interesses destes vendedores e promotores não coincidem com os seus. Este é o conhecido problema de agência na economia em que os interesses dos agentes ou gestores não coincide com os dos donos/clientes. E nestes casos, estes que se cuidem. Os acionistas de empresas, que foram pilhadas por CEO's ou administrações que põem os seus interesses em primeiro lugar, têm uma dolorosa familiaridade com esta situação. Os Clientes da esmagadora maioria das instituições financeiras infelizmente engrossam esta fileira.
Termino dizendo que é preciso pensar muito e que o investimento se resume a duas coisas: a procura de valor e a guarda dos interesses dos nossos clientes.
Qualquer um gosta de lucros fáceis e rápidos. Mas a perspectiva de um ganho sem esforço incentiva a ganância, e a ganância leva muitos investidores a procurar atalhos quando investem. Em vez de permitirem que os retornos se componham ao longo do tempo, tentam conseguir lucros rápidos com base em palpites quentes. O investimento inteligente requer paciência e nada tem em comum com uma carteira de acções da moda.
Quando é que é a melhor altura para investir? A resposta é simples: quando se tem o dinheiro e tempo para esperar pelos resultados.
Investir é difícil. Seguir uma estratégia de Valor exige muito trabalho, uma disciplina extraordinariamente rigorosa e um horizonte de longo prazo.
Poucas pessoas estão dispostas a dedicar o tempo e o esforço necessários para serem investidores em Valor. Ainda menos têm o temperamento adequado para ter sucesso.
Os investidores institucionais são incapazes de tomar decisões de investimento de longo prazo com base nos fundamentos económicos dos negócios.
Isto sucede por várias razões: a pressão que sofrem relativamente à sua performance, a estrutura de compensação da indústria financeira, e o frenesim dos mercados financeiros com os media a regar o fogo com gasolina. Inevitavelmente, o resultado para os investidores é uma corrida à performance de curto prazo, onde as flutuações temporárias dos preços das acções se tornam o foco dominante.
Peter Lynch, que durante 13 anos geriu o Fundo Magellan da Fidelity, com retornos anuais de 29%, assegura que mais de metade dos subscritores do fundo perdeu dinheiro: subscreviam o fundo passados dois ou três meses de bons desempenhos e saíam após dois a três meses de desempenhos negativos. Qualquer um gosta de lucros fáceis e rápidos.
Mas a perspectiva de um ganho sem esforço incentiva a ganância, e a ganância leva muitos investidores a procurar atalhos quando investem.
Em vez de permitirem que os retornos se componham ao longo do tempo, tentam conseguir lucros rápidos com base em palpites "quentes", a última moda. A ganância também se manifesta no optimismo exagerado ou, mais subtilmente, na complacência face a más notícias e desvia os investidores do objectivo de retornos de longo prazo para tentarem especular no curto prazo.
O investimento inteligente requer paciência e nada tem em comum com uma carteira de acções da moda. Para nós, investidores em Valor, é bom que as acções não tenham grandes variações de preço enquanto as estamos a comprar.
Tal como Warren Buffett diz, "se vamos comer hambúrgueres, queremos que o preço da carne de vaca se mantenha barato".
Isto reforça a necessidade de avaliarmos os nossos resultados ao longo de um período de tempo adequado e que deverá ser de cinco anos.
O investimento em Valor não permite bater os mercados quando todos estão eufóricos. Num bull market, qualquer um consegue ganhar, muitas vezes mais do que um investidor em Valor. No entanto, é quando os mercados estão caros ou caem que a disciplina do investimento em Valor se torna especialmente importante: ajuda a manter o rumo quando os "marcos" não estão visíveis e a salvaguardar o valor. No curto prazo, não sabemos como se comportará o mercado, mas temos a certeza de que, mais cedo ou mais tarde, este reconhece o valor aos activos com qualidade. Com tempo, isso acontece sempre.
Só existe fortuna quando há dinheiro para passar de geração em geração. Por isso, o investidor deve comprometer-se com o longo prazo.
Como diz Buffett, "não importa o talento nem o esforço. Algumas coisas demoram o seu tempo. Não se consegue fazer um bebé num mês engravidando 9 mulheres."
Emília. O Vieira
Presidente do Conselho de Administração da Casa de Investimentos
O que nos impede de tomar decisões racionais de investimento? Porque é que o medo e a ganância dominam a nossa actuação? Como diz Benjamim Graham, o principal problema do investidor e talvez o seu pior inimigo é ele próprio.
O que nos impede de tomar decisões racionais de investimento? Porque é que o medo e a ganância dominam a nossa actuação? Como diz Benjamim Graham, o principal problema do investidor -- e talvez o seu pior inimigo -- é ele próprio.
Tal como perder peso, investir é simples, mas não é fácil. Há apenas duas formas de perder peso: comer menos e fazer mais exercício. No entanto, tal revela-se muito difícil num mundo cheio de bolos de chocolate, de batatas fritas, de bons assados ou bons vinhos. A tentação está em todo o lado.
A chave para investir com sucesso também é simples: comprar bons ativos, que produzam rendimentos, quando estão baratos e mantê-los; diversificar apenas o essencial e manter os custos de transação baixos. Infelizmente este conceito tão simples não é facilmente aplicável pelos investidores que todos os dias são bombardeados com a ideia "fique rico depressa", avisos para saírem do mercado (ou entrarem) antes que seja demasiado tarde e comentadores de televisão que gritam dicas de investimento como se tivessem a roupa interior a arder. Os investidores são muitas vezes "forçados" a tomar decisões motivados pelo medo ou pela ganância.
Este ambiente de sobrecarga sensorial seria o suficiente para impedir que o investidor aplique esta receita tão simples. Mas um obstáculo maior bloqueia o seu caminho. Nos últimos 40 anos, neurocientistas e psicólogos têm estudado o nosso processo de tomada de decisões, o que nos condiciona como seres humanos e porque fazemos muitas vezes as escolhas erradas ao longo da vida.
O que era considerado como as fundações das finanças -- Efficient Market Hypothesis (Teoria dos Mercados Eficientes), Capital Asset Pricing Model (Modelo de Avaliação de Ativos Financeiros) e Modern Portfolio Theory (Teoria Moderna de Portefólios) -- pressupõe que os investidores são racionais e que, por isso, tomam as decisões sempre no seu melhor interesse. A história financeira, no entanto, está recheada de exemplos que contradizem estas teorias. Basta recordar todas as bolhas e crashes que tiveram lugar nos últimos anos.
As finanças comportamentais pretendem ser uma resposta a estes dilemas. Compreendendo a forma como tomamos decisões de consumo e investimento, podemos criar o nosso próprio processo sistemático que nos conduza à tomada de decisões corretas.
Psicólogos e neurocientistas descobriram duas características que são particularmente relevantes na tomada de decisões. A primeira, é que estamos programados para o curto prazo: o ser humano tende a considerar a possibilidade de ganhos no curto prazo extremamente atrativa. Estes ganhos estimulam os centros emocionais do cérebro e libertam dopamina. Isto torna-nos mais confiantes, estimulados e, de uma forma geral, satisfeitos connosco próprios. A segunda, é a nossa tendência para adotar comportamentos de rebanho: a dor da exclusão social (por exemplo, comprar quando todos estão a vender ou vice-versa) é sentida nas mesmas partes do cérebro que sentem a dor física real. Adotar estratégias de investimentos contrárias é, portanto, um pouco como sermos espancados.
A evidência que tem sido coligida em inúmeros estudos mostra que todos nós, como seres humanos, somos afetados por desafios comportamentais -- vieses mentais -- que condicionam o nosso processo de tomada de decisões racionais.
Da savana africana à era digital
Porque sofremos estes vieses que tanto nos condicionam na tomada de melhores decisões? Como qualquer outra característica da nossa existência, os nossos cérebros foram, e continuam a ser, refinados por um processo de evolução que ocorre a um ritmo glacial. Os nossos cérebros estão perfeitamente adaptados para o ambiente que enfrentávamos há 150 mil anos (a savana africana). Estão menos preparados para a revolução industrial de há 300 anos e talvez ainda menos preparados para a era digital em que vivemos hoje. Por outras palavras, as nossas mentes estão preparadas para resolver os problemas relacionados com a sobrevivência e não estão ainda otimizadas para decisões de investimento. O resultado desta herança é que todos nós, sem exceção, cometemos estes erros.
Os cientistas sugerem que o melhor método para entender como o nosso cérebro funciona é imaginar que temos dois sistemas diferentes instalados nas nossas mentes: o sistema X e o sistema C.
O sistema X é essencialmente a emoção na tomada de decisões. O sistema X é a opção automática. Toda a informação passa pelo sistema X para processamento e não exige qualquer esforço. As conclusões tiradas pelo sistema X são, geralmente, baseadas em aspetos como a semelhança, familiaridade e proximidade temporal. Estes atalhos mentais permitem ao sistema X lidar com imensas quantidades de informação simultaneamente. O sistema X é um sistema de "satisfação" rápido e pouco sofisticado que tenta dar respostas aproximadamente (e não exatamente) corretas. Para que o sistema X acredite que algo é válido, pode muito simplesmente desejar que assim o seja.
O sistema C requer um esforço deliberado e tenta resolver os problemas através de uma abordagem lógica e dedutiva. Contudo, como qualquer processo lógico, verifica a informação passo a passo de uma forma lenta e em série. Para que o sistema C acredite em algo, precisa de provas.
Todos gostamos de acreditar que o nosso sistema C controla as nossas tomadas de decisão. A realidade é que o sistema X controla muito mais as nossas ações do que estamos dispostos a admitir. De facto, muito frequentemente acabamos por confiar na nossa reação emocional inicial e só ocasionalmente recorremos ao sistema C para rever a nossa decisão. Por exemplo, quando tropeçamos numa pedra, insultamos o objeto inanimado apesar de ele não ter responsabilidade alguma pelo nosso erro. Ainda assim, o sistema X, segundo conclusões de António Damásio, é indispensável à tomada de decisões. Sem emoção, o ser humano fica paralisado perante os desafios.
Neurocientistas descobriram que as partes do nosso cérebro associadas com o sistema X são muito mais antigas do que as partes associadas com o sistema C. Quer isto dizer que a necessidade da emoção evoluiu mais cedo do que a necessidade da razão. Imagine que estamos a visitar um jardim zoológico. Ao passar pela jaula dos leões, um leão salta na nossa direção; imediatamente damos um salto para trás. O sistema X reagiu para salvaguardar a nossa segurança. De facto, um sinal foi gerado assim que o nosso cérebro se apercebeu do movimento do leão. Este sinal foi enviado por dois caminhos -- pelo sistema X que enviou a informação diretamente para a amígdala cerebelosa (o centro do cérebro para medo e risco) que reage com rapidez e força o nosso corpo a saltar para trás. A segunda parte do sinal é enviada para o sistema C que processa a informação de uma forma mais consciente, avaliando a ameaça potencial. O sistema C recorda que existem barras de metal que nos separam do leão. Mas, entretanto, já saltámos para trás. A emoção ganha à razão.
O que tem isto que ver com finanças?
Em que circunstâncias somos mais suscetíveis a deixar rédea solta ao sistema X? Segundo a neurociência e a psicologia há um conjunto de situações em que isto acontece: quando o problema é mal estruturado e complexo, quando a informação disponível é incompleta, ambígua e está em permanente mudança, quando os objetivos estão mal definidos, se alteram ou competem entre si, quando os níveis de stresse estão altos devido a constrangimentos de tempo e/ou porque muito está em jogo, quando as decisões dependem da interação com outros.
Estas circunstâncias caracterizam muitas das decisões que tomamos quando confrontados com oportunidades de investimento. Um dos maiores investidores de todos os tempos, Warren Buffett, diz que os investidores precisam de controlar o seu sistema X: "o sucesso no investimento não está correlacionado com o QI. Se tiver uma inteligência normal, o que precisa é de um temperamento capaz de controlar os impulsos que causam problemas às outras pessoas".
Para Warren Buffett, se tiver uma inteligência normal, o que precisa é de um temperamento que controle os impulsos que causam problemas às outras pessoas
Ao longo de anos, os psicólogos documentaram e catalogaram os tipos de vieses mentais aosquais somos suscetíveis. Os resultados principais são surpreendentemente comuns a culturas e países muito diferentes. A maior parte destes erros tem a sua origem em quatro causas: autoilusão, simplificação, emoção e interação social.
Vieses comportamentais mais comuns
Excesso de otimismo e excesso de confiança. Na nossa evolução como espécie, o otimismo terá tido um papel fundamental para ultrapassar grandes desafios de sobrevivência. Estudos científicos demonstram que as pessoas otimistas são mais resistentes e vivem mais tempo quando enfrentam problemas graves de saúde. Nas decisões de investimento, contudo, o resultado não é o melhor.
Responda a estas duas perguntas: o leitor é um condutor acima da média? O leitor é, na sua profissão, acima da média? A esmagadora maioria das respostas a estas perguntas é positiva. Estas perguntas revelam dois dos vieses mais comuns: excesso de otimismo e excesso de confiança. Estes vieses têm origem na ilusão de controlo e ilusão de conhecimento. A ilusão de conhecimento é a tendência que as pessoas têm de acreditar que a precisão das suas previsões aumenta com mais informação. A verdade é que mais informação não é necessariamente melhor informação. A utilização que fazemos da informação disponível é que interessa.
A tendência para sobrevalorizar as nossas capacidades é amplificada pela ilusão de controlo -- a crença que as pessoas têm que conseguem controlar acontecimentos incontroláveis. As pessoas pagarão quatro vezes mais por um bilhete de lotaria se puderem escolher os números do que por um bilhete com números aleatórios, como se o ato de escolher os números aumentasse a probabilidade deles serem sorteados. A aleatoriedade é frequentemente confundida com controlo.
Viés confirmatório: mostra-me o que quero ver. Temos o mau hábito de procurar apenas a informação que concorda connosco. Isto é o que se chama o viés confirmatório. Karl Popper dizia que a melhor forma de testar uma hipótese é tentar contradizê-la. Na verdade, não é assim que funcionamos. Tendemos a formar um ponto de vista e passamos o tempo a procurar informação que o confirme. Gostamos de ouvir quem concorda connosco, de ouvir as nossas próprias opiniões refletidas nos outros.
Infelizmente, esta não é melhor forma de tomar decisões. Devíamos ouvir aqueles que discordam, não para mudar de opinião, mas para tomarmos conhecimento dos pontos de vista opostos e para tentar encontrar a falha lógica nos seus argumentos. Se não conseguirmos encontrar essa falha, talvez não devamos ter tamanha convicção nos nossos pontos de vista.
Um problema adicional ao viés confirmatório é o viés dos médios hostis. Isto é, não só procuramos apenas a informação que concorda connosco, mas, quando somos confrontados com informação que discorda connosco, temos a tendência de considerar a fonte dessa informação como tendo um ponto de vista enviesado.
Autoatribuição: caras é mérito nosso, coroa é azar. Todos nós temos um relativamente frágil sentido de autoestima e um dos mecanismos-chave para o proteger é o viés da autoatribuição, a tendência de atribuir bons desfechos à nossa habilidade e os maus desfechos ao azar. Este viés constitui um dos mais fortes limites à aprendizagem que os investidores encontram. Este mecanismo de defesa impede-nos de reconhecer os erros que cometemos e, desta forma, de aprendermos com os erros cometidos no passado. Como disse George Santayana, "a história repete-se e esquecer o passado é estar condenado a repeti-lo".
Quando questionado sobre se os investidores iriam aprender algo com a crise financeira em 2008 e 2009, Jeremy Grantham, estratego chefe da gestora de ativos GMO, respondeu: "Iremos aprender muito no curto prazo, alguma coisa no médio prazo, e absolutamente nada no longo prazo."
Recuando no tempo, John K. Galbraith dizia que os mercados financeiros são caracterizados pela "extrema brevidade da memória financeira. Consequentemente, os desastres financeiros são rapidamente esquecidos. Quando as mesmas ou similares circunstâncias se repetem, são saudadas por uma nova, frequentemente jovem e sempre confiante, geração como uma descoberta brilhantemente inovadora no mundo económico e financeiro. Poucos são os campos da atividade humana em que a história é tão pouco importante como no mundo das finanças".
Hindsight: eu já sabia. Um dos mais perigosos vieses que enfrentamos é o viés do retrovisor (hindsight). Refere-se ao facto de, após um evento ter tido lugar, nós estarmos convencidos de que sabíamos o que se iria passar. O melhor exemplo do viés do retrovisor nos investidores é a bolha tecnológica do final dos anos 90. Na altura, chamar a atenção dos investidores para a bolha tecnológica resultava em "ameaças físicas". Hoje, os mesmos investidores reescreveram a sua história. Todos eles sabiam que era uma bolha -- estavam todos investidos, mas sabiam que era uma bolha e que, mais cedo ou mais tarde, iria explodir.
Obviamente, se todos estão convencidos de que conseguem prever o passado, é natural que estejam excessivamente certos de que conseguem prever o futuro. Assim, o hindsight é o mais poderoso gerador de excesso de confiança.
Ancoramento: o irrelevante tem valor. Quando confrontados com a incerteza, todos temos a tendência de nos agarrarmos ao irrelevante como se fosse uma muleta ou uma âncora. Esta incorporação do irrelevante acontece frequentemente sem qualquer reconhecimento consciente do facto.
Que âncoras influenciarão os investidores? A toda a hora, os preços das ações são publicitados: nos jornais, na internet, no ticker que está permanentemente a rodar na parte inferior dos canais financeiros de televisão. Os investidores agarram-se a estas miragens de preços e, erradamente, fazem-nos equivaler ao valor dos negócios subjacentes.
Representatividade: tiro conclusões com base na aparência e semelhança. As pessoas julgam os eventos pela sua aparência e semelhança, não pela probabilidade deles acontecerem. É o chamado viés da representatividade. Este viés tem muitas aplicações no mercado de capitais. Por exemplo, as boas empresas são bons investimentos? Podem não ser, se estiverem a transacionar a preços acima do seu valor justo.
Nos mercados financeiros, os analistas também sofrem deste viés. Preveem que as empresas com forte crescimento dos resultados nos últimos cinco anos irão continuar a crescer ao mesmo ritmo nos próximos cinco anos. O que os analistas estão a dizer é "esta empresa é excecional e, portanto, continuará a sê-lo". O que ignoram (inconscientemente) é que o crescimento de resultados é um processo altamente reversivo para a média, em períodos de cinco anos. Um portefólio de empresas com crescimento mais lento consegue quase a mesma taxa de crescimento de longo prazo do que um portefólio de empresas de crescimento rápido. Efetivamente, os analistas avaliam as empresas pelo que parecem ser e não pela probabilidade de conseguirem sustentar as altas taxas de crescimento. Como salienta Philip Fisher, autor do livro Common Stocks and Uncommon Profits: "O mercado bolsista está cheio de indivíduos que sabem o preço de tudo e o valor de nada."
Experiência direta: não é isso de que me recordo. As nossas mentes não são supercomputadores. Não são sequer bons arquivos. No entanto, estamos convencidos de que as nossas memórias são perfeitas como fotografias ou postais. De uma forma geral, as pessoas recordam-se melhor de informação vívida, bem publicitada ou mais recente. O efeito proximidade temporal é também reforçado pelo facto de as pessoas tenderem a confiar mais nas suas experiências em detrimento de estatísticas ou de experiências alheias.
Estudos concluem que a experiência direta é frequentemente muito mais ponderada do que a experiência geral, mesmo quando esta é igualmente objetiva e relevante. Uma possível razão para a importância excessiva da experiência pessoal é o impacto da emoção: informação diretamente experimentada desencadeia reações emocionais ausentes das experiências alheias. Desta forma, se as pessoas utilizarem a sua experiência pessoal para avaliar a probabilidade de eventos, irão exagerar o peso de eventos improváveis porque passaram e subestimar o peso daqueles que não experimentaram em primeira mão.
A experiência recente da maior parte dos investidores em Portugal é de perdas significativas. Os títulos mais disseminados na Bolsa portuguesa são os que maiores perdas acumulam. Recentemente, um dos jornais económicos noticiava que, diariamente, mais de 700 investidores deixavam de ter ações. Os investidores atribuem maior ponderação à sua experiência pessoal do que a todos os estudos que comprovam o sucesso do investimento em valor. Este comportamento reflete também o efeito da proximidade temporal: o investidor acredita que o futuro será sempre este. Esta atitude verifica-se nos dois extremos do mercado ampliando, assim, os efeitos das bolhas e dos crashes.
Porque existem investidores excecionais?
No dia a dia, tomamos decisões de consumo, poupança e investimento. Grande parte de nós não tem formação financeira para as tomar no seu melhor interesse. Os vieses comportamentais de que sofremos são também handicaps com que temos de lidar. A história está repleta de bolhas: no mercado bolsista, no mercado imobiliário, nas matérias-primas e até as tulipas excitaram muitos investidores, no século XVII.
Alguns dos melhores investidores do mundo ultrapassaram estes vieses comportamentais que afetam as decisões de investimento e reduzem os retornos à esmagadora maioria dos investidores. Entre 1929 e 1934, Benjamim Graham e David Dodd testemunharam o melhor e o pior nos mercados financeiros. Da escalada até ao pico de 1929, até ao crash em Outubro do mesmo ano e a implacável Grande Depressão. Desta sua experiência no mercado financeiro e do vasto conhecimento da teoria financeira, os dois professores da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, construíram um modelo com o qual os investidores podiam filtrar centenas ou até milhares de ações e obrigações e identificar aquelas em que valia a pena investir. Esta filosofia de investimento é conhecida como o investimento em valor e o seu mais famoso praticante, aluno de Benjamin Graham, é Warren Buffett.
Para investir em valor, compre bons ativos baratos, venda-os, pelo menos, ao seu preço justo e, no intervalo entre a compra e a venda, ignore as cotações de mercado
Em 1992, Tweedy, Brown Company LLC, gestora de patrimónios muito conceituada, publicou uma compilação de 44 estudos intitulada "O que funciona no investimento". O estudo concluiu que o que funcionou é muito simples: as ações baratas conseguem, consistentemente, melhores retornos do que as ações caras; e as ações cujo preço teve pior performance (em períodos de três e cinco anos) conseguiram melhores rentabilidades, nos períodos seguintes, do que as ações cujos preços tiveram melhor performance nos mesmos períodos.
Ao longo dos últimos 54 anos, Warren Buffett conseguiu rentabilidades médias de 20,2% ao ano. Quando questionado sobre o seu sucesso como investidor, responde: "O nosso método é muito simples. Tentamos selecionar negócios com fundamentos económicos soberbos, geridos por pessoas honestas e capazes e compramo-los a preços sensatos. É só isto que tentamos fazer."
Warren Buffett escreveu um artigo, em 1984, intitulado "Os superinvestidores de Graham e Doddsville". Nesse artigo, Buffett elenca alguns investidores que, ao longo de vários anos, conseguiram retornos muito acima do mercado. Walter Schloss ganhou, durante 20 anos, 21,3% ao ano; Tom Knapp, da Tweedy Browne, conseguiu retornos de 20% ao ano; Bill Ruane, da Sequoia Funds, conseguiu 17,2% anuais; Charlie Munger, sócio de Warren Buffett, ganhou, num período de 13 anos, 19,8% anuais. Segundo a teoria dos mercados eficientes, estes investidores foram simplesmente bafejados pela sorte. No entanto, argumenta Buffett, todos estes investidores têm um patriarca intelectual em comum, Benjamin Graham. Eles trabalham em locais diferentes e investiram em ativos diferentes, a única coisa em comum é a estratégia que seguem, o investimento em valor. O seu sucesso, portanto, não pode ser atribuído apenas à sorte; é o triunfo da estratégia certa. Por outras palavras, o investimento em valor funciona.
O que é o investimento em valor?
É investir em bons ativos, que produzem rendimentos, comprados a desconto do seu valor justo e que sejam geridos por gente capaz e honesta. É simples, mas está longe de ser fácil.
O investidor em valor é avesso ao risco e portanto a decisão de investimento é um processo de avaliação profunda dos dados fundamentais das empresas, dos negócios que lhe estão subjacentes e da sua capacidade de gerar um rendimento crescente no futuro. A partir dos balanços e demonstrações financeiras da empresa, avaliam-se a qualidade do negócio, as margens operacionais, a evolução dos lucros, a rentabilidade dos capitais investidos, os níveis de endividamento, as vantagens competitivas dentro do sector e a capacidade de remunerar o acionista. As palavras de Benjamin Graham resumem bem este processo: "A análise deve ser penetrante, não profética."
No entanto, o investimento em valor não se resume apenas à análise das demonstrações financeiras. Uma vez que nem todos os elementos que afetam o valor da empresa são revelados pelo escrutínio dos documentos contabilísticos, a experiência, a capacidade de julgamento e o ceticismo são fundamentais para estimar o real valor da empresa.
Uma vez estimado o valor da empresa, confrontamo-lo com o preço a que está a cotar no mercado. Preço é o que se paga, valor é o que se recebe e da diferença entre o preço a que estamos a comprar e o valor intrínseco do ativo, obtemos a margem de segurança, a "almofada" necessária para proteger os valores investidos. Disciplina e paciência para esperar pelo preço certo de compra são essenciais para que o método tenha sucesso. Quando a cotação no mercado refletir o valor da empresa, é altura de vender.
Poucos investidores são suficientemente disciplinados para manter padrões rigorosos de avaliação e aversão ao risco. É em tempos de grande incerteza e de conjunturas negativas que a prática de um método de investimento conservador e seguro -- o investimento em valor -- é particularmente fundamental.
Sir John Templeton, pioneiro dos fundos de investimento e considerado pela revista Money como o melhor investidor global do século xx, mantinha sob vigilância um conjunto de excelentes empresas que transacionavam a preços muito elevados e os preços a que gostaria de as comprar. Quando o mercado caía e arrastava as ações para os níveis desejados, as compras eram executadas. Templeton sabia que, no dia em que o mercado caísse, ele não teria a disciplina para comprar. No entanto, ao determinar, a priori, os preços de compra, retirava da equação a emoção e os seus vieses mentais. Um processo disciplinado e objetivo é essencial ao sucesso.
Em agosto passado, na Casa de Investimentos, aplicámos este processo. Aproveitámos a reação negativa do mercado ao downgrade da dívida americana - uma queda de cerca de 20% em duas semanas - investimos nalgumas empresas excecionais que, sem qualquer justificação fundamental, ficaram baratas.
Por que tão poucos seguem esta filosofia
Apesar dos resultados excecionais de grandes investidores em Valor e de inúmeros estudos que os comprovam, poucos são os investidores que seguem este método de investimento. Warren Buffett, para lá da publicação trimestral das suas transações, escreve na imprensa, de tempos a tempos. Em 17 de outubro de 2008, aconselhou, em carta aberta no The New York Times ("Buy American, I Am"), o investimento em empresas americanas. Em fevereiro passado, escreveu na revista Fortune reiterando a sua preferência pelo investimento em ativos que produzam rendimento, isto é, ações.
Os professores universitários Gerald Martin e John Puthenpurackal, num paper de 2008, concluíram que, imitando as compras de Warren Buffett um mês após a sua divulgação pública, qualquer investidor bateria o S&P 500 por uma média de 10,75% ao ano, no período de 1976 a 2006. Este resultado é extraordinário tendo em conta que a performance de Warren Buffett, no mesmo período bateu o S&P 500 por 11,14% ao ano.
Muito antes de neurocientistas e psicólogos terem descoberto a importância destes vieses, Benjamin Graham refletia que o investidor deveria estar preparado, financeira e psicologicamente, para as flutuações do mercado e explicava-o através de uma metáfora a que chamava Sr. Mercado: "Imagine que é proprietário de parte do capital de uma pequena empresa e que essa participação lhe custou 1000 euros. Um dos seus sócios, chamado Sr. Mercado, é muito prestável. Todos os dias, ele diz-lhe qual é o valor, na opinião dele, da sua parte da empresa e oferece-se para comprá-la ou para lhe vender uma participação adicional ao mesmo preço. Por vezes, a avaliação do Sr. Mercado parece plausível e justificada pelos desenvolvimentos e perspetivas futuras do negócio. Frequentemente, contudo, o Sr. Mercado é levado pelo entusiasmo ou pelo medo e o valor que ele propõe é pouco menos do que ridículo. Se o leitor é um investidor prudente ou um empresário sensato, vai deixar que as comunicações diárias do Sr. Mercado determinem a sua convicção do que vale a sua participação de 1000 euros na sua empresa? Apenas nos casos em que concorda com o Sr. Mercado ou quando está disposto a negociar com ele. Poderá vender a sua participação quando o Sr. Mercado lhe propõe um preço ridiculamente alto, assim como poderá comprar uma participação adicional quando o preço é baixo. No tempo restante, poderá formar as suas próprias opiniões acerca de quanto realmente vale a sua participação, baseado nos relatórios da empresa sobre as suas atividades e situação financeira. O verdadeiro investidor está nesta posição quando tem ações de uma empresa cotada. Ele pode tirar partido do preço diário de mercado ou ignorá-lo. As flutuações de preço têm apenas um significado para o verdadeiro investidor. Elas oferecem oportunidades para compras inteligentes quando o preço cai bastante e oportunidades para vendas inteligentes quando os preços ultrapassam o valor da empresa. No resto do tempo, o investidor deverá ignorar o mercado e concentrar-se nos dividendos e resultados operacionais das suas empresas."
Por outras palavras, compre bons ativos baratos, venda-os, pelo menos, ao seu preço justo e no espaço de tempo entre a compra e a venda, ignore as cotações de mercado. Ou, como Warren Buffett recomenda: "Encare as flutuações de mercado como amigas e não como inimigas; lucre com a loucura em vez de participar nela."
O medo e a ganância têm separado muitos investidores do seu dinheiro. Quando o mercado de ações cai porque as notícias são más e a conjuntura macroeconómica difícil, os investidores vendem a qualquer preço ativos de grande valor. Porque muita gente o está a fazer, os investidores ignoram a qualidade dos ativos que têm e adotam o comportamento de rebanho. Do mesmo modo, quando a conjuntura é favorável ou as notícias para determinada empresa são muito positivas, é fácil perder o bom senso e seguir a multidão, comprando a qualquer preço.
O público investidor festeja o lucro fácil. Mas as bolhas inevitavelmente estouram. E o provérbio é confirmado: "Aquilo que o sábio faz no princípio, o tolo faz no fim"
Demasiadas pessoas investem no mercado de capitais com o objetivo de enriquecerem da noite para o dia. As ações, em vez de serem encaradas como uma "fatia" do negócio subjacente que, ano após ano, cria riqueza para os seus acionistas, são vistas apenas como papel que troca de mãos, frequentemente mais de uma vez por dia. A satisfação imediata, a falta de convicção com que se compram e vendem ativos e a busca de excitação no mundo do investimento potenciam decisões irrefletidas, tomadas por impulso. Muitos consideram que investir em Bolsa continua a ser um jogo de sorte e azar.
A especulação e as bolhas
A definição de investimento expandiu-se muito nos últimos 20 anos: desde selos, arte, vinhos, ouro, petróleo, todo o tipo de produtos financeiros exóticos e até apostas desportivas. Muitos destes ativos não são produtivos e quem os compra tem a esperança de que no futuro alguém venha a pagar mais por eles. Quem investe assim, não é inspirado por aquilo que o ativo produz, mas, sim, porque acredita que outros o desejarão ainda mais no futuro. Esta é, na sua essência, a definição de especulação. É desta forma que surgem as bolhas especulativas.
Nos últimos 15 anos, tanto as ações tecnológicas como o mercado imobiliário demonstraram os excessos extraordinários que podem ser criados pela combinação de uma tese de investimento sensata (na sua génese) e bem publicitados preços crescentes (o ouro é um bom exemplo). Nestas bolhas, um exército de investidores, a princípio cético, sucumbe à prova entregue pelo mercado e o grupo de compradores expande-se -- durante algum tempo -- o suficiente para manter a roda a girar. O público investidor festeja o lucro fácil. Mas as bolhas inevitavelmente estouram. E o velho provérbio é mais uma vez confirmado: "Aquilo que o sábio faz no princípio, o tolo faz no fim."
Canais de televisão de negócios, jornais, revistas, analistas e comentadores alimentam diariamente um público vasto e em expansão. Este é o "circo" que é montado diariamente à volta do mercado financeiro e que precisa de fazer crer que, durante o dia, irão passar-se eventos extraordinariamente importantes.
A quantidade de informação -- completamente irrelevante para a vida diária das empresas -- é espremida ao máximo. As "dicas para ganhar dinheiro hoje" encurtam ainda mais o horizonte de investimento. Mais informação não é melhor informação, apenas reforça no investidor a ilusão de controlo, o excesso de otimismo e de confiança.
Larry Summers, ex-secretário do Tesouro americano, investigou os 50 maiores movimentos no mercado de ações americano entre 1947 e 1987. Summers e os seus colegas vasculharam a imprensa na tentativa de encontrar alguma razão para os movimentos do mercado. Concluíram que, "na maioria dos dias com maior movimento, a informação que a imprensa avança como causa não é particularmente importante". Dito de outra forma, mais de metade dos maiores movimentos nos mercados não tem qualquer relação com os fundamentos económicos das empresas ou da economia.
A indústria financeira tem sido a grande promotora de toda esta "festa". Se por um lado está a satisfazer necessidades novas aos seus clientes, como argumenta, por outro, está a promover o curtíssimo prazo e o comissionamento excessivo. No seu livro The Battle for the Soul of Capitalism, John Bogle, fundador da Vanguard, expõe com grande clareza os conflitos de interesses dos grandes grupos financeiros e como a glorificação do curtíssimo prazo triunfou sobre os tradicionais valores da fidúcia. As comissões pagas, entre 1997 e 2002, pelos investidores norte-americanos aos bancos, corretoras e fundos de investimentos excederam os 1,275 triliões de dólares. No final dos anos 90, as previsões dos analistas e dos especialistas em estratégia tornaram-se mais importantes do que nunca nos mercados financeiros. Infelizmente, não se tornaram mais precisas e os exemplos são imensos. Existem hoje previsões sobre todo o tipo de indicadores, desde a inflação, as taxas de juro, o desemprego, os resultados trimestrais das empresas, passando pelos preços das ações e das obrigações, das matérias-primas, etc. Quando os números reais observados são divulgados, raramente coincidem com as previsões. Estão assim reunidas as condições para que os mercados se comportem com grande volatilidade. Isto não faz qualquer sentido. As previsões -- que criam a ilusão de controlo sobre o que pode ser o futuro -- vêm limitar a capacidade de tomar decisões baseadas em processos lógicos.
Para Warren Buffett, "as previsões políticas e económicas de curto prazo são uma distração muito cara para os investidores. A prazo, as notícias sobre os mercados financeiros serão positivas. No século xx, os Estados Unidos passaram por duas Guerras Mundiais e outros conflitos militares dispendiosos, uma Grande Depressão, uma dúzia de recessões, vários pânicos financeiros, choques petrolíferos, etc. No entanto, o Dow Jones subiu dos 66 para os 11497 pontos."
Os analistas e gestores de dinheiro são também vítimas destas armadilhas mentais. Têm acesso a demasiada informação e precisam de proteger o seu posto de trabalho. Se seguirem o rebanho e estiverem errados, fizeram o que toda a gente fez. Se não seguirem o rebanho e estiverem errados, o seu emprego está em causa. A evolução tecnológica, a internet, a grande difusão de informação e a engenharia financeira contribuíram para potenciar negativamente os nossos vieses comportamentais.
Conclusões
O investidor deverá ter a disciplina e a coragem de se manter fiel aos seus princípios. Como Benjamin Graham declarou: "Se acredita que o investimento em valor é um conceito sólido, deverá devotar-se a esse princípio. Mantenha-se fiel e não se deixe arrastar pelas modas, pelas ilusões e pela perseguição constante do lucro rápido de Wall Street. Não é preciso ter uma inteligência de génio para ser um investidor em valor de sucesso. O que é necessário é, em primeiro lugar, uma inteligência razoável; em segundo, bons princípios de atuação; e terceiro e mais importante, firmeza de caráter."
Só dominando estes três elementos é que o investidor inteligente será capaz de agir de forma contrária -- comprar quando todos vendem e vender quando todos compram.
Nunca deixaremos de ser suscetíveis aos vieses comportamentais. Reconhecendo as nossas limitações, estaremos mais bem preparados para que os processos lógicos assumam o controlo. Só com processos sólidos de tomada de decisões será possível obter resultados consistentes a médio e a longo prazo.
O Millennium BCP tem sido consistente a destruir valor na última década e meia.
Desde Abril de 2008, o Millennium BCP fez aumentos de capital de 5957 milhões de euros, dos quais 1481 milhões através da conversão de dívida em acções e o restante pela emissão de novas acções. Agora, com uma capitalização inferior a 800 milhões de euros, o banco vem pedir aos accionistas mais 1332 milhões de euros para pagar os 700 milhões de empréstimo do Estado e reforçar os rácios de capital core tier one de 9,5% para os respeitáveis 11,4%.
O banco tem sido consistente a destruir valor na última década e meia. Depois deste aumento de capital, cotará a 39% do seu valor contabilístico, reflectindo a percepção do mercado que também este capital será consumido pelos elevados níveis de crédito malparado, pelos graves erros de gestão do passado e dificuldades à volta do negócio. Primeiro, os níveis de malparado não deverão ter redução rápida devido ao sobre-endividamento do Estado, famílias e empresas, e são um entrave ao crescimento económico. Segundo, o aperto na regulação europeia torna esta actividade menos rentável. E terceiro, o ambiente de taxas de juro tão baixas reduz o potencial de resultados para uma indústria que está sobredimensionada em toda a economia europeia.
A crise financeira de 2008 e as medidas tomadas para a ultrapassar realçam a grande diferença entre os EUA e a Europa. Nos EUA atacou-se de uma vez o problema e recapitalizaram-se os bancos para que a economia e a confiança dos agentes económicos recuperassem. Passados oito anos, os principais bancos americanos (agora entre os mais sólidos no mundo) têm um rácio médio de capitais próprios em relação ao total dos activos de cerca de 10% enquanto que na banca europeia é de apenas 6%. Na Europa, políticos, reguladores e gestores continuam a braços com graves insuficiências de capital: em Portugal procura-se ainda uma solução para o Novo Banco, na Alemanha, o Deutsche Bank - com um balanço frágil - tem de suportar elevadas multas por ilegalidades cometidas - e em Itália, a banca está a ser recapitalizada, nalguns casos pelo Estado por não haver solução privada.
A elevada dependência que as economias europeias continentais têm da banca como fonte de financiamento enfraquece a sustentabilidade do modelo económico e limita o seu crescimento. Enquanto que nos EUA o peso dos activos dos bancos é de 65% do PIB, na zona Euro representa 260%. O sistema bancário europeu não tem alternativa: deve reforçar capitais, promover a concentração de activos com fusões e aquisições e reduzir o seu peso no financiamento das economias.
Então, por que razão estarão os investidores disponíveis para colocar mais dinheiro no Millennium BCP? Um investimento é uma operação que deve garantir a segurança do capital e obter um retorno satisfatório a prazo. A segurança consegue-se investindo em empresas com negócios excepcionais e com histórico de criação de valor para os accionistas, geridas por gestores capazes e honestos e compradas quando o preço que pagamos está a desconto face ao valor intrínseco subjacente. Quando as variáveis são tantas e tão difíceis de prever e não se consegue aferir quanto vale, como é o caso deste aumento de capital do BCP, a decisão de investimento é, por definição, especulativa.
O Investimento em Valor é investir em bons ativos, que produzem rendimentos, comprados a desconto do seu valor justo. Ou seja, devemos comprar quando está barato, quando nos vendem 1 euro por 60 cêntimos. É simples, mas está longe de ser fácil.
O gráfico que pode encontrar no PDF ao lado, apresenta as rentabilidades de várias classes de ativos desde 1926 até 2010. Ao longo destes 84 anos, a taxa média de inflação foi de 3%, ou seja, um dólar em 1926, atualizado para 2010, valeria 12 dólares. Um dólar investido em Obrigações do Tesouro americano de curto prazo (T-Bills) teria obtido um rendimento médio anual de 3,6%, o que até 2010 resultaria em 21 dólares. Se tivesse optado por investir em Obrigações do Tesouro Americano de Longo Prazo, teria uma rentabilidade média anual no mesmo período de 5,5%, ou seja, 93 dólares. Finalmente, se tivesse investido em ações de grande capitalização teria uma rentabilidade anual de 9,9%, o que, em valores absolutos resultaria em 2.982 dólares, 32 vezes mais que o investimento em Obrigações do Tesouro Americano de Longo Prazo.
Durante este período viveram-se tempos de grande incerteza: a Grande Depressão, a Segunda Guerra Mundial, várias recessões, os choques petrolíferos de 1973 e 1979, a bolha tecnológica e a crise financeira do subprime, da qual ainda estamos a recuperar. No entanto, as ações foram a classe de ativos que melhores retornos proporcionaram aos investidores.
Warren Buffett escreveu um artigo, em 1984, intitulado "Os Super Investidores de Graham e Doddsville". Nesse artigo, Buffett elenca alguns investidores que, ao longo de vários anos conseguiram retornos muito acima do mercado. Walter Schloss ganhou, durante 20 anos, 21,3% ao ano; Tom Knapp, da Tweedy Browne, conseguiu retornos de 20% ao ano; Bill Ruane, da Sequoia Funds, conseguiu 17,2% anuais; Charlie Munger, sócio de Warren Buffett, ganhou, num período de 13 anos, 19,8%/ano. Todos estes investidores têm um patriarca intelectual em comum, Benjamin Graham.
No rescaldo da Grande Depressão, Benjamim Graham e David Dodd testemunharam o melhor e o pior nos mercados financeiros: do pico de 1929, até ao crash em Outubro do mesmo ano e a implacável Grande Depressão. Em 1934, desta sua experiência no mercado financeiro e do vasto conhecimento da teoria financeira, os dois professores da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, construíram um modelo com o qual os investidores podiam filtrar centenas ou até milhares de ações e obrigações e identificar aquelas em que valia a pena investir. Esta filosofia de investimento é conhecida como o Investimento em Valor e Warren Buffett o seu mais famoso praticante.
O investidor em Valor é avesso ao risco e a decisão de investir é um processo de avaliação profundo dos dados fundamentais das empresas, dos negócios que lhe estão subjacentes e da sua capacidade de gerar um rendimento crescente no futuro. A partir dos balanços e demonstrações financeiras da empresa, avaliam-se a qualidade do negócio, as margens operacionais, a evolução dos lucros, a rentabilidade dos capitais investidos, os níveis de endividamento, as vantagens competitivas dentro do sector e a capacidade de remunerar o acionista.
Uma vez que nem todos os elementos que afetam o valor da empresa são revelados pelo escrutínio dos documentos contabilísticos, a experiência, a capacidade de julgamento e o ceticismo são fundamentais para estimar o real valor da empresa. Quando estimado, devemos confrontar esse valor com o preço a que está a cotar no mercado. Preço é o que se paga, valor é o que se recebe e da diferença entre o preço a que estamos a comprar e o valor intrínseco do ativo, obtemos a Margem de Segurança, a "almofada" necessária para proteger os valores investidos. Horizonte de investimento adequado, disciplina e paciência para esperar pelo preço certo de compra são essenciais para que o método tenha sucesso. Quando a cotação no mercado refletir o valor da empresa, é altura de vender.
É fundamental, para preservamos o poder de compra do dinheiro no futuro, investir em ativos que produzam rendimento e comprá-los quando estão baratos. O grande problema para o maioria dos investidores - para além de não terem a capacidade técnica para fazer uma análise profunda da empresa e da sua capacidade de produzir riqueza para os acionistas - é o seu comportamento de imitar o que outros estão a fazer. Compram quando toda a gente compra (quando os ativos ficam caros) e não aproveitam para comprar quando as ações caem para preços que permitem excelentes margens de segurança.
Em Agosto passado, na Casa de Investimentos, aproveitando a reação negativa do mercado ao downgrade da dívida americana - uma queda de cerca de 20% em duas semanas - investimos nalgumas empresas excecionais que, sem qualquer justificação fundamental, ficaram baratas. Na altura, escrevi um artigo de opinião no Jornal i, "Ignore a Multidão", em que justificava porque deveríamos investir em excelentes empresas americanas. Só com más notícias é que conseguimos comprar ações de grandes empresas tão a desconto do seu valor intrínseco.
Do mesmo modo que quando vamos comprar mercearias aproveitamos os descontos nos produtos que precisamos, devemos na Bolsa tirar partido de grandes descontos. Nesta altura, há excelentes descontos em ações. A prazo, a Bolsa recupera sempre.
Parafraseando John Maynard Keynes, quando todos concordarem com os méritos do investimento em ações, já o mercado terá subido substancialmente.
Na semana passada, o Banco Espírito Santo surpreendeu o mercado com o anúncio de um aumento de capital de 1.010 milhões de euros. O BES pretende emitir 2.556,7 milhões de novas ações ao preço de subscrição de 0,395 o que, face à cotação de fecho do dia do anúncio, representa um desconto de 66%.
Os testes de stress realizados pela Autoridade Bancária Europeia (ABE), atualizados em Dezembro passado na sequência da avaliação da TROIKA aos ativos dos bancos, indicavam a necessidade de 810 milhões de euros. Na altura, o BES chamou a atenção para o facto de já depois de 30 de Setembro (data até à qual decorreram os testes de stress) ter reforçado o capital em 622 milhões de euros, resultantes da troca de valores mobiliários. Portanto, feitas as contas, o BES precisaria apenas de um reforço do capital social de 188 milhões de euros.
O Banco Espírito Santo sempre defendeu que as suas necessidades de capital eram reduzidas, pondo sempre de parte qualquer recurso aos dinheiros públicos, que implicassem a presença do Estado na estrutura acionista.
O banco defende que, com este aumento de capital, assegura o reforço dos rácios de capital para cumprimento das exigências da ABE e do Banco de Portugal.
Este aumento de capital, na nossa opinião, não é a melhor maneira de proteger os atuais acionistas do banco, que sofrerão uma enorme diluição de capital. Vejamos:
1. O valor contabilístico do BES era, antes do aumento de capital de 3,69 euros por ação. No dia 11 de Abril, data do anúncio do aumento de capital, a cotação de fecho do BES foi de 1,167 euros, 32% do valor contabilístico. Com o aumento de capital a 0,395 euros, o desconto relativamente à cotação de fecho é de 66%. No entanto, relativamente ao valor contabilístico, representa um desconto de 89,3%. Este foi, porventura, o desconto que tiveram que conceder ao sindicato bancário e ao núcleo duro de acionistas para que um aumento de capital desta dimensão se concretizasse.
Atendendo que as necessidades de capital do banco não eram tão elevadas, não encontramos justificação para que se faça um aumento de capital tão grande com um desconto tão penalizador.
2. No mesmo dia, o BES anuncia que parte deste aumento de capital - 225 milhões de euros - será usado para comprar a participação de 50% do Credit Agricole na BES Vida. Entendemos que o preço que o BES está disposto a pagar é extremamente elevado: a posição está a ser comprada a 3,97 vezes o valor contabilístico da seguradora, que em 2011 apresentou um prejuízo de 107 milhões de euros. Nesta altura, a seguradora francesa AXA transaciona no mercado a 60% do valor contabilístico e o sector, a nível mundial, transaciona a 88% do valor contabilístico; muito abaixo dos múltiplos deste negócio do BES com o Credit Agricole.
Não se compreende, portanto, porque se concede um desconto tão grande nas ações do banco neste aumento de capital e se gasta parte desse aumento de capital para comprar um ativo tão caro.
Resta-nos dizer que o valor de 225 milhões a pagar pela BES Vida é praticamente o mesmo valor que o Credit Agricole, segundo maior acionista do BES, precisa para ir a este aumento de capital. Não será este um preço demasiado alto para manter os franceses na estrutura acionista?
3. O BES dispõe de activos financeiros líquidos que poderia vender nomeadamente, a posição de 10,45% na Portugal Telecom, que valia 462,68 milhões e a posição de 2,12% na EDP e que valia 213,89 milhões, isto a preços de mercado no mesmo dia do anúncio do aumento de capital. Estas vendas só por si permitiriam um reforço muito significativo dos seus rácios de capital.
4. Poderia ainda, em último caso, recorrer à linha de recapitalização do Estado. Os títulos de capital contingente que irão ser disponibilizados não deverão causar um efeito de diluição tão grande como este aumento de capital.
No auge da crise de subprime nos Estados Unidos, o Governo americano forçou todos os bancos a aceitar dinheiros públicos para que as instituições que realmente precisavam de ajuda não fosse estigmatizadas pelo mercado. Na altura, a JPMorgan, o Wells Fargo e o US Bank Corp eram claramente três dos bancos que dispensavam a ajuda do governo. Foram, no entanto, obrigados a recebê-la.
Estes capitais do Governo americano foram concedidos sob a forma de ações preferenciais, a ligeiros descontos dos preços de mercado . O Estado americano impôs aos bancos a redução drástica no pagamento de dividendos, na maior parte dos casos para 1 cêntimo, e limitações salariais e bónus aos gestores. Foi sem dúvida esta a razão pela qual os gestores destes grandes bancos quiseram pagar estas ajudas o mais depressa possível.
O Governo americano quis, com esta medida, garantir que a banca tinha condições mais robustas para assumir perdas de crédito mal parado. Pretendeu também garantir que o dinheiro entregue aos bancos entrasse na economia real e que o mercado de crédito voltasse a funcionar rapidamente.
Sobre esta intervenção do Estado americano, Warren Buffett escreveu, em 16 de Novembro de 2010, uma carta aberta ao New York Times com o título "Pretty Good For Government Work".
Esperemos que o Estado português faça também um bom trabalho. A qualquer economia é indispensável o bom e normal funcionamento do sistema financeiro. Ao BES, não valeria a pena aguardar pela definição deste processo com o Estado?
Esta operação vai provocar uma enorme diluição sobre as ações do banco, reduzindo o valor contabilístico por ação em 57%. Devido ao tão elevado número de ações novas, as estimativas de lucros normalizados por ação, para os próximos anos, caem 62%. Este aumento de capital vai limitar o potencial de crescimento futuro do BES e reduzir o valor justo do negócio. Vai obrigar os atuais acionistas a investir mais dinheiro para evitar uma maior diluição.
Considerando que os gestores são também acionistas relevantes do banco e com a informação até à data disponível ao público, um aumento de capital desta magnitude não é compreensível.
Os investidores esperam de Trump um corte nos impostos para as famílias e empresas, um perdão fiscal parcial na repatriação de 1,3 triliões de dólares que as empresas americanas têm fora dos EUA, uma desregulação da economia, um programa de construção de infraestruturas sem precedentes e a consequente criação de emprego (apesar de os EUA estarem já em situação de pleno emprego). Sim, isto é bom para a economia.
Trump promete também a construção do "Muro". Anuncia, numa retórica nacionalista/populista, o fim de acordos e alianças comerciais, politicas e militares. Num estilo errático e com tácticas de negociação entre a fanfarronice e o autoritarismo, anuncia medidas de governação, ameaça sectores e empresas e, sobretudo, demonstra inconsistência, falta de liderança e de bom senso na tomada de decisões cujos efeitos se estendem a todo o mundo. Sim, a incerteza e os riscos são maiores.
A economia poderá crescer com a presidência de Trump mas também as taxas de juro e a inflação. O trabalho do investidor é avaliar o impacto destas políticas no valor de negócios específicos e diferentes classes de activos.
Hoje, o mundo está inundado em dívida com custo quase zero. Em meados de Agosto de 2016, 13,4 triliões de dólares de dívida no mundo inteiro (maioritariamente soberana) transaccionavam a taxas de juro negativas, circunstâncias inéditas nas quais os obrigacionistas se obrigam a si próprios, de livre vontade, a pagar juros aos emitentes das obrigações pelo privilégio de prender o seu dinheiro por largos períodos de tempo enquanto que continuam a correr o risco de incumprimento. No final do ano, os investidores ignoraram todos os problemas da economia italiana e compraram dívida a 50 anos com um yield de 2,8%. A Áustria fez uma emissão de obrigações a 70 anos com um cupão de 1,5% que foi totalmente subscrito por investidores que ignoram o valor temporal do dinheiro e o "prendem" a um retorno medíocre para o resto da vida.
É muito mais fácil avaliar correctamente o valor de activos ou títulos específicos do que fazer previsões macroeconómicas.
O mundo está cada vez mais interligado e complexo: ameaças tecnológicas, a disrupção industrial, a crescente desigualdade económica, as pressões da globalização e agendas e interesses nacionais aparentemente irreconciliáveis. Os investidores devem preparar-se para a incerteza e a volatilidade.
Contudo, risco e incerteza (volatilidade), são coisas muito diferentes. O risco é a probabilidade de perda permanente de capital e a incerteza é a variação no preço (não no valor). A incerteza equivale a risco apenas quando o horizonte de investimento não é suficientemente longo para esperar que o mercado reconheça o valor justo do activo. Por isso, a volatilidade é oportunidade para o investidor em valor.
Hoje, mais do que nunca, é essencial seguir uma estratégia consistente a médio e longo prazo de preservação de valor. É muito mais fácil avaliar correctamente o valor de activos ou títulos específicos do que fazer previsões macroeconómicas.
"O futuro nunca é claro e paga-se um preço muito elevado por um consenso alargado. Aliás, a incerteza é amiga do investidor de longo prazo", Warren Buffett
A cautela não deve ser sazonal. A cautela não deve ser redescoberta quando os mercados estão negativos e esquecida quando sobem. A manutenção de um estado mental estável, nos bons e nos maus períodos, é fundamental para o sucesso do investimento a médio e longo prazo.
A prática de grande parte dos investidores, profissionais ou não, é muito diferente. A maioria das pessoas procura gratificação imediata em quase tudo o que fazem, incluindo o investimento. Acreditam que o caminho mais rápido para retornos mais altos passa por negócios de curto prazo que tentam adivinhar os movimentos do dia, da semana ou do mês seguinte. Esta prática nada tem de investimento, é especulação.
Num artigo do Económico de 27 de julho passado com o título "Como preparar a sua carteira antes de ir de férias" são sugeridas aos leitores um conjunto muito variado de estratégias que partem do argumento de nos anos anteriores os mercados terem caído em agosto.
De tantas estratégias que existem de curto prazo, nunca conseguimos encontrar uma que funcionasse de forma consistente. Todo o tipo de profetas vieram e partiram ao longo dos anos. Por um curto período de tempo qualquer um deles pode estar certo e fazer uma ou duas previsões acertadas.
Vários estudos comprovam que a maioria destes investidores que tentam estar no mercado pelo timing, compram caro e vendem barato.
Peter Lynch, o lendário gestor do Fidelity Magellan Fund, declarou certa vez que, segundo os seus cálculos, metade dos investidores no seu fundo perdia dinheiro. Isto acontecia porque o dinheiro entrava no fundo após um par de bons trimestres e saía passado um par de trimestres não tão bons. Lynch ganhou 29% ao ano ao longo de 13 anos, o que, para um investimento inicial de 10.000 USD resultaria passado 13 anos um valor acumulado de cerca de 274.000 USD
William Sharpe, vencedor de um prémio Nobel, descobriu que um "market timer" tem que estar certo 82% do tempo para igualar os retornos da estratégia de comprar e manter.
Sanford Bernstein & Company, num estudo que realizou entre 1926 e 1993, os retornos nos melhores 60 meses, 7% do período total, foram em média de 11%. Nos restantes 93% do período total, os retornos foram de 1/100 de um por cento. Parece pois uma tarefa hercúlea conseguir prever com confiança os 7% do período em que as ações dão bons retornos.
É simplesmente melhor estar investido no mercado nas ações de valor que nos oferecem o maior potencial de retorno, do que entrar no jogo de adivinhar o mercado. Entre 80 a 90% do retorno do investimento em ações ocorre em 2 a 7% do tempo.
American Century Investments estudou o período entre 1990 e 2005, (desde a subida fabulosa ao longo dos anos 90, até à queda brutal da bolha tecnológica de 2000 a 2002 ) demonstrou que 10.000 USD teriam crescido até 51.354USD. Contudo, se nesse perído os investidores tivessem perdido os 10 melhores dias desses 15 anos, o seu retorno caíria para 31.994USD. Se tivesse falhado os 30 melhores dias, ou seja, 1 mês em 180, teria conseguido 15730USD. Se tivesse perdido os 50 melhores dias perderia dinheiro e os 10.000 USD valeriam apenas 9.030USD.
Entre 1985 e 2005 a taxa de retorno composta anual do índice Standard & Poors foi de 11,9%. Durante estes 20 anos, 10.000 USD investidos num fundo que replicasse este índice, teria resultado em 94.555 USD. Contudo, um estudo recente mostrou que o investidor médio apenas conseguiu uma rentabilidade composta de 3,9%, ou seja, com os mesmos 10.000USD o resultado foi de 21.422 USD. O estudo concluiu ainda que a maioria dos investidores "foge" durante os períodos de declínio dos mercados, receando que as quedas continuem indefinidamente. Assim que o mercado recupera, começam a regressar. Entretanto, perderam a maior parte da recuperação.
A realidade é que tentar adivinhar quando entrar e sair do mercado é quase impossível. Não devemos prever tentando acertar no timing. Devemos, isso sim, prevenirmo-nos, ou seja, estar no mercado pelo preço: comprar excelentes activos quando estão baratos. Devemos avaliar o que estamos a comprar, comprar apenas quando está barato e manter. Depois, temos que aceitar as flutuações de mercado e suportar alguns temporários recuos. Se o nosso portfólio de investimentos for bem construído, um pouco de turbulência no mercado não é motivo para fugir.
Usando os princípios do investimento em valor, dá-nos a segurança de saber que as ações que temos em carteira têm características que as fazem vencedoras no longo prazo.
Um portfólio de ações de empresas com negócios excecionais, comprados a preços sensatos, é um activo de longo prazo tal como um imóvel e deve ser tratado da mesma forma.
Venderia a sua casa ou a quinta antes de ir de férias para a voltar a comprar no regresso?
Claro que não.
Capitalismo, segundo o Dicionário Webster, é "um sistema económico baseado na propriedade de bens de capital, com o investimento determinado por decisão privada e com preços, produção e a distribuição de bens e serviços determinados principalmente num mercado livre".
Durante os séc. XVIII e XIX, à medida que o mundo se afastava das suas raízes agrárias em direção a uma sociedade industrial, o capitalismo começou a florescer. Tornaram-se indispensáveis grandes acumulações de capital para a construção de fábricas, para o desenvolvimento de sistemas de transporte e para o financiamento dos bancos, de quem a nova economia iria depender.
Segundo um artigo de James Surowiecki na Revista Forbes, os Quakers estiveram na origem deste desenvolvimento. No séc. XVIII e início do séc. XIX, os Quakers dominavam a economia britânica, provavelmente porque a sua simplicidade e frugalidade lendárias lhes permitiram arrecadar o capital para investir. Eram proprietários de mais de metade das empresas metalúrgicas do país e desempenhavam papéis chave na banca e no comércio transatlântico. A sua ênfase na fiabilidade, honestidade absoluta e registos rigorosos criavam confiança nos negócios entre si e os restantes mercadores observavam que a confiança caminhava de mãos dadas com o sucesso nos negócios. O interesse próprio exigia a virtude.
Esta coincidência de virtude e valor é exatamente aquilo que o grande economista e filósofo escocês, Adam Smith, esperava. Em "A Riqueza das Nações", de 1776, escreveu, "o esforço ininterrupto e uniforme para melhorar a sua condição, o princípio do qual derivam a opulência pública e privada é suficientemente poderoso para manter o progresso natural das coisas para a sua melhoria...Cada indivíduo não pretende promover o interesse público nem sabe o quão o está a promover... (mas) ao orientar a sua indústria de forma a que o seu produto seja o mais valioso possível, ele é guiado por uma mão invisível que promove um objetivo que não faz parte das suas intenções".
Assim, continua o artigo da Forbes, a evolução do capitalismo foi na direção de uma maior confiança e transparência e um comportamento menos egoísta; não é coincidência que esta evolução trouxe consigo uma maior produtividade e crescimento económico...Não porque os capitalistas são boas pessoas, mas porque os benefícios da confiança são potencialmente imensos e porque um sistema de mercado de sucesso ensina as pessoas a reconhecer esses benefícios...um ciclo virtuoso em que cada nível de confiança gera um novo nível de confiança".
Este era o capitalismo dos proprietários, cujo objetivo era servir os interesses dos donos e acionistas das empresas maximizando os retornos dos capitais investidos.
Capitalismo sem Donos
Infelizmente, nos últimos anos, desenvolveu-se um novo sistema: o capitalismo dos gestores. As grandes empresas são geridas para beneficiar os seus gestores, em cumplicidade com contabilistas, auditores e gestores de outras empresas. Como é que isto aconteceu?
A grande dispersão do capital das grandes multinacionais em bolsa, sobretudo a partir de 1950, faz com que não haja "um dono" responsável. Milhões de investidores deram lugar a investidores institucionais criados e controlados pelas grandes instituições financeiras. Os investidores - grandes institucionais ou particulares - não assacam responsabilidades aos gestores. Os grandes institucionais, que detêm grande parte das ações - e na maioria dos casos são detidos por grandes bancos - gerem os fundos de pensões destas grandes multinacionais e são contratados para as operações de banca de investimento, que proporcionam comissões extraordinárias. Ora, não têm "liberdade" para questionar as remunerações de gestores, as políticas de aquisições ou a falta estratégia de criação de riqueza para os acionistas a longo prazo. Os pequenos investidores são estimulados a olhar para o curto prazo e as ações são papel para trocar de mãos todos os dias, permitindo elevadas comissões de transação. Os auditores, que deveriam vigiar a atividade dos gestores para minorar conflitos de interesses, são, eles próprios, contratados por aqueles que terão que avaliar. Ao mesmo tempo criou-se um sério conflito de interesses: as empresas que gerem os fundos de biliões são as mesmas que prestam os serviços de banca de investimento a estas grandes multinacionais.
Assistimos, por isso, a uma enorme transferência de riqueza dos acionistas para os gestores de grandes multinacionais que pagam a si próprios bónus extravagantes. Os investidores "profissionais" alteraram o seu foco de investimento de longo prazo para a especulação de curto prazo e comissionamento. Entre 1997 e 2002, o total de comissões pago pelos investidores norte americanos aos bancos, corretoras e fundos de investimentos excedeu os 1,275 triliões de dólares. Parafraseando Churchil, nunca tanto foi pago por tantos a tão poucos por tão pouco.
O nosso sistema de capitalismo de mercado sofreu um falhanço profundo, com uma variedade de causas, cada uma interagindo com e reforçando as outras: a ascensão do CEO imperial; os truques da engenharia financeira no reporte de resultados; o falhanço dos nossos guardiões - auditores, reguladores, gestores de investimentos e conselhos de administração - que se esqueceram a quem deviam lealdade; as instituições financeiras que passaram a ser traders de ações ao invés de se comportarem como donos de ações; a hipérbole promocional de Wall Street; a vontade dos analistas em pôr de lado o seu ceticismo; a excitação frenética dos media; e, obviamente, os membros do público investidor que festejam sempre o lucro fácil. Quando deveríamos estar a ensinar os nossos jovens universitários sobre o investimento a longo prazo e a magia do juro composto, os jogos da bolsa que são organizados pelas universidades e corretoras estão, na realidade, a ensiná-los a especular e a reforçar uma mentalidade de curto prazo. Foi esta conspiração entre todas as partes interessadas, que baixou os padrões do negócio.
Há meses, um artigo da Bloomberg noticiava que por todo o mundo Family Offices retiravam o dinheiro dos bancos para criarem as suas estruturas de gestão. Nesse artigo, gestores de várias famílias nos quatro cantos do mundo manifestavam a sua insatisfação com os grandes bancos e gestores de dinheiro, alegando que deixaram de atuar como guardiões de capital, para passarem a meros vendedores e comissionistas.
Em Março passado, a Deco denunciou que maus depósitos custaram 1,5 mil milhões aos portugueses. A semana passada, depois de uma análise aos depósitos indexados e duais vem novamente dizer que "a taxa atrativa do depósito serve como isco para atrair investidores" com exemplos de produtos de várias instituições financeiras.
Londres arrisca-se a perder o estatuto de maior centro financeiro do mundo. Depois da JPMorgan anunciar uma perda de trading de mais de $2 biliões e da alegada fraude de $2,3 biliões da UBS, 12 bancos vêm-se envolvidos na investigação sobre a manipulação das Libor (taxas de juro globais, num mercado que representa cerca de 360 triliões de dólares) e que motivou já a demissão de vários quadros de topo do Barclays.
Este é o capitalismo dos gestores e não o dos donos, como deveria ser.
A Alma do Capitalismo
O capitalismo requer uma estrutura e um sistema de valores em que as pessoas acreditem e dependam. Não precisamos de ter fé na boa vontade humana, mas precisamos de ter confiança que as promessas e compromissos, uma vez assumidos, serão cumpridos. Também necessitamos de garantias que o sistema, no seu todo, não beneficia indevidamente alguns à custa de outros. É importante o regresso do capitalismo dos donos.
É essencial ser de confiança.
A diferença-chave entre investidores e especuladores é que o horizonte destes últimos é o dia, a semana, o mês. Já o investidor pensa como um empresário.
A beleza do Investimento em Valor reside na sua simplicidade lógica. É baseado em dois princípios: quanto vale - valor intrínseco do activo - e não perca dinheiro - obtenha a margem de segurança, um preço tão bom na compra que, uma venda ao valor justo produza um bom retorno.
O investidor deve ainda estar preparado, psicológica e financeiramente, para as flutuações do preço do activo no mercado. Isto acontece em qualquer classe de activos: acções, obrigações, imóveis, arte, etc. No caso das acções e obrigações, porque transaccionam em mercados organizados e onde há grande liquidez , cotam muitos preços ao longo de uma sessão. No caso de imóveis ou arte, mercados com pouca liquidez, o preço será sempre obtido sob consulta do possível comprador. Neste último caso, e porque não há um mercado organizado a cotar os activos, os seus detentores não têm a percepção de perda de valor. Preferem acreditar que o preço actual é igual ao preço obtido numa conjuntura mais favorável. Contudo, se tiverem necessidade de vender de imediato, as variações podem ser maiores do que no mercado de acções ou obrigações.
É pois fundamental, para além das considerações acima, conhecer o horizonte de investimento que cada investidor tem para aplicar as suas poupanças. A prudência aconselha que os valores, necessários para fazer face às necessidades do agregado familiar durante um ou dois anos, sejam aplicados, por exemplo, num depósito a prazo a 6 meses com flexibilidade de renovação e consulta de taxas periódicas. No entanto, uma parte significativa do património deve ser investido em activos cujo retorno a médio e longo prazo seja significativamente acima da inflação, garantindo o poder de compra no futuro e a preservação do nível de vida.
Para o investidor inteligente, a poupança e o seu investimento devem obedecer a uma atitude planeada e consistente. Desenvolver um horizonte de investimento de médio e longo prazo é um hábito que necessita de constante reforço. A volatilidade dos mercados financeiros e as opiniões diárias, muitas vezes contraditórias, de comentadores e analistas acabam por influenciar negativamente o horizonte de investimento de quem investe e deseja ver o seu património protegido e rentabilizado.
"No curto prazo, os mercados funcionam com uma máquina de contagem de votos mas, no longo prazo, comportam-se como uma balança"
-- Benjamin Graham
No curto prazo, os mercados são influenciados por muitos factores pontuais tais como: resultados trimestrais das empresas, dados macroeconómicos ou acontecimentos políticos que causam grandes variações nos preços das acções que, muitas vezes, não se justificam. É normal que os mercados reajam exageradamente aos factores acima descritos. Cabe ao Investidor em Valor ponderar, com base na sua análise, se essas variações são justificadas.
A prazo, os mercados acabarão por reflectir o verdadeiro valor das empresas nas cotações das acções em que investe.
A diferença chave entre investidores e especuladores é precisamente o horizonte de investimento. O especulador quer o seu lucro o mais depressa possível. O seu horizonte de investimento é o dia, a semana ou o mês. O investidor em valor pensa como um empresário, entende que o seu esforço não dá frutos de um dia para o outro.
Actualmente, o investidor inteligente, com um horizonte de investimento de 3 a 5 anos, pode comprar imenso valor por um preço muito baixo. As acções que hoje estão subavaliadas não têm, no entanto, uma data exacta em que atingirão o seu valor justo. Às vezes este processo é muito rápido, outras vezes demora anos.
Nas últimas semanas, os mercados financeiros mundiais sofreram correcções significativas motivadas pelos receios de alastramento da crise de dívida soberana europeia e pelas demoradas negociações sobre o alargamento do tecto da dívida americana. A agência S&P veio, dias depois, cortar o rating americano de AAA para AA+, justificando esta medida com a dificuldade dos políticos americanos se entenderem em matéria fiscal. Surgiram também receios de abrandamento económico mundial.
Apesar disto, a economia americana continua a indicar crescimento económico e criação de emprego. No último trimestre, 75% das empresas americanas apresentaram resultados que superaram as expectativas. Em muitos casos, os resultados foram os melhores de sempre. Não menos importante, é o facto das empresas americanas terem enormes reservas de dinheiro e pouca dívida nos seus balanços, o que lhes permite reforçar os seus investimentos, nomeadamente através de fusões e aquisições. Na sequência desta desvalorização das acções, as empresas estão a aproveitar também para recomprar acções próprias e os seus gestores a investir nas acções das empresas que administram.
Demasiadas pessoas investem no mercado accionista com o objectivo de ganhar dinheiro rápido. Esta orientação envolve especulação e não investimento. As acções das empresas são vistas como papel para ser comprado e vendido repetidamente recorrendo aos mais variados instrumentos financeiros, muitos deles alavancados. Este tipo de actuação não se baseia em qualquer racional económico, mas antes procura adivinhar a tendência dos mercados. Este é o maior erro de muitos investidores.
Ou seja, o mercado financeiro está cheio de indivíduos que sabem o preço de tudo e o valor de nada.
Investir em acções deve ser entendido como o investimento racional em negócios que devem ser cuidadosamente avaliados e acompanhados. Investir é comprar bons activos (sejam eles acções, imóveis, terra..) a preços substancialmente inferiores ao que realmente valem, ou seja, a desconto do seu valor intrínseco.
Este método de investimento é conhecido como Investimento em Valor, e o seu mais conceituado praticante é Warren Buffett, um dos mais bem sucedidos investidores de todos os tempos, que ao longo dos últimos 45 anos, obteve retornos de 20,2% ao ano. Recentemente entrevistado na CNBC, afirmou que tem estado a comprar acções porque gosta de comprar em saldos.
Para Warren Buffett, "as previsões políticas e económicas de curto prazo são uma distracção muito cara para investidores. A prazo, as notícias sobre os mercados financeiros serão positivas. Durante o século XX, os Estados Unidos passaram por duas Guerras Mundiais e outros conflitos militares dispendiosos, uma grande depressão, uma dúzia de recessões e pânicos financeiros, choques petrolíferos, etc... No entanto, o Dow Jones subiu dos 66 para os 11497 pontos."
Num mercado caracterizado pela excessiva volatilidade, é fácil, ao investidor comum, perder a calma e cometer erros dispendiosos. A postura correcta de investimento passa por o investidor concentrar-se no valor das empresas que tem em carteira, seguro que a prazo obterá bons retornos.
Comprar boas empresas mundiais, com posições competitivas fortes, com balanços com pouca dívida, geridos por gente capaz e honesta, quando estão baratas, é a melhor forma de preservar e valorizar o património a médio e longo prazo.
Os investidores adoptam as mais variadas estratégias que oferecem poucas ou nenhumas perspectivas reais de sucesso a longo prazo e uma grande probabilidade de perdas financeiras substanciais. Essas estratégias não são métodos coerentes de investimento mas antes se assemelham a especulação ou jogo.
"Confrontado com o desafio de divulgar o segredo do investimento seguro em três palavras, arrisco o lema: Margem de Segurança."
-- Benjamin Graham
A Margem de Segurança deve ser central em qualquer processo de investimento conservador. No caso do investimento em acções, o investidor avesso ao risco deve reconhecer que quanto maior for a diferença entre o valor - o que realmente valem os negócios por detrás das acções - e o preço a que estão a cotar - o que temos que pagar para ser donos desses negócios - maior é a margem de segurança com que aplica o seu dinheiro. Daqui resulta uma melhor taxa de retorno para o seu investimento.
O investidor inteligente não deve depender do mercado para fazer uma venda excepcional; deve comprar a preços tão atractivos que, uma venda ao valor justo, produz bons resultados.
Sendo a Margem de Segurança o factor de maior importância em qualquer investimento seguro, que tenha por trás um racional económico sólido, deveria ser este o posicionamento de todos os investidores. Contudo, a esmagadora maioria investe ou já investiu em acções, tendo como critério o timing do mercado. Isto implica tentar antecipar ou prever como o mercado se irá comportar no curto prazo - comprando ou mantendo acções quando as notícias são positivas e a tendência de mercado é de subida - vendendo ou abstendo-se de investir quando as notícias são más, a conjuntura económica é negativa e o sentido do mercado é de desvalorização. Se o investidor, nas suas decisões, colocar a ênfase no timing, no sentido de prever a evolução dos mercados, acabará por obter resultados especulativos e rentabilidades medíocres.
A questão do timing é de grande importância para o especulador porque pretende obter o seu lucro o mais depressa possível. É-lhe incompreensível aguardar um ano para que a sua carteira de acções se valorize.
No entanto, o investidor que segue um método de investimento centrado na diferença entre o preço e o valor - na margem de segurança confortável - tem a paciência para esperar um ano ou dois para que os seus investimentos floresçam. Durante este período, em que não está à espera de um qualquer sinal técnico para comprar ou vender, o Investidor em Valor é compensado recebendo a parte a que tem direito dos lucros que a empresa gera na sua actividade, sob a forma de dividendos.
Segundo a Teoria dos Mercados Eficientes, um activo é tanto mais arriscado quanto maior for a sua volatilidade ou variações de preço, isto é, quanto maior a queda de uma acção, mais arriscado é investir. Nada de mais errado. A noção de risco no Investimento em Valor não tem a ver com volatilidade mas sim com a amplitude da margem de segurança, a diferença entre o valor e o preço. Se uma acção cai muito mas o valor do negócio subjacente pouco se altera, essa acção não fica mais arriscada porque a volatilidade do seu preço aumenta, antes pelo contrário. O capital necessário para comprar o mesmo número de acções é menor.
Quanto maior for a margem de segurança, menor é o risco do investimento.
Um investimento é uma operação que, após avaliação cuidada, promete a segurança do capital investido e um retorno satisfatório. Todas as operações que não cumpram estes requisitos são especulativas.
O Investimento em Valor é uma filosofia de investimento introduzida nos anos 30 por Benjamin Graham e David Dodd, professores na Universidade de Columbia nos Estados Unidos, e consolidada no histórico livro "Security Analysis" . Segundo os autores, um investimento é uma operação que, após avaliação cuidada, promete a segurança do capital investido e um retorno satisfatório. Todas as operações que não cumpram estes requisitos são especulativas.
O Investimento em Valor pressupõe que investir em acções seja encarado como um investimento racional em negócios que devem ser analisados, entendidos, avaliados e acompanhados. Determinado o valor do negócio, é necessário compará-lo com o preço a que está a cotar no mercado. Só devemos investir em acções, se o preço a que estão a cotar for substancialmente inferior ao seu valor justo, ou seja, com uma margem de segurança confortável que permita proteger os valores investidos e potenciar, a prazo, uma taxa de retorno razoável.
Esta filosofia de investimento é intuitiva, tem subjacente um racional económico forte e uma sabedoria intemporal. Contudo, é difícil de seguir na prática. Primeiro, porque a maioria dos investidores não tem capacidade técnica para levar a cabo uma análise detalhada dos balanços e demonstrações financeiras das empresas e da sua capacidade de criar riqueza para os accionistas, para analisar e determinar das respectivas vantagens competitivas desses negócios e aferir a competência e honestidade dos gestores que as administram. Segundo, porque grande parte dos investidores estão focados no curto prazo, não vêm as acções como uma fatia do negócio, não são disciplinados nem dispõe do temperamento adequado para ignorar a "multidão", que no curto prazo reage mais de forma emocional do que racional.
Para obter consistentemente bons resultados no mercado accionista, é importante ter um método de investimento sólido, ter disciplina e paciência. Quando o mercado sobe, toda a gente pode ganhar dinheiro e uma filosofia de investimento não parece necessária. No entanto, em situações adversas como a actual, os investidores sem preparação e orientados para o curto prazo, todos os dias mudam de opinião, não possuem disciplina nem mentalidade forte para resistir a opiniões contrárias e vão cometendo erros que prejudicam o seu património. Como não há forma de prever o que os mercados irão fazer no futuro próximo, é necessário seguir um método de investimento nos bons e nos maus momentos. Seguindo os princípios do investidor em valor, pode esperar bons resultados com riscos limitados. Este deve ser o objectivo de um investidor prudente e consciente.
Numa entrevista realizada há dias num canal de televisão norte americano, o Sr. Warren Buffett, investidor que popularizou esta filosofia de investimento, dizia que " só há uma altura em que devemos comprar acções, e essa altura é quando estão baratas". Justificou, desta forma, o programa de recompra de acções da Berkshire Hathaway, holding através da qual faz os seus investimentos.
Na análise diária de dados económicos das empresas encontramos muitas situações em que podemos obter um euro pagando apenas 50 ou 60 cêntimos. Actualmente, a diferença entre o valor - o que realmente valem os negócios por detrás das acções - e o preço a que estão a cotar - o que temos que pagar para ser donos desses negócios - permite-nos investir com grande margem de segurança.
A prazo, o mercado accionista tende a reflectir o verdadeiro valor dos negócios e proporcionará ao investidor retornos significativos.
O estudo concluiu que o que funcionou é muito simples: as acções baratas conseguem consistentemente melhores retornos que as acções caras.
Entre 1929 e 1934, Benjamim Graham e David Dodd testemunharam o melhor e o pior nos mercados financeiros. Da escalada até ao pico de 1929, até ao crash em Outubro do mesmo ano e a implacável Grande Depressão. Desta sua experiência no mercado financeiro e do vasto conhecimento da teoria financeira, os dois professores da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, construíram um modelo com o qual os investidores podiam filtrar centenas ou até milhares de acções ordinárias e preferenciais, e obrigações e identificar aqueles em que valia a pena investir. A abordagem que fizeram na altura à avaliação de activos é essencialmente a mesma que os investidores em valor utilizam actualmente.
Em 1992 Tweedy, Brown Company LLC, gestora muito conceituada que segue a filosofia de Investimento em Valor, publicou uma compilação de 44 estudos intitulada "O que funciona no investimento". O estudo concluiu que o que funcionou é muito simples: as acções baratas (medidas pelo seus rácios preço/valor contabilístico, preço/lucros e taxa de dividendo) conseguem consistentemente melhores retornos que as acções caras; e as acções cujo preço teve pior performance (em períodos de três e cinco anos) conseguiram melhores rentabilidades do que as acções cujos preços tiveram melhor performance nos mesmos períodos. Por outras palavras, o Investimento em Valor funciona. Poucos investidores que aderem aos seus princípios fundamentais abandonam esta abordagem.
Os investidores tendem a assumir que o mercado de amanhã será muito idêntico ao de hoje, e, na maior parte do tempo, têm razão. Contudo, de vez em quando a sabedoria convencional é posta em causa e o dia de hoje é muito diferente do de ontem. Em tempos tumultuosos como os que vivemos, poucos investidores são suficientemente disciplinados para manter padrões rigorosos de avaliação e aversão ao risco.
Às vezes, os mercados avaliam correctamente os activos, outras vezes não. No curto prazo os mercados podem ser muito ineficientes e apresentar grandes desvios entre o preço e o valor subjacente dos negócios. Desenvolvimentos inesperados, aumento da incerteza dos decisores políticos, fluxos de capitais potenciam a volatilidade nos mercados financeiros no curto prazo, com os preços a variar muito em ambos os sentidos.
É em tempos de grande incerteza e conjunturas tão negativas que a prática de um método de investimento conservador e seguro, baseado num racional económico forte - o Investimento em Valor - é particularmente fundamental.
O investidor em valor é avesso ao risco e portanto a decisão de investimento é um processo de avaliação profunda dos dados fundamentais das empresas e dos negócios que lhe estão subjacentes, da sua capacidade de gerar um rendimento crescente no futuro.
A partir dos balanços e demonstrações financeiras da empresa, a qualidade do negócio é avaliada, as suas margens operacionais, a evolução dos lucros da empresa, as rentabilidades dos capitais investidos, os níveis de endividamento, as suas vantagens competitivas dentro do sector e a sua capacidade de remunerar o accionista. Contudo, o Investimento em Valor não se resume apenas à análise das demonstrações financeiras.
Uma vez que nem todos os elementos que afectam o valor da empresa são captados através do escrutínio das demonstrações financeiras, a experiência e capacidade de julgamento são fundamentais para levar a cabo a determinação do real valor da empresa.
Grande parte dos "actores" diários no mercado financeiro tomam decisões por razões emocionais ignorando o racional económico da avaliação.
"A análise deve ser penetrante e não profética"
-- Benjamim Graham