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Autoria
Emília O. Vieira
Emília O. Vieira

Excertos da Carta a Clientes, enviada a 16 de março de 2023

Na sequência das notícias dos últimos dias, entendemos oportuno clarificar algumas questões que possam suscitar dúvidas ou preocupações sobre as notícias que têm dominado a atualidade nos mercados financeiros.

Silicon Valley Bank (SVB)

O que estamos a assistir é o resultado do impacto das subidas das taxas de juro no balanço do banco, provocado pelo investimento que este fez em obrigações do governo americano com maturidades longas. A subida das taxas de juro nos últimos meses provocou uma forte queda nas cotações destas obrigações e consequentemente, ao ser preciso vender estes ativos para satisfazer o levantamento de depósitos de que foi alvo nos últimos tempos, levou a que o banco tivesse que incorrer em perdas significativas. Neste caso, o banco negligenciou o risco da subida das taxas de juro e o seu impacto nesta carteira de investimentos própria. Por um lado, recebia depósitos que tipicamente podem ser levantados a qualquer momento e, por outro, estava a investir estes valores em obrigações de longo prazo para ter um rendimento um pouco melhor. Há que lembrar que nos últimos 14 anos, as taxas de curto prazo estiveram praticamente a zero e as de longo prazo, embora mais elevadas, estavam muito abaixo da média histórica.

O banco está muito ligado a start-ups tecnológicas, cuja média de depósitos era bastante elevada nos últimos anos em virtude de uma era dourada para estas empresas. Nos últimos meses, as empresas tecnológicas têm tido maiores dificuldades, o que as obrigou a levantar depósitos para fazerem face ao pagamento de salários e financiamento da sua atividade. O banco foi fazendo vendas para satisfazer estes levantamentos e assumindo perdas. O mercado começou a ter conhecimento das dificuldades do banco e, sendo estes clientes bem informados, provocaram uma corrida aos depósitos. Em apenas um dia, foram levantados 45 mil milhões de euros.

Convém dizer que nenhum banco é imune a uma “corrida aos depósitos” que provoque uma crise de liquidez. Neste caso, não foi só isso. A equipa de gestão do banco negligenciou o risco de subida de taxas, o que é muito grave. Esta é uma crise de solvência do banco pelas perdas que estes levantamentos provocaram e que levou à intervenção no domingo à noite da Reserva Federal americana. A Reserva Federal garantiu os depósitos na sua totalidade, tanto neste banco como no Signature Bank, ligado ao negócio das criptomoedas. Neste caso, os acionistas do SVB perderam tudo e os obrigacionistas do banco eventualmente perderão grande parte ou todo o investimento.

Credit Suisse

O banco suíço esteve envolvido em grande parte dos escândalos financeiros recentes, com perdas no Archegos Capital e nos fundos de investimentos associados à Greensill. Ao longo de 2022, a saúde financeira do grupo foi sendo colocada em dúvida, o que se traduziu em saídas de ativos líquidas de 123,2 mil milhões de CHF (francos suíços).

Terça-feira, dia 14 de março, apresentaram o Relatório & Contas mostrando um prejuízo de 7 mil milhões de CHF (cerca de 5,7 mil milhões de euros), acompanhado de notas do auditor a identificar fraquezas materiais no controlo de informação financeira. As dúvidas em relação à saúde financeira do banco aumentaram e a intervenção pública do seu maior acionista - o Saudi National Bank - afirmando a indisponibilidade em participar num aumento de capital, provocaram a queda forte das cotações das ações e criaram um risco sério de liquidez no banco.

O que se passou nos Estados Unidos durante o fim de semana, a situação do Credit Suisse e a possibilidade de haver mais bancos com elevada exposição à subida das taxas de juro levaram a que os investidores vendessem as ações da banca europeia quase de forma indiscriminada, com o Credit Suisse a cair 30% durante a sessão e o índice da banca europeia a cair cerca de 8%. No mesmo dia à noite, o Banco Central Suíço (SNB) e o FINMA, regulador suíço, afirmaram que o Credit Suisse cumpre os requisitos de capital e liquidez aplicáveis aos riscos sistémicos importantes, assegurando linhas de financiamento caso o banco necessite de liquidez. Ambas as instituições suíças emitiram um comunicado em que asseguram que os problemas de alguns bancos nos Estados Unidos não colocam um risco direto de contágio para a banca suíça.

Entretanto, o Credit Suisse anunciou que vai recorrer à facilidade do Banco Central Suíço e levantar até ao limite de 50 mil milhões de CHF (cerca de 53,7 mil milhões de euros). O CEO do Credit Suisse afirmou, "A minha equipa e eu estamos determinados a avançar rapidamente para oferecer um banco mais simples e mais focado, construído para responder às necessidades dos clientes". Esta deveria ser sempre a missão de qualquer instituição financeira, que infelizmente se tem concentrado em vender aos Clientes o que não precisam, não percebem e muitas vezes nem sabem que têm.

Nas carteiras de investimento não temos qualquer exposição às entidades com problemas

Não temos quaisquer investimentos em bancos. Na construção da carteira em que investimos, privilegiamos negócios com balanços fortes e altamente geradores de free cash flow, o que lhes garante independência da banca e da subida das taxas de juro.

Há dois anos, com os primeiros sinais de inflação, antecipámos que a era do dinheiro barato estaria a chegar ao fim. Isso significou ir vendendo negócios com estruturas alavancadas, como Bank of America, Synchrony Financial, AB Inbev e Bayer. Redirecionámos estes investimentos para empresas de qualidade excecional, medidas pela força do balanço, pela competência das equipas de gestão a alocar capital e pela capacidade de reinvestir os lucros do próprio negócio em boas oportunidades de crescimento nos mercados globais.

Reiteramos o que referimos na Assembleia Anual de Clientes no passado dia 25 de fevereiro: as empresas em carteira têm, em média, um rácio de dívida líquida face ao EBITDA de 0,1x. Isto significa que o cash flow operacional que geram é suficiente para pagar a sua dívida com pouco mais de um mês de atividade. Estamos muito confiantes nos retornos que esta carteira pode gerar a prazo.

Não sabemos se teremos uma nova crise financeira grave

Não sabemos se teremos uma nova crise financeira grave ou quantas mais instituições poderão ser afetadas pela subida das taxas de juro e potenciais perdas nas carteiras próprias. No entanto, consideramos que a situação atual é muito diferente de 2008: os bancos funcionam hoje com menores níveis de alavancagem, estão com rácios de capital mais sólidos, níveis de regulação muito mais apertados e as autoridades estão muito mais atentas à necessidade de intervir ativamente na estabilização do sistema.

A volatilidade dos mercados poderá continuar. No curto prazo o mercado financeiro funciona como uma máquina de votar: o “voto” dos que sabem o que estão a fazer pesa o mesmo dos que não sabem (que são muitos mais) ou dos que têm medo de perder o seu emprego e têm maior facilidade em seguir a multidão. No entanto, no longo prazo os mercados acionistas funcionam como uma balança: as cotações refletirão a riqueza que esses negócios conseguirão gerar para os seus acionistas.

São estas alturas de incerteza e medo que geram as melhores oportunidades para quem investe a longo prazo, como é o que fazemos na Casa de Investimentos.

Para aqueles que queiram perceber um pouco melhor como funciona a atividade bancária (e porque motivo os bancos podem ser arriscados quer para depositantes, quer para quem investe nas suas ações) sugiro a leitura do artigo, aqui, que escrevi em 14 de fevereiro de 2014, dias depois do Banco Espírito Santo ter adiado a apresentação de contas publicamente e cinco meses antes de ter sido intervencionado pelo Banco de Portugal.


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