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Portugal é o sexto país do mundo com maior taxa de empreendedorismo feminino, à frente de Espanha, Austrália e Reino Unido
Elas são donas de uma em cada três empresas
Na véspera do Dia Internacional da Mulher, um estudo internacional sobre empreendedorismo traz boas notícias: Portugal é o 6º melhor país do Mundo para o empreendedorismo feminino, à frente de países como Espanha, Austrália ou Reino Unido. A percentagem de mulheres que detêm um negócio - um em cada três, em Portugal -, as condições de apoio ao empreendedorismo e a disponibilidade de conhecimento e recursos financeiros foram as áreas avaliadas pela Mastercard, em 57 países de cinco continentes, representantes de 78,6% da força de trabalho feminina em todo o Mundo.
A Nova Zelândia manteve o lugar cimeiro neste ranking, com 74,2 pontos; em 2º lugar, está a Suécia com 71,3 pontos; em 3º, o Canadá, com 70,9 pontos; em 4º, os Estados Unidos, com 70,8 pontos; e Singapura em 5º, com 69,2 pontos, a escassa distância dos 69,1 pontos de Portugal. Este índice revela que as mulheres empreendedoras têm tido mais sucesso em economias mais ricas e desenvolvidas, tal como na Nova Zelândia, na Suécia ou em Portugal, onde as pontuações relativas ao progresso, conhecimento e acesso financeiro das mulheres são mais elevadas. Mas também sublinha as exceções de economias com rendimento médio-baixo, como as Filipinas ou o Vietname, que surpreendem com pontuações acima do esperado. Enquanto, no Gana, a necessidade dita um número excecionalmente elevado de mulheres empreendedoras, apesar de menos acesso a conhecimento ou recursos financeiros, noutros países extremamente ricos e com 100% de mulheres com cursos superiores, como os Emirados Árabes, são raras as mulheres empreendedoras.
As barreiras ao progresso dos negócios das mulheres acabam por ser, todavia, semelhantes em todo o Mundo: a descriminação de género, que inclui a falta de aceitação social, e a falta de recursos de negócios (financeiros, capital, formação e desenvolvimento) são os fatores que mais frequentemente levam à descontinuidade do negócio das mulheres.
"A desigualdade de género continua a ser o principal obstáculo ao empreendedorismo das mulheres. Esperamos que estas conclusões possam constituir um alerta atempado para que os governos e organizações reforcem o apoio ao desenvolvimento de uma maior inclusão financeira e acesso à educação para mulheres empresárias e trabalhadoras", rematou Ann Cairns, presidente de Mercados Internacionais da Mastercard.
Finanças: Num mundo de fato e gravata, CEO da Casa de Investimentos usa saia
Chefiar homens ou mulheres é indiferente para Emília Vieira, cofundadora e CEO da Casa de Investimentos, a única gestora de patrimónios portuguesa localizada em Braga. A especialista em Finanças gere cerca de uma centena de milhão de euros, num mundo ainda dominado pelos fatos e gravatas masculinos. "As mulheres têm uma capacidade especial para gerir dinheiro e há muitos estudos que o dizem. Warren Buffet costuma dizer que investe como uma mulher (com cautela), começa por dizer a gestora, que não abdica de ser mulher e mãe de dois filhos que apoia de perto.
"Mas, mais do que o género, deve ser a capacidade de trabalho, a honestidade, o empenho e o talento com que conseguimos fazer o nosso trabalho que deve pesar", completa. Enquanto responsável pela gestão de recursos humanos da empresa, nota que os preconceitos chegam a ser maiores entre as mulheres:
Há demasiadas mulheres que autoimpõem limitações e também somos nós que temos de vencer barreiras, nos negócios, na política e na cultura.
-- Emília Vieira
A Casa de Investimentos nasceu em 2010, porque Emília Vieira queria "ter a liberdade de poder fazer a coisa certa" e os dois outros sócios são homens (um deles marido). "Temos uma equipa extraordinária de homens", assegura. "Decidimos que seria eu a CEO por causa da minha carreira internacional, que projeta mais facilmente a empresa, mas trabalhamos em equipa, remata.
Ligações Úteis
O que nos impede de tomar decisões racionais de investimento? Porque é que o medo e a ganância dominam a nossa actuação? Como diz Benjamim Graham, o principal problema do investidor -- e talvez o seu pior inimigo -- é ele próprio
Tal como perder peso, investir é simples, mas não é fácil. Há apenas duas formas de perder peso: comer menos e fazer mais exercício. No entanto, tal revela-se muito difícil num mundo cheio de bolos de chocolate, de batatas fritas, de bons assados ou bons vinhos.
A tentação está em todo o lado. A chave para investir com sucesso também é simples: comprar bons ativos, que produzam rendimentos, quando estão baratos e mantê-los; diversificar apenas o essencial e manter os custos de transação baixos. Infelizmente este conceito tão simples não é facilmente aplicável pelos investidores que todos os dias são bombardeados com a ideia "fique rico depressa", avisos para saírem do mercado (ou entrarem) antes que seja demasiado tarde e comentadores de televisão que gritam dicas de investimento como se tivessem a roupa interior a arder. Os investidores são muitas vezes "forçados" a tomar decisões motivados pelo medo ou pela ganância.
Este ambiente de sobrecarga sensorial seria o suficiente para impedir que o investidor aplique esta receita tão simples. Mas um obstáculo maior bloqueia o seu caminho. Nos últimos 40 anos, neurocientistas e psicólogos têm estudado o nosso processo de tomada de decisões, o que nos condiciona como seres humanos e porque fazemos muitas vezes as escolhas erradas ao longo da vida.
O que era considerado como as fundações das finanças -- Efficient Market Hypothesis (Teoria dos Mercados Eficientes), Capital Asset Pricing Model (Modelo de Avaliação de Ativos Financeiros) e Modern Portfolio Theory (Teoria Moderna de Portefólios) -- pressupõe que os investidores são racionais e que, por isso, tomam as decisões sempre no seu melhor interesse. A história financeira, no entanto, está recheada de exemplos que contradizem estas teorias. Basta recordar todas as bolhas e crashes que tiveram lugar nos últimos anos.
As finanças comportamentais pretendem ser uma resposta a estes dilemas. Compreendendo a forma como tomamos decisões de consumo e investimento, podemos criar o nosso próprio processo sistemático que nos conduza à tomada de decisões corretas.
Psicólogos e neurocientistas descobriram duas características que são particularmente relevantes na tomada de decisões. A primeira, é que estamos programados para o curto prazo: o ser humano tende a considerar a possibilidade de ganhos no curto prazo extremamente atrativa. Estes ganhos estimulam os centros emocionais do cérebro e libertam dopamina. Isto torna-nos mais confiantes, estimulados e, de uma forma geral, satisfeitos connosco próprios. A segunda, é a nossa tendência para adotar comportamentos de rebanho: a dor da exclusão social (por exemplo, comprar quando todos estão a vender ou vice-versa) é sentida nas mesmas partes do cérebro que sentem a dor física real. Adotar estratégias de investimentos contrárias é, portanto, um pouco como sermos espancados.
A evidência que tem sido coligida em inúmeros estudos mostra que todos nós, como seres humanos, somos afetados por desafios comportamentais -- vieses mentais -- que condicionam o nosso processo de tomada de decisões racionais.
Da savana africana à era digital
Porque sofremos estes vieses que tanto nos condicionam na tomada de melhores decisões? Como qualquer outra característica da nossa existência, os nossos cérebros foram, e continuam a ser, refinados por um processo de evolução que ocorre a um ritmo glacial. Os nossos cérebros estão perfeitamente adaptados para o ambiente que enfrentávamos há 150 mil anos (a savana africana). Estão menos preparados para a revolução industrial de há 300 anos e talvez ainda menos preparados para a era digital em que vivemos hoje. Por outras palavras, as nossas mentes estão preparadas para resolver os problemas relacionados com a sobrevivência e não estão ainda otimizadas para decisões de investimento. O resultado desta herança é que todos nós, sem exceção, cometemos estes erros.
Os cientistas sugerem que o melhor método para entender como o nosso cérebro funciona é imaginar que temos dois sistemas diferentes instalados nas nossas mentes: o sistema X e o sistema C.
O sistema X é essencialmente a emoção na tomada de decisões. O sistema X é a opção automática. Toda a informação passa pelo sistema X para processamento e não exige qualquer esforço. As conclusões tiradas pelo sistema X são, geralmente, baseadas em aspetos como a semelhança, familiaridade e proximidade temporal. Estes atalhos mentais permitem ao sistema X lidar com imensas quantidades de informação simultaneamente. O sistema X é um sistema de "satisfação" rápido e pouco sofisticado que tenta dar respostas aproximadamente (e não exatamente) corretas. Para que o sistema X acredite que algo é válido, pode muito simplesmente desejar que assim o seja.
O sistema C requer um esforço deliberado e tenta resolver os problemas através de uma abordagem lógica e dedutiva. Contudo, como qualquer processo lógico, verifica a informação passo a passo de uma forma lenta e em série. Para que o sistema C acredite em algo, precisa de provas.
Todos gostamos de acreditar que o nosso sistema C controla as nossas tomadas de decisão. A realidade é que o sistema X controla muito mais as nossas ações do que estamos dispostos a admitir. De facto, muito frequentemente acabamos por confiar na nossa reação emocional inicial e só ocasionalmente recorremos ao sistema C para rever a nossa decisão. Por exemplo, quando tropeçamos numa pedra, insultamos o objeto inanimado apesar de ele não ter responsabilidade alguma pelo nosso erro. Ainda assim, o sistema X, segundo conclusões de António Damásio, é indispensável à tomada de decisões. Sem emoção, o ser humano fica paralisado perante os desafios.
Neurocientistas descobriram que as partes do nosso cérebro associadas com o sistema X são muito mais antigas do que as partes associadas com o sistema C. Quer isto dizer que a necessidade da emoção evoluiu mais cedo do que a necessidade da razão. Imagine que estamos a visitar um jardim zoológico. Ao passar pela jaula dos leões, um leão salta na nossa direção; imediatamente damos um salto para trás. O sistema X reagiu para salvaguardar a nossa segurança. De facto, um sinal foi gerado assim que o nosso cérebro se apercebeu do movimento do leão. Este sinal foi enviado por dois caminhos -- pelo sistema X que enviou a informação diretamente para a amígdala cerebelosa (o centro do cérebro para medo e risco) que reage com rapidez e força o nosso corpo a saltar para trás. A segunda parte do sinal é enviada para o sistema C que processa a informação de uma forma mais consciente, avaliando a ameaça potencial. O sistema C recorda que existem barras de metal que nos separam do leão. Mas, entretanto, já saltámos para trás. A emoção ganha à razão.
O que tem isto que ver com finanças?
Em que circunstâncias somos mais suscetíveis a deixar rédea solta ao sistema X? Segundo a neurociência e a psicologia há um conjunto de situações em que isto acontece: quando o problema é mal estruturado e complexo, quando a informação disponível é incompleta, ambígua e está em permanente mudança, quando os objetivos estão mal definidos, se alteram ou competem entre si, quando os níveis de stresse estão altos devido a constrangimentos de tempo e/ou porque muito está em jogo, quando as decisões dependem da interação com outros.
Estas circunstâncias caracterizam muitas das decisões que tomamos quando confrontados com oportunidades de investimento. Um dos maiores investidores de todos os tempos, Warren Buffett, diz que os investidores precisam de controlar o seu sistema X: "o sucesso no investimento não está correlacionado com o QI. Se tiver uma inteligência normal, o que precisa é de um temperamento capaz de controlar os impulsos que causam problemas às outras pessoas".
Para Warren Buffett, se tiver uma inteligência normal, o que precisa é de um temperamento que controle os impulsos que causam problemas às outras pessoas
Ao longo de anos, os psicólogos documentaram e catalogaram os tipos de vieses mentais aosquais somos suscetíveis. Os resultados principais são surpreendentemente comuns a culturas e países muito diferentes. A maior parte destes erros tem a sua origem em quatro causas: autoilusão, simplificação, emoção e interação social.
Vieses comportamentais mais comuns
Excesso de otimismo e excesso de confiança. Na nossa evolução como espécie, o otimismo terá tido um papel fundamental para ultrapassar grandes desafios de sobrevivência. Estudos científicos demonstram que as pessoas otimistas são mais resistentes e vivem mais tempo quando enfrentam problemas graves de saúde. Nas decisões de investimento, contudo, o resultado não é o melhor.
Responda a estas duas perguntas: o leitor é um condutor acima da média? O leitor é, na sua profissão, acima da média? A esmagadora maioria das respostas a estas perguntas é positiva. Estas perguntas revelam dois dos vieses mais comuns: excesso de otimismo e excesso de confiança. Estes vieses têm origem na ilusão de controlo e ilusão de conhecimento. A ilusão de conhecimento é a tendência que as pessoas têm de acreditar que a precisão das suas previsões aumenta com mais informação. A verdade é que mais informação não é necessariamente melhor informação. A utilização que fazemos da informação disponível é que interessa.
A tendência para sobrevalorizar as nossas capacidades é amplificada pela ilusão de controlo -- a crença que as pessoas têm que conseguem controlar acontecimentos incontroláveis. As pessoas pagarão quatro vezes mais por um bilhete de lotaria se puderem escolher os números do que por um bilhete com números aleatórios, como se o ato de escolher os números aumentasse a probabilidade deles serem sorteados. A aleatoriedade é frequentemente confundida com controlo.
Viés confirmatório: mostra-me o que quero ver. Temos o mau hábito de procurar apenas a informação que concorda connosco. Isto é o que se chama o viés confirmatório. Karl Popper dizia que a melhor forma de testar uma hipótese é tentar contradizê-la. Na verdade, não é assim que funcionamos. Tendemos a formar um ponto de vista e passamos o tempo a procurar informação que o confirme. Gostamos de ouvir quem concorda connosco, de ouvir as nossas próprias opiniões refletidas nos outros.
Infelizmente, esta não é melhor forma de tomar decisões. Devíamos ouvir aqueles que discordam, não para mudar de opinião, mas para tomarmos conhecimento dos pontos de vista opostos e para tentar encontrar a falha lógica nos seus argumentos. Se não conseguirmos encontrar essa falha, talvez não devamos ter tamanha convicção nos nossos pontos de vista.
Um problema adicional ao viés confirmatório é o viés dos médios hostis. Isto é, não só procuramos apenas a informação que concorda connosco, mas, quando somos confrontados com informação que discorda connosco, temos a tendência de considerar a fonte dessa informação como tendo um ponto de vista enviesado.
Autoatribuição: caras é mérito nosso, coroa é azar. Todos nós temos um relativamente frágil sentido de autoestima e um dos mecanismos-chave para o proteger é o viés da autoatribuição, a tendência de atribuir bons desfechos à nossa habilidade e os maus desfechos ao azar. Este viés constitui um dos mais fortes limites à aprendizagem que os investidores encontram. Este mecanismo de defesa impede-nos de reconhecer os erros que cometemos e, desta forma, de aprendermos com os erros cometidos no passado. Como disse George Santayana, "a história repete-se e esquecer o passado é estar condenado a repeti-lo".
Quando questionado sobre se os investidores iriam aprender algo com a crise financeira em 2008 e 2009, Jeremy Grantham, estratego chefe da gestora de ativos GMO, respondeu: "Iremos aprender muito no curto prazo, alguma coisa no médio prazo, e absolutamente nada no longo prazo."
Recuando no tempo, John K. Galbraith dizia que os mercados financeiros são caracterizados pela "extrema brevidade da memória financeira. Consequentemente, os desastres financeiros são rapidamente esquecidos. Quando as mesmas ou similares circunstâncias se repetem, são saudadas por uma nova, frequentemente jovem e sempre confiante, geração como uma descoberta brilhantemente inovadora no mundo económico e financeiro. Poucos são os campos da atividade humana em que a história é tão pouco importante como no mundo das finanças".
Hindsight: eu já sabia. Um dos mais perigosos vieses que enfrentamos é o viés do retrovisor (hindsight). Refere-se ao facto de, após um evento ter tido lugar, nós estarmos convencidos de que sabíamos o que se iria passar. O melhor exemplo do viés do retrovisor nos investidores é a bolha tecnológica do final dos anos 90. Na altura, chamar a atenção dos investidores para a bolha tecnológica resultava em "ameaças físicas". Hoje, os mesmos investidores reescreveram a sua história. Todos eles sabiam que era uma bolha -- estavam todos investidos, mas sabiam que era uma bolha e que, mais cedo ou mais tarde, iria explodir.
Obviamente, se todos estão convencidos de que conseguem prever o passado, é natural que estejam excessivamente certos de que conseguem prever o futuro. Assim, o hindsight é o mais poderoso gerador de excesso de confiança.
Ancoramento: o irrelevante tem valor. Quando confrontados com a incerteza, todos temos a tendência de nos agarrarmos ao irrelevante como se fosse uma muleta ou uma âncora. Esta incorporação do irrelevante acontece frequentemente sem qualquer reconhecimento consciente do facto.
Que âncoras influenciarão os investidores? A toda a hora, os preços das ações são publicitados: nos jornais, na internet, no ticker que está permanentemente a rodar na parte inferior dos canais financeiros de televisão. Os investidores agarram-se a estas miragens de preços e, erradamente, fazem-nos equivaler ao valor dos negócios subjacentes.
Representatividade: tiro conclusões com base na aparência e semelhança. As pessoas julgam os eventos pela sua aparência e semelhança, não pela probabilidade deles acontecerem. É o chamado viés da representatividade. Este viés tem muitas aplicações no mercado de capitais. Por exemplo, as boas empresas são bons investimentos? Podem não ser, se estiverem a transacionar a preços acima do seu valor justo.
Nos mercados financeiros, os analistas também sofrem deste viés. Preveem que as empresas com forte crescimento dos resultados nos últimos cinco anos irão continuar a crescer ao mesmo ritmo nos próximos cinco anos. O que os analistas estão a dizer é "esta empresa é excecional e, portanto, continuará a sê-lo". O que ignoram (inconscientemente) é que o crescimento de resultados é um processo altamente reversivo para a média, em períodos de cinco anos. Um portefólio de empresas com crescimento mais lento consegue quase a mesma taxa de crescimento de longo prazo do que um portefólio de empresas de crescimento rápido. Efetivamente, os analistas avaliam as empresas pelo que parecem ser e não pela probabilidade de conseguirem sustentar as altas taxas de crescimento. Como salienta Philip Fisher, autor do livro Common Stocks and Uncommon Profits: "O mercado bolsista está cheio de indivíduos que sabem o preço de tudo e o valor de nada."
Experiência direta: não é isso de que me recordo. As nossas mentes não são supercomputadores. Não são sequer bons arquivos. No entanto, estamos convencidos de que as nossas memórias são perfeitas como fotografias ou postais. De uma forma geral, as pessoas recordam-se melhor de informação vívida, bem publicitada ou mais recente. O efeito proximidade temporal é também reforçado pelo facto de as pessoas tenderem a confiar mais nas suas experiências em detrimento de estatísticas ou de experiências alheias.
Estudos concluem que a experiência direta é frequentemente muito mais ponderada do que a experiência geral, mesmo quando esta é igualmente objetiva e relevante. Uma possível razão para a importância excessiva da experiência pessoal é o impacto da emoção: informação diretamente experimentada desencadeia reações emocionais ausentes das experiências alheias. Desta forma, se as pessoas utilizarem a sua experiência pessoal para avaliar a probabilidade de eventos, irão exagerar o peso de eventos improváveis porque passaram e subestimar o peso daqueles que não experimentaram em primeira mão.
A experiência recente da maior parte dos investidores em Portugal é de perdas significativas. Os títulos mais disseminados na Bolsa portuguesa são os que maiores perdas acumulam. Recentemente, um dos jornais económicos noticiava que, diariamente, mais de 700 investidores deixavam de ter ações. Os investidores atribuem maior ponderação à sua experiência pessoal do que a todos os estudos que comprovam o sucesso do investimento em valor. Este comportamento reflete também o efeito da proximidade temporal: o investidor acredita que o futuro será sempre este. Esta atitude verifica-se nos dois extremos do mercado ampliando, assim, os efeitos das bolhas e dos crashes.
Para investir em valor, compre bons ativos baratos, venda-os, pelo menos, ao seu preço justo e, no intervalo entre a compra e a venda, ignore as cotações de mercado
Porque existem investidores excecionais?
No dia a dia, tomamos decisões de consumo, poupança e investimento. Grande parte de nós não tem formação financeira para as tomar no seu melhor interesse. Os vieses comportamentais de que sofremos são também handicaps com que temos de lidar. A história está repleta de bolhas: no mercado bolsista, no mercado imobiliário, nas matérias-primas e até as tulipas excitaram muitos investidores, no século XVII.
Alguns dos melhores investidores do mundo ultrapassaram estes vieses comportamentais que afetam as decisões de investimento e reduzem os retornos à esmagadora maioria dos investidores. Entre 1929 e 1934, Benjamim Graham e David Dodd testemunharam o melhor e o pior nos mercados financeiros. Da escalada até ao pico de 1929, até ao crash em Outubro do mesmo ano e a implacável Grande Depressão. Desta sua experiência no mercado financeiro e do vasto conhecimento da teoria financeira, os dois professores da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, construíram um modelo com o qual os investidores podiam filtrar centenas ou até milhares de ações e obrigações e identificar aquelas em que valia a pena investir. Esta filosofia de investimento é conhecida como o investimento em valor e o seu mais famoso praticante, aluno de Benjamin Graham, é Warren Buffett.
Em 1992, Tweedy, Brown Company LLC, gestora de patrimónios muito conceituada, publicou uma compilação de 44 estudos intitulada "O que funciona no investimento". O estudo concluiu que o que funcionou é muito simples: as ações baratas conseguem, consistentemente, melhores retornos do que as ações caras; e as ações cujo preço teve pior performance (em períodos de três e cinco anos) conseguiram melhores rentabilidades, nos períodos seguintes, do que as ações cujos preços tiveram melhor performance nos mesmos períodos.
Ao longo dos últimos 54 anos, Warren Buffett conseguiu rentabilidades médias de 20,2% ao ano. Quando questionado sobre o seu sucesso como investidor, responde: "O nosso método é muito simples. Tentamos selecionar negócios com fundamentos económicos soberbos, geridos por pessoas honestas e capazes e compramo-los a preços sensatos. É só isto que tentamos fazer."
Warren Buffett escreveu um artigo, em 1984, intitulado "Os superinvestidores de Graham e Doddsville". Nesse artigo, Buffett elenca alguns investidores que, ao longo de vários anos, conseguiram retornos muito acima do mercado. Walter Schloss ganhou, durante 20 anos, 21,3% ao ano; Tom Knapp, da Tweedy Browne, conseguiu retornos de 20% ao ano; Bill Ruane, da Sequoia Funds, conseguiu 17,2% anuais; Charlie Munger, sócio de Warren Buffett, ganhou, num período de 13 anos, 19,8% anuais. Segundo a teoria dos mercados eficientes, estes investidores foram simplesmente bafejados pela sorte. No entanto, argumenta Buffett, todos estes investidores têm um patriarca intelectual em comum, Benjamin Graham. Eles trabalham em locais diferentes e investiram em ativos diferentes, a única coisa em comum é a estratégia que seguem, o investimento em valor. O seu sucesso, portanto, não pode ser atribuído apenas à sorte; é o triunfo da estratégia certa. Por outras palavras, o investimento em valor funciona.
O que é o investimento em valor?
É investir em bons ativos, que produzem rendimentos, comprados a desconto do seu valor justo e que sejam geridos por gente capaz e honesta. É simples, mas está longe de ser fácil.
O investidor em valor é avesso ao risco e portanto a decisão de investimento é um processo de avaliação profunda dos dados fundamentais das empresas, dos negócios que lhe estão subjacentes e da sua capacidade de gerar um rendimento crescente no futuro. A partir dos balanços e demonstrações financeiras da empresa, avaliam-se a qualidade do negócio, as margens operacionais, a evolução dos lucros, a rentabilidade dos capitais investidos, os níveis de endividamento, as vantagens competitivas dentro do sector e a capacidade de remunerar o acionista. As palavras de Benjamin Graham resumem bem este processo: "A análise deve ser penetrante, não profética."
No entanto, o investimento em valor não se resume apenas à análise das demonstrações financeiras. Uma vez que nem todos os elementos que afetam o valor da empresa são revelados pelo escrutínio dos documentos contabilísticos, a experiência, a capacidade de julgamento e o ceticismo são fundamentais para estimar o real valor da empresa.
Uma vez estimado o valor da empresa, confrontamo-lo com o preço a que está a cotar no mercado. Preço é o que se paga, valor é o que se recebe e da diferença entre o preço a que estamos a comprar e o valor intrínseco do ativo, obtemos a margem de segurança, a "almofada" necessária para proteger os valores investidos. Disciplina e paciência para esperar pelo preço certo de compra são essenciais para que o método tenha sucesso. Quando a cotação no mercado refletir o valor da empresa, é altura de vender.
Poucos investidores são suficientemente disciplinados para manter padrões rigorosos de avaliação e aversão ao risco. É em tempos de grande incerteza e de conjunturas negativas que a prática de um método de investimento conservador e seguro -- o investimento em valor -- é particularmente fundamental.
Sir John Templeton, pioneiro dos fundos de investimento e considerado pela revista Money como o melhor investidor global do século xx, mantinha sob vigilância um conjunto de excelentes empresas que transacionavam a preços muito elevados e os preços a que gostaria de as comprar. Quando o mercado caía e arrastava as ações para os níveis desejados, as compras eram executadas. Templeton sabia que, no dia em que o mercado caísse, ele não teria a disciplina para comprar. No entanto, ao determinar, a priori, os preços de compra, retirava da equação a emoção e os seus vieses mentais. Um processo disciplinado e objetivo é essencial ao sucesso.
Em agosto passado, na Casa de Investimentos, aplicámos este processo. Aproveitámos a reação negativa do mercado ao downgrade da dívida americana - uma queda de cerca de 20% em duas semanas - investimos nalgumas empresas excecionais que, sem qualquer justificação fundamental, ficaram baratas.
Por que tão poucos seguem esta filosofia
Apesar dos resultados excecionais de grandes investidores em Valor e de inúmeros estudos que os comprovam, poucos são os investidores que seguem este método de investimento. Warren Buffett, para lá da publicação trimestral das suas transações, escreve na imprensa, de tempos a tempos. Em 17 de outubro de 2008, aconselhou, em carta aberta no The New York Times ("Buy American, I Am"), o investimento em empresas americanas. Em fevereiro passado, escreveu na revista Fortune reiterando a sua preferência pelo investimento em ativos que produzam rendimento, isto é, ações.
Os professores universitários Gerald Martin e John Puthenpurackal, num paper de 2008, concluíram que, imitando as compras de Warren Buffett um mês após a sua divulgação pública, qualquer investidor bateria o S&P 500 por uma média de 10,75% ao ano, no período de 1976 a 2006. Este resultado é extraordinário tendo em conta que a performance de Warren Buffett, no mesmo período bateu o S&P 500 por 11,14% ao ano.
Muito antes de neurocientistas e psicólogos terem descoberto a importância destes vieses, Benjamin Graham refletia que o investidor deveria estar preparado, financeira e psicologicamente, para as flutuações do mercado e explicava-o através de uma metáfora a que chamava Sr. Mercado: "Imagine que é proprietário de parte do capital de uma pequena empresa e que essa participação lhe custou 1000 euros. Um dos seus sócios, chamado Sr. Mercado, é muito prestável. Todos os dias, ele diz-lhe qual é o valor, na opinião dele, da sua parte da empresa e oferece-se para comprá-la ou para lhe vender uma participação adicional ao mesmo preço. Por vezes, a avaliação do Sr. Mercado parece plausível e justificada pelos desenvolvimentos e perspetivas futuras do negócio. Frequentemente, contudo, o Sr. Mercado é levado pelo entusiasmo ou pelo medo e o valor que ele propõe é pouco menos do que ridículo. Se o leitor é um investidor prudente ou um empresário sensato, vai deixar que as comunicações diárias do Sr. Mercado determinem a sua convicção do que vale a sua participação de 1000 euros na sua empresa? Apenas nos casos em que concorda com o Sr. Mercado ou quando está disposto a negociar com ele. Poderá vender a sua participação quando o Sr. Mercado lhe propõe um preço ridiculamente alto, assim como poderá comprar uma participação adicional quando o preço é baixo. No tempo restante, poderá formar as suas próprias opiniões acerca de quanto realmente vale a sua participação, baseado nos relatórios da empresa sobre as suas atividades e situação financeira. O verdadeiro investidor está nesta posição quando tem ações de uma empresa cotada. Ele pode tirar partido do preço diário de mercado ou ignorá-lo. As flutuações de preço têm apenas um significado para o verdadeiro investidor. Elas oferecem oportunidades para compras inteligentes quando o preço cai bastante e oportunidades para vendas inteligentes quando os preços ultrapassam o valor da empresa. No resto do tempo, o investidor deverá ignorar o mercado e concentrar-se nos dividendos e resultados operacionais das suas empresas."
Por outras palavras, compre bons ativos baratos, venda-os, pelo menos, ao seu preço justo e no espaço de tempo entre a compra e a venda, ignore as cotações de mercado. Ou, como Warren Buffett recomenda: "Encare as flutuações de mercado como amigas e não como inimigas; lucre com a loucura em vez de participar nela."
O medo e a ganância têm separado muitos investidores do seu dinheiro. Quando o mercado de ações cai porque as notícias são más e a conjuntura macroeconómica difícil, os investidores vendem a qualquer preço ativos de grande valor. Porque muita gente o está a fazer, os investidores ignoram a qualidade dos ativos que têm e adotam o comportamento de rebanho. Do mesmo modo, quando a conjuntura é favorável ou as notícias para determinada empresa são muito positivas, é fácil perder o bom senso e seguir a multidão, comprando a qualquer preço.
O público investidor festeja o lucro fácil. Mas as bolhas inevitavelmente estouram. E o provérbio é confirmado: "Aquilo que o sábio faz no princípio, o tolo faz no fim"
Demasiadas pessoas investem no mercado de capitais com o objetivo de enriquecerem da noite para o dia. As ações, em vez de serem encaradas como uma "fatia" do negócio subjacente que, ano após ano, cria riqueza para os seus acionistas, são vistas apenas como papel que troca de mãos, frequentemente mais de uma vez por dia. A satisfação imediata, a falta de convicção com que se compram e vendem ativos e a busca de excitação no mundo do investimento potenciam decisões irrefletidas, tomadas por impulso. Muitos consideram que investir em Bolsa continua a ser um jogo de sorte e azar.
A especulação e as bolhas
A definição de investimento expandiu-se muito nos últimos 20 anos: desde selos, arte, vinhos, ouro, petróleo, todo o tipo de produtos financeiros exóticos e até apostas desportivas. Muitos destes ativos não são produtivos e quem os compra tem a esperança de que no futuro alguém venha a pagar mais por eles. Quem investe assim, não é inspirado por aquilo que o ativo produz, mas, sim, porque acredita que outros o desejarão ainda mais no futuro. Esta é, na sua essência, a definição de especulação. É desta forma que surgem as bolhas especulativas.
Nos últimos 15 anos, tanto as ações tecnológicas como o mercado imobiliário demonstraram os excessos extraordinários que podem ser criados pela combinação de uma tese de investimento sensata (na sua génese) e bem publicitados preços crescentes (o ouro é um bom exemplo). Nestas bolhas, um exército de investidores, a princípio cético, sucumbe à prova entregue pelo mercado e o grupo de compradores expande-se -- durante algum tempo -- o suficiente para manter a roda a girar. O público investidor festeja o lucro fácil. Mas as bolhas inevitavelmente estouram. E o velho provérbio é mais uma vez confirmado: "Aquilo que o sábio faz no princípio, o tolo faz no fim."
Canais de televisão de negócios, jornais, revistas, analistas e comentadores alimentam diariamente um público vasto e em expansão. Este é o "circo" que é montado diariamente à volta do mercado financeiro e que precisa de fazer crer que, durante o dia, irão passar-se eventos extraordinariamente importantes.
A quantidade de informação -- completamente irrelevante para a vida diária das empresas -- é espremida ao máximo. As "dicas para ganhar dinheiro hoje" encurtam ainda mais o horizonte de investimento. Mais informação não é melhor informação, apenas reforça no investidor a ilusão de controlo, o excesso de otimismo e de confiança.
Larry Summers, ex-secretário do Tesouro americano, investigou os 50 maiores movimentos no mercado de ações americano entre 1947 e 1987. Summers e os seus colegas vasculharam a imprensa na tentativa de encontrar alguma razão para os movimentos do mercado. Concluíram que, "na maioria dos dias com maior movimento, a informação que a imprensa avança como causa não é particularmente importante". Dito de outra forma, mais de metade dos maiores movimentos nos mercados não tem qualquer relação com os fundamentos económicos das empresas ou da economia.
A indústria financeira tem sido a grande promotora de toda esta "festa". Se por um lado está a satisfazer necessidades novas aos seus clientes, como argumenta, por outro, está a promover o curtíssimo prazo e o comissionamento excessivo. No seu livro The Battle for the Soul of Capitalism, John Bogle, fundador da Vanguard, expõe com grande clareza os conflitos de interesses dos grandes grupos financeiros e como a glorificação do curtíssimo prazo triunfou sobre os tradicionais valores da fidúcia. As comissões pagas, entre 1997 e 2002, pelos investidores norte-americanos aos bancos, corretoras e fundos de investimentos excederam os 1,275 triliões de dólares. No final dos anos 90, as previsões dos analistas e dos especialistas em estratégia tornaram-se mais importantes do que nunca nos mercados financeiros. Infelizmente, não se tornaram mais precisas e os exemplos são imensos. Existem hoje previsões sobre todo o tipo de indicadores, desde a inflação, as taxas de juro, o desemprego, os resultados trimestrais das empresas, passando pelos preços das ações e das obrigações, das matérias-primas, etc. Quando os números reais observados são divulgados, raramente coincidem com as previsões. Estão assim reunidas as condições para que os mercados se comportem com grande volatilidade. Isto não faz qualquer sentido. As previsões -- que criam a ilusão de controlo sobre o que pode ser o futuro -- vêm limitar a capacidade de tomar decisões baseadas em processos lógicos.
Para Warren Buffett, "as previsões políticas e económicas de curto prazo são uma distração muito cara para os investidores. A prazo, as notícias sobre os mercados financeiros serão positivas. No século xx, os Estados Unidos passaram por duas Guerras Mundiais e outros conflitos militares dispendiosos, uma Grande Depressão, uma dúzia de recessões, vários pânicos financeiros, choques petrolíferos, etc. No entanto, o Dow Jones subiu dos 66 para os 11497 pontos."
Os analistas e gestores de dinheiro são também vítimas destas armadilhas mentais. Têm acesso a demasiada informação e precisam de proteger o seu posto de trabalho. Se seguirem o rebanho e estiverem errados, fizeram o que toda a gente fez. Se não seguirem o rebanho e estiverem errados, o seu emprego está em causa. A evolução tecnológica, a internet, a grande difusão de informação e a engenharia financeira contribuíram para potenciar negativamente os nossos vieses comportamentais.
Conclusões
O investidor deverá ter a disciplina e a coragem de se manter fiel aos seus princípios. Como Benjamin Graham declarou: "Se acredita que o investimento em valor é um conceito sólido, deverá devotar-se a esse princípio. Mantenha-se fiel e não se deixe arrastar pelas modas, pelas ilusões e pela perseguição constante do lucro rápido de Wall Street. Não é preciso ter uma inteligência de génio para ser um investidor em valor de sucesso. O que é necessário é, em primeiro lugar, uma inteligência razoável; em segundo, bons princípios de atuação; e terceiro e mais importante, firmeza de caráter."
Só dominando estes três elementos é que o investidor inteligente será capaz de agir de forma contrária -- comprar quando todos vendem e vender quando todos compram.
Nunca deixaremos de ser suscetíveis aos vieses comportamentais. Reconhecendo as nossas limitações, estaremos mais bem preparados para que os processos lógicos assumam o controlo. Só com processos sólidos de tomada de decisões será possível obter resultados consistentes a médio e a longo prazo.
O co-autor de estudos sobre 117 anos de retornos de cinco classes de ativos nos mercados globais explica que os investidores que assumiram o risco tiveram mais sucesso que os conservadores.
'O Triunfo dos Otimistas' é o título do livro publicado pelo economista Elroy Dimson (com Paul Marsh e Mike Staunton) em 2002 baseado no estudo de 101 anos dos retornos dos investimentos globais. é também o título da conferência organizada pela Casa de Investimentos e pelo Jornal Económico nos dias 15 (Lisboa) e 16 de novembro (Braga), na qual Dimson irá explicar as bases e as conclusões do estudo que foi sendo atualizado e engloba agora cinco classes de ativos em 23 países e ao longo de 117 anos.
Doutorado pela London Business School, Fimson é chair da Newton Centre for Endowment Asset Management na Cambridge Judge Business School e Emeritus Professor of Finance na London Business School. Na sua vasta bibliografia, constam a co-autoria dos livros "Financial Markets History" (2017) e "Global Investment Returns Yearbook" (2017), entre vários outros.
Como, quando e porquê desenvolveu a ideia de escrever "O Triunfo dos Otimistas"?
O esforço maior na pesquisa dos retornos dos investimentos globais iniciou-se no final dos anos 90. Com os meus colegas Paul Marsh e Mike Staunton, pretendíamos inicialmente fazer um estudo a ser publicado no novo milénio, no ano 2000. No início, pensávamos apenas em estender os dados do Reino Unido (UK) até 1900, uma aspiração estimulante. O nosso objetivo era comparar as experiências de investimento no longo prazo nos Estados Unidos (US) e no UK. No entanto, como todos sabemos, os projetos de pesquisa evoluem à medida que o estudo é levado a cabo. Este acabou por ser também o nosso caso.
Mark Brown, o (então) responsável pelo Research no ABN Amro, sugeriu a publicação de um livro, patrocinado pela sua empresa. Com este encorajamento, iniciamos a expansão do conjunto de países a incluir no livro. Descobrimos muitas pessoas que estavam a trabalhar isoladamente na compilação de registos para os mercados nacionais respetivos. O nosso estudo inicial (publicado pelo ABN Amro em 2000) englobava 10 mercados, com mais de um século de dados sobre os retornos anuais das principais classes de ativos em cada país.
Eventualmente, com a cooperação de um painel crescente de outros investigadores interessados em participar, encontrámos 16 mercados nacionais que incluímos em "O Triunfo dos Otimistas", publicado pela Princeton University Press em 2002, de Dimson, Marsh e Staunton ("DMS"). Fomos afortunados. A investigação teve grande impacto e o seu alcance expandiu-se ao longo do tempo, cobrindo múltiplos tópicos em várias edições do nosso Global Investment Returns Yearbook. O nosso estudo inclui atualmente os principais mercados norte americanos, asiáticos, europeus e africanos desde 1900 até hoje, englobando cinco classes de ativos em 23 países e três regiões transnacionais.
Quais são as principais vantagens que um investidor, ou potencial investidor, pode obter através da análise de uma tão longa série de retornos de mercado?
Para compreendermos o risco e retorno, devemos analisar longos períodos de história. Isto porque os retornos dos ativos, e especialmente das ações, são bastante voláteis. Mesmo em períodos de 20 anos ou mais, podem observar-se retornos "invulgares". Isto é facilmente ilustrável pela história recente. O Séc. XXI teve início com um dos bear markets mais selvagens da história. Os danos causados infligidos às ações globais tiveram início em 2000 e, em março de 2003, as ações americanas tinham recuado 45%, os preços das ações no UK caíram para metade e as ações alemãs perderam dois terços. Os mercados encetaram então uma recuperação notável, com ganhos substanciais que reduziram e, em muitos países, eliminaram completamente as perdas do bear market. Os mercados mundiais registaram novos máximos em finais de outubro de 2007, apenas para mergulhar noutro épico bear market impulsionado pela Crise Financeira Global. Os mercados fizeram mínimos em março de 2009 e encetaram nova recuperação admirável. No entanto, em termos reais, só em 2013 é que muitos dos maiores mercados mundiais atingiram novamente os níveis do início de 2000.
A nossa pesquisa sumariza as evidências históricas globais de longo prazo dos retornos de ações, obrigações, bilhetes de tesouro e taxas de câmbio, todas ajustadas para a inflação, ao longo dos 117 anos desde 1900. Atualizamos e expandimos os dados originalmente publicados no nosso livro de 2002, "O Triunfo dos Otimistas". Dada a volatilidade dos retornos, os dados históricos de longo prazo são essenciais para a compreensão dos retornos dos ativos e as séries longas são necessárias não só para a minimização de erros de medição, mas também para a cobertura da mais larga banda possível de condições históricas de mercado.
Como define um otimista? Quais as suas caraterísticas? Estas evoluíram ao longo do tempo?
O título do livro resume a conclusão mais marcante da nossa investigação. Ao longo do Séc. XX, aqueles que assumiram o risco e, com otimismo, investiram em ações conseguiram muito melhores retornos do que os seus homólogos mais conservadores que mantiveram obrigações de governos mais "seguras". No longo prazo, os otimistas triunfaram: as ações bateram a inflação; as ações bateram o dinheiro; e as ações bateram as obrigações soberanas de longo prazo. Não apenas no UK e nos US, mas em todo o lado.
Os Professores Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton estudaram os retornos dos mercados financeiros ao longo dos últimos 117 anos. Quais foram as maiores alterações verificadas na composição dos principais mercados financeiros analisados?
Em 1900 - a data de início da nossa base de dados de retornos globais - praticamente ninguém tinha conduzido um carro, feito uma chamada telefónica, utilizado luz elétrica, visto um filme ou ouvido música gravada; ninguém tinha voado num avião, ouvido rádio, visto televisão, utilizado um computador, enviado um e-mail ou utilizado um smartphone. Não existiam radiografias, scanners corporais, testes de ADN ou transplantes; ninguém tinha tomado antibióticos. Devido a isto, muitos morreriam mais jovens. A humanidade beneficiou de uma vaga de inovação transformativa com origem na Revolução Industrial, continuou ao longo da Idade de Ouro da Invenção nos finais do Séc. XIX e estende-se agora pela atual era da informação. Estas transformações criaram novas indústrias - eletricidade e geração de energia, automóveis, indústria aeroespacial, companhias aéreas, telecomunicações, petróleo e gás, farmacêuticas e biotecnologia, computadores, tecnologia de informação, media e entretenimento. Entretanto, fabricantes de carruagens e carroças puxadas a cavalo, barcas, locomotivas a vapor, velas e fósforos viram as suas indústrias a entrar em declínio. Verificaram-se enormes alterações no que é produzido, como é fabricado e na forma como as pessoas vivem e trabalham.
Estas alterações podem ser observadas na evolução do tipo de empresas cotadas nos US (ver abaixo) assim como noutros mercados. No início do Séc. XX, os mercados eram dominados por empresas ferroviárias. No UK, as empresas ferroviárias representavam quase metade do valor do mercado acionista, enquanto que nos US tinham um peso de 63%. 117 anos mais tarde, as ferroviárias caíram ao ponto da quase extinção no mercado acionista, representando menos de 1% nos US e quase zero no UK.
Das empresas americanas cotadas em 1900, mais de 80% do seu valor estava em indústrias que atualmente são pequenas ou extintas; o número no UK é de 65%. Para além das ferroviárias, outras indústrias que sofreram declínios vertiginosos foram, os têxteis, ferro, carvão e aço. Estas indústrias ainda existem, mas foram transferidas para locais mais baratos, em países emergentes. No entanto, as semelhanças entre 1900 e 2015 são também aparentes. As indústrias bancárias e de seguros continuam a ser importantes. Similarmente, as indústrias da alimentação e bebidas (incluindo álcool), tabaco e utilities estavam presentes em 1900, tal como estão hoje. E no UK, as empresas mineiras cotadas eram importantes em 1900 e continuam a sê-lo atualmente, em Londres.
Mas mesmo as indústrias que à primeira vista parecem similares sofreram alterações radicais. Comparem, por exemplo, a telegrafia em 1900 com os smartphones de 2017. Ambos são, no seu tempo, alta tecnologia. Ou contrastem os transportes em 1900 - transportes marítimos, elétricos, docas - com as suas contrapartes modernas, companhias aéreas, autocarros e camiões. Dentro do sector manufatureiro e industrial, a lista de empresas de 1900 incluía o então maior fabricante de velas do mundo assim como o maior fabricante de fósforos.
Outra estatística que se destaca é a elevada proporção das empresas atuais cujas indústrias eram pequenas ou não existentes em 1900 - 62% do valor para os US e 47% para UK. As maiores indústrias em 2017 são tecnologia (principalmente nos US), petróleo e gás, banca, saúde, o grupo das outras indústrias, minas (no UK), seguros, telecomunicações e retalho. Destas, petróleo, gás, tecnologia, saúde (incluindo farmacêuticas e biotecnologia) eram praticamente inexistentes em 1900. As telecomunicações e os media, tal como os conhecemos hoje, são também, na realidade, novas indústrias.
Como compararia as diferentes classes de ativos em termos de retorno ao longo de tão extenso período? As conclusões são semelhantes em todos os países, incluindo Portugal?
Analisamos os retornos reais anualizados de ações, obrigações e bilhetes do tesouro ao longo dos últimos 117 anos em 21 países com histórias de investimento contínuas mais o índice mundial, o índice mundial ex-US e Europa, ordenados por ordem ascendente de performance do mercado acionista. Os retornos reais das ações foram positivos em todos os locais, tipicamente a um nível de 3% a 6% por ano. As ações foram a classe de ativos com melhor performance em todo o lado. Outrossim, as obrigações bateram os bilhetes de tesouro em todos os países. Este padrão global, ações batendo obrigações e obrigações batendo bilhetes do tesouro, é o expectável no longo prazo, uma vez que as ações são mais arriscadas do que as obrigações e as obrigações mais arriscadas que os bilhetes do tesouro.
O gráfico de barras abaixo mostra que, embora na maior parte dos países as obrigações tenham um retorno real positivo, quatro países têm retornos negativos. A maioria destes países encontra-se também entre aqueles com pior performance nas ações. A sua fraca performance tem origem na primeira metade do Séc. XX e estes foram os países que mais sofreram com a devastação da guerra e com períodos de alta ou hiperinflação, tipicamente associada com as guerras e o seu rescaldo. O gráfico mostra que Portugal bate cinco mercados acionistas, ficando assim colocado na metade inferior na ordenação dos países por retornos reais ajustados para a inflação. Nos mercados obrigacionistas, Portugal bate também cinco países, caindo nos 50% centrais dos mercados obrigacionistas ordenados por retornos reais ajustados para a inflação ao longo de 117 anos.
Investimento em valor ou em crescimento?
Elroy Dimson compara os retornos de ações baratas que o mercado ignora, mas que têm potencial de subida com ações que têm uma apreciação de capital superior e cujo preço está a subir.
Ao longo dos últimos 117 anos, passámos por duas guerras mundiais e vários outros conflitos militares, uma grande depressão, duas crises petrolíferas, o crash de 87, a bolha tecnológica de 2000, a grande recessão de 2008-09 e várias recessões pelo caminho. Qual é, na sua opinião, o papel das ações na proteção da riqueza, no longo prazo, contra estes eventos e contra a erosão da inflação?
As ações são um armazém de valor. As fortunas dos mercados individuais variaram, como ilustra o gráfico abaixo, que reporta a proporção do mercado acionista global representado anualmente pelos vários mercados acionistas nacionais.
O professor Dimson mencionou num evento recente que vivemos num mundo de baixos retornos e que assim continuaremos. Compararia este a algum período da história recente? O que poderão os investidores aprender com esta experiência e como se deverão preparar em termos de alocação de ativos para retornos futuros?
Eis uma comparação entre os retornos historicamente altos da geração baby boomer e a geração millennial e uma projeção para o futuro de longo prazo baseada nos nossos dados e análise. Olhando para o futuro, as baixas taxas de juro sinalizam um mundo em que os baixos retornos serão a norma.
Em anos recentes, temos testemunhado intervenções massivas de bancos centrais nos mercados financeiros sem consequências negativas de maior e sem inflação. O que pensa poderá acontecer aos retornos das diferentes classes de ativos quando os bancos centrais reduzirem os seus balanços?
Após subidas de taxas de juro, quase todos os ativos, em média, geram retornos inferiores. Isto é ilustrado abaixo e é descrito em maior detalhe no nosso Yearbook de 2016.
No seu estudo, identifica o valor como um fator da melhor performance das ações. Considera que os últimos anos em que este estilo de investimento teve performances inferiores são o advento de um novo paradigma ou apenas um ciclo adverso que eventualmente se inverterá?
O investimento em valor procura ações baratas que o mercado ignora, mas que oferecem o potencial de subida assim que as pessoas acordem para o seu verdadeiro valor.
O investimento em crescimento (growth) foca-se em ações que têm uma apreciação de capital superior, isto é, o preço da ação está a subir. As mais proeminentes são as ações FAANG (Facebook, Apple, Amazon, Netflix e Google (Alphabet) que estão a subir entre 23% (Google) e 53% (Apple) versus perto de 15% para o S&P500, este ano.
O investimento em valor sofreu comparado com o investimento em crescimento desde que os mercados acionistas recuperaram após a crise financeira. Isto tem sido atribuído ao dinheiro barato do QE (Quantitative Easing) e aos investidores que procuram crescimento rápido; o crescimento dos gigantes da tecnologia; fundos passivos que querem grandes posições em grandes empresas tecnológicas. No entanto, ao longo dos últimos dois anos, o crescimento e o valor têm performances muito próximas.
Paul Marsh, Mike Staunton e eu próprio analisámos o investimento em valor e outras regularidades no mercado acionista - recuando no tempo 117 anos. Analisámos a performance de longo prazo, em 23 países diferentes, de duas estratégias de seleção de ações com base no valor. A primeira estratégia é investir em ações com um elevado rácio de valor contabilístico para valor de mercado por ação (book-to-market). A segunda é investir em ações com elevadas taxas de dividendos em detrimento de ações com taxas baixas.
A série mais longa para a seleção de ações com base no book-to-market é para os US: desde o final de 1926 até ao final de 2016, as ações de valor bateram as ações de crescimento por uma margem de 3,3% anuais. Os dados para o Reino Unido, que começam em 1955, indicam um prémio ainda mais elevado. A série mais longa para a seleção de ações com base nas taxas de dividendos é para o UK: entre 1899 e 2015, as ações com taxas de dividendos mais elevadas batem as ações com taxas baixas por uma margem anual de 2,8%. Os dados para os US, que têm início em 1927, indicam um prémio ligeiramente inferior para as ações com elevados dividendos. Os dados para outros países favorecem também o investimento em valor (DMS 2016).
Se me pergunta, no entanto, se as evidências a favor do investimento em valor são claras, tenho algumas reservas. Em primeiro lugar, o prémio varia de mercado para mercado. Segundo, os intervalos durante os quais o valor é uma estratégia vencedora são episódicos; por vezes, as ações de crescimento têm melhor performance. Na realidade, historicamente, verificam-se longos períodos em que a performance relativa das estratégias de crescimento foi superior. O quadro varia conforme nos focamos no valor contabilístico, taxas de dividendo, período de amostra ou o país.
Mas historicamente, a diferença de retornos entre ações de valor e de crescimento tem sido substancial, com um prémio de cerca de 3% ao ano. A recompensa histórica do investimento em valor parece tão atrativa que devemos ter cautela na sua extrapolação. No entanto, no longo prazo, eu espero que as ações de valor vençam.
Na sua opinião, qual poderá ser o impacto nos mercados financeiros da proliferação da indexação e das estratégias passivas?
Penso que os perigos estão a ser sobrestimados. O capital está a deslocar-se de mandatos de gestão ativa para mandatos passivos. A principal questão é a menor quantidade de dinheiro gasta em comissões e advisory. Isto origina um ambiente mais desafiante para as empresas de investimento, mas oferece aos investidores mais escolha.
Hoje, quais são os principais fatores de risco para os otimistas?
A persistente subida no preço dos ativos financeiros que geram rendimento, juntamente com a sede dos investidores por estratégias orientadas para o rendimento, levantam a questão se as estratégias high-yield e high-coupon não se estarão a tornar sobrelotadas. Isto poderá afetar tanto os portfolios tradicionalmente geridos assim como os factor driven.
A minha maior preocupação, no entanto, é que demasiados investidores esperam ainda que a performance dos investimentos lhes permita manter o consumo a taxas insustentavelmente altas. Isto é um perigo para as instituições - planos de pensões e endowments - e para os investidores individuais. A maioria das pessoas não está a poupar o suficiente para as suas necessidades financeiras futuras. Precisam de consumir menos, baixar as suas aspirações financeiras e seguir o conselho de investir para o futuro.
Quem são os analistas que estão detrás das melhores ideias de investimento em Wall Street? A edição de 21 de março do "Wall Street Journal" fazia a pergunta e deixava a resposta, sob a forma de uma lista de 14 nomes que tinham em comum a proeza de se terem revelado certeiros nas recomendações de compra. Um único analista europeu figurava na lista: Hugo Roque, 32 anos, gestor de ativos da Casa de Investimentos (CI), de Braga. Hugo é um dos oito mil analistas financeiros que regularmente colocam as suas apreciações na rede SumZero, a maior comunidade mundial de partilha de análises bolsistas. O "Wall Street Journal" fez as contas e verificou que, no consolidado dos últimos 18 meses, a carteira de Hugo registara uma valorização de 46%. O seudesempenho só foi superado por três americanos. Kyle Detwiler, o vencedor, conseguiu 58%.
Sorte de principiante? No mercado de capitais sorte é a combinação de talento com oportunidade e Hugo Roque tem cara de menino, mas é já muito rodado. Após o curso na Faculdade de Economia do Porto e uma curta experiência numa empresa de software financeiro, abraçou em 2005 na CI uma carreira que estimulava a sua vocação. Estudioso, Hugo já fez dois dos três primeiros níveis do programa Chartered Financial Analyst (CFA), a certificação internacional mais cobiçada pelos gestores de investimentos.
A distinção "foi uma surpresa, não estava nada à espera", confessa Hugo. Mas,"é um estímulo para a nossa equipa e tem o mérito de incorporar também o resultado das avaliações sobre a qualidade das análises publicadas". O segredo reside "no método de investimento em valor adotado na Casa de Investimentos". Esperar que os ativos de excelência estejam a desconto no mercado, pagando um preço muito inferior ao seu valor intrínseco. "Comprar um euro por 60 cêntimos", eis o lema de Hugo. O método exige uma dose de paciência e duas de conhecimento profundo sobre as empresas para que se "compre muito valor por pouco dinheiro".
Johnson & Johnson
O caso da Johnson & Johnson é exemplar. Com vendas em máximos (50milhões euros), um balanço com pouca dívida (30% do capital próprio), um portefólio de produtos robusto e dividendos sempre a subir, a multinacional sofreu danos de imagem e da distração dos investidores. Há um ano, cotava nos 50 euros , agora está nos 63 euros (+23%). Desde a primeira recomendação da CI a J&J valorizou 49%, incluindo dividendos.
A Sonae SGPS foi a única empresa portuguesa que Hugo recomendou no SumZero, numa altura em que a sua cotação correspondia apenas à soma do valor da sua participação na Sonaecom e Sonae Sierra, como se o negócio da distribuição valesse zero. Com a valorização registada, deixou de figurar nas recomendações. A Tesco,que num só dia caiu 18% por ter desiludido os investidores com resultados mais fracos do que o esperado, foi outra aposta da casa de Braga que verificou que os seus fundamentais não tinham sido afetados.
"Acreditamos em empresas que se distinguem dos concorrentes e tenham vantagens competitivas, desde que a sua cotação revele uma grande margem de progressão", explica Hugo Roque. Pfizer, Wells Fargo, General Electric, Cisco Systems ou Bank of America são exemplos de recomendações que se revelaram certeiras e que permanecem, apesar das valorizações registadas, na carteira da CI. Na banca, Hugo compara a cotação com o valor contabilístico. No caso português, o BES é o preferido. A cotação (0,73 euros) é 62% do valor contabilístico.
Nesta fase de turbulência em que acabaram as aplicações seguras, Hugo acredita que é no mercado acionista que se encontram as melhores soluções de investimento. É preciso pesquisar, encontrar as pechinchas, antecipando os movimentos dos mercados.
Um dos critérios é identificar as grandes empresas (EDP, Tesco, Total, etc.) com um histórico de dividendos generosos que superam a rentabilidade dos depósitos bancários e das obrigações.
Decálogo de analista
Um analista financeiro "deve combinar o ceticismo de quem trabalha com uma folgada margem de segurança, com a disciplina de quem não se comove com as oscilações do mercado", adotando "uma visão persistente mas não profética". No seu decálogo de atuação, os principais mandamentos dizem que se deve conhecer o histórico da empresa, perceber bem o que ela faz, quais as vantagens e traços distintivos relativamente aos seus concorrentes, preferir empresas geridas por gente capaz e honesta, com balanços conservadores e pouca dívida e que transacionem a preço que lhe conceda uma forte margem de progressão. É essencial ter nervos de aço e controlar os impulsos para "evitar o comportamento de rebanho". É preciso ter coragem para "remar contra a maré e estar comprador num momento em que há um movimento geral de venda".
A abordagem à criação de valor não pode passar por olhar para o mercado financeiro como um jogo de sorte e azar. A presidente do CA da Casa de Investimentos explica.
O investimento em valor está na génese da criação da Casa de Investimentos, em Braga. Esta gestora de patrimónios, que investe essencialmente em acções, «é a instituição em Portugal com melhores rentabilidades», afirma a cofundadora e presidente do Conselho de Administração, Emília Vieira. Com uma equipa de oito pessoas e pouco mais de 200 clientes, tem como principal foco «criar uma filosofia de valor e orientar os clientes para o médio, longo prazo».
O que a levou a criar a Casa de Investimentos em 2010, numa altura em que o País e o mundo atravessavam uma grave crise económica e financeira?
Trabalhei cinco anos no Banco Português do Atlântico, fiz um mestrado em Finanças em Inglaterra, regressei e estive na Bolsa dois anos. Depois acabei por regressar a Inglaterra e fui dando aulas por todo o mundo ao sector financeiro, desde a União de Bancos Suíços, em Londres, Zurique e Nova Iorque, Credit Suisse, Merrill Lynch, Banco de Inglaterra. Ao longo destes anos, vi sempre que no sistema financeiro estão muito mais preocupados com os lucros das instituições, com os seus bónus, do que com os interesses dos clientes. Em 2002, foi-me pedido se alguém em Braga podia abrir uma agência de uma corretora e achei que seria uma oportunidade. O que constatámos foi que as pessoas não analisam os activos, não têm paciência para esperar uma boa oportunidade de investimento que lhes dê frutos e usam o mercado financeiro quase como um jogo de sorte e azar. Esta não pode ser a abordagem à criação de valor. Entendemos a partir de 2006 que o que fazia sentido era criar uma casa com o nosso nome, em que conseguíssemos alinhar interesses com os clientes.
Algo que não acontecia no mercado...
O grande problema é que enquanto um lado, para maximizar o resultado tem de estar sempre a comprar e a vender, o outro tem alguém que quando mais o fizer menos lucros vai ter, porque as comissões custam dinheiro. Para nós era fundamental que o modelo de negócio fosse sobre o património do cliente. Ou seja, criar uma filosofia de valor e orientar os clientes para o médio, longo prazo. As pessoas normalmente gerem o seu dinheiro focadas no curto prazo, num depósito a prazo, que vão renovando, e muitas vezes o que fazem num bom investimento são capazes de o perder em três ou quatro maus. Por isso, o que fazia sentido era ter uma casa independente de bancos em que temos imenso prazer em tornar os clientes mais ricos. No livro "Investimento em Valor", traduzido por um dos nossos administradores, e em que escrevo o prefácio, conto como se decidiu isto. Estava em Londres a fazer uma formação com um professor com quem dei aulas 14 anos pelo mundo, e ele ofereceu-me um livro do Warren Buffett, o Buffettology, que já conhecia, mas que ao ler fiquei a conhecer mais profundamente a forma como geria os activos e como fazia sentido ser dessa forma. Foi a partir daí que o Hugo Roque - co-fundador da Casa de Investimentos - foi pegando nestes livros, nos vários que depois fomos comprando, e descobriu muito mais sobre a filosofia de investimento em valor e o modelo, o método de investimento que é consistente e que há mais de oito décadas prova que cria imensa riqueza. A maior prova ou mais conhecida é Warren Buffett, mas há um conjunto de investidores extraordinários que criaram riqueza para os accionistas e os clientes e é nisto em que acreditamos. O dinheiro tem uma importância muito grande na vida. Estamos ainda a falar de um País com problemas financeiros, onde a Segurança Social se vai retirando cada vez mais e, por isso, acho que esta ideia de criar valor a prazo é extraordinária. E temos histórias muito boas com os nossos clientes. O que o investidor em valor faz é comprar activos com um grande desconto face ao seu real valor.
Investem essencialmente em acções...
Investimos essencialmente em acções, embora muitas vezes tenhamos uma parte tão relevante do património de uma família que nos é pedida uma parte do património mais alocada em obrigações. Fazemos as duas coisas. Aliás, a minha escola é a da taxa fixa, a minha tese de mestrado é na Modelização da Curva de Rendimentos, o trabalho que fiz de doutoramento foi na área de Risco de Crédito, por isso compreendemos muito bem a taxa fixa e tudo gira à volta do custo do dinheiro. Hoje, na nossa opinião, o investimento em obrigações não é uma boa alternativa de rendimento, já que para termos segurança máxima, temos rendimento de quase zero. A Casa de Investimentos está muito mais vocacionada para acções porque entendemos que são o que cria riqueza no mundo. Se reparar, grande parte dos investimentos de taxa fixa, ao longo do tempo, são corroídos pela inflação, a inflação retira-lhes o valor. Porquê? Porque quando uma instituição emite uma obrigação a 10 anos, daqui a 10 anos vai devolver exactamente o mesmo dinheiro e hoje vai pagar uma taxa de 1,5 ou 2 ou 3,5%. É claro que se for com risco elevado, então já põe em causa o capital e é para isto que nós sensibilizamos os investidores. Nós gostamos é de investir em activos que produzam rendimentos crescentes ao longo do tempo. Procuramos que nas contas dos nossos clientes haja um conjunto diversificado de acções, de grandes empresas mundiais, empresas com enormes vantagens competitivas que ano a ano conseguem aumentar os seus lucros, que ano a ano aumentam os dividendos.
Pode dar um exemplo?
Um dos maiores investimentos que fizemos nos últimos quatro anos foi na Johnson & Johnson, uma empresa que há 53 anos consecutivos aumenta o dividendo. Os últimos resultados vêm acima do esperado novamente. Tem 18 mil milhões de dólares para ir ao mercado comprar outros negócios que agora estão baratos e vão ampliar as suas vantagens. A Casa de Investimentos o que entende é que a solidez está em identificar estas máquinas de criar riqueza no mundo e comprá-las quando estão baratas.
Portanto só investem em empresas sólidas...
Só investimos em activos sólidos, acções de grandes empresas mundiais que compramos quando estão em desconto. Não quer dizer que às vezes não fiquem durante algum tempo mais baratas do que o preço pelo qual as comprámos, porque nunca acertamos no mínimo. Mas o segredo é esperar. Costumo dizer que primeiro faz-se uma análise profunda dos activos e depois é disciplina férrea, só comprar quando está barato e ter paciência para aguardar os frutos. É por isso que a Casa de Investimentos é a instituição em Portugal com melhores rentabilidades.
Tem áreas de negócio onde prefere investir, como as tecnologias ou o retalho?
Nós temos presente a diversificação sectorial, mas analisamos sobretudo as oportunidades individualmente. Gostamos de ir à pesca num oceano muito grande e gostamos sobretudo de muitas características que vemos em empresas americanas. Nós gostamos de empresas europeias e americanas, mas as europeias que são hoje excelentes empresas, muitas delas não são bons investimentos, não estão com grande desconto. Temos algumas, mas continuamos a encontrar mais valor a um preço mais baixo nos Estados Unidos.
Quem são os vossos principais clientes? Empresários?
Sim, são empresários, profissionais liberais, médicos. Estamos fisicamente em Braga, mas temos clientes um pouco por todo o país e grande parte dos contactos que nos são feitos - a Casa de Investimentos não tem comerciais - são recomendações dos nossos clientes a familiares ou amigos e tem sido esse o nosso crescimento.
Qual é o montante mínimo para ser cliente da Casa de Investimentos?
São 50 mil euros.
O segredo é esperar. Costumo dizer que primeiro faz-se uma análise profunda dos activos e depois é disciplina férrea, só comprar quando está barato e ter paciência para aguardar os frutos. É por isso que a Casa de Investimentos é a instituição em Portugal com melhores rentabilidades.
E estão a considerar alargar este leque a investidores mais pequenos?
Temos em curso com o processo de licenciamento para ser também gestora de fundos. Quando a Casa de Investimentos conseguir oferecer um fundo de investimentos à pequena poupança, à abertura de contas individuais, terá de ser aumentado o montante mínimo para um valor mais elevado. O cliente individual quer faça um reforço de 3 mil, 30 mil ou 50 mil euros na sua conta, esta vai ser ajustada e gerida individualmente, e isto também representa um custo de atenção. A partir do momento em que temos esse serviço, temos que oferecer um serviço de primeira classe. É claro que nós não o vamos poder fazer para centenas e centenas de clientes. Nesta altura temos pouco mais de 200 clientes e não iremos alargar muito mais, porque entendemos que depois se perde a qualidade do serviço. Nunca vamos querer pôr em causa a rentabilidade dos nossos clientes. Não temos interesse nenhum em ser muito grandes, temos interesse em ser a melhor gestora em Portugal, os melhores gestores de dinheiro em Portugal. Isso acho que já somos. Somos mais pequenos, ainda gerimos valores baixos, mas também é a natureza do investidor português que muitas vezes não distingue risco de volatilidade. As acções são, de facto, mais voláteis e não quer dizer que tenham mais risco do que muitas obrigações ou investimentos. O que para nós é importante é mostrar esta diferença.
O que é que considera investimentos seguros?
O investimento seguro passa por seleccionar activos sólidos. A solidez de uma empresa é que transmite a segurança, depois a rentabilidade alcança-se comprando barato. O princípio deve ser comprar um activo sólido barato. Há pouco tempo escrevi um artigo em que perguntava "Vendia a sua casa se lhe pagassem menos 30% do que vale? Por que é que o faz nas acções?". Quando estamos a falar de empresas como a Microsoft, Apple, Google ou Pfizer ou Johnson ou Nestlé, estamos a falar de activos que têm uma liquidez tão grande que no dia-a-dia é possível entrar e sair sem perdas. Esta grande liquidez, e a vantagem de poder aproveitá-la e comprar um activo com grande desconto, o investidor não a usa, tem medo. E uma parte do que fazemos é ensinar, é explicar às pessoas. Essa também foi a ideia que nos levou a traduzir o livro "Investimento em Valor". Somos pioneiros em Portugal, não há mais nenhuma instituição que verdadeiramente o faça: olhar para o dinheiro do cliente e não o "atirar" todo para o mercado ao mesmo tempo. Este é um investimento gradual que se vai fazendo à medida que se encontrem os tais activos sólidos a desconto de valor. Dito isto, eles vão ter volatilidade, mas não quer dizer que sejam mais arriscados. Risco é a probabilidade de perda permanente de capital. Volatilidade são variações que por vezes são temporárias. Não vou dizer que o investidor não tem razão para ter medo. Hoje, encontramos empresas extraordinárias a transaccionar em múltiplos que não víamos há cinco, seis anos. Hoje, o potencial da nossa carteira de investimento é de uma valorização de cerca de 80%, o que não sabemos é quanto tempo vai ser necessário para fazermos esses 80%. Mas mesmo que fosse em quatro ou cinco anos era uma rentabilidade muito boa. O que procuramos é motivar a pessoa primeiro para preservar valor. A grande questão do investimento é não perder dinheiro, por isso Warren Buffett tem uma frase que é "A primeira regra é não perder dinheiro e a segunda é não esquecer a primeira". Este deve ser o princípio do investimento seguro. O investidor em Portugal tem uma história terrível. Há dias víamos na Bloomberg o comportamento do PSI20 nos últimos 15 anos e efectivamente perdeu dois terços do seu valor... Desapareceu um conjunto de empresas de grande capitalização.
Ninguém nos ensina como é que devemos gerir o dinheiro e, hoje, a complexidade dos produtos que a banca apresenta às pessoas é de tal ordem que não consigo entender por que é que as pessoas põem uma assinatura no escuro.
Numa conferência na Faculdade de Direito de Lisboa, Jorge Tomé, antigo presidente do Banif, criticou fortemente a actuação do Banco de Portugal e da DGCom relativamente ao processo de resolução do Banif. Partilha da opinião de que o Banco de Portugal neste momento não actua como regulador do mercado?
Não é fácil resolver a crise grave que temos no sistema financeiro, não é fácil para o regulador e não é fácil até para os governantes. As pessoas devem-se lembrar que, muitas vezes, os chamados livros dos bancos não são assim tão fáceis de auditar, de supervisionar. Dito isto, não foi apenas Portugal que teve um problema grave, houve um problema grave em Inglaterra, Irlanda, e que começou nos EUA. Respondo com algo que me disseram há tempos. Visitei um empresário para lhe apresentar a Casa de Investimentos e abrir uma conta e ele disse-me: "Perdi dinheiro no BPP, e pelos vistos houve crime mas ninguém está preso. Perdi dinheiro no BES e ninguém está preso. Portanto, a senhora não tem qualquer incentivo para fazer bem ou para não deixar de fazer asneiras, portanto não vou abrir a conta. Se as pessoas estivessem presas, eu poderia abrir a conta." Ninguém nos ensina como é que devemos gerir o dinheiro e, hoje, a complexidade dos produtos que a banca apresenta às pessoas é de tal ordem que não consigo entender por que é que as pessoas põem uma assinatura no escuro. E faz muito mais confusão por estarmos num país tão pobre, onde precisávamos tanto de capital, onde precisávamos de capital estrangeiro... O que eu acho que Portugal tem de maior problema é que demora muito tempo a tomar as resoluções. Os acidentes acontecem, os problemas acontecem, mas demorar três anos, a resolver problemas que se resolviam em meses...
Têm investimento alocado em alguma empresa do PSI20?
Nesta altura temos ainda acções do Banco Português de Investimento (BPI). Quando comprámos fizemo-lo porque o vimos com um desconto enorme face ao seu valor contabilístico e achamos que o banco tem uma gestão sensata. Apesar de viver num ambiente muito difícil, economicamente adverso, achámos que a margem de segurança era tão grande - a diferença entre o valor contabilístico é uma medida muito sensata na banca, uma vez que os activos têm grande liquidez - que efectivamente o banco tinha um desconto muito grande. Hoje é nossa opinião que a última resolução do Banco de Portugal vem tornar mais difícil a vida das instituições financeiras em Portugal no que diz respeito ao financiamento. Ora uma instituição financeira trabalha muitas vezes mais com capitais alheios do que próprios, o que significa que num contexto em que o acesso ao capital lhe for encarecido - e os clientes e os institucionais internacionais não gostaram de ver a sua dívida sénior não ser paga, não gostaram desta resolução - obviamente vai criar dificuldades futuras à banca, até porque está também num contexto de taxas de juro muito baixas que se deve manter por tempo prolongado. A economia europeia está ainda numa fase muito débil de recuperação ao contrário da economia americana, que está já mais avançada e que, embora possa ser lenta, está num contexto de subida de taxas. Na Europa temos ainda as taxas muito esmagadas, temos a curva de rendimentos do mercado alemão negativa até ao sexto ano e isto diz tudo. Temos multinacionais como a Total que emite dívida com um spread de 0,65, acima da Euribor a três meses que é negativa. E isto também mostra que os investimentos em taxa fixa hoje estão extremamente condicionados e também por isso achamos que os investimentos em acções são hoje muito melhores para uma boa carteira, com boas perspectivas para o futuro de crescimento e valorização. Por isso, nesta altura, diria que mesmo este investimento no BPI é um investimento do qual estamos a ponderar sair.
Casa de Investimentos esperou quatro anos para chegar ao mercado. Será dirigida por mulheres.
Braga já tem o clube de futebol na Liga dos Campões, recebeu o primeiro hotel de cinco estrelas e torna-se a primeira cidade fora de Lisboa e do Porto a acolher uma gestora de fortunas.
A Casa de Investimentos - Gestão de Patrimónios é inaugurada para a semana, com um cariz marcadamente feminino. Emília Vieira, fundadora da loja Fincor em Braga, depois de sete anos por praças internacionais, e Cândida Rodrigues, com uma carreira de 25 anos na banca (BES; Credit Lyonnais e BBVA) surgem como as principais impulsionadoras da empresa, liderando uma equipa de seis pessoas.
Lançasr a 12ª gestora de fortunas do país no atual ambiente recessivo e na ressaca de casos dolorosos como o BPP e BPN pode afigurar-se como um ato corajoso ou aventureiro, mas o processo foi posto em marcha há quatro anos. Seria aprovado pelo Banco de Portugal no fim de 2008 e o registo na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários surgiria apenas em julho deste ano.
Este lapso de tempo "não altera em nada a filosofia e posicionamento numa atividade que é intemporal", diz Emília Vieira. O negócio "tem todas as condições para fazer sucesso porque tem uma componente de aconselhamento e não estará dependente das oscilações diárias dos mercados", acrescenta.
Cândida acredita que os valores da "confiança, proximidade, isenção e independência" serão suficientes para atrair, numa primeira fase, aforradores do triângulo Braga-Famalicão-Guimarães. Num segundo momento, a Casa de Investimentos conta formatar um fundo de investimento, seduzir pequenas poupanças e adquirir uma vocação nacional, apesar de já contra com investidores do Porto e Lisboa, entre os 60 da carteira que transita da Fincor.
A empresa nasce em Braga "porque somos todos bracarenses", explica Emília. O mercado das "fortunas ocultas", se existe, "é igual ao das outras regiões do país".
A sociedade conta com um capital de 500 mil euros e tem por meta atingir rapidamente os cem clientes, sem se preocupar demasiado com o valor da carteira sob gestão. Os promotores consideram que 25 mil euros é a base mínima, mas fortunas de milhões serão as mais cobiçadas.
"A prioridade é tornar a Casa uma referência do mercado", diz Emília Vieira. A companhia atua também, junto de empresas, na consultadoria de investimentos e com programas de formação.
Com o marido, o corretor Pedro Alves, Emília esteve no lançamento da loja Fincor mas depressa se cansou do frenesim da corretagem e de seguir os movimentos diários das cotações. Prefere a calma olímpica de Warren Buffett (com uma rentabilidade anualizada de 21,5%), investindo em "boas marcas e grandes nomes", quando os preços "estão abaixo do seu valor intrínseco". Cita empresas como a Pfizer, a Johnson & Johnson, eBay ou o Wells Fargo, o seu banco preferido.
Na base do seu modelo de avaliação há um conceito chave: moat (fosso), uma forma de medir a vantagem competitiva pelo fosso que separa a empresa dos seus concorrentes. Valorizar uma carteira "é tão simples como fazer dieta: é preciso resistir às tentações diárias e pôr em prática a receita teórica". A gestora acredita que "esta década será uma das melhores da história das bolsas mundiais".
Depois de uma passagem pelo BPA, Emília Vieira tirou o Mestrado em Finanças na Universidade de Lancaster - a sua tese sobre taxas de juro teve direito a um artigo no "Financial Times". Instalou-se em Londres e participou em programas de formação de equipas em bancos como a UBS, JP Morgan ou Paribas em várias praças mundiais.
Em “The Little Book that Still Beats the Market”, Joel Greenblatt apresenta a sua fórmula magica para ter sucesso no investimento: comprar negócios excecionais quando estão baratos.Esta abordagem requer disciplina e tempo para esperar que o mercado reconheça o seu verdadeiro valor.
“No curto prazo, o Sr. Mercado determina o preço de uma ação baseado nas suas emoções, mas no longo prazo o que realmente importa é o valor intrínseco do negócio”
No livro, “The Little Book That Builds Wealth” (2008), Pat Dorsey explica-nos o que são vantagens competitivas e porque são determinantes para ter retornos no investimento a longo prazo.
“A menos que uma empresa tenha um fosso económico que proteja o seu negócio, a concorrência depressa chegará aos seus portões e corroerá os seus lucros. Wall Street está repleta de carcaças de empresas que foram de bestiais a bestas num piscar de olhos.”
Pensamento predatório significa ser mais esperto que o problema. Quando um pensador predatório encontra um problema que não consegue resolver, ele altera o contexto do problema e transforma-o em algo que consegue resolver. Desmantela o problema num conjunto de problemas mais pequenos. Encontra o elo mais fraco. A parte do problema que consegue mudar. Essa mudança, por sua vez, altera todos os outros problemas.Dave Trott utiliza histórias reais para demonstrar como os pensadores predatórios fizeram exatamente isto. Este não é um livro teórico que destila 10 fórmulas ou receitas milagrosas. Trott conta as suas histórias e cabe ao leitor fazer o resto do trabalho, cabe ao leitor aplicar os princípios aos seus problemas. Predatory Thinking prova que não é difícil pensar ou abordar os problemas de forma diferente. O hábito de o fazer é que é difícil de entranhar.Apesar de a maior parte das histórias terem origem no mundo da publicidade, este livro é dirigido a todos aqueles que querem ou precisam de pensar fora da caixa. Todos nós.
Readers of Warren Buffett?s letters to Berkshire Hathaway shareholders have gained an enormously valuable informal education in the art of investing. Broad in scope and long on wisdom, Buffett?s letters explain his principles on sound investing, selecting managers, valuing businesses, using financial information profitably, and other vital topics for investors.This newly updated Fourth Edition includes Buffett?s latest wisdom on such topics as the financial crisis, the housing bubble, corporate governance, Berkshire Hathaway?s acquisition of Burlington Northern Santa Fe, the role of oversight in heavily regulated industries, today?s best investing opportunities, and the weaknesses of popular option valuation models.Features investing advice in plain English from one of the world?s most legendary investorsIncludes Buffett?s insights on the current financial crisis and recessionOffers new and potent insight on good corporate governance and other issues vital to executives and managersFor investors, corporate executives, managers, and Buffett fans, The Essays of Warren Buffett, Fourth Edition features the kind of wisdom on investing, finance, and leadership that can be found nowhere else.
Daniel Kahneman, psicólogo israelita galardoado com o Nobel da Economia de 2002, condensa o trabalho de toda a sua carreira neste livro.Thinking, Fast and Slow é, acima de tudo, sobre a facilidade com que, sem nos darmos conta disso, tomamos decisões pouco racionais. Ao contrário do que defende a teoria económica tradicional, o ser humano não toma sempre a decisão que melhor serve o seu interesse. Na realidade, as pessoas cometem erros sistemáticos de julgamento.Kahneman explica porquê e lança pistas para tentarmos evitar estas armadilhas mentais ou, pelo menos, conseguirmos identificá-las quando somos nelas apanhados.Em Thinking, Fast and Slow, Kahneman demonstra que não somos os paradigmas da razão que pensávamos ser.
Guy Spier estudou em Oxford e Harvard. Iniciou a sua carreira na banca de investimentos convencido que iria ter sucesso e que iria ser feliz. Desiludido com o ambiente que o rodeava, despediu-se. Vive agora na Suíça, feliz e em paz e gere milhões de dólares segundo os princípios do Investimento em Valor.Este livro conta a história de Guy Spier. Na realidade, este livro não se debruça particularmente sobre as regras do Investimento em Valor mas sim sobre o desenvolvimento do temperamento do investidor.Warren Buffett diz que não é preciso ter um QI de 160 para ter sucesso no investimento. É preciso, isso sim, ter o temperamento adequado. É essa a história de A Educação de um Investidor em Valor.
«As crises, como a da economia portuguesa, que resultam de diminuições da poupança tendem a originar recessões mais graves e recuperações mais lentas do que as crises em que o endividamento resultou de aumentos do investimento.Neste livro, Fernando Alexandre, Luís Aguiar-Conraria, Pedro Bação e Miguel Portela mostram a evolução das grandes tendências da poupança e investimento, desde a evolução dos fluxos globais de poupança até aos dados para a economia portuguesa. A sua publicação constitui um excelente contributo para a sistematização destes temas, fulcrais para a evolução económica.O retrato traçado é de um país com uma baixa taxa de poupança e excesso de endividamento, em particular no Estado e nas Empresas, o que constitui um obstáculo ao crescimento e à estabilidade financeira. Todos os agentes económicos acabaram por ter um papel na acumulação do endividamento externo que provocou a necessidade da entrada da troika e de um plano de intervenção externo. Vários fatores conduziram a esse comportamento, em particular as descidas das taxas de inflação e das taxas de juro em simultâneo a um maior acesso ao crédito.Na análise efetuada da composição do património das famílias, percebe-se uma grande concentração da riqueza na habitação e nos depósitos bancários. Apesar da riqueza financeira estar concentrada nos grupos com mais altos rendimentos, observa-se um grande conservadorismo nessas aplicações (74% dos ativos financeiros estão aplicados em depósitos à ordem e depósitos a prazo).O livro conclui com propostas de promoção da poupança, objetivo fulcral para superar os desafios que a economia nacional vai enfrentar nas próximas décadas, em especial com as alterações demográficas que se perspetivam.
Publicada em 2002, no rescaldo do crash das empresas dotcom, The New Buffettology é um guia para a filosofia de investimento de Warren Buffett, o Investimento em Valor.The New Buffettology ensina os investidores a decifrar e a utilizar a informação financeira disponível publicamente tal como Buffett o faz. Passo a passo, guia os investidores através das equações e fórmulas que Warren Buffett utiliza para determinar em que empresas investir e, mais importante, quando.Os autores Mary Buffett e David Clark exploram detalhadamente alguns dos investimentos de Warren Buffett e provam mais uma vez que o Investimento em Valor funciona: consegue rentabilidades acima da média com risco limitado
Widely respected and admired, Philip Fisher is among the most influential investors of all time. His investment philosophies, introduced almost forty years ago, are not only studied and applied by today?s financiers and investors, but are also regarded by many as gospel. This book is invaluable reading and has been since it was first published in 1958. The updated paperback retains the investment wisdom of the original edition and includes the perspectives of the author?s son Ken Fisher, an investment guru in his own right in an expanded preface and introduction."I sought out Phil Fisher after reading his Common Stocks and Uncommon Profits...A thorough understanding of the business, obtained by using Phil?s techniques...enables one to make intelligent investment commitments."Warren Buffet
A propósito deste livro, John Bogle, fundador da Vanguard, escreveu estas palavras: "Este livro mostra-nos o que correu mal com as nossas instituições financeiras e mercados. Neste apelo à ação - aos investidores que coletivamente são donos das empresas americanas - os autores sugerem passos claros para que possamos construir um mundo empresarial que sirva os nossos interesses e não os de Wall Street." Sem compromissos na crítica, mas otimistas na sua visão, Stephen Davis, Jon Lukomnik e Davis Pitt-Watson oferecem uma análise clara dos problemas do sistema financeiro e adiantam soluções práticas que podem mudar o mundo para melhor.
Qual é a taxa de retorno de longo prazo das acções e obrigações? Antes da publicação de "O Triunfo dos Optimistas", era surpreendentemente difícil responder a esta pergunta. Em pouco mais de 300 páginas, este livro fornece a resposta definitiva.Os investidores dão frequentemente demasiada importância à experiência mais recente. Nos anos 50, quem sonharia, a não ser o maior optimista, que, nos 50 anos seguintes, as acções renderiam cerca de 9% ao ano? No entanto, foi o que aconteceu nos Estados Unidos. Os optimistas triunfaram!Os autores desta obra, Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton, apresentam uma análise rigorosa e consistente dos retornos do investimento em acções, obrigações e notas do Tesouro, assim como câmbios e taxa de inflação, em dezasseis países desde o fim do Séc. XIX até ao início do séc. XXI. Esta informação é apresentada de uma forma clara e simples com mais de 130 diagramas que facilitam a comparação.Não restam quaisquer dúvidas, as acções são a classe de activos que melhor remunera o investidor no longo prazo.
Não existe ninguém mais qualificado que John Bogle, fundador e ex CEO dos fundos Vanguard, para denunciar as falhas do sistema financeiro americano e os abusos que aconteceram nos últimos anos. Zeloso defensor do pequeno investidor há mais de 50 anos, Bogle defende a restauração da integridade nas práticas da indústria financeira.Segundo Bogle, um sistema financeiro transparente e confiável é essencial ao progresso económico e social.Este livro não nos conta apenas a história de como tudo correu mal. Explica também o porquê e o que devemos fazer para corrigir o rumo. Para Bogle, a solução é o regresso a um capitalismo dos donos, isto é, o controlo das empresas deverá ser devolvido aos accionistas e retirado dos gestores com as suas stock options e remunerações obscenas.Este é um livro obrigatório para qualquer investidor, analista, legislador, regulador ou empresário.
Como pode uma empresa que nunca apresentou lucros ter uma avaliação de vários biliões de dólares? Por que razão algumas start-ups atraem investimentos milionários e outras não?Aswath Damodaran, professor de finanças e investidor experimentado, argumenta que o poder da história impulsiona o valor da empresa, acrescentando substância aos números e convencendo até os investidores mais cautelosos a correr riscos. Nos negócios, existem os contadores de histórias, que tecem narrativas irresistíveis, e os mastigadores de números, que constroem modelos e fazem contas. Ambos são essenciais para o sucesso, mas só combinando os dois, defende Damodaran, é que um negócio consegue criar e suster valor.Com o auxílio de um conjunto de casos de estudo, Narrative and Numbers descreve como os contadores de histórias podem incorporar e narrar números e como os mastigadores de números podem calcular modelos mais imaginativos e mais resistentes ao escrutínio. Damodaran analisa a origem da Uber e a forma como a narrativa desempenha um papel chave na compreensão de diferentes avaliações. Ele investiga por que o Twitter e o Facebook eram avaliados em biliões de dólares nas suas OPVs e por que um (Twitter) estagnou enquanto que o outro (Facebook) cresceu. Damodaran analisa também modelos de negócio já estabelecidos, tais como a Apple e a Amazon, para demonstrar como a história de uma empresa pode enriquecer ou constranger a sua narrativa. E, através da Vale, uma empresa mineira global, sediada no Brasil, demonstra a influência da narrativa externa e como um país, uma matéria prima ou uma moeda podem influenciar a história de uma empresa.Narrative and Numbers revela os benefícios, os desafios e as armadilhas de tecer narrativas à volta de números e como podemos melhor testar a plausibilidade de uma história.
Richard Thaler, autor de Misbehaving, foi galardoado pela Academia Real das Ciências da Suécia com o Nobel da Economia de 2017.Thaler, professor de economia na Universidade de Chicago, passou a maior parte dos últimos 40 anos a chamar a atenção para o facto de que as pessoas não se comportam como os economistas dizem que se deveriam comportar. As pessoas, ao contrário do que as teorias económicas defendem, não são racionais, não tomam sempre as melhores decisões financeiras e não agem sempre no seu melhor interesse.Este livro - Misbehaving - abre-nos a porta ao campo da economia comportamental. Robert Schiller, também galardoado com o Nobel da economia, declara, "Thaler está na vanguarda da mais importante revolução na economia dos últimos 30 anos. Neste cativante livro, Thaler apresenta os argumentos a favor da economia comportamental e explica porque ainda existe tanta resistência"Ler os livros de Richard Thaler torna-nos melhores investidores.
Por vezes um problema profundamente complexo tem uma solução enganadoramente simples. Esta é a mensagem de The Checklist Manifesto, de Atul Gawande, que explica como uma simples checklist uma lista de tarefas ou procedimentos pode reduzir dramaticamente as probabilidades de erro em situações de vida ou morte.Gawande, ele próprio um cirurgião, defende que a medicina se tornou demasiadamente sofisticada para o seu próprio bem. O volume e complexidade daquilo que agora sabemos excedeu a nossa capacidade individual de aproveitar os seus benefícios de forma correta, segura e fiável. O conhecimento salva-nos e simultaneamente oprime-nos.Gawande compila vários estudos que demonstram quedas dramáticas nas taxas de infeção morte após determinados procedimentos cirúrgicos. A causa destas quedas dramáticas? A implementação de simples checklists.Este livro pode ser resumido em três frases:As checklists protegem-nos de erros;As checklists estabelecem um padrão superior de performance;No fim de contas, uma checklist não é mais que uma ferramenta. Se não ajudar, algo está errado.As checklists podem ser aplicadas em todas áreas da atividade humana, na aviação, arquitetura e até nos investimentos.Warren Buffett e Charlie Munger utilizam uma checklist muito simples:Compreendo o negócio?É um negócio excelente (tem vantagens competitivas, altos retornos no capital, etc.)?Os gestores são capazes e honestos?O preço é atrativo?Se a alguma das questões acima respondemos não, provavelmente não devemos investir. Revisitando a história recente da bolsa portuguesa, muito valor poderia ter sido salvo se esta checklist tivesse sido aplicada.Atul Gawande foi recentemente nomeado CEO da empresa de cuidados médicos criada por Warren Buffett, Jeff Bezos e Jamie Dimon - três referências mais do que suficientes para prestar atenção ao que Gawande escreve.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de outubro, partilhamos a sugestão de António Murta, CEO da Pathena e Administrador Não-Executivo da Casa de Investimentos (Ver Nota Biográfica António Murta).Memórias de Adriano"Porquê recomendar um livro de literatura a investidores / gestores profissionais? Porque é o melhor livro que eu conheço sobre liderança. É uma quase-biografia de um homem extraordinário (o Imperador Adriano), que geriu um Império (Romano).Marguerite Yourcenar retrata, de um modo romanceado é certo, mas extraordinariamente vívido a vida de um homem, as suas escolhas e as escolhas dos homens de confiança que o haviam de rodear. É para mim o melhor livro de Marguerite Yourcenar e isso já é dizer muito quando se escreveu também A Obra ao Negro, O Tempo esse grande Escultor entre outros.Recomendação de leitura por António Murta, Managing Partner, Co-Fundador e CEO da Pathena e Administrador Não-Executivo da Casa de Investimentos.
Quando questionados acerca das tendências globais: - que percentagem da população mundial vive em pobreza extrema?- por que motivo aumenta a população mundial?- quantas meninas completam o ensino básico? - erramos sistematicamente as respostas.Erramos de uma forma tão enfática que um chimpanzé, escolhendo as respostas aleatoriamente, consegue, de forma consistente, melhores resultados que jornalistas, prémios Nobel e banqueiros.Afinal, o mundo está em muito melhor estado do que julgamos. Quando nos preocupamos com tudo a toda a hora e não adotamos uma perspetiva global baseada nos factos, perdemos a capacidade de nos concentrarmos naquilo que realmente nos ameaça.Em Factfulness, Hans Rosling, o Professor de Saúde Internacional famoso pelas suas TED Talks, oferece-nos uma explicação radical para este fenómeno e revela os dez instintos que distorcem a nossa perspetiva.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de novembro, partilhamos a sugestão de Fernando Alexandre, Professor Universitário na Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho.Enlightenment NowA percepção da maioria da população, em muitos países desenvolvidos, é que o mundo está cada vez pior e que não está no bom caminho. Não podemos ignorar as guerras que persistem, a pobreza que convive ao lado da mais absoluta riqueza ou as doenças que continuam a tornar tão difícil a vida de tantas pessoas. No entanto, contra a percepção da maioria, os factos mostram que o mundo registou um extraordinário progresso nos últimos três séculos, proporcionando mais rendimento e mais qualidade de vida a cada vez mais pessoas e reduzindo o número das que vivem em situação de pobreza, situação de guerra, expostas ao crime e insegurança ou que morrem prematuramente, para valores que, apenas há algumas décadas, eram impensáveis.Steven Pinker, professor na Universidade de Harvard, escreveu o livro Enlighenment Now como um manifesto em defesa das instituições do Iluminismo, que estiveram na origem daquele extraordinário progresso da humanidade e que estão hoje sob ataque de movimentos populistas. Estes movimentos preferem o nacionalismo ao cosmopolitismo, o autoritarismo à democracia, desvalorizam o conhecimento científico e, mais do que um futuro melhor, procuram um passado idílico, que nunca existiu.Pinker lembra que as instituições refletem formas de cooperação que as sociedades foram aperfeiçoando ao longo do tempo e que permitem que o bem universal se sobreponha aos egoísmos individuais e de grupos de interesse. Entre as regras que favorecem o progresso estão a abertura à crítica, a liberdade de expressão, a cooperação, o cosmopolitismo, os direitos humanos, o reconhecimento da falibilidade do ser humano. Entre as instituições que promovem o progresso estão a ciência, a educação, os media, os governos democráticos, as organizações internacionais e os mercados. Apresentando um manancial de dados sobre o progresso e os seus benefícios para o bem-estar da humanidade, Pinker mostra por que é que hoje, mais do que nunca, é essencial preservar as instituições que herdámos do Iluminismo. Utilizando a razão, a ciência e os princípios do humanismo será mais fácil ultrapassar os problemas que se colocam à sociedade, evitando retrocessos civilizacionais e o regresso da barbárie, que, como sabemos, está sempre à porta.Recomendação de leitura por Fernando Alexandre, Doutorado em Economia pela Universidade de Londres - Birkbeck College. Professor Associado da UMinho, consultor da área de estudos económicos da Fundação Francisco Manuel dos Santos e Presidente do Conselho de Administração da SBS Startup Braga Investimentos em Startups, SA. Foi Pró-Reitor da UMinho para a Valorização do Conhecimento e Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna no XIX Governo Constitucional. É autor e coordenador de quatro livros sobre a economia portuguesa. Prestou serviços de consultoria para entidades como a Fundação Calouste Gulbenkian, o Tribunal de Contas, o Governo português, a Associação Portuguesa de Seguradores ou a Associação Comercial do Porto.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de dezembro, partilhamos a sugestão de Luísa Anacoreta, Professora Auxiliar da Universidade Católica Portuguesa, Administradora não executiva dos CTT, Impresa e Sonaegest.Elogio da SombraO Japão é um país fascinante. Reconhecido pela sua capacidade de desenvolvimento e afirmação tecnológica, económica e, receio, também social, é para alguns difícil concebê-lo abstratamente nos conceitos tradicionais de leveza, suavidade, paz, calma e beleza. Ler o Elogio da Sombra permite deliciarmo-nos com as raízes de um país riquíssimo em história, cultura e primor estético. É um livro obrigatório para quem quer visitar o Japão, porque toda a sua visita fará muito mais sentido. Mas também essencial para quem apenas tem curiosidade sobre o país e sobre aquela cultura oriental.Mas, o Elogio da Sombra é lido com muito prazer também por aqueles que apenas querem ler quem escreve bem, e refletir sobre o que a todos um pouco interessa. Tanizaki faz-nos pensar sobre arquitetura, cosméticos, mobiliário, comida, sobre o que carateriza a evolução dos tempos, sobre contrastes entre hoje e ontem, ou amanhã e antes de ontem, sobre feio e bonito, ou atraente e repelente ou ainda sobre Ocidente e Oriente.Junichiró Tanizaki nasceu no centro de Tóquio em 1886 e fez-se o mais célebre contador de histórias do seu país. Da leitura das suas páginas vamos sentindo uma escrita suave, reveladora de uma grande sensibilidade. O tema é a estética, e portanto a beleza, mas o que se sente é uma forte nostalgia. Como se Tanizaki nos quisesse avisar que na sombra do que é belo há de estar sempre uma recordação.Confesso que procuro evitar nostalgias. Gosto do futuro e de o desenhar. Olhar para trás é perda de tempo. Mas ler Tanizaki a descrever as casas japonesas, a luz quente filtrada pelos shoji, o jogo de luz e sombra das toko no ma, e a irradiação misteriosa do papel dourado não é olhar para atrás. É ler a beleza, ler a paz, e transportarmo-nos para um espaço singular, sem dúvida penetrante e atraente.O Elogio da Sombra, sendo um ensaio sobre estética e não um romance, é um livro atípico de um dos maiores escritores japoneses. Foi escrito em 1933 mas para mim é intemporal. Deliciei-me a lê-lo. Recomendo-o a muitos e esses também se deliciam.Recomendação de leitura por Luísa Anacoreta, Doutorada em Gestão, com especialização em Contabilidade, pelo ISCTE. Professora Auxiliar da Universidade Católica Portuguesa. Administradora não executiva dos CTT, Impresa e Sonaegest. Presidente da Comissão de Auditoria dos CTT e vogal da Comissão de Auditoria da Impresa. Presidente do Conselho Fiscal do Centro Hospitalar de São João e da Sogrape. Vogal do Conselho Diretivo da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas. Membro da Comissão Executiva da Comissão de Normalização Contabilística. Árbitro fiscal no CAAD. Autora de livros e outras publicações na área contabilístico-fiscal.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de setembro, em que damos um novo cunho a esta rubrica, temos o privilégio de partilhar a sugestão do Professor António Cunha, ex-Reitor da Universidade do Minho e Presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Casa de Investimentos (Ver Nota Biográfica António Cunha).Tecnologia versus Humanidade"Vivemos tempos muito particulares, marcados por uma revolução digital que está a introduzir transformações profundas nos nossos modos de vida, de trabalho e de organização das nossas sociedades. Assistimos igualmente a uma revolução biológica, em grande parte induzida por desenvolvimentos ao nível computacional, e ao limiar de uma era que será marcada por uma interação sem precedentes entre o tecnológico e o humano.Este tempo novo é descrito e analisado por Gerd Leonhard no livro Tecnologia vs. Humanidade, editado em Portugal pela Gradiva em 2017.Assumindo e consubstanciando a ideia de que estamos a protagonizar uma revolução sem precedentes e com impactos muito maiores do que os que resultaram da invenção da máquina a vapor ou da introdução dos computadores, Leonhard descreve a natureza exponencial, combinatória e recursiva das transformações em curso, que irão alterar radicalmente as interações entre humanos e máquinas. Para alem da partilha com robôs de operações e tarefas que sempre associamos a pessoas, partilharemos conhecimento e inteligência com máquinas que, cada vez mais, tomarão decisões.Leonhard analisa igualmente, de modo muito lúcido e de fácil leitura, as implicações destes desenvolvimentos e nossos atuais conceitos civilizacionais e levanta pertinentes interrogações sobre os seus limites. De facto, a humanidade, confronta-se com a necessidade imperiosa de refletir e fazer balanços sobre o seu futuro, decidir como avançar na procura de caminhos seguros no sentido de um aparentemente irrecusável mundo novo, marcado pelo aumento da longevidade humana e pela tendencial eliminação de trabalho físico, repetitivo ou perigoso.É para este debate que o capítulo final deste livro A hora de decidir introduz sugestões importantes para uma reflexão estruturada."Recomendação de leitura por António Cunha, Professor Catedrático, ex-Reitor da Universidade do Minho e Presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Casa de Investimentos.
Até 1999, os Estados Unidos não incluíam o software nos cálculos do PIB. Em 2006, a Microsoft era a empresa mais valiosa do mundo, com uma capitalização bolsista de 250 biliões de dólares. No seu balanço, constavam 3 biliões de dólares de ativos tradicionais, pouco mais de 1% do seu valor de mercado. O valor restante era justificado pelo design de produtos, ideias geradas pelo seu programa de Investigação & Desenvolvimento (I&D), a sua marca, a cadeia de fornecimento global, estruturas internas e o capital humano criado com a formação interna.Atualmente, o PIB americano ainda não inclui investimentos em pesquisas de mercado, branding e formação - ativos intangíveis em que as empresas investem biliões todos os anos. Esta é a nova economia e a percentagem destes investimentos na economia mundial não para de crescer.O livro Capitalism without Capital: The Rise of the Intangible Economy, de Jonathan Haskel e Stian Westlake, explica as diferenças fundamentais do investimento intangível e a sua importância. Os autores começam por definir ativos intangíveis como qualquer coisa em que não podemos tocar. A grande diferença, quando comparadas com a velha economia, é que as indústrias intangíveis têm dinâmicas muito diferentes em termos de velocidade de mudança, risco e competição e estes fatores são determinantes na forma como se avaliam estes negócios.O núcleo do livro é uma explicação dos Quatro S que diferenciam os investimentos intangíveis: scalability (capacidade de escalar o negócio), sunkenness (incapacidade de recuperar os custos), spillovers (efeitos de repercussão) e sinergias.Estas quatro propriedades aliam-se para criar duas características gerais adicionais. Em primeiro lugar, há uma maior incerteza quanto ao valor do investimento intangível relativamente ao investimento tangível. A combinação de sunkenness e spillovers pode significar que o investimento não terá retorno. Em alternativa, a combinação de sinergias e escala pode levar a sucessos inesperados que criam valor para os donos dos ativos intangíveis.Em segundo lugar, os intangíveis tendem a ser contestados. Tal como os autores explicam, as pessoas e negócios frequentemente disputam quem os controla, os possui ou beneficia com eles.Capitalism without Capital descreve também a ligação entre o aumento dos intangíveis e outros desafios estagnação, desigualdades crescentes e o impacto da alteração dos padrões de investimento nas políticas públicas. O livro reforça a necessidade de atuação dos legisladores para que se ajustem as políticas económicas de forma a refletir estas novas realidades, políticas de concorrência e questões fiscais.Os autores apresentam três cenários possíveis para o que poderá ser o mundo intangível do futuro e sugerem de que forma os gestores, investidores e políticos podem explorar as características de uma era intangível para potenciar os seus negócios, portefólios e economias.Este livro não é de leitura difícil, mas interpretar as suas muitas lições pode ser um desafio um desafio altamente recomendável para quem é investidor ou se interessa por o que pode ser o futuro.
Gestão descontraída, mas Profissional é o meu primeiro livro. Não é mais um livro sobre gestão, é uma obra a pensar nas PME portuguesas. Nele, revelo muitas das práticas que estão na base do sucesso da PHC Software.Ao longo da obra, explico tudo o que gostava de ter aprendido na faculdade, mas que fui aprendendo com a experiência na prática.Este é um livro a pensar nos gestores portugueses, com exemplos práticos, baseados em conhecimento de gestão comprovado e que podem ser facilmente aplicados no tecido empresarial português.Na introdução da obra afirmo que A gestão é acima de tudo uma ciência prática que pode ser aprendida através do erro ou pela partilha de conhecimento da experiência e completo afirmando que Este é o livro que gostava de ter lido quando comecei a empresa e que evitava muitos erros que fui cometendo.Ao longo de nove capítulos, este meu livro é uma viagem de gestão para os gestores que procuram exemplos para melhorar as suas empresas e divide-se em três partes: a gestão do próprio indivíduo, a gestão da equipa e a gestão da empresa. Lembre-se que as práticas internas da gestão da empresa, agora tornadas públicas, estão na base do sucesso da PHC Software, que nasceu há trinta anos por dois amigos de faculdade e que é hoje uma multinacional que bate recordes de venda há vários anos consecutivos e que tem sido distinguida e ganho prémios pelas suas boas práticas.____Ricardo Parreira é CEO da PHC Software. Licenciado em gestão e com MBA em marketing, ambos pela Universidade Católica. Destaca-se por ser um líder que inspira boas práticas de gestão e a atitude para a felicidade no local de trabalho, características que têm permitido à PHC crescer de forma sustentável. Tem criado na PHC um ecossistema focado na best experience at work. Um conceito que procura construir empresas com pessoas mais felizes, motivadas e consequentemente mais produtivas.
No livro Only the Best Will Do, o investidor Peter Seilern revela o que é necessário para investir em empresas de qualidade incontestável (Quality Growth): empresas que retornam aos seus acionistas, de forma confiável, um crescimento sólido e estável no longo prazo.Os negócios de Quality Growth são os ativos preferenciais para os investidores que desejam investir para o longo prazo, minimizando o risco de perda permanente de capital. Segundo Seilern, tudo o que o investimento em Quality Growth exige é paciência, pensamento independente e as 10 regras de ouro - reveladas em detalhe no livro - para encontrar as melhores empresas do mundo.Tal como Warren Buffett declarou: É melhor comprar empresas excelentes a preços razoáveis do que empresas razoáveis a preços excelentes
Novas Lições de Liderança de CEO Portuguesas, de que eu e Maria Serina somos autoras, é a destilação de dez extensas e aprofundadas entrevistas com Carla Rebelo, diretora geral do Adecco Group, Carmo Sousa Machado, chairman da Abreu Advogados, Clara Raposo, presidente do ISEG, Cristina Campos, presidente do Grupo Novartis, Cristina Rodrigues, administradora delegada da Capgemini, Dulce Mota, CEO do Montepio, Marta Carvalho Araújo, CEO da Castelbel, Paula Panarra, country manager da Microsoft, Ruth Breitenfeld, vice-presidente da Cepsa, e Vera Pinto Pereira, administradora executiva do Grupo EDP. Estas 10 executivas lideram em diferentes setores de atividade (banca, tecnologia, consultoria, energia, academia, indústria, recursos humanos, advocacia e consumo) e têm percursos muito diversificados. Em entrevistas francas, partilham como chegaram aos lugares que hoje ocupam, os principais desafios que enfrentaram, as conquistas que alcançaram, os receios que sentiram, os erros que cometeram e as principais aprendizagens que fizeram. Este livro surge na senda de Lições de Liderança de CEO Portuguesas, publicado em 2016,com edição esgotada, para dar palco a outras dez mulheres que lideram importantes empresas em Portugal, com o objetivo de inspirar as novas gerações de líderes. São testemunhos muito valiosos para todas as mulheres que ambicionam construir uma carreira de sucesso. Mais do que isso, são lições de liderança úteis a homens e mulheres, porque a boa liderança não tem género. Isabel Canha, jornalista, é co-fundadora e directora da Executiva.pt, depois de perto 30 anos de jornalismo na área dos negócios, em que se inclui a direcção da revista Exame (de Setembro de 2003 a Dezembro de 2012). É autora dos livros As Mulheres Normais têm Qualquer Coisa de Excepcional; António Champalimaud Construtor de Impérios (com Filipe S. Fernandes); e Memórias de Executivas, Lições de Liderança de CEO Portuguesas, Como Chegar a Líder (coordenação), O Sucesso Não Cai do Céu e Novas Lições de Liderança de CEO Portuguesas (todos com Maria Serina). Foi organizadora licenciada da TEDxBelémWomen (em 2013) e oradora na TEDxFCT-UNL 2013 com o tema Telhado de Vidro. Será oradora na TEDxPorto, em Março de 2020. Licenciada em Direito pela Faculdade de Direito de Lisboa, tem extensa formação complementar em Gestão, Finanças, Marketing, Liderança e Jornalismo. Nos tempos livres, dança tango.
Desde a primeira edição da nossa newsletter O Investidor Inteligente, temos vindo a recomendar um livro a todos os nossos leitores. Porque entendemos que a leitura deve ser vasta e abrangente, decidimos convidar personalidades de relevo nas mais variadas áreas de atuação para cumprir com este desígnio e proporcionar, assim, um roteiro e arquivo mais vastos para a Biblioteca da Casa de Investimentos e para todos aqueles que a acompanham.Na sua edição de janeiro, interrompemos excecionalmente este "roteiro" para recuperar "The Battle For The Soul Of Capitalism", assinalando desta forma a vida do extraordinário Investidor, Fundador e ex-CEO dos Fundos Vanguard, John Bogle, que faleceu no passado dia 16.A Batalha pela Alma do CapitalismoNeste livro, publicado em 2005, ainda antes da grande crise financeira de 2008, Bogle é extremamente crítico dos gestores de grandes empresas e aponta o dedo ao sistema financeiro. Para si, a grande dispersão do capital das grandes multinacionais em bolsa faz com que não haja um dono responsável. Os investidores grandes institucionais ou particulares não assacam responsabilidades aos gestores. Os grandes institucionais que detêm grande parte das ações e na maioria dos casos são detidos por grandes bancos gerem os fundos de pensões destas grandes multinacionais e são contratados para as operações de banca de investimento, que proporcionam comissões extraordinárias. Ora, não têm liberdade para questionar as remunerações de gestores, as políticas de aquisições ou a falta de estratégia de criação de riqueza para os acionistas a longo prazo. Os pequenos investidores são estimulados a olhar para o curto prazo e as ações são papel para trocar de mãos todos os dias, permitindo elevadas comissões de transação. Os auditores, que deveriam vigiar a atividade dos gestores para minorar conflitos de interesses, são, eles próprios, contratados por aqueles que terão que avaliar.Através de inúmeros exemplos com factos concretos e nomes, Bogle escreve que assistimos a uma enorme transferência de riqueza dos acionistas para os gestores de grandes multinacionais, financeiras ou não, que pagam a si próprios compensações extravagantes. Nas instituições financeiras, esta transferência acontece, não só de acionistas, mas também de clientes para administrações e gestores. Entre 1997 e 2002, o total de comissões pagas pelos investidores norte americanos aos bancos, corretoras e fundos de investimentos excedeu os 1,275 triliões de dólares.Segundo Bogle, um sistema financeiro transparente e confiável é essencial ao progresso económico e social. Este livro não nos conta apenas a história de como tudo correu mal. Explica também o porquê e o que devemos fazer para corrigir o rumo. Aponta uma variedade de causas para se ter chegado aqui, cada uma interagindo com e reforçando as outras: a ascensão do CEO imperial; os truques da engenharia financeira no reporte de resultados; o falhanço dos nossos guardiões auditores, reguladores, gestores de investimentos e conselhos de administração que se esqueceram a quem deviam lealdade; as instituições financeiras que passaram a ser traders de ações ao invés de se comportarem como donos de ações; a hipérbole promocional de Wall Street; a vontade dos analistas em pôr de lado o seu cepticismo; a excitação frenética dos media; e, obviamente, os membros do público investidor que festejam sempre o lucro fácil. Foi esta conspiração entre todas as partes interessadas, que baixou os padrões do negócio. Conclui, que este é o capitalismo dos gestores e não o dos donos, como deveria ser.
O nosso método é muito simples: tentamos comprar negócios com bons fundamentais económicos, geridos por pessoas honestas e capazes e compramo-los a preços sensatos. É só isto que tentamos fazer.
-- Warren Buffett
Este é o ensinamento que todos os dias procuramos seguir ao serviço dos nossos clientes. Ao longo deste ano e meio a escrever quinzenalmente nestas páginas, tenho apresentado inúmeras vezes os fundamentais de alguns negócios em que temos investido. Tenho realçado a importância, primeiro, de serem negócios excecionais - por comporem retornos a taxas acima da média protegidos por vantagens competitivas duráveis - segundo, a importância de sermos disciplinados, comprando apenas quando transacionam a desconto significativo do valor justo. Terceiro, tenho referido a importância destes negócios serem geridos por gestores que se comportam como donos do capital das empresas que gerem e que ponham o interesse dos acionistas acima de tudo.
Contudo, até gestores de primeira classe terão por vezes conflitos de interesses com os acionistas, os legítimos donos das empresas. Como eliminar esses conflitos e incentivar a guarda dos interesses dos acionistas, têm sido objectivos constantes nos mais de 50 anos de carreira de Warren Buffett e tema recorrente nas suas cartas a acionistas da Berkshire.
Este não é um problema novo. Há mais de 2 séculos Adam Smith escreveu: "Sendo os administradores de tais empresas, os gestores de dinheiro alheio, mais do que do próprio, não se pode esperar que o vigiem tão ansiosamente como os sócios particulares fazem com o seu. Como os guardiões de um homem rico, muito facilmente concedem a si mesmo uma recompensa. A negligência e profusão, portanto, prevalecem sempre".
Teoria de Agência e Informação Assimétrica
Duzentos anos depois (1976), os professores Jensen e Meckling da Universidade de Rochester nos Estados Unidos, publicaram o mais conceituado artigo nesta área: "Teoria da Empresa: comportamento dos gestores, custos de agência e estrutura de propriedade". Uma grande parte deste artigo discute a relação entre o Dono do capital (acionista) e o Agente (os gestores da empresa): porque razão as partes têm conflito de interesses (porque têm interesses e objectivos diferentes e informação incompleta ou assimétrica - os gestores têm informação privilegiada pois são eles que gerem o negócio), como quantificá-los e resolvê-los.
O que procura Warren Buffett nos gestores das empresas que compra?
1. Gestores que pensam como donos das empresas que gerem, cujo principal objetivo é, ano após ano, aumentar o valor intrínseco do negócio.
2. Os gestores devem ser cândidos com os acionistas e usar de total transparência na comunicação de todos os assuntos relevantes para a empresa: a performance financeira deve ser transparente e os sucessos e erros reconhecidos.
3. É essencial que os gestores resistam àquilo a que Buffett chama de imperativo institucional. O mais importante na atuação dos gestores é a alocação do capital da empresa uma vez que, ao longo do tempo, tem um impacto enorme no valor intrínseco do negócio e por conseguinte, no valor dos acionistas.
Decidir o que fazer com os lucros que a empresa gera - seja reinvestindo no próprio negócio ou devolver o dinheiro aos acionistas (sob a forma de dividendos ou recompras de ações) - é um exercício de lógica e racionalidade. Quando uma empresa atinge o ponto em que gera mais lucros do que o que precisa para se desenvolver, surge a questão: como devem ser os lucros realocados? Se ao reinvestir a empresa conseguir produzir retornos acima do custo de capital, deve reter os lucros e reinvesti-los. Caso contrário seria uma decisão completamente irracional. Infelizmente, esta decisão é muito comum. Este é o melhor indicador para aferir a capacidade e racionalidade dos gestores. Frequentemente, os gestores anunciam planos de aquisições de outras empresas que entusiasmam os acionistas e dissuadem potenciais interessados na compra das empresas que gerem. No entanto, devemos olhar para esta estratégia de comprar crescimento, com cepticismo: são poucos os gestores que se mantêm disciplinados e fazem estas compras a preços sensatos.
É portanto claro, não conseguindo os gestores rentabilizar os lucros em excesso a taxas superiores ao custo de capital, devem devolver o dinheiro aos acionistas: ou aumentando o dividendo ou recomprando ações próprias. É desta forma que Warren Buffett gere a Berkshire: não paga dividendos porque consegue reinvestir 100% dos lucros a taxas excecionais e tem total confiança dos seus acionistas.
Quando os gestores recompram as próprias ações, e apesar do benefício para os acionistas não se ver de imediato, há dois ganhos potenciais: se as compras forem feitas quando a cotação da empresa está a desconto do valor intrínseco, os acionistas ganham na proporção desse desconto. Ainda, se os gestores comprarem as ações no mercado estão a demonstrar que estão a agir no melhor interesse dos acionistas. Este tipo de atuação atrai outros investidores que procuram empresas bem geridas. Desta forma as ações sobem e os acionistas ficam mais ricos.
"A batalha pela alma do capitalismo"
É o título do livro de John Bogle, fundador da Gestora de Fundos Vanguard. No seu livro, Bogle é extremamente crítico dos gestores de grandes empresas e aponta o dedo ao sistema financeiro. Para si, a grande dispersão do capital das grandes multinacionais em bolsa, faz com que não haja "um dono" responsável. Os investidores - grandes institucionais ou particulares - não assacam responsabilidades aos gestores. Os grandes institucionais que detêm grande parte das ações - e na maioria dos casos são detidos por grandes bancos - gerem os fundos de pensões destas grandes multinacionais e são contratados para as operações de banca de investimento, que proporcionam comissões extraordinárias. Ora, não têm "liberdade" para questionar as remunerações de gestores, as políticas de aquisições ou a falta de estratégia de criação de riqueza para os acionistas a longo prazo. Os pequenos investidores são estimulados a olhar para o curto prazo e as ações são papel para trocar de mãos todos os dias, permitindo elevadas comissões de transação. Os auditores, que deveriam vigiar a atividade dos gestores para minorar conflitos de interesses, são, eles próprios, contratados por aqueles que terão que avaliar.
Através de inúmeros exemplos com factos concretos e nomes, Bogle escreve que assistimos a uma enorme transferência de riqueza dos acionistas para os gestores de grandes multinacionais, financeiras ou não, que pagam a si próprios compensações extravagantes. Nas instituições financeiras, esta transferência acontece, não só de acionistas, mas também de clientes para administrações e gestores. Entre 1997 e 2002, o total de comissões pagas pelos investidores norte americanos aos bancos, corretoras e fundos de investimentos excedeu os 1,275 triliões de dólares.
Aponta uma variedade de causas para se ter chegado aqui, cada uma interagindo com e reforçando as outras: a ascensão do CEO imperial; os truques da engenharia financeira no reporte de resultados; o falhanço dos nossos guardiões - auditores, reguladores, gestores de investimentos e conselhos de administração - que se esqueceram a quem deviam lealdade; as instituições financeiras que passaram a ser traders de ações ao invés de se comportarem como donos de ações; a hipérbole promocional de Wall Street; a vontade dos analistas em pôr de lado o seu cepticismo; a excitação frenética dos media; e, obviamente, os membros do público investidor que festejam sempre o lucro fácil. Foi esta conspiração entre todas as partes interessadas, que baixou os padrões do negócio. Conclui, que este é o capitalismo dos gestores e não o dos donos, como deveria ser.
Podemos, na prática, avaliar os Gestores?
Apesar de ser mais difícil do que avaliar a performance financeira da empresa - pela simples razão dos seres humanos serem mais complexos do que números, Hugo Roque, Director da Gestão de Ativos da Casa de Investimentos, explica que "na seleção de excelentes negócios devemos privilegiar administrações que comunicam com clareza com o mercado, que executam o que prometem e que adotam critérios contabilísticos simples. Na estrutura de remuneração, damos relevância à existência de bónus de performance relacionados com a eficiência e rentabilidade da empresa e não com a sua dimensão. É um excelente sinal ver os gestores a comprar ações das empresas que gerem com o seu próprio dinheiro".
Cada um deve assumir as suas responsabilidades. Cabe aos donos do dinheiro, dos negócios e das empresas sentarem-se no lugar do condutor. Aos investidores cabe garantir que os gestores do seu dinheiro o fazem agindo sempre no seu melhor interesse.
Ao avaliar pessoas devemos procurar três qualidades: integridade, inteligência e energia. Se não tiverem a primeira, as outras duas serão terríveis.
-- Warren Buffett
Warren Buffett costuma dizer que é melhor gestor porque é investidor e vice versa.
The Outsiders, o livro de William Thorndike Jr, conta as histórias de oito CEO's cujo principal objetivo foi o de criar valor para os seus acionistas. De entre estes CEO's, destaco Henry Singleton, CEO da Teledyne desde 1963 até 1990. Um dólar investido na Teledyne, em 1963, valeria em 1990 mais de 180 dólares! Isto significa uma rentabilidade anual composta de 20,4%. O S&P500 conseguiu, no mesmo período, apenas 8% ao ano: o mesmo dólar investido na mesma data valeria em 1990 apenas 8 dólares.
1. O papel dos CEO's
Os CEO's precisam de fazer duas coisas bem para terem sucesso: gerir eficientemente as operações quotidianas da empresa e decidir o destino a dar ao dinheiro gerado por essas operações. A maioria dos CEO's - e os livros de gestão que eles escrevem ou lêem - concentram-se na gestão quotidiana. Os CEO's "Outsiders", pelo contrário, concentram a sua atenção na alocação de capital.
Basicamente, os CEO's têm cinco alternativas na alocação de capital:
- investir nas operações existentes,
- adquirir outros negócios,
- pagar dividendos,
- amortizar dívida ou recomprar ações próprias.
Para a angariação de capital têm três alternativas:
- cash-flow interno, gerado pelas operações da empresa
- crédito bancário ou obrigacionista ou
- emissão de ações novas.
Duas empresas com resultados operacionais semelhantes e abordagens na alocação do capital diferentes conseguirão para os seus acionistas resultados de longo prazo muito diferentes.
2. A alocação de capital é investimento
Todos os CEO's são alocadores de capital e investidores. Na realidade, esta é a responsabilidade mais importante do CEO e, apesar da sua importância, não existem cadeiras de alocação de capital nas escolas de gestão de topo. Como Warren Buffett nota, muito poucos CEO's estão preparados para esta tarefa:
"Os líderes de muitas empresas não têm qualquer habilitação na alocação de capital. A sua inadequação não é surpreendente. A maior parte dos CEO's ascende aos lugares cimeiros porque foram bem sucedidos em áreas como o marketing, produção, engenharia, administração ou, frequentemente, nas políticas empresariais. Quando se tornam CEO's, têm agora que tomar decisões de alocação de capital, um desafio fundamental que nunca enfrentaram e que não é facilmente dominado. Exagerando um pouco, é como se a meta final de um talentoso músico não fosse tocar no Carnegie Hall mas sim ser nomeado presidente da Reserva Federal."
3. Receita para o Sucesso
Ao procurar CEO's de sucesso, aqueles que conseguiram, ao longo de décadas , retornos muito acima da média para os seus acionistas, talvez encontremos características especiais. No fim de contas, os CEO's convencionais raramente conseguem resultados acima da média.
Estes 8 CEO's geriam empresas em mercados em expansão e recessão, em setores tão diversos como manufaturação, media, defesa, produtos de consumo e serviços financeiros. As suas empresas eram muitos diversas quer em tamanho ou maturidade. Nenhuma beneficiava de conceitos de retalho facilmente replicáveis ou de propriedade intelectual sobre os seus concorrentes e, no entanto, conseguiram retornos bastante superiores.
É possível identificar um padrão, uma "receita" para o sucesso, que está altamente correlacionada com retornos extraordinários. Para todos eles,
- A alocação de capital é a função mais importante de um CEO.
- O que interessa, no longo prazo, é o crescimento do valor por ação, não o crescimento global ou o tamanho da empresa.
- É o cash flow, não o lucro reportado, que determina o valor de longo prazo.
- Organizações descentralizadas libertam energia empresarial e mantém custos e "rancores" baixos.
- Pensamento independente é essencial para o sucesso de longo prazo e as interações com conselheiros exteriores à empresa (Wall Street, consultores, imprensa, etc.) podem ser fonte de distrações e desperdício de tempo.
- Por vezes, o melhor investimento é a própria ação (recompras de ações próprias).
- No que diz respeito a aquisições, a paciência é uma virtude... assim como a ousadia ocasional.
A maioria dos CEO's das empresas cotadas preocupam-se em maximizar o lucro líquido trimestral reportado, o que é compreensível vistos ser este o indicador preferido dos analistas de Wall Street. Estão focados no curto prazo.
No entanto, o lucro líquido reportado pode ser significativamente distorcido por diferenças em níveis de dívida, impostos, amortizações e pelo histórico de aquisições.
Os CEO's presentes neste livro não eram visionários carismáticos nem eram dados a anúncios estratégicos grandiosos. Eram práticos e ignoravam o ruído do senso comum ao cultivar uma certa simplicidade. Isto levou a que todos eles se concentrassem no Cash Flow e não na perseguição cega dos lucros reportados - o Santo Graal de Wall Street.
Os CEO's Outsiders acreditam que a chave para a criação de valor a longo prazo é a optimização do cash flow. Esta ênfase na geração de dinheiro revela todos os aspetos de gestão da empresa - desde a forma como as aquisições são financiadas e os balanços são geridos até às medidas contabilísticas e fiscais e aos sistemas de compensação dos colaboradores.
4. Henry Singleton
Singleton era um mestre na alocação de capital. As suas decisões na navegação das diferentes alternativas de alocação de capital eram diametralmente opostas às que os seus pares estavam a tomar e tiveram um enorme impacto positivo nos retornos de longo prazo dos seus acionistas. Singleton concentrou o capital da Teledyne em aquisições seletivas e numa série de grandes recompras de ações. Singleton emitiu ações de uma forma muito limitada, preferia utilizar crédito e não pagou um único dividendo até ao final dos anos 80. Em contraste, os seus concorrentes, CEO's de outros conglomerados, seguiam uma estratégia oposta: emitiam ações ativamente para financiar a aquisição de empresas, pagavam dividendos, evitavam recompras de ações e utilizavam menos dívida. Em resumo, utilizavam um conjunto de ferramentas diferente com resultados, forçosamente, bastante diferentes.
5. Singleton e Buffett: Separados à nascença?
Muitas dos princípios de gestão que Buffett aplica na Berkshire Hathaway foram aplicados primeiro por Henry Singleton na Teledyne. Ambos têm visões muito semelhantes do seu papel:
- O CEO como Investidor. Buffett e Singleton montaram as suas empresas de forma a poderem concentra-se na alocação de capital e não nas operações quotidianas. Ambos se viam, antes de mais, como investidores , não gestores.
- Operações descentralizadas, decisões de investimento centralizadas. Ambos geriam organizações altamente descentralizadas com poucos colaboradores nas respetivas sedes e poucas, ou inexistentes, camadas entre os departamentos operacionais e os gestores de topo. Ambos eram responsáveis pelas decisões de alocação de capital das suas empresas.
- Filosofia de Investimento: ambos concentraram os seus investimentos em indústrias que conheciam bem.
- Na relação com investidores: nenhum disponibilizava "expectativas" trimestrais aos analistas financeiros ou frequentava conferências. Ambos disponibilizavam relatórios anuais informativos com pormenores detalhados de cada unidade de negócio.
- Dividendos: Teledyne não pagou um único dividendo nos primeiros 26 anos de atividade. A Berkshire nunca pagou dividendos.
- Stock Splits. Teledyne foi a ação com o preço mais alto na NYSE durante a maior parte dos anos 70 e 80. Buffett nunca fez um stock split das ações A da Berkhire Hathaway, a transaccionar a 187.000 dólares.
- Participação significativa: Buffett e Singleton eram acionistas de referência nas empresas que geriam. 13% para Singleton, mais de 30% para Buffett. Eles pensavam como donos, porque eram donos.
6. Investir como um Dono
O mercado de capitais é um local curioso porque todos os agentes participantes têm um objetivo comum - ganhar dinheiro. No entanto, poucos concordam com o caminho a seguir para o alcançar. Podemos aprender imenso com grandes investidores como Benjamin Graham, Warren Buffett ou Seth Klarman. Um dos maiores ensinamentos destes mestres do investimento é tão simples quanto importante: uma ação representa uma pequena fatia de um negócio. O mercado de capitais fornece uma forma conveniente de trocar a pequena fatia da propriedade do negócio por dinheiro. Sem o mercado de capitais, a sua propriedade do negócio não se alteraria. A facilidade de a vender seria afetada negativamente mas continuaria a ser possível, da mesma forma como é possível vender o carro ou a casa.
Infelizmente, quando investimos no mercado de capitais, somos bombardeados com distrações que nos fazem esquecer a essência do investimento em ações. Desde o rodapé da CNBC, os comentadores aparentemente omniscientes, os press releases das empresas, os gráficos das ações que ora consolidam, ora quebram para cima ou para baixo, estimativas de analistas que são batidas e ações que atingem novos máximos, e as elevadas comissões geradas pela banca a comprar e vender ativamente, tudo conspira para que a abordagem dos investidores seja sempre de curto prazo.
Ao contrário do que muita gente acredita, o mercado de capitais não é um casino. O principal papel do mercado de capitais é a alocação de capitais numa economia capitalista. O objectivo final dessa alocação de capitais é o lucro. Os negócios que adicionam valor aos seus clientes e, simultaneamente, conseguem retornos aceitáveis no capital investido deverão ser capazes de angariar capital para futura expansão; os negócios que não conseguem retornos suficientes não deverão, por conseguinte, ser capazes de angariar capital adicional.
Um mercado de capitais que funcione corretamente ajuda no processo de criação de riqueza, acelerando o crescimento das poupanças, do investimentos e do Produto Interno Bruto dos países. É um motor de criação de valor.
Se investir fosse tão simples como comprar excelentes negócios, ganhar dinheiro nos mercados de capitais seria muito mais fácil. Se fosse tão simples como comprar uma ação porque está a subir muito, mais fácil ainda. Mas a realidade é que o preço que se paga por uma acção é essencial para a determinação dos futuros retornos do investimento. A questão que os investidores devem colocar é: "Quanto vale a empresa toda?"
Para sabermos quanto vale a empresa, recorremos a diversos métodos de análise de todos os fundamentais económicos do seu negócio. Dividimos em três categorias de avaliação absoluta: a Avaliação dos Ativos, a Avaliação dos Resultados e a Avaliação do Potencial de Crescimento Sustentado.
O método de avaliação deve adequar-se, consoante os elementos de valor da empresa:
1. Avaliação dos Ativos: aplica-se a empresas com muitos ativos, rentabilidades do capital baixas, que estão presentes em sectores muito concorrenciais, de capital intensivo e a cotarem próximo do seu valor contabilístico. O seu valor advém dos ativos que possui, pelo que a análise deve recair inteiramente sobre o balanço da empresa e na aferição do valor real desses elementos. Ativos correntes como dinheiro, depósitos ou mercadorias, são normalmente considerados na avaliação a 100% (ou muito próximo) do seu valor inscrito no balanço. Ativos não correntes como máquinas, edifícios ou terrenos e também ativos intangíveis como o goodwill (conjunto de elementos não físicos adquiridos) devem receber maior escrutínio no sentido de se determinar o seu valor actual.
Somando todos os ativos da empresa e subtraindo as suas dívidas, obtemos o valor dos capitais próprios. Este valor deve comparar-se com a capitalização de mercado da empresa (o número total de ações emitidas multiplicado pelo preço a que estão a cotar) para se determinar se existe margem de segurança para o investimento. Como exemplos de negócios que se podem enquadrar neste grupo temos as empresas do ramo imobiliário, empresas industriais, e os bancos.
2. Avaliação de Resultados: aplica-se a empresas com capacidade de geração de resultados ao longo do ciclo económico, com taxas de rentabilidade razoáveis, inseridas em indústrias competitivas e sem grandes perspetivas de crescimento embora rentáveis. Nestas situações, muito provavelmente a acção cotará acima do seu valor contabilístico refletindo exatamente essa capacidade de geração de resultados, que se traduzirá em valor para os acionistas. Como estas empresas não têm perspetivas de crescimento, a sua avaliação pressupõe que os seus resultados se manterão constantes indefinidamente. Deste modo, o cálculo do valor resulta da divisão dos resultados considerados normais para a empresa por uma taxa de desconto razoável para o negócio. Negócios de margens de lucro reduzidas e enquadrados em sectores regulados, como o sector da energia ou telecomunicações, podem avaliar-se recorrendo a este método.
3. Avaliação do Potencial de Crescimento Sustentado: aplica-se a empresas com boas taxas de rentabilidade dos seus capitais investidos, que são consistentemente superiores ao custo médio ponderado dos capitais e que tenham boas perspetivas de crescimento futuro de resultados. O método natural para avaliação deste género de empresas é o conhecido modelo dos cash flows (fluxos de caixa) descontados: partindo da previsão dos cash flows futuros do negócio e assumindo determinadas taxas de crescimento e outros pressupostos de eficiência operacional, descontam-se esses valores para o momento atual utilizando uma taxa de desconto conservadora para o negócio. Este modelo é mais sujeito à sensibilidade das estimativas, pelo que é importante salientar que deve apenas ser aplicado na análise de empresas que evidenciem grande previsibilidade de geração de resultados. Normalmente, aplica-se a negócios que tenham vantagens competitivas duradouras e que nos permitem projetar rendimentos futuros com elevado grau de certeza.
Como exemplos de sectores onde será mais fácil encontrar-se negócios com vantagens competitivas duráveis temos o sector de bens de consumo não duráveis, de cuidados de saúde ou de software.
Métodos Comparativos- Avaliação Relativa.
Independentemente do sector em que a empresa opera, podem ainda usar-se métodos comparativos de avaliação. O valor da empresa é calculado usando um múltiplo que pode ser uma média do setor em que a empresa se insere ou uma média histórica da empresa.
Price Earnings Ratio (PER) - Um dos múltiplos mais utilizados é o rácio Preço/Lucros (PER), que se obtém dividindo a cotação da ação pelo resultado líquido por ação do último ano. Este rácio evidencia a relação do preço da ação com os lucros que a empresa gera. A título de exemplo, um rácio de 15, admitindo que os resultados da empresa serão constantes, significa que para recuperarmos o investimento feito na ação, precisamos de 15 anos. Deste modo, podemos também concluir que a rentabilidade anual do investimento (lucro anual por acção a dividir pela cotação) seria de 1/15 ou 6,67% ao ano. Quanto mais baixo este rácio, mantendo tudo o resto constante, mais barata se encontrará a ação.
Price to Book Ratio (PB) - outro rácio de análise bastante utilizado é o Preço/Valor Contabilístico (PB), ou seja, a cotação da ação a dividir pelo valor contabilístico da empresa por ação. O valor contabilístico de uma empresa traduz o valor dos seus capitais próprios, ou seja, a soma de todos os seus ativos subtraindo a totalidade das dívidas.
No entanto, estes são métodos muito simplistas que, procurando chegar a um valor por comparação, estão sujeitos a erros, nomeadamente da amostra comparativa. Se um sector em determinado momento se encontra sobreavaliado, a avaliação usando os métodos comparativos resultará num valor também elevado. Da mesma forma, o múltiplo histórico de uma empresa pode não ser o melhor guia de valor futuro, pois as condições de mercado, do setor ou da própria empresa podem ser diferentes.
Todo o investidor, tendo presente o objetivo da preservação do capital, deve procurar em todos os seus investimentos, uma diferença razoável entre o valor que atribui ao negócio e o preço a que o pode adquirir, de forma a proteger-se caso ocorra algum acontecimento desfavorável e a potenciar o seu investimento caso a sua análise se confirme.
-- Benjamin Graham
Margem de Segurança
Para além do desconto necessário entre o preço e o valor para se fazer um investimento, no processo de análise e avaliação, pode-se e deve-se procurar outras fontes de segurança nos investimentos que permitam reforçar a robustez da margem de segurança. Deste modo, é importante:
1. Selecionar negócios com balanços saudáveis e com potencial de criação de valor. Empresas com um rácio de dívida baixo em relação aos capitais próprios estão mais protegidas contra imprevistos do negócio: recessões, litígios custosos ou desvalorizações de ativos, podem colocar uma empresa aparentemente equilibrada, numa situação de grave dificuldade de liquidez.
A qualidade dos ativos do balanço de uma empresa pode ser outra fonte de segurança do investimento. Ativos valiosos como imóveis ou terrenos bem localizados, ativos líquidos como dinheiro ou depósitos, ativos maioritariamente tangíveis e facilmente valoráveis, contribuem para termos maior certeza na qualidade do balanço da empresa.
2. A seleção de negócios em áreas dentro das nossas competências de análise permite elevar o grau de confiança da avaliação da empresa. Estruturas de negócio simples, bem definidas, com mercados e produtos claramente estabelecidos, margens consistentes e perspetivas de crescimento percetíveis facilitam e ajudam a análise. Empresas especulativas, sem ativos valiosos, com modelos de negócio complexos ou que não demonstrem ter capacidade de geração sustentada de resultados e estejam muito expostas à concorrência de mercado, devem ser colocadas de parte.
3. Procurar oportunidades de investimento em períodos de dificuldades conjunturais: uma recessão, um problema de um determinado sector de atividade ou uma dificuldade pontual de uma empresa, alteração à regulação, podem criar o clima ideal para investimentos lucrativos se nos focarmos no valor desses negócios a prazo e tendo em conta condições normais de atividade.
4. Em períodos de dificuldade, os lucros das empresas caem, as margens comprimem-se e as dívidas acumulam-se. Os rácios financeiros deterioram-se e a incerteza acerca da evolução futura do negócio intensifica-se. No entanto, assistimos muitas vezes que as consequentes correções nas cotações vão muito para lá do razoável com o mercado a reagir exageradamente às más notícias. É nestas circunstância, contudo, que o investidor conseguirá uma maior margem de segurança para o seu investimento, suportada na expectativa de uma futura melhoria do clima económico, da estabilização das condições do sector ou da resolução dos problemas específicos da empresa. Estes cenários devem ser cuidadosamente analisados, bem como a capacidade operacional e financeira da empresa em superar estas dificuldades.
Utilizar estimativas conservadoras na determinação do valor intrínseco: aquando da estimativa do valor de um negócio são necessárias considerações relativamente à evolução futura da empresa: Qual será o crescimento dos lucros da empresa nos próximos anos? A empresa manterá a sua posição competitiva? Conseguirá manter as suas margens de lucro? Necessitará de avultados investimentos para manter ou expandir o negócio? Que taxa de desconto (taxa de retorno do negócio exigida pelo acionista) que devemos utilizar para atualizar os cash flows previstos?
Todas estas questões necessitam de ser respondidas, mas o investimento fica mais protegido se forem respondidas de forma mais conservadora. Provavelmente o valor calculado para o negócio será menor nestas circunstâncias mas, por outro lado, permite maior certeza e conforto.
Todos estes fatores contribuem para a definição de uma margem de segurança forte, que será a base sustentável para uma política bem sucedida de investimentos com valor.
Há cerca de 20 anos, quando fui estudar para Inglaterra, o jornalista Peter Wise, num extenso artigo no Financial Times dedicado ao nosso país, sob o título "Portugal, the country where know who is better than knowhow", apresentava o nosso país assim mesmo: o país onde conhecer a pessoa certa (a cunha) é melhor do que ter conhecimentos (ser capaz).
O resultado está à vista de todos: de tempos a tempos lá temos nós que andar a pedir (desta vez à Troika), ir procurar emprego no estrangeiro, ser sobrecarregados com impostos que asfixiam qualquer economia e ver a falta de capacidade prosseguir caminho e comandar. Muitas instituições são chefiadas por gente incapaz, gente sem conhecimento e que destrói valor a toda a economia. É um ciclo vicioso do qual não conseguimos sair e contra o qual desistimos de lutar. Como pode o destino de um povo estar nas mãos de "tolos"?
John Hibben, antigo presidente da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, dizia que o conhecimento prepara as pessoas para os desafios da vida. Concordo completamente. O conhecimento paga dividendos e permite-nos tomar decisões mais esclarecidas, proteger melhor os nossos interesses e assumir de forma consciente e responsável as nossas obrigações.
I - "As pessoas odeiam os bancos porque são ignorantes"
Este é o título de um artigo da Bloomberg, empresa de informação económica e financeira cujos principais clientes são as instituições financeiras. Para todos nós, que nas últimas semanas assistimos à queda do Banco Espírito Santo e à maior delapidação de riqueza de accionistas, obrigacionistas e clientes da história do nosso país, este título é ofensivo e grosseiro. O artigo começa assim:
"Regulem os bancos o quanto quiserem. Multem-nos e obriguem-nos a ser mais cuidadosos que os duendes que guardam o ouro dos feiticeiros no Banco Gringott's da saga Harry Potter. Ainda assim, as pessoas desconfiarão sempre dos bancos porque não compreendem o que eles fazem".
No dia 25 de março deste ano, o Financial Times contabilizava as multas pagas pela banca ao departamento de justiça americana nos últimos dois anos : 100 mil milhões de dólares. Este valor subiu significativamente nos últimos meses. Estas somas, extraordinárias, reflectem uma mudança de atitude dos políticos perante a banca. A administração Obama e os reguladores americanos procuram contrariar a percepção geral de que os bancos foram poupados pelo seu papel na crise financeira. No dia 30 de julho, o Wall Street Journal noticiava a instalação de monitores do governo americano junto do Deutsche Bank e do Barclays Bank em Nova York, como parte de uma investigação sobre uma possível manipulação no mercado cambial, onde estes são os dois maiores players mundiais.
Apesar das multas enormes pagas pelos grandes bancos, começa a ser opinião geral que estas terão um impacto reduzido na prevenção de futuros comportamentos ilegais, dada a capacidade que estas grandes instituições têm para absorver estas penalizações. As multas começam a ser vistas pelos bancos como um "custo para fazer negócio" e são passadas para os clientes e acionistas: os acionistas perdem pelo impacto que têm nos lucros finais dos bancos. Os clientes perdem pelas comissões que pagam e pelo "lixo" que lhes é vendido. Desta forma, não se está a mudar o comportamento dos gestores da banca, que têm grandes incentivos em entrar neste tipo de ilegalidades. Os seus bónus não são afectados.
Não deve ser objectivo dos Governos fazer dinheiro multando, como têm feito, os prevaricadores. É importante que os supervisores consigam que este tipo de comportamento seja banido e que não perverta um sistema de funcionamento de mercado que deveria ser são. Afinal de contas, estes são os senhores que "guardam" o dinheiro, que financiam a economia, que fixam as taxas para os financiamento e que permitem o acesso ao dinheiro. São neles que temos que acreditar para colocar à sua guarda o que poupamos, o resultado do que investimos e que esperamos poder ter para a nossa reforma e salvaguardar a riqueza para as gerações vindouras.
Porque razão não são punidos e inibidos de actividade quem pratica estes actos? Porque não podem os aforradores e investidores confiar que as instituições fazem o seu trabalho e assumem as suas responsabilidades?
II- A literacia financeira é a capacidade das pessoas processarem informação económica e tomarem decisões informadas acerca de planeamento financeiro, acumulação de riqueza, dívida e pensões.
O conhecimento financeiro pode ser visto como um tipo de investimento em capital humano. As pessoas que conseguem "acumular" conhecimentos financeiros podem conseguir, com os seus investimentos, retornos esperados acima da média.
III- A importância económica da literacia financeira
Os mercados financeiros de todo o mundo estão cada vez mais acessíveis ao "pequeno investidor", à medida que se disseminam novos produtos e serviços financeiros, que mais tecnologia torna os mercados financeiros acessíveis em segundos a qualquer investidor, quer através de plataformas electrónicas quer através de empresas financeiras cujo principal objectivo é ganhar comissões com a compra e venda destes produtos e não, como deveria ser: investir os valores dos clientes com risco limitado e aumentar a sua riqueza a prazo.
As mudanças verificadas no sistema de segurança social e nas reformas estão a atirar cada vez mais para os trabalhadores e pensionistas as responsabilidades na poupança e investimento, enquanto que no passado, estas responsabilidades cabiam exclusivamente ao Estado e Segurança Social. Este processo de "desintermediação" obriga a que as pessoas decidam elas próprias o que poupar, onde investir e, durante a reforma, assumir a responsabilidade de gerir os seus activos para que não lhes falte nada.
Embora estes desenvolvimentos tenham vantagens, é também imposta às pessoas uma muito maior responsabilidade na poupança e investimento. Contudo, a esmagadora maioria das pessoas não está preparada para tomar estas decisões no seu melhor interesse.
As teorias microeconómicas convencionais assumem que as decisões de consumo e poupança são tomadas por indivíduos racionais e bem informados. Pressupõe ainda, que as pessoas consomem menos que os seus rendimentos em tempos de rendimentos mais elevados para poderem suportar o consumo em alturas em que o seu rendimento cai (ou seja, quando ficam desempregados ou se reformam).
Num estudo levado a cabo por duas professoras americanas publicado em março deste ano, são apresentados os resultados do trabalho que fizeram sobre a importância económica da literacia financeira, para vários países do mundo.
Estas duas professoras conceberam um teste muito básico de conhecimentos financeiros, composto por três perguntas:
1. Suponha que tem um depósito a prazo de 100 euros com uma taxa anual de 2%. Após 5 anos, quanto dinheiro teria na conta se tivesse deixado o dinheiro a render? a) Mais de 102 euros; b) Exactamente 102 Euros; c) Menos de 102 Euros; d) Não sabe; e) Recusa-se a responder.
2. Imagine que a taxa de juro do seu depósito a prazo é de 1% ao ano e a taxa de inflação é de 2% ao ano. Passado um ano, seria capaz de, com o dinheiro que tem na conta: a) Comprar mais coisas; b) Comprar as mesmas coisas; c) Comprar menos coisas; d) Não sabe; e) Recusa-se a responder.
3. Acha que a afirmação seguinte é verdadeira ou falsa? "Investir numa única acção oferece habitualmente um retorno mais seguro que investir num fundo de acções". a) Verdadeira; b) Falsa; c) Não sabe; d) Recusa-se a responder.
Estas questões foram colocadas a grupos de pessoas estatisticamente representativos em vários países. Apenas na Alemanha (53,2%) e na Suíça (50,1%) uma pequena maioria respondeu correctamente às três questões. Nos Estados Unidos, esse número baixa para 30,2%, no Japão, 27% e na Itália, 24,9%. Na Rússia, apenas 3,7% das pessoas conseguiram responder acertadamente às três perguntas.
O resultado final de 6 anos de estudos sobre esta nova área de investigação económica é que os bancos e empresas financeiras vendem produtos a inocentes que estão à sua mercê. A média das comissões dos cartões de crédito pagas pelos americanos menos informadas é 50% mais alta que a paga por aqueles com maior literacia financeira.
O artigo da Bloomberg conclui: "devido à sua ignorância financeira, as pessoas são "roubadas" pelos seus bancos; compram casas que não podem pagar com a ajuda de crédito à habitação que não conseguem amortizar; as suas poupanças são dizimadas por vendedores de penny stocks; e, do outro lado da balança, os bancos remuneram-lhes o dinheiro que têm em depósitos a prazo a taxas inferiores à inflação. O 1% rapina os 70% de iletrados financeiros, não porque são pobres, mas porque não sabem o suficiente para tomar decisões informadas.
Em março de 2012, a Casa de Investimentos traduziu e publicou um livro sobre investimento em valor. O nosso objectivo era, e é, contribuir para o esclarecimento dos investidores, para que se protejam da ganância do sistema financeiro, não subscrevam nenhum produto que não entendem e potenciem as suas poupanças para o futuro. O objectivo destes artigos é o mesmo: chamar a atenção para o risco, o rigor e a consistência que são necessárias para tomar decisões de investimento que a prazo produzam bons rendimentos.
A gestão de fortunas moderna assemelha-se, infelizmente, a uma profissão muito antiga, a alquimia, com as suas constantes promessas de transformar chumbo em ouro, tal como os gestores de dinheiro que repetidamente prometem transformar retornos baixos em retornos altos e garantidos. Isto levanta a questão: porque continuam os investidores a acreditar nas histórias que os gestores/alquimistas contam?
I - A TRISTE HISTÓRIA DE SIR ROGER TICHBORNE
Podemos aprender algo sobre a razão pela qual as pessoas caem constantemente nestas armadilhas analisando a triste história de Roger Tichborne. Tal como muitos outros jovens vitorianos, Sir Roger partiu em 1854 à aventura para a América do Sul. No Brasil, embarcou no navio Bella. Quatro dias mais tarde, os destroços do Bella deram à costa e todas as almas dadas como perdidas. Lady Tichborne, mãe de Sir Roger, recusou-se a acreditar que o seu filho falecera. Encorajada por um médium que insistia em dizer-lhe que ela não encontraria o seu filho no além, Lady Tichborne publicou diversos anúncios nos jornais oferecendo uma recompensa por qualquer informação sobre o seu filho. Cerca de dez anos após o desaparecimento de Sir Roger, Lady Tichborne foi contactada por um solicitador australiano que a informou que o seu filho estava vivo, bem de saúde, e trabalhava como talhante em Wagga Wagga. Lady Tichborne, felicíssima, enviou fundos para que o filho fosse repatriado. Aquando da sua chegada, Lady Tichborne reconheceu o homem como sendo o seu filho e estabeleceu um estipêndio anual de £1000.
Nem todos ficaram totalmente convencidos que o "candidato" a filho recém-chegado fosse, de facto, Sir Roger. É perfeitamente possível que o peso de uma pessoa se altere ao longo dos anos. Contudo, Sir Roger era fluente em grego e latim, o "candidato" não. Sir Roger tinha conhecimentos práticos de química, o recém-chegado não conseguia distinguir cloreto de sódio de carbonato de cálcio. É possível esquecer coisas aprendidas há muitos anos; talvez uma pancada na cabeça durante o naufrágio do Bella tenha resultado numa perda de memória. No entanto, é muito raro que tatuagens desapareçam espontaneamente, mesmo no sol escaldante da Austrália. Sir Roger tinha algumas, o recém-chegado não exibia nenhuma. Mais raro ainda é o fenómeno de mudança de cor dos olhos. Sir Roger tinha os olhos azuis, o candidato tinha-os castanhos.
Lady Tichborne, de alguma forma, conseguiu ignorar todas estas evidências. Só depois da sua morte é que a família conseguiu finalmente desmascarar o impostor australiano que acabou por passar dez anos na prisão por perjúrio.
A moral desta história? Nunca subestime a vontade das pessoas acreditarem na história mais fantástica, desde que ela encaixe nas suas ideias preconcebidas.
II - RETORNOS DO FUNDO MISTÉRIO VERSUS RETORNOS S&P 500
Os investidores estão constantemente em busca do Santo Graal do investimento, uma estratégia que gera bons retornos e não tem recuos de monta - algo parecido com o Fundo Mistério, retratado na imagem. Costumamos dizer que os investidores se comportam como Lady Tichborne e, nos seus anúncios revelam os seus desejos: retornos constantes e suaves, mas sempre crescentes, estar completamente investidos quando o mercado começa a subir e completamente desinvestidos quando os mercados recuam. Os gestores de dinheiro alegremente criam essas ilusões e ideias preconcebidas.
Infelizmente, o gráfico representa os retornos de um tal Bernie Madoff (investidor que operava um esquema de pirâmide e cometeu a maior fraude financeira na história dos EUA). A lição óbvia do caso Madoff é que se alguma coisa parece boa demais para ser verdade, provavelmente é. No entanto, tal como Lady Tichborne, os investidores veem aquilo em que querem acreditar.
III - MOSTRA-ME O QUE QUERO VER
Karl Popper argumentava que a única forma de testar uma hipótese era procurar as evidências que provassem que a hipótese estaria errada. Charles Darwin também procurava provas que contradissessem a sua teoria. De cada vez que encontrava um facto que parecia contradizer a sua teoria da evolução, anotava-o e tentava compreendê-lo. Esta não é, no entanto, a forma como habitualmente os seres humanos funcionam. Esta não é a forma como nos comportamos como investidores: formamos as nossas convicções e depois passamos o tempo a procurar a informação que confirma o nosso ponto de vista.
Temos o hábito de procurar apenas a informação e pontos de vista que concordam connosco: faz-nos sentir confortáveis, gostamos de ouvir quem concorda connosco e de ouvir as nossas próprias opiniões refletidas nos outros.
Existe ainda um problema adicional e que agrava este viés: quando confrontados com opiniões contrárias, temos a tendência em considerar a fonte de informação como enviesada.
IV - PRISIONEIROS DOS NOSSOS PRECONCEITOS
Embora a história da Lady Tichborne seja um caso extremo de cegueira face às evidências, encontramos com frequência casos menores. Por exemplo, a um grupo de pessoas foi pedido que lessem um conjunto, aleatoriamente selecionado, de estudos sobre a eficácia dissuasora da pena de morte (e estudos que criticavam essa eficácia). A esse grupo foi pedido também que classificassem os estudos em termos do impacto que tiveram nas suas próprias convicções sobre a pena de morte. Metade das pessoas eram a favor da pena de morte e os restantes eram contra.
Aqueles que eram já a favor da pena de morte concluíram que os estudos que apoiavam a pena de morte apresentavam bons argumentos. Concluíram também que os estudos que apresentavam argumentos contra a pena de morte tinham falhas profundas. As pessoas que tinham a posição oposta no início chegaram à conclusão exactamente oposta. Na realidade, os pontos de vista de cada participante polarizaram-se, tornando-se mais extremos do que no início da experiência.
V - A INOVAÇÃO FINANCEIRA
De tempos a tempos, a indústria financeira reclama os benefícios da inovação de produtos novos. A inovação deveria significar prosperidade, algo de excitante. Infelizmente, partilho a visão de J. K. Galbraith e Paul Volcker no que diz respeito à indústria financeira. Galbraith dizia "O mundo das finanças saúda a invenção da roda uma e outra vez, frequentemente numa versão ligeiramente mais instável." Paul Volcker, antigo secretário do tesouro americano, declarou que a única inovação financeira útil dos últimos 30 anos foi o Multibanco.
Uma das modas mais populares nos círculos do investimento atualmente é que os investidores devem ser inventivos na sua exposição ao Beta. As inovações nesta área tem uma variedade de nomes, tais como, smart beta, fatores de risco, etc. No investimento em ações testemunhámos o nascimento de várias estratégias: variância mínima, baixa volatilidade, índices fundamentais ponderados e outros. Grande parte dos "especialistas", que repetem vezes sem conta estas palavras, não sabem o seu significado e muito menos os riscos que estes produtos têm associados.
Estes nomes, siglas e frases, são o resultado do marketing da indústria financeira: palavras como premier, triunfo, premium, Valor Mais, Segurança Ativa, umas quantas palavras em inglês para parecer inteligente, sofisticado e seguro. Conseguem criar a ilusão aos investidores de segurança, qualidade, exclusividade, inteligência e bons retornos.
Na passada segunda-feira, um estudo da PROTESTE INVESTE, publicado pelo Jornal de Negócios, apresenta dados arrasadores sobre produtos financeiros complexos comercializados pela banca. Desde rendimento nulo em 70% destes produtos, à criação da ilusão por parte das instituições bancárias, são apresentados argumentos suficientes para que este tipo de investimento não seja considerado pelos investidores.
V - "MATAR" A EMPRESA
O que podemos fazer então para defender os nossos investimentos desta tendência insidiosa de procurar apenas informação que concorde connosco? A resposta óbvia é que precisamos de aprender a procurar informação que prove que a nossa análise está errada.
No entanto, tal como acontece com a maioria dos vieses comportamentais que tanto nos condicionam como investidores, embora a resposta seja relativamente óbvia, a implementação da solução é muito mais difícil.
Bruce Berkowitz, famoso investidor em valor, destaca-se no esforço que dedica na tentativa de se proteger dos perigos do viés confirmatório: em vez de procurar a informação que defenda um investimento, Berkowitz tenta "matar" a empresa: "analisamos as empresas, contamos o dinheiro e tentamos matar a empresa. Tentamos imaginar o que poderá correr mal com a empresa - uma recessão, taxas de juro exageradas, um ataque terrorista, etc. Tentamos matar as nossas ideias de todas as maneiras possíveis. Se não o conseguirmos, talvez tenhamos uma boa oportunidade de investimento. Se investirmos em empresas preparadas para tempos difíceis, especialmente se tiverem gestores adequados, quase que desejamos que esses tempos difíceis surjam porque é nessa altura que se conseguem comprar os melhores negócios".
Os investidores podem aprender muito com Berkowitz: ao concentrar-se naquilo que pode correr mal, está a proteger-se e só será surpreendido pelos lucros - o que nunca é mau - e não pelas perdas.
Para os Investidores em Valor, a regra de ouro do investimento é que nenhum ativo é tão bom que possa ser comprado qualquer que seja o seu preço. A segurança com que investimos e os retornos do investimento, são o resultado da nossa disciplina e paciência em aplicar essa regra de ouro.
Infelizmente, não é isto que a esmagadora maioria dos investidores querem ouvir. Repetem vezes sem conta o mesmo erro. É evidente que o barbeiro lhes vai dizer que precisam dum corte de cabelo.
Às vezes os "investidores" estão dispostos a pagar qualquer preço para entrarem na "festa", convencidos que conseguem sair 5 minutos antes da meia noite. Nestas alturas, os investidores sensatos estão aparentemente desfasados do que quase todos querem ouvir: comprar, comprar, comprar. A tentação de especular é quase irresistível.
Porque razão têm os investidores tanta atração pelas ações da banca? Este é um negócio muito difícil de avaliar porque envolve muitos riscos e trabalha com muitos mais capitais alheios do que próprios. Por isso, os erros são ampliados.
A Carta de Warren Buffett aos acionistas da Berkshire de 1990, a propósito da compra de 10% das ações do Banco Wells Fargo, diz o essencial:
"O negócio da Banca não é o nosso preferido. Quando os ativos são 20 vezes os capitais próprios - um rácio muito comum nesta indústria - erros que envolvam apenas uma pequena parte dos ativos podem destruir uma grande percentagem dos capitais próprios. E os erros têm sido a regra e não a exceção em muitos grandes bancos. Muitos desses erros resultaram de falhas de gestão que no ano passado descrevemos como "imperativo institucional": a tendência dos gestores para imitarem o comportamento dos seus pares, não importa o quão tolo possa ser fazê-lo. Na sua atividade de concessão de crédito, muitos banqueiros entraram num jogo de segue-o-líder com o zelo de lemingues; agora estão a partilhar o seu destino.
Uma vez que uma alavancagem de 20 para 1 magnifica os efeitos das forças e fraquezas das administrações dos bancos, não temos qualquer interesse em comprar ações de um banco mal gerido a um preço barato. Em vez disso, apenas estamos interessados em comprar bancos bem geridos a preços justos."
A- O QUE OS TORNA TÃO APETECÍVEIS PARA OS INVESTIDORES?
Os bancos ocupam um lugar invejável na economia global, são o funil no processo de formação de capital e o motor que mantém o carro a funcionar. Sem eles as empresas teriam muitas dificuldades em angariar dinheiro para expandir e os consumidores enfrentariam um obstáculo quase inultrapassável na compra de casa ou no investimento e poupança. O papel dos bancos é vital no crescimento económico de longo prazo e por essa razão a indústria bancária acompanha o crescimento mundial, independentemente do setor que mais necessita de capital.
Atendendo à sua importância na economia, quando tudo corre mal - e a história diz-nos que a cada 10 , 15 anos a banca tem uma grave crise - os governos e os bancos centrais vêm em sua ajuda. Nenhum outro setor goza deste subsídio para a sua atividade.
O modelo de negócio é simples: os bancos recebem dinheiro dos depositantes e mercados de capital e emprestam-no, lucrando com a diferença entre o que pagam pelos depósitos e o que recebem dos financiamentos que fazem: esta diferença é o spread ou juro líquido. Para além disso, ganham dinheiro com comissões e outros serviços, o chamado rendimento não juros. Somando os rendimentos de juros líquido e o rendimento não juros, obtemos as receitas líquidas. Este é o modelo de negócio da banca, a visão global dos seus rendimentos.
B - AS VANTAGENS COMPETITIVAS
Os bancos têm inúmeras vantagens competitivas.
1. A natureza de capital intensivo dos bancos dissuade novos concorrentes,
2. Acesso a liquidez mais barata junto dos bancos centrais. Nem os governos têm acesso a crédito mais barato,
3. Os custos de mudança dos clientes são elevados e as barreiras à saída de investimentos perdedores são limitadas. A inércia dos clientes é uma vantagem para os bancos,
4. Existem enormes economias de escala neste negócio que advêm duma rede de distribuição instalada. Esta indústria é cada vez mais concentrada, colhendo os benefícios de oligopólio.
C - OS RISCOS DA ATIVIDADE
A alma da indústria bancária está centrada na gestão do risco. Os bancos aceitam três tipos de risco:
risco de crédito - é uma componente fundamental do negócio de emprestar dinheiro. A qualidade de crédito de um banco, pode ser analisada através do seu balanço, categorias de empréstimo, tendências de crédito mal parado e taxas de crédito incobrável, assim como a filosofia de crédito da administração.
O problema é que estes e outros indicadores financeiros são históricos: dizem-nos onde o banco esteve, mas não para onde vai. Na prática, quase tudo o que sabemos da qualidade de crédito de um banco é após os factos terem acontecido. Quando os bancos têm uma cultura de crédito conservadora, o portfólio de crédito é diversificado, os processos de cobrança são agressivos e por isso, a gestão de risco é mais fácil.
risco de liquidez - os bancos oferecem serviços de gestão de liquidez de diversas formas: por exemplo, muitas empresas pagam para manter uma linha de crédito que não está a ser utilizada. Na prática o banco não está a vender mais do que uma promessa. Menos óbvio para muitos consumidores é que estão a pagar por serviços de gestão de liquidez. Não existe outro negócio no mundo em que se receba dinheiro dos clientes e se cobra para o manter. Consegue imaginar dirigir-se a uma pessoa na rua e oferecer-se para lhe guardar o dinheiro e cobrar por esse serviço? É exactamente isso que os bancos fazem. Neste sentido, o passivo na forma de depósitos são, na realidade, ativos do banco.
Os depósitos de baixo custo - depósitos à ordem - são bastante estáveis e baratos. É muito importante verificar se estão a aumentar ou a diminuir. O preço que o banco paga para atrair depósitos a prazo é muito importante na sua rentabilidade.
risco de taxas de juro - uma das principais objeções ao investimento em bancos é o facto dos seus resultados poderem ser fortemente afetados pelas taxas de juro, que estão totalmente fora do seu controlo.
O impacto das variações das taxas de juro é muitas vezes excessivamente simplificado: taxas mais altas é bom, taxas mais baixas é mau. A gestão das taxas de juro é mais complexa que isto: os bancos podem ser mais sensíveis nos seus ativos ou mais sensíveis nos seus passivos. É fundamental que o banco case maturidades, isto é, que financie empréstimos de longo prazo com dívida ou depósitos de longo prazo.
D - AS CARACTERÍSTICAS DE SUCESSO DOS BANCOS
O que devem os investidores procurar quando investem em bancos?
Porque todo o seu negócio - pontos fortes e oportunidades - é baseado em riscos, é conveniente procurar bancos com gestão conservadora, que consistentemente apresentam lucros sólidos. Os principais indicadores a procurar são:
Forte base de capital - este é o primeiro indicador a analisar antes de investir num banco. Quanto maior for o rácio capitais próprios/ativos totais, melhor.
Retorno nos capitais próprios (ROE) e retorno nos ativos (ROA) - estas são as medidas que nos permitem aferir a rentabilidade do banco. De uma forma geral, o investidor deve procurar bancos que consistentemente conseguem gerar entre 15% a 18% de retornos nos capitais próprios. Um número muito alto poderá significar provisões insuficientes para perdas na carteira de crédito. Lembre-se sempre que é muito fácil aumentar os lucros de um banco no curto prazo através de provisões insuficientes e aumento de alavancagem no balanço do banco. No longo prazo, este tipo de "contabilidade" é muito arriscada".
Infelizmente, este foi o passado recente de quase todos nesta indústria, a nível mundial. É importante ver um nível elevado de retorno nos ativos. Para os bancos, um ROA muito bom deverá situar-se entre os 1,20% e 1,40%.
Rácios de eficiência - este rácio mede os custos operacionais relativamente às receitas líquidas. Basicamente, indica a eficiência com que o banco é gerido. Valores baixos indicam que os custos são atentamente vigiados.
Margem de juro líquida - mede a rentabilidade da carteira de crédito. As margens dependem do tipo de financiamento: cartões de crédito, crédito ao consumo, crédito à habitação, crédito às empresas, etc. Os riscos são muito diferentes em cada um destes segmentos.
Receitas fortes - os bancos com melhor performance são os que consistentemente apresentam receitas crescentes e acima da média. Alguns dos bancos mais bem sucedidos tem sido capazes de vender novos produtos e serviços - o que resulta em maiores receitas de comissões - de pagar menos pelos depósitos, ou ainda, porque conseguem vender o crédito um pouco mais caro.
Valor contabilístico - uma vez que os balanços dos bancos são compostos sobretudo por activos financeiros (ativos com liquidez), o valor contabilístico é um bom indicador do valor dum banco. Assumindo que os valores dos ativos e passivos são muito próximos dos reportados pelo banco, o valor de base de um banco deverá ser o valor contabilístico. Qualquer valor acima do valor contabilístico por ação, o investidor estará a pagar pelo crescimento e lucros futuros.
Estes indicadores deverão servir como um ponto de partida na procura de ações de bancos de qualidade. A melhor defesa para os investidores é paciência e uma dose reforçada de cepticismo.
Em 2009, comprámos Wells Fargo (WFC): no artigo de 22 de dezembro desse ano, publicado no jornal Diário do Minho, e disponível no nosso site, apresentamos as razões que nos motivaram a investir em banca num contexto de mercado tão adverso. Estas ações, apesar de estarem com uma rentabilidade excecional, estão ainda nas carteiras dos nossos Clientes, por três razões:
1. Por ser uma excelente máquina de fazer dinheiro para os acionistas,
2. Apesar de não estarem baratas para as comprarmos actualmente, estão a cotar abaixo do seu valor justo,
3. Por ser gerido por administradores capazes, conservadores e honestos.
Em qualquer negócio é fundamental gente capaz, trabalhadora e honesta. Nesta actividade, a existência das duas primeiras qualidades e ausência da última, podem ser um desastre.
Não adianta correr se estivermos na estrada errada.
-- Warren Buffett
Investir com sucesso depende da disciplina pessoal do investidor e não do facto da "multidão" concordar ou não consigo. É por isso que é crucial ter uma sólida e bem fundamentada filosofia de investimento.
"Buffett diz a mesma coisa todos os anos", dizia um acionista da Berkshire que também assistia à Assembleia Geral e se queixava que não voltaria a mais nenhuma. Para nós esse é a verdadeira razão de ter uma filosofia de investimento e de sermos capazes de nos manter fieis a ela. Se fizermos o nosso trabalho de casa, se formos pacientes e ignorarmos a multidão e as suas mais recentes folias, conseguiremos bons retornos ao longo do tempo.
Ao longo de mais de cinco horas de perguntas, Warren Buffett (WB) e o seu Sócio Charlie Munger (CM), respondem para uma audiência de cerca de 38 mil accionistas presentes no CenturyLink de Omaha. Foram colocadas 62 perguntas de entre jornalistas, accionistas e analistas. Realço aqui as que nos parecem mais relevantes.
Q. Obama é o maior desmancha prazeres da economia. Outros países estão a baixar impostos e a reduzir défices. Pode convencer Obama a alterar as suas políticas?
WB. Acho que vou deixar que comunique directamente com o Presidente. Não concordo com algumas coisas que disse. As nossas opiniões políticas são muito diferentes, o senhor não me convencerá e eu não o convencerei a si. As empresas americanas estão a ter performances excepcionalmente positivas. Repare nos lucros das empresas e no gráfico dos impostos às empresas relativamente ao PIB. Os impostos às empresas baixaram de 4% para 2% do PIB enquanto que outros impostos subiram. Os retornos americanos nos activos líquidos tangíveis são a inveja de todo o mundo. Vou deixar o Charlie comentar.
CM. Vou evitar esta.
Q. A Berkshire, pela primeira vez, fez pior que o S&P500 num período de cinco anos. Vai alterar o critério de comparação?
WB. Não. Dissemos no relatório anual de 2012 que faríamos pior em bons anos e dissemos que, caso o mercado estivesse forte em 2013, a nossa sequência iria terminar. Nos últimos quarenta anos, o mercado fez melhor que 2013 apenas duas vezes. Nos melhores anos de mercado, teremos performances piores; nos anos mais fracos de mercado, faremos muito melhor. No longo prazo, continuaremos a ter melhores retornos mas não posso garanti-lo.
CM. Warren está a falar de subidas no valor contabilístico após pagar impostos de 35%. Os índices não pagam impostos. Se isto é falhanço, quero mais.
Q. A medida de uma boa administração é a sua capacidade de gerar retornos acima da média mas o tamanho da Berkshire torna isso muito mais difícil. Actualmente, qual é o custo de capital da Berkshire?
WB. Não há dúvida de que o tamanho é uma âncora à performance. Vamos tentar provar isso até ao ponto em que realmente comece a doer. É impossível ter os mesmos retornos quando a base de capital é 300 biliões de dólares. Arquimedes disse que, com uma alavanca suficientemente grande, conseguiria mover o mundo. Gostava muito de ter essa alavanca. O custo de capital é aquilo que conseguimos produzir com a nossa segunda melhor ideia. A nossa melhor idéia tem que exceder esse número. Já ouvi muitas discussões acerca do cálculo do custo de capital...
CM. Nunca ouvi uma discussão inteligente.
WB. O verdadeiro teste é que, no longo prazo, o capital que retemos produz mais que um dólar de valor de mercado. Se conseguirmos investir biliões e adicionar valor à Berkshire que ultrapasse o seu custo, continuaremos a fazê-lo. Vamos investir cerca de 3 biliões numa empresa canadiana e vamos ficar melhor e esse foi o melhor investimento para os 3 biliões nesse dia.
CM. A expressão "custo de capital" é uma que não utilizamos. A definição de Warren - adicionar mais em valor de mercado do que se investe - nunca será utilizada nas escolas de finanças. É simples: nós estamos certos; eles estão errados.
Q. A questão da sucessão de Warren Buffett já foi muitas vezes colocada. Relativamente a Charlie Munger, já foi escolhido o seu sucessor?
WB. O Charlie é o meu canário na mina. Charlie comemorou recentemente o seu 90º aniversário e acho muito encorajadora a forma como ele está a lidar com a meia idade (risos). É uma questão legítima, ninguém fala no sucessor de Charlie. Penso que, quem quer que me substitua como CEO, terá alguém com quem trabalhe de forma muito próxima. É uma excelente forma de trabalhar. A Berkshire é muito melhor porque trabalhamos juntos, não há qualquer dúvida.
CM. Não me parece que o mundo tenha muito com que se preocupar. A maior parte dos homens com 90 anos desaparecerá em breve.
WB. Falou o canário (risos).
Q. Em 2009, disse que se tivesse que investir todo o seu dinheiro numa empresa, essa empresa seria Wells Fargo. Hoje, excluindo a Berkshire, qual seria a empresa?
WB. Essa é uma excelente pergunta mas não vai ter resposta. Charlie, queres responder?
CM. Acho que a tua resposta foi perfeita.
Q. Taxas baixas levaram a uma bolha no imobiliário e, potencialmente, a uma bolha nas obrigações. Vê alguma necessidade de aumentar as taxas?
WB. Quem poderia adivinhar que as taxas se manteriam tão baixas tanto tempo? Posso dizer que fico surpreendido por as coisas estarem a correr tão bem. Este é um "filme" muito interessante, nunca o vimos e não sabemos como vai acabar. Acho que Ben Bernanke foi um herói durante e depois do crash de 2008. Quando as minutas do FED de 2007 e 2008 foram publicadas, verificámos que os membros do FED não estavam a compreender a seriedade do que se estava a passar. Bernanke, no entanto, avançou e fez um trabalho magistral.
CM. No Japão, ninguém poderia ter antecipado que as taxas ficariam tão baixas durante 20 anos e que as acções caíssem durante 20 anos. Às vezes, acontecem coisas estranhas e que confundem os economistas. Na Berkshire, não estamos a comprar obrigações de longo prazo.
WB. Dinheiro é rei, mas só se o investires. As pessoas agarram-se ao dinheiro nas alturas erradas. Taxas de juro a zero tem tido um efeito enorme na economia e no preço dos activos. Não estamos a viver uma bolha mas a situação é muito pouco habitual.
CM. É verdade, estou tão confuso como tu.
Q. Que aquisições estão na mira da Berkshire? O financiamento dessas aquisições poderá vir da venda de outras posições em acções?
WB. Poderão ser uma fonte de financiamento mas é pouco provável que as vendamos. O nosso objectivo é comprar grandes negócios. O nosso objectivo é criar capacidade de gerar lucros e adicioná-la à já existente na Berkshire. Essas oportunidades já são raras. Se a oportunidade for suficientemente grande, podemos recorrer a uma enorme reserva de títulos. Temos 40 biliões e estou disposto a investir 20 biliões. Isto pode acontecer este ano ou daqui a dez, nunca se sabe.
Q. Como determina o seu círculo de competência?
WB. É uma questão de ser realista, o que se aplica às áreas fora dos negócios. Temos sido razoavelmente bons na identificação do perímetro desse círculo. Investi mais no retalho do que em qualquer outra área; penso que é fácil pensar que entendemos o retalho. Comprei a Berkshire, o que foi uma decisão palerma mas que funcionou. Umas pessoas são melhor que outras na avaliação dos seus talentos e limitações. Alguns CEO's não fazem ideia onde começa e acaba o seu círculo de competência. A Berkshire tem gestores que sabem exactamente os seus limites e não jogam fora do círculo. A Sra. B (que vendeu a Nebraska Furniture Mart à Berkshire) não quis acções. Ela sabia exactamente o que fazer com dinheiro e imobiliário e isso fê-la chegar muito longe. Essa capacidade de saber quando as probabilidades estão a nosso favor é um grande activo. Os amigos que nos conhecem muitas vezes dizem-nos: que sabes tu desse assunto?
CM. Não me parece difícil descobrir competências. Se tens 1,6 metros de altura, não vais ser jogador de basquetebol profissional. Se tens 92 anos, não vais ser o protagonista de uma comédia romântica de Hollywood. Se pesas 125 quilos, não vais dançar no Bolshoi e se não sabes contar cartas, não compitas no poker.
WB. Estás a eliminar todos os meus objectivos! (risos)
CM. A competência é um conceito relativo. Cheguei à conclusão que tudo o que preciso de fazer é competir com idiotas e, felizmente, a oferta é enorme. Q. Como é que uma administração pode influenciar a avaliação do valor intrínseco? Que empresa teme mais? No fim de contas, a Coca-Cola tem a Pepsi.
WB. Na realidade, Ben Graham não foi muito específico no cálculo do valor intrínseco. Actualmente, equivale ao valor do negócio se fosse comprado na totalidade. Esopo foi o primeiro a definir valor: um pássaro na mão vale dois a voar. A questão é ter a certeza que estão realmente dois pássaros a voar e a que altitude. Ao calcular o valor intrínseco, Ben Graham dizia que queria dois dólares e pagar um. Fischer utilizava factores qualitativos para estimar o número de pássaros. No início da carreira, fui muito influenciado por Graham, portanto mais quantitativo, depois veio o Charlie Munger e convenceu-me a prestar mais atenção aos factores qualitativos. Se pensarmos em investir em McDonald's, calculamos o dinheiro que entra, o que sai e a que desconto conseguimos comprar. Pergunta essencial: existem ameaças? Não vejo grandes concorrentes para a Berkshire. As capitais de risco estão a comprar empresas e o crédito está barato - portanto concorrem connosco. No entanto, não vejo ninguém que tenha ou esteja a tentar construir um modelo de negócio que tente ir atrás daquilo que estamos a tentar atingir.
CM. O modelo da Berkshire tem pernas para ir muito mais além. É credível. Tem vantagens competitivas muito fortes ao contrário de outras empresas. Algumas empresas cresceram muito mas não conseguiram manter-se grandes. Penso que vamos ser como a Standard Oil (empresa petrolífera monopolista de John D. Rockefeller). As pessoas que gerem a Berkshire deixaram de ser essenciais. Jovens na audiência, não se apressem a vender as acções!
À pergunta de um acionista se a Berkshire estava a investir noutras moedas, Warren Buffett respondeu que atualmente só têm posições em dólares americanos e que a exposição a outras moedas deriva apenas das vendas que as empresas que detêm fazem noutras moedas ao venderem, em todo o mundo, os seus produtos e serviços. As respostas às perguntas sobre educação serão apresentadas no próximo artigo.
Não temos que ser mais inteligentes que os outros. Temos que ser mais disciplinados.
-- Warren Buffett
Para a maior parte dos investidores, o único momento em que se ganha dinheiro é quando se vendem as ações e se realiza o lucro. A decisão de vender frequentemente atormenta o investidor na procura do sucesso. Realizar lucros deveria ser tão admirável como manter as acções em carteira para o longo prazo. A verdade é que saber quando vender não é simples nem fácil. Cada um tem a sua opinião e um investidor pode hesitar durante um largo período de tempo e, desta forma, cometer um grave erro na gestão da sua carteira de investimentos.
Os investidores apegam-se a preços específicos com demasiada paixão. Se um investidor estabelece como preço de venda 30 euros e o preço sobe até aos 35, é mais provável que o investidor mantenha o investimento à espera de lucros adicionais, em vez de vender. O mesmo acontece quando a acção cai; alguns investidores preferem ver a acção cair quase até zero na esperança de recuperarem o que perderam.
Para nós, investidores em valor, saber quando devemos sair de uma ação é, pelo menos, tão importante quanto saber quando devemos comprar. Muitos estudos documentam que grande parte dos investidores vendem as melhores ações e mantêm as piores demasiado tempo.
CONSTRUÇÃO DE UMA CARTEIRA DE INVESTIMENTOS
Entendemos que a selecção de 20 a 25 empresas excecionais são suficientes para uma diversificação adequada. Estas empresas devem ser compradas apenas quando transaccionam no mercado a desconto do seu valor justo. Por isso, a construção da carteira de investimentos é um processo demorado, que deve ser rigoroso, muito disciplinado e que pode levar mais de um ano a concluir.
Quando avaliamos uma empresa, determinamos aquele que nos parece ser o valor intrínseco do negócio, usando critérios conservadores de avaliação. A determinação do valor intrínseco do ativo é essencial por duas razões: primeiro porque nos permite determinar a margem de segurança que precisamos para efectivar a compra - gostamos de comprar com um desconto de 40% do valor intrínseco a que chegamos na avaliação. Segundo, é um indicador do preço a que pretendemos vender. A ideia fundamental de comprar ações por menos do que valem e vendê-las quando se aproximam do seu valor real está no coração daquilo que é o investimento em valor.
A paciência é a parte mais difícil do investimento em valor. Quando descobrimos uma ação de uma empresa a transaccionar a 50% do valor da nossa estimativa do seu real valor, o nosso trabalho está praticamente concluído. A cotação da ação poderá aproximar-se do seu valor real daqui a 1 mês ou daqui a um ano. Poderá não ter uma tendência definida durante 3 ou 4 anos e entretanto quadruplicar de preço. Não há forma de saber quando uma ação irá subir. Nós não tentamos adivinhar o que o mercado irá fazer amanhã ou daqui a um ano. Procuramos centrar o nosso trabalho naquilo que sabemos fazer e podemos controlar: comprar quando está barato e vender quando está ao valor intrínseco ou caro.
A LOUCURA DAS ORDENS STOP
Alguns investidores colocam ordens stop com o objectivo de vender determinadas acções a determinado preço, habitualmente pouco abaixo do seu valor de custo. Se os preços sobem, essas ordens não são executadas. Se os preços recuam ligeiramente, presumivelmente antecipando uma queda mais acentuada, essas ordens são executadas. Embora esta estratégia aparente ser uma forma eficaz de limitar o risco de perda, é, na realidade, uma loucura. Ao invés de tirar partido das pequenas correcções o mercado para aumentar as suas posições, o investidor que utiliza estas práticas comporta-se como se o mercado soubesse melhor os méritos de um determinado investimento.
Na realidade, existe apenas uma regra válida para vender: Todos os investimentos devem ser vendidos ao preço certo.
As decisões de venda, tais como as decisões de compra, devem ter como base o valor do negócio subjacente. O momento exacto de comprar ou vender depende das alternativas que estão disponíveis. Devemos vender a posição toda ou apenas uma parte? Seria pouco inteligente manter uma posição, que transaciona a pouco menos do valor intrínseco, na esperança de ganhar um pouco mais quando abundam as pechinchas no mercado. Pelo contrário, não desejaríamos vender uma acção ( e pagar impostos sobre mais valias) se ela se mantiver subavaliada e não houver alternativas disponíveis.
QUANDO DEVEMOS VENDER?
1. Se foi cometido algum erro de avaliação
Algum pormenor escapou aquando da primeira avaliação da empresa? Talvez pensasse que os gestores iriam conseguir recuperar a empresa mas essa tarefa revelou-se mais difícil do que os gestores pensaram. Ou talvez tenha subestimado a força dos concorrentes da empresa ou sobrestimado a sua capacidade de encontrar novas oportunidades de crescimento. Não importa qual foi o erro, raramente compensa manter uma ação que comprámos por uma razão que já não é válida. Se a análise inicial estava errada, assuma as perdas e não olhe para trás.
2. Se os fundamentais económicos se deterioraram
Após vários anos de sucesso, a empresa de crescimento rápido que comprou está a abrandar. O dinheiro está a acumular-se no balanço porque a empresa está a ter dificuldades em encontrar novas oportunidades lucrativas e os concorrentes estão a comer as margens de lucro. Está na altura de reavaliar as perspetivas futuras da empresa. Se elas forem piores do que costumavam ser, é altura de vender.
3. Se a ação subiu muito acima do valor intrínseco
O "Sr. Mercado", por vezes, acorda muito bem disposto e oferece-lhe um preço muito acima do que o seu investimento realmente vale. Não há qualquer motivo porque não deve tirar partido da boa disposição dos outros investidores. Com certeza, não quererá vender empresas extraordinários só porque estão ligeiramente caras - incorrerá em impostos sobre mais valias e não tirará todo o partido do juro composto. Mas até as melhores empresas devem ser vendidas quando transacionam a preços exagerados.
4. Se existem melhores oportunidades para o seu dinheiro
Como investidor, deverá alocar o seu capital nos ativos que consigam gerar o melhor retorno. Não há vergonha em vender um investimento subavaliado - mesmo que tenha perdido dinheiro - para libertar fundos para comprar uma ação com maior potencial. Se a avaliação inicial de determinado negócio foi demasiado otimista e o seu potencial é agora muito limitado, perante nova oportunidade de investimento com maior potencial de valorização, o investidor tem boas razões para vender. Não devemos permitir que um mau investimento se perpetue numa carteira.
5. Se temos muito dinheiro na mesma ação
Esta é a melhor razão para vender porque significa que acertou e escolheu uma ação vencedora. A chave é não deixar que a ganância interfira na gestão inteligente de uma carteira de investimentos. Se um determinado investimento constituir uma percentagem muito grande da sua carteira, está na altura de pensar seriamente em vender uma parte, ainda que as perspetivas da empresa sejam as mais sólidas.
Esta técnica e conhecida como rebalanceamento da carteira de investimentos e é uma prática inteligente e saudável de gestão ativa da carteira que permite assegurar que as características da carteira hoje, vão de encontro às traçadas no momento da sua constituição. Cada ação, no início do processo de investimentos, tem um peso na carteira. Contudo, as forças de mercado fazem com que os activos subam e/ou desçam em valor. Por isso mesmo, devemos ir vendendo uma ação que subiu muito sob pena do seu peso na carteira de investimentos representar um peso excessivo na carteira e também porque a margem de segurança vai desaparecendo à medida que o ativo sobe.
Obviamente, esta técnica de rebalanceamento das carteira de investimento requer um comportamento contrário ao pensamento tradicional: devemos reduzir a posição das ações que subiram muito e comprar as posições que temos em carteira e que caíram muito; mantendo sempre o perfil de risco da carteira que traçámos, aquando do início do processo de investimento. Só assim manteremos a carteira de investimento com o perfil de risco/retorno desejado. Este tipo de atuação exige um conhecimento profundo dos investimentos, forte convicção e firmeza de carácter para não ir atrás da maioria dos investidores, que geralmente têm resultados medíocres.
Intelectualmente qualquer investidor entende que devemos comprar barato e vender caro, ou pelo menos ao preço justo. O investidor deve comprar quando as notícias são más e vender quando são boas e o ativo subiu consideravelmente. É muito simples de entender em teoria. No entanto, na prática, quando as notícias são boas tendemos a acreditar que o serão sempre e que o futuro será ainda melhor que o passado. O facto de muitos mais investidores terem agora interesse no ativo torna a decisão de venda muito mais difícil.
Atualmente, vemos muitas ações e obrigações a transacionarem acima do que valem. Vemos muitos investidores, sobretudo profissionais, sacrificarem padrões de segurança para conseguir um pouco mais de retorno. Ou seja, muitos estão hoje dispostos a comprar1 euro por 1 euro e 15 ou 1 euro e 20 cêntimos. Nós não aceitamos estas ofertas. Quando nos querem comprar 1 euro por 1 euro e 15 cêntimos, aproveitamos. Preferimos ter dinheiro remunerado em Depósitos a Prazo entre 1,5% ou 2% do que comprar caro. Tal como diz o ditado, vender é quando nos procuram. Em muitos casos nos mercados financeiros, hoje é altura de vender.
Como seguidores da filosofia de investimento do Senhor Warren Buffett e do seu sócio Charlie Munger e partilhando dos seus princípios de criação de riqueza para os acionistas, no nosso caso para os nossos clientes, a Casa de Investimentos esteve presente na Assembleia de Accionistas da Berkshire em Omaha, no estado do Nebraska. Este evento anual é também conhecido como o Woodstock para capitalistas.
Benvindos Acionistas da Berkshire
Ao aterrar no aeroporto de Omaha, desde a saída do avião, recolha de bagagens, lojas comerciais, saída do aeroporto, várias são as frases que desejam as Boas Vindas a todos os accionistas da Berkshire e que fazem elogios ao Senhor Warren Buffett. Estes são os 3 dias do ano mais importantes para a cidade que vê neste acontecimento anual a possibilidade de ganhar dinheiro, desde hotéis, restaurantes, estabelecimentos comerciais, taxistas, etc, que tentam aproveitar para fazer negócio com os cerca de 38.000 accionistas que eram esperados para ouvir ao vivo Warren Buffett e Charlie Munger responder às perguntas de acionistas que vêm de todo o mundo e que todos os anos repetem este ritual.
No dia 3 de maio, o número recorde de accionistas dirigiu-se ao CenturyLink Center em Omaha para ouvirem Warren Buffett falar sobre dinheiro. Os accionistas da Berkshire Hathaway podem celebrar um recorde financeiro inédito: 100 biliões de dólares em acções.
Foi o horizonte temporal de longo prazo que permitiu este feito histórico
O portfólio de acções da Berkshire ultrapassou os 100 biliões de dólares em 2013. Foi um horizonte temporal de longo prazo que abriu o caminho para este feito histórico. Totalizando já cerca de 115 biliões de dólares, o valor deste portfólio triplicou na década passada e vale 30.789 vezes (trinta mil setecentas e oitenta e nove vezes) mais do que valia em 1967.
É esta performance o motivo pelo tantos accionistas eram esperados nesta assembleia geral. Vêm ouvir horas de perguntas e, mais importante, as respostas de Buffett e do Vice-Chairman, Charlie Munger.
"Nunca estabeleci, como objectivo, um número" declara Warren Buffett. Construir um portfólio de 100 biliões é "simpático" mas "estou sempre concentrado no dia seguinte. Nunca estabeleci metas para vendas anuais ou lucros ou taxas de penetração no mercado".
O valor crescente do portfólio das acções detidas pela Berkshire, 33% no último ano, é o resultado, não só das subidas do preço de mercado das acções mas é também resultado da subida dos lucros - mais de um bilião de dólares por mês - das mais de 80 empresas detidas a 100% pela Berkshire. As seguradoras do grupo angariam também mais dinheiro disponível para investir. É como uma conta bancária revolving, escreveu Buffett. Sai dinheiro para pagar responsabilidades com seguros, mas entra muito mais - mais 3 biliões no ano passado - nos pagamentos dos prémios das apólices de seguro. A Berkshire detém também no seu balanço 48,9 biliões de dólares, que podem ser utilizados na compra de acções ou empresas inteiras.
"Não temos dinheiro no balanço porque gostamos"
Esta é uma frase recorrente de Buffett, "nada me faz mais infeliz do que ter dinheiro, excepto a falta de dinheiro no momento errado"."Todos os dias, ao vir trabalhar, estou a pensar no que fará mais sentido para a Berkshire. Como é óbvio, as circunstâncias alteram-se de dia para dia, os preços variam diariamente, as oportunidades mudam de dia para dia."
Buffett promete que a Berkshire terá sempre em carteira acções de negócios excelentes. Buffett chama a atenção para o facto de "no ano passado, encontrámos muitas formas de investir muito dinheiro - 1,2 biliões de dólares em IBM e 1,35 biliões em Wells Fargo". Ted Weschler e Todd Combs, gestores contratados nos últimos dois anos, ajudam a pôr o dinheiro a render; cada um gere uma carteira de 7 biliões de dólares.
Todos estes valores pertencem aos accionistas da Berkshire Hathaway. O dinheiro nos fundos de investimento, pelo contrário, pertence aos investidores que, ao mais pequeno sinal de uma queda do mercado, fogem a sete pés e retiram o seu dinheiro.
Este facto constitui, segundo Vitaly Katsenelson, conceituado investidor em valor que todos os anos marca aqui presença, uma fabulosa vantagem competitiva inerente à Berkshire.
"É capital permanente. Buffett toma decisões que vão ser boas para a Berkshire no longo prazo. Mesmo que no curto prazo, elas pareçam não resultar, esse dinheiro não vai fugir. A maior parte das boas decisões de investimento causam dor no curto prazo."
Os gestores de fundos, por outro lado, são obrigados a levar em conta as consequências de curto prazo uma vez que precisam de ter liquidez disponível para fazer face aos levantamentos de clientes. " Eles são forçados a ter horizontes de investimento curtos", diz Katsenelson, "precisam de ter boas performances em três meses, seis meses, um ano. É desta forma que são compensados porque é desta forma que o dinheiro entra e sai dos fundos."
Buffett pode tomar decisões para as próximas décadas. Se, no curto prazo, as suas decisões não produzem resultados satisfatórios, o dinheiro não lhe é "arrancado". Buffett declarou numa entrevista recente que a forte posição financeira da Berkshire lhe permite evitar a pressão de comprar ou vender algo que não quer. "Podemos fazer coisas estúpidas mas não será por termos sido obrigados a isso". Esta visão de longo prazo encaixa com a filosofia de investimento de Buffett segundo a qual devemos investir em poucas acções e concentrar as posições nas oportunidades com maior potencial de valorização.
Em 2003, o portfólio da Berkhshire era constituído por 30 biliões de dólares distribuídos por 10 empresas: American Express, Coca-Cola, Gillette, H&R Block, HCA Inc. (fornecedor de cuidados médicos), M&T Bank, Moody's, PetroChina, Washington Post e Wells Fargo. 5 biliões adicionais estavam distribuídos por algumas dúzias de negócios.
Agora, 15 empresas representam cerca de 100 biliões de dólares: American Express, Coca-Cola, Moody's e Wells Fargo continuam na lista e às quais se juntam DirecTV, Exxon Mobil, Goldman Sachs, IBM, Munich Re, Phillips 66, Procter & Gamble, Sanofi-Aventis, Tesco, U.S. Bancorp e Walmart. Os 20 biliões remanescentes estão distribuídos por cerca de 30 empresas.
"Esta é uma concentração muito pouco usual para uma carteira desta dimensão" diz Whitney Tilson, outro conceituado investidor em valor de Nova Iorque. "É difícil encontrar um portfólio desta dimensão tão concentrado", diz Tilson, "mas isto é o que Buffett tem feito durante a maior parte da sua carreira. Ele age com pouca frequência e quando o faz, fá-lo com convicção e investe grandes somas de capital. Obviamente isto só funciona quando se sabe o que se está a fazer e Buffett sabe o que está a fazer."
A vantagem do "capital permanente" da Berkshire foi amplamente demonstrada durante as quedas dos preços das acções em 2008-2009. Os preços das acções do portfólio da Berkshire caíram, assim como quase todas as outras acções. Buffett, em nenhuma altura, sentiu pressão para liquidar as suas posições, enquanto que praticamente todos os outros gestores de dinheiro estavam a liquidar ou com receio de liquidar as suas posições. Nesta altura, quando as empresas estavam a preços de saldos, muitos gestores vieram para os canais de televisão financeiros dizer "Cash is King". O futuro demonstrou que "dinheiro não era rei". Num artigo de opinião em 16 de Outubro de 2008 que escreveu no New York Times, Warren Buffett veio incentivar os americanos a comprar ações: "Buy American. I Am". Desde esse dia até aos mínimos de mercado, o S&P ainda caiu quase 27%. Durante este período foi duramente criticado. Contudo, fez compras extraordinárias que se valorizaram imenso e contribuíram para potenciar os lucros da Berkshire e dos seus accionistas.
Durante a crise financeira de 2009, Bank of America, General Electric e Goldman Sachs, Harley Davidson, recorreram a Buffett e estavam dispostos a pagar mais para conseguirem o seu selo de aprovação. Não precisavam apenas do seu dinheiro, precisavam também de demonstrar aos mercados financeiros mundiais que Warren Buffett acreditava nestas empresas e nos seus gestores.
Como diz William Browne, "o investimento é levado a cabo por pessoas e as pessoas, na maior parte do tempo, não são racionais."
Investir exige bom senso. Tal como Charlie Munger disse: "Só quero saber onde vou morrer para nunca lá ir". Infelizmente, a maior parte dos investidores não aprende com os seus erros, nem com os erros dos outros, e repetem-nos vezes sem conta esperando resultados diferentes.
No próximo artigo, darei destaque às respostas mais importantes que Warren Buffett e Charlie Munger nos deram na Assembleia Geral da Berkshire Hathaway, em 3 de Maio passado.
I - Honestidade, integridade e transparência
A propósito do escândalo da manipulação da Libor, Bob Diamond, na altura presidente do Barclays Bank, foi chamado em julho de 2012 a uma comissão de inquérito parlamentar para explicar a actuação do banco nesta matéria. As respostas às questões técnicas não levantaram qualquer problema para Diamond, que a cada passo do interrogatório manifestava o seu "amor" ao banco e aos seus 114 mil colaboradores. O Membro do Parlamento Inglês, John Mann, um pouco irritado com este discurso do então Presidente do Barclays, perguntou-lhe se ele conhecia a história do Banco e dos seus fundadores, os Quakers. Bob Diamond não soube responder.
Os Quakers estiveram na origem do grande desenvolvimento de Inglaterra nos séculos XVIII e XIX. À medida que o mundo caminhava para uma sociedade industrial e o capitalismo começou a florescer, tornaram-se indispensáveis grandes acumulações de capital para a construção de fábricas, para o desenvolvimento de sistemas de transporte e para o financiamento dos bancos, a nova economia iria depender. Os Quakers dominavam a economia britânica, provavelmente porque a sua simplicidade e frugalidade lendárias lhes permitiram arrecadar o capital para investir. Eram proprietários de mais de metade das empresas metalúrgicas do país e desempenhavam papéis chave na banca, bens de consumo e no comércio transatlântico. A sua ênfase na fiabilidade, honestidade absoluta e registos rigorosos criavam confiança nos negócios entre si e os restantes mercadores observavam que a confiança caminhava de mãos dadas com o sucesso nos negócios. O interesse próprio exigia a virtude (escrevi sobre os Quakers em fevereiro de 2012 no Jornal i, o artigo "Capitalismo sem Donos").
Esta coincidência de virtude e valor é o que o grande economista e filósofo escocês, Adam Smith, escreveu em A Riqueza das Nações, de 1776: "o esforço ininterrupto e uniforme para melhorar a sua condição, o princípio do qual derivam a opulência pública e privada é suficientemente poderoso para manter o progresso natural das coisas para a sua melhoria...Cada indivíduo não pretende promover o interesse público nem sabe o quão o está a promover... (mas) ao orientar a sua indústria de forma a que o seu produto seja o mais valioso possível, ele é guiado por uma mão invisível que promove um objectivo que não faz parte das suas intenções".
Os princípios dos Quakers eram a honestidade, integridade e a transparência.
O capitalismo deve basear-se num sistema de valores em que as pessoas acreditem e dependam. Não precisamos de ter fé na boa vontade humana, mas precisamos de ter confiança que as promessas e compromissos, uma vez assumidos, serão cumpridos. É necessário garantir que o sistema, no seu todo, não beneficia indevidamente alguns à custa de outros. É importante o regresso do capitalismo dos donos. É fundamental confiar e ser de confiança.
Como diz Charlie Munger, sócio de Buffett, "só quero saber onde vou morrer para nunca lá ir". Porque razão perdem os investidores tanto dinheiro nas ações da banca?
II - São apenas uns cêntimos por ação: o que é que eu posso perder?
A propósito da questão que domina a actualidade no nosso país, a situação do BES, escrevi há dois anos nestas páginas o artigo "Porquê este aumento de capital no BES?. Ainda, a propósito das subidas exageradas que se verificaram nas ações da banca no final do ano e primeiros meses deste ano, escrevi em 14 de fevereiro o artigo "Banca - atração fatal". Este artigo pretendia apenas esclarecer os investidores para a dificuldade de avaliar um banco e quais os indicadores que devem ter em conta antes de fazer os seus investimentos.
Quantas vezes já ouviram a pergunta: são apenas uns cêntimos por ação: o que é que eu posso perder? Talvez o próprio leitor já o tenha feito. Encontramos uma ação a transacionar a menos de 1 euro por ação e pensamos: "é muito mais segura que uma ação de 50 euros". Na realidade, não importa se a ação custa 50 ou 3 euros, se forem a zero, perdemos a totalidade do capital investido. Se caírem para 50 cêntimos, o resultado é ligeiramente diferente. O investidor que comprou a 50, perde 99% do capital; o que comprou a 3, perde 83%. Fraca consolação.
Uma ação com um preço baixo é tão arriscada como uma ação com um preço alto. Se investirmos 1000 euros numa ação de 43 euros ou numa ação de 3 euros, perderemos o mesmo montante se elas forem a zero. Não importa o preço, o risco máximo de perda são sempre os mesmos 100%.
No entanto, podemos ter a certeza que muito investidores não resistem a uma pechincha e dizem: o que é que eu posso perder?
É interessante notar que os "curtos" profissionais, aqueles que lucram com a queda das ações, habitualmente abrem as suas posições mais perto dos mínimos do que dos máximos. Os curtos gostam de esperar que uma empresa esteja em tão graves dificuldades que a falência é quase inevitável. Eles não se preocupam porque entraram a 8 ou a 6 em vez de entrarem a 60. Se a ação for a zero, eles ganham exactamente o mesmo. E adivinhe a quem estão os curtos a vender as ações a 8 ou a 6? A todos aqueles investidores que dizem: o que é que eu posso perder?
III - Custos afundados/ redução do custo médio por ação
As teorias económicas tradicionais prevêem que as pessoas consideram os custos e benefícios presentes e futuros na tomada de decisões. Os custos passados não deverão ser um factor a ter em conta. Contradizendo as previsões, as pessoas habitualmente levam em conta custos históricos não recuperáveis quando tomam decisões acerca do futuro. Este comportamento é denominado efeito custos irrecuperáveis/afundados. Em termos práticos, alguém que comprou uma ação por 6 euros, à medida que a ação cai, vai continuar a comprar mais ações para baixar o seu preço médio e recuperar as perdas na posição global. Este tipo da atitude tem duas graves consequências: o investidor expõe demasiado património a um só ativo e está muito mais vulnerável a "jogar". Muitos estudos demonstram que um investidor que sofre perdas graves tem uma maior tendência a entrar em jogos de sorte ou azar.
Este tipo de atitude não é apenas levada à prática por investidores não profissionais. É muito comum em gestores de investimentos: primeiro porque estão preocupados em proteger a sua carreira, segundo porque precisam de manter a "roda a girar" e a cobrar comissões.
O efeito custos irrecuperáveis/afundados é uma escalada de compromisso e é definido como a tendência para prosseguir um curso de ação quando foi feito um investimento em tempo e dinheiro. Reconhecer que se errou exige discernimento e conhecimento.
IV - Ignore a Multidão
"A moda é o grande "governador" deste mundo; a moda preside, não só às áreas da roupa e da diversão, mas também às da lei, física, política, religião,etc. De facto, o mais sábio dos homens teria graves dificuldades em encontrar explicação melhor para que determinadas manifestações nestas áreas sejam, em certos períodos, universalmente recebidas e noutros universalmente rejeitadas do que declarar que estão ou não na moda."
Henry Fielding
Investir em ativos especulativos é uma atividade social. Os investidores dedicam uma parte substancial do seu tempo livre a discutir investimentos, a ler acerca de investimentos ou a comentar os sucessos e os erros dos outros investidores. É assim plausível que o comportamento dos investidores (e o preço dos ativos especulativos) seja influenciado por movimentos sociais. As atitudes e modas parecem flutuar em muitos outros tópicos de conversação, tais como comida, roupa, saúde ou política. Estas flutuações nas atitudes ocorrem transversalmente nas sociedades e surgem, muitas vezes, sem qualquer explicação lógica aparente. É plausível que as atitudes ou modas que dizem respeito aos investimentos também mudem espontaneamente ou tenham reações sociais arbitrárias a eventos globais.
A maioria dos agentes de mercado que compram e vendem em mercados especulativos parecem dar como certo que o comportamento dos preços é significativamente influenciado por movimentos sociais. Primeiro, o ser humano tende a considerar a possibilidade de ganhos no curto prazo extremamente atrativa. Estes ganhos estimulam os centros emocionais do cérebro e libertam dopamina. Isto torna-nos mais confiantes, satisfeitos connosco próprios. Segundo, a nossa tendência para adotar comportamentos de rebanho: a dor da exclusão social (por exemplo, comprar quando todos estão a vender ou vice-versa) é sentida nas mesmas partes do cérebro que sentem a dor física real. Adotar estratégias de investimentos contrárias é, segundo psicólogos e neurocientistas, um pouco como sermos espancados.
Na análise de investimentos e oportunidades de negócios, procuramos prestar um serviço sério e independente. O nosso trabalho é concentrarmos-nos na maximização da objectividade e criação de riqueza para os nossos Clientes. Nestas páginas procuramos esclarecer o leitor sobre o que realmente importa no investimento.
Não poderia terminar este artigo sem desejar ao Dr. Vitor Bento e sua Equipa, aos colaboradores, aos acionistas e obrigacionistas do Banco Espírito Santo uma recuperação rápida desta grande instituição e um futuro próspero.
Eventualmente, as taxas de juro subirão no mundo desenvolvido. A grande questão é para que níveis. Qual é o nível adequado?
As taxas de juro seguem, na sua essência, um processo de reversão para uma média de longo prazo. Quer isto significar que, quando estão muito altas tenderão a reverter para a dita média e quando estão muito baixas tenderão a subir para a média de longo prazo. Por isso, o movimento a que assistiremos nos próximos anos, embora a ritmo lento, será de subida.
Para os aforradores, aqueles que aplicam as suas poupanças em depósitos a prazo ou títulos de dívida, como as obrigações de governos ou empresas, certificados, papel comercial, entre outros, as notícias não são animadoras: as taxas poderão manter-se baixas durante tempo considerável.
Que razões justificam taxas de juro tão baixas?
Primeiro, os processos de desalavancagem dos agentes económicos demoram anos e só as taxas baixas permitem que este sofrimento seja menor e mais fácil de gerir para os políticos, cuja agenda é sempre de curto prazo.
Nos últimos anos, as politicas monetárias seguidas pelos bancos centrais, ao baixarem as taxas de juro para níveis próximos de zero, impuseram aos aforradores pagar o custo da crise - para a qual não contribuíram. A crise resultou do excesso de endividamento dos agentes económicos. Foi necessário tomar medidas que ajudassem particulares, empresas e mesmo países a recuperarem os seus "balanços". Governos e Bancos Centrais tomaram medidas de estímulo às economias através de taxas de juro nunca antes observadas e de programas de recompra de dívida que permitem injetar dinheiro na economia, promover o investimento, o consumo e a criação de emprego.
Cinco anos depois, na maior economia do mundo, talvez ninguém imaginasse que as taxas de juro se iriam manter próximas do zero. Warren Buffett disse-o na Assembleia Anual de Acionistas da Berkshire, em maio passado. Acrescentou que o trabalho de Bernanke, à frente da Reserva Federal Americana, foi extraordinário e que a atual presidente, Janet Yellen, continua a fazer um bom trabalho. Disse ainda que não sabe como acabará esta situação, que nunca viveu no passado.
Nos anos 50 e 60, para ajudar os países a livrarem-se dos fardos de dívida incorridos para financiar a guerra, as taxas de juro reais (que equivalem às taxas nominais deduzidas da taxa de inflação) estavam muito baixas. Esta prática, conhecida por Repressão Financeira, pode levar os aforradores a perderem poder de compra se não conseguirem rendimentos adequados para as suas poupanças.
Segundo, os dados económicos dos principais países têm sido pouco animadores: nos Estados Unidos o primeiro trimestre ficou aquém do esperado, com o PIB a recuar a uma taxa anual de 2,1%. Embora os últimos dados sejam mais animadores, o crescimento do PIB deve ficar abaixo do inicialmente previsto. Na Europa: a Itália mantém-se em recessão, o PIB Francês está estagnado e os dados da produção industrial na Alemanha caíram muito. O PIB japonês caiu 6,8% anualizados no segundo trimestre e os dados mais recentes da China têm sido mais fracos que o esperado.
Terceiro, esta lenta recuperação a nível global tem mantido as taxas de inflação abaixo da média histórica. Na Europa, onde o número alvo para o BCE é os 2%, os últimos dados apresentam o nível mais baixo até agora, 0,4%, podendo a deflação ser um problema mais premente. As taxas de inflação baixas permitem grande flexibilidade para que a politica monetária seja tão expansionista e o dinheiro tão barato.
Apesar da recuperação no mercado de trabalho nos Estados Unidos e no Reino Unido, os responsáveis pela política monetária têm assegurado que as taxas irão continuar baixas durante tempo considerável. Espera-se no entanto que, no início de 2015, quer a Reserva Federal Americana quer o Banco de Inglaterra comecem a subir as taxas.
O Banco Central Europeu prometeu há meses "fazer o que for preciso" para estimular a economia europeia. Recentemente na reunião anual de banqueiros centrais em Jackson Hole nos Estados Unidos, o presidente do BCE, Mário Draghi, mostrou-se favorável a seguir o caminho já trilhado pelos americanos e pelos ingleses através do programa de recompra de ativos (o chamado quantitative easing). Apesar das taxas estarem próximas de zero, há ainda quem defenda mais um corte do BCE para 0,10% na reunião de quinta-feira, 4 de setembro.
No último dia útil de agosto, os yields das dívidas soberanas testaram mínimos históricos, nomeadamente na Alemanha, onde o yield a dez anos caíra de 1,93%, em final do ano passado, para 0,89%. O yield da obrigação do tesouro americano equivalente caiu dos 3,03% para 2,34%. Na França, o yield a 10 anos caiu de 2,56% para 1,25%. No Japão, para a mesma maturidade, os yields caíram de 0,74% para 0,51%. O yield de uma obrigaçção a 10 anos é o rendimento que um investidor terá anualmente caso decida investir nestas obrigações, ou seja, caso decida "emprestar" dinheiro a qualquer um destes países. Recapitulando, caso invista nas obrigações da Alemanha a 10 anos, está a "atar" o seu dinheiro a um investimento que lhe pagará para os próximos 10 anos menos de 1% ao ano. Que sentido faz emprestar hoje dinheiro para receber menos no futuro? É isso mesmo, a França emitiu divida a 1 ano a menos 0,002%.
As empresas europeias estão a aproveitar os níveis de taxas de juro para baixarem os custos de financiamento. Têm emitido, em média, 23,3 mil milhões de euros por mês em obrigações com maturidades a 10 ou mais anos. O que é bom para as empresas é mau para os investidores, que ficarão agarrados a rendimentos baixos para longos períodos de tempo. O extenso rally nas obrigações também terá um fim, e desta vez, não será diferente: a porta será demasiado estreita para saírem todos ao mesmo tempo.
Os instrumentos de mercado monetário não oferecem qualquer rendimento. Os rendimentos de obrigações consideradas sem risco são tão baixos que os investidores procuram obrigações com rendimentos melhores, relaxando os critérios de risco do emitente. Muito recentemente, verificámos emissão de divida por parte de empresas cujos capitais alheios (empréstimos obtidos) são mais de 10 vezes superiores aos capitais próprios. Dito de outra forma, a procura desesperada dos investidores por rendimento, leva-os a aceitar qualquer devedor sem saber se têm capacidade para lhes pagar os juros e devolver o dinheiro no futuro. É claro que o setor financeiro, de uma forma geral, embarca em qualquer folia que permita arrecadar comissões aos investidores. Recentemente, a Bloomberg reportou que a JPMorgan e a Goldman Sachs já estão a oferecer aos investidores produtos em tudo semelhantes aos que provocaram a crise em 2008. No Wall Street Journal de 11 de agosto, com o título de "Caçadores de yield, uma nova música ecoa um passado infeliz", é reportado mais do mesmo: aos investidores são impingidos produtos pouco rentáveis, altamente arriscados e com elevado comissionamento.
Que alternativas têm os investidores?
O dinheiro procura a cada momento o investimento que permita os melhores retornos. Contudo, muitos investidores limitam as suas escolhas e preferências a uma só classe de ativos: os investimentos de taxa fixa como os depósitos a prazo, obrigações de empresas e governos. As crises nos mercados financeiros, as más experiências do passado, a falta de conhecimento financeiro e a preferência por obter um rendimento certo, fazem com que os investidores privilegiem uma classe de ativos que lhes parece mais segura. Contudo, estes investimentos não estão isentos de risco: risco de crédito do emitente, risco de liquidez para maturidades longas, risco das taxas de juro subirem e os riscos da inflação, que não avisa quando chega.
O investimento em ações e a sua capacidade de produzir riqueza
A teoria financeira prevê e a experiência prática demonstra que as ações oferecem retornos superiores, ao longo de períodos razoavelmente longos, apesar de não ser uma estratégia convencial para a grande parte dos aforradores. O alinhamento de interesses entre os acionistas e os gestores tende a servir tanto os interesses dos donos externos das empresas como os dos seus gestores internos. As ações oferecem proteção contra a inflação no médio e longo prazo. As características atrativas das ações justificam a sua presença em todos os portfólios de ativos.
Os princípios financeiros básicos requerem que os portfolios de investimento de longo prazo sejam diversificados e orientados para as ações. A orientação para as ações requer que as classes de ativos com altos retornos esperados predominem no portfólio.
Atualmente os lucros das empresas estão fortes. Os lucros americanos recuperaram muito rapidamente após o colapso de 2008. Estão muito próximos dos máximos do pós guerra, relativamente ao PIB, embora tenham caído ligeiramente no primeiro trimestre. O principal fator tem sido o aumento das margens; as vendas por ação estão pouco acima do que estavam há seis anos. A estagnação dos salários reais manteve os custos baixos. Um outro factor é a recompra de ações próprias: as empresas utilizam o dinheiro extra que detêm no balanço para comprar as suas próprias ações. Isto faz com que os lucros por ação subam mais depressa. No ano passado, as empresas americanas anunciaram recompras de ações no valor de 671 mil milhões de dólares, cerca de 3,9% do PIB, e planeiam cerca de 300 biliões em 2014. Este valor é quatro vezes superior ao dinheiro colocado em fundos de ações por investidores institucionais e de retalho.
Uma sondagem levada a cabo pela associação britânica de analistas descobriu que 55% dos investidores acreditam que as ações dos países ricos estão sobreavaliadas. No entanto, as ações continuam a ser a melhor alternativa: 75% acham que as obrigações soberanas estão caras e 72% acreditam que as obrigações de empresas estão sobreavaliadas.
Seguir uma estratégia ponderada e pouco convencional geralmente dá bons resultados. A estrada menos utilizada proporciona maiores oportunidades de sucesso. A natureza humana prefere o conforto de seguir uma estratégia tradicional. Partilhar um objetivo comum a um grande número de concidadãos cria um laço social reforçado. Infelizmente, o confortável raramente tem sucesso.
O fosso que separa os países ricos dos paíse pobres é uma das duas características incontornáveis da economia mundial actual. Há duzentos anos, este fosso não existia, pelo menos à escala a que hoje estamos habituados; e daqui a duzentos anos, já terá, provavelmente, desaparecido. A realidade actual, no entanto, é de uma diferença estarrecedora: as mesmas pessoas vivem em pobreza extrema num país e, quando se mudam para outro, conseguem prosperar.
Why Nations Fail ( Porque Falham as Nações) de Darren Acemoglu e James Robinson apresenta o exemplo da cidades gêmeas de Nogales, uma no lado mexicano da fronteira, a outra do lado americano. Como pode uma fronteira fazer tanta diferença? Esta questão é, por motivos óbvios, importantíssima uma vez que a desigualdade global gera outros problemas: ressentimentos, pressões cada vez maiores que empurram para a migração; escolhas terríveis que o mundo tem que enfrentar quando algumas nações, não apenas ficam para trás mas também implodem.
Há décadas que os académicos e intelectuais procuram uma resposta convincente para esta questão. Nos anos 60, a explicação dominante era que os países pobres não dispunham de capital para investir. Nos anos 80, era que os países pobres seguiam políticas económicas erradas.
Nas últimas duas décadas, surgiu uma nova pista: a ascensão da China que é a segunda característica incontornável da economia mundial actual. Este fenómeno sem precedentes na história mundial tem implicações enormes na pobreza e no enquadramento geopolítico globais. Arrancou milhões de pessoas da pobreza indigente e ameaça, num futuro muito próximo, destronar os Estados Unidos da América da sua posição de maior economia do mundo. O sucesso chinês tem, assim, sido interpretado, principalmente pelas elites africanas, como prova incontrovertível dos benefícios da autocracia política.
Para quem está interessado neste assuntos, Why Nations Fail torna-se leitura obrigatória. Acemoglu é professor de economia no MIT (Massachusetts Institute of Technology) e Robinson é professor de ciência política em Harvard. São, portanto, pesos pesados. Na maioria das vezes, este tipo de pessoas escreve apenas para outros académicos. No entanto, Acemoglu e Robinson escrevem este livro de uma forma que, não só é legível para qualquer pessoa mas é também cativante.
A razão pela qual Why Nations Fail é leitura obrigatória é o facto de a tese que apresenta desmantela as "vacas sagradas" do desenvolvimento global. A China e a sua ascensão meteórica não são a chave para a propagação da prosperidade; é uma sociedade que caminha a passos largos para um beco sem saída e não para o nível de prosperidade que as sociedades ocidentais têm como garantido.
O nível de prosperidade assenta em alicerces políticos
O argumento avançado por Acemoglu e Robinson é que o nível de prosperidade moderno está assente em alicerces políticos. A prosperidade é gerada pelo investimento e inovação mas estes são actos de fé: os investidores e inovadores têm que ter razões para acreditar que, se tiverem sucesso, os seus retornos não serão consfiscados pelos poderosos. O sucesso (ou o desenvolvimento) surge quando as instituições políticas e económicas são "inclusivas" e pluralistas, criando incentivos para que todos possam investir no futuro. Isso significa uma ampla distribuição do poder político (com uma constituição escrita e eleições democráticas) e instituições económicas igualmente inclusivas que garantam direito à propriedade, respeito pelos contratos, facilidade para abrir uma empresa, mercados competitivos e liberdade para que os cidadãos desempenhem as profissões desejadas.
Para que estas garantias sejam dadas, são essenciais duas condições: o poder político tem que ser centralizado e as instituições de poder devem ser inclusivas. Sem um poder centralizado, reinaria a desordem que afasta o investimento.
A China, sem qualquer dúvida, preenche esta condição - o poder está, sem a mais pequena dúvida, centralizado. Alguma sociedades africanas não; os poderes tribais localizados usurpam o poder do Estado. A China, no entanto, falha redondamente nas instituições inclusivas. Eis um resumo, citado por Acemoglu e Robinson, da estrututura de poder chinesa: "O Partido controla as forças armadas; o Partido controla os quadros; e o Partido controla as notícias."
O facto de o Estado necessitar de ordem para prosperar não é controverso. O facto de necessitar de instituições inclusivas é, face ao sucesso da China, altamente controverso. Ordem sem instituições inclusivas pode permitir a uma sociedade escapar da pobreza extrema mas não permitirá a ascensão até à propsperidade moderna. Acemoglu e Robinson explicam: se as instituições do poder permitem que as elites sirvam os seus próprios interesses - instituições extractivas - esses interesses colidirão e subjugarão os interesses da população em geral.
O que são então instituições inclusivas e extractivas?
Instituições inclusivas são instituições económicas e políticas que incluem a maioria da população na comunidade política e económica. As instituições inclusivas são democráticas, permitem o voto e a participação de todos, protegem a liberdade de expressão e respondem aos interesses de todas as pessoas. As instituições inclusivas determinam claramente os direitos de propriedade que são feitos valer por sistemas legais adequados que tratam todos igualmente perante a lei.
Instituições extractivas são instituições económicas e políticas que restringem os ganhos económicos a uma elite e asseguram que a riqueza é distribuida "para cima" tornando os pobres cada vez mais pobres. As instituições extractivas são anti-democráticas e não definem ou aplicam direitos de propriedade ou defendem a lei. Embora as economias extractivas possam crescer, esse crescimento tende a ser insustentável e enviesados para as classes altas.
Assim, se as instituições inclusivas são necessárias para a prosperidade, como é que elas surgem? Mais uma vez, Acemoglu e Robinson são radicais. Eles argumentam que não existe qualquer processo natural que transforme uma autocracia numa sociedade inclusiva. Nenhuma elite cede poder e benefícios voluntariamente. Pelo contrário, as elites apenas cedem poder às instituições inclusivas se a alternativa com que são confrontados for pior, nomeadamente a iminência de uma revolução. As fundações da prosperidade são a luta política contra o privilégio.
A Inglaterra, berço da Revolução Industrial, é a prova maior desta teoria. Pequenas diferenças entre os absolutismos inglês, espanhol e português foram ampliados ao longo da história. Quando se deu início à época dos Descobrimentos, Portugal e Espanha favoreceram o controlo estatal do comércio marítimo enquanto que a Inglaterra o deixou nas mãos de navegantes privados. As riquezas do Novo Mundo solidificaram as monarquias portuguesa e espanhola; em Inglaterra, deram poder a uma elite mercante que desiquilibrou a balança na Revolução Gloriosa de 1688, assegurando o pluralismo político e semeando as sementes do crescimento económico.
Na América do Sul, os exploradores europeus encontraram densas populações facilmente controláveis e exploráveis. As instituições extractivas encontraram terreno fértil para a sua implementação. Exemplo paradigmático era o Pacto Colonial imposto por Portugal ao Brasil:o Brasil estava impedido de fabricar qualquer produto. Estava reduzido a enviar as matérias primas para Portugal e apenas podia comprar produtos manufacturados a Portugal.
Nas colónias britânicas na América do Norte, pelo contrário, as populações indígenas estavam demasiadamente dispersas para que a sua escravização fosse possível. Os governadores coloniais viram-se obrigados a utilizar incentivos económicos para atrair colonos para a Virgínia e Massachusetts. Onde o pluralismo económico e político ganhou raízes, a indústria e prosperidade floresceram; onde falhou, nas colónias esclavagistas do Sul, seguiu-se um longo período de atraso económico - um século após a Guerra Civil americana, o Sul mantinha-se muito mais pobre que o Norte.
Não é possível ignorar o papel da expansão europeia na criação das instituições extractivas dos países mais pobres que, num círculo vicioso, continuam a restringir as reformas políticas e o desenvolvimento económico. No entanto, ideais contagiosos, lideranças inspiradoras e pressões externas são importantes. A promessa de entrada na União Europeia encorajou reformas institucionais em vários países da Europa Central e de Leste. Os estados Unidos erradicaram as instituições extractivas sulistas e colocou o Sul no caminho da convergência económica.
A prosperidade e desenvolvimento de uma população depende da capacidade dos seus governantes tornarem as instituições inclusivas e permitir que todos tenham as mesmas oportunidades. Só assim se constroi uma economia com vantagens competitivas, se cria mais riqueza para as empresas, para os seus trabalhadores e para o estado como um todo. Só assim se gera um circulo virtuoso que permite o progresso e bem estar.
Eis a lição mais importante deste livro: só as instituições inclusivas permitem que o potencial criativo das pessoas e dos países seja libertado; só as instituições inclusivas permitem que a riqueza e prosperidade assim criadas seja partilhada por todos.
1. A economia de mercado portuguesa
O historial da economia de mercado portuguesa deixa muito a desejar. A destruição de riqueza provocada pela desvalorização acentuada ou implosão de grandes empresas e grupos nacionais, como PT, BES, GES, BCP, BPN ou BPP, demonstram o problema sério que a sociedade necessita de enfrentar: a credibilização das suas instituições económicas e políticas.
Numa altura em que o país acumulou uma dívida assustadora, a perda ou a desvalorização de alguns dos principais grupos económicos portugueses fragiliza decisivamente o valor económico dos ativos do país e a sua capacidade de geração de riqueza para o futuro que sustente uma trajetória de redução de dívida e de novos investimentos. Num país já extremamente descapitalizado, assistir a esta perda de riqueza é dramático. Um país com recursos tão escassos não se pode dar ao luxo de não rentabilizar devidamente os que tem.
Depois de verificarmos o excesso de endividamento das famílias que condiciona a sua capacidade de consumo desde 2008, depois de assistirmos à quase bancarrota do país em 2011 e consequente programa de assistência financeira da Troika, algumas das grandes empresas também não estão a fazer o seu trabalho: em vez de criarem valor, estão a destrui-lo.
Demasiados anos foram desperdiçados a assistir ao Estado intrometer-se na vida das empresas: a nomear ex-ministros, a controlar administrações, a usar golden shares, a decidir para os seus interesses.
Demasiados anos foram gastos a promover a mediocridade, a esconder a incompetência, a iludir com grandes projetos, a enganar e a enganar-se.
O caso da Portugal Telecom é sintomático. Quando, em 2007, foi rejeitada pela administração da Portugal Telecom, pelo governo e pelo BES, uma oferta de compra da Sonae que mais do que refletia o valor da empresa, não foi salvaguardado o investimento dos acionistas. Pelo contrário, prometeram-se dividendos chorudos, que foram descapitalizando a empresa ao longo dos anos.
Quando em 2010, a PT vende a peso de ouro a Vivo no Brasil e, por imposição do governo português, compra a muito mais fraca operadora brasileira Oi, comete mais dois erros de alocação de capital: a aposta num operador pouco rentável apenas porque tinha de se manter no Brasil e a promessa de mais dividendos gordos, superiores inclusivamente aos resultados gerados pela empresa, o que significou que a empresa necessitou de se endividar para suportar estes pagamentos aos acionistas.
Quando em Abril de 2014, num ambiente já muito difícil para o Banco Espírito Santo e para o Grupo, a administração da PT decidiu fazer uma aplicação de cerca de 900 milhões de euros em papel comercial da Rio Forte, (que na altura representavam cerca de 47% dos capitais próprios da PT) demonstrou total incompetência e irresponsabilidade pela seleção da instituição financeira e pelo montante aplicado.
A Casa de Investimentos também investiu 1,5% das carteiras dos seus clientes no Banco Espírito Santo quando as ações cotavam com um desconto de cerca de 50% do seu valor contabilístico, acabando por vender em Janeiro e Fevereiro de 2014, com as notícias de irregularidades nas contas do Grupo.
Um país não sobrevive sem empresas. Um estado social não sobrevive sem empresas. São elas o motor da criação de valor, do emprego, da estabilidade, do desenvolvimento.
O desvendar destes casos, vem demonstrar a triste sina do investidor português na saga pela aplicação das suas poupanças: a extraordinária erosão que teve lugar nos últimos anos na conduta e valores dos nossos líderes empresariais, nos banqueiros, nos gestores de dinheiro e nas administrações de algumas das grandes empresas, com a passividade e até conivência de auditores, legisladores e mesmo supervisores, permitiram a destruição de riqueza em massa e a sua transferência para alguns.
Os executivos foram compensados não pela realidade da criação de valor económico de longo prazo, mas pela percepção ilusória dos preços das ações no curto prazo.
2. O capitalismo dos donos e o dos gestores
A bolsa foi criada com o objectivo de permitir aos empresários procurar capital para expandir os negócios das suas empresas a troco de permitir a entrada de novos sócios (os detentores das ações) que investiam as suas poupanças para obter um retorno a prazo. Estes investidores tinham assim acesso aos mesmos benefícios dos fundadores destes negócios - também os seus donos maioritários. Quem pretendia angariar o capital tinha que demonstrar a coincidência de virtude e valor, tal como Adam Smith a descreve na "Riqueza das Nações", em que as promessas feitas aos "novos sócios" - os investidores das ações, seriam cumpridas.
Uma ação é vista como um interesse económico numa empresa, representa uma pequena fatia da empresa e o direito aos seus lucros.
Este foi o sistema que permitiu uma criação de riqueza extraordinária e que foi essencial para a prosperidade que se tornou imagem de marca da era moderna.
Infelizmente, o capitalismo atual afastou-se, não só em grau mas também em espécie, das suas orgulhosas raízes tradicionais. Ao longo das últimas décadas, uma mudança gradual do "capitalismo dos donos" - que dá a parte de leão das recompensas do investimento àqueles que arriscam o seu capital (os acionistas) - culminou numa versão extrema do "capitalismo dos gestores" - que oferece recompensas vastamente desproporcionais àqueles a quem foi confiada a gestão das empresas em representação dos seus donos, os acionistas, e que os exemplos acima demonstram culminou numa enorme destruição de valor. O capitalismo dos gestores é uma traição do capitalismo dos donos, um sistema que funcionou, ainda que com imperfeições, com uma eficiência notável desde a Revolução Industrial, há dois séculos.
À medida que as ações se tornaram entretenimento, os mercados financeiros transformaram-se no nosso maior circo. Abunda o trading eletrónico; os anúncios para ficar rico ao segundo, os day traders e corretores fazem com que o mercado se mova em espasmos e muitas vezes sem qualquer relação com o verdadeiro valor dos ativos que lhes estão subjacentes. Uma obrigação emitida com vencimento a 10 anos que, há décadas, seria detida pelo mesmo investidor até ao seu vencimento, é detida pelos investidores alguns dias ou horas.
O que causou este desvio? Os profundos conflitos de interesse que permeiam o mundo da intermediação financeira e as alterações radicais de comportamento dos acionistas que ignoraram a sabedoria do investimento de longo prazo e abraçaram a loucura da especulação de curto prazo - esta mudança fez com que a precisão momentânea do preço da ação de uma empresa ganhasse a supremacia sobre o valor intrínseco da própria empresa.
3. O Triunfo dos otimistas
Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton - reputados estudiosos dos mercados financeiros mundiais, asseguram, no livro "Triumph of the Optimists", que os otimistas triunfaram. Ao longo de 101 anos, o investimento em ações remunerou os investidores com retornos médios de cerca de 10% ao ano. Neste livro, apresentam uma análise consistente sobre as obrigações, ações, bilhetes de tesouro, moedas e inflação, nos 16 principais mercados no mundo desde os finais do século XIX ao início do século XXI.
O Professor Roger Ibbotson, da Universidade de Yale e o Professor Jeremy Siegel da Universidade de Wharton, ambas nos Estados Unidos, apresentam dados históricos dos mercados financeiros que permitem as mesmas conclusões.
Contudo, hoje o grande problema dos investidores é sofrerem de dois vieses que os condicionam na tomada de decisões: por um lado tendem a dar maior relevância às suas experiências pessoais e por outro, atribuem, na tomada de decisões, maior importância ao passado que viveram recentemente. Os investidores portugueses, muito mais investidos no mercado português - por terem maior conforto com os nomes das empresas que conhecem melhor e porque a banca concentra os investimentos em ações de empresas portuguesas - estão cada vez mais afastados do investimento em ações.
Numa altura em que as alternativas de investimento em obrigações ou depósitos a prazo estão com rentabilidades próximas de zero e, ao que tudo indica, por um período de tempo alargado, é lamentável que não tenham confiança para investir na classe de ativos que melhores rendimentos proporciona, nomedamente com dividendos acima dos rendimentos de taxa fixa.
No investimento, é importante investir em ativos que produzam rendimento, comprá-los quando estão baratos e certificar-se que os gestores são capazes e honestos. São estes os gestores que merecem a confiança dos investidores. Só assim se cria um ciclo virtuoso em que a confiança gera negócio e a criação de riqueza, com rigor e transparência, gera mais confiança.
Os investidores devem procurar não repetir os erros do passado. Fazer sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes é absurdo.
No final de 2008 e início de 2009, ouvíamos muitas vezes a expressão "cash is king" . De forma generalizada, para comentadores, analistas, jornalistas e até investidores institucionais, o dinheiro era rei e os riscos de investir - com as bolsas mundiais a baterem mínimos consecutivos - eram enormes para os investidores. Nada de mais errado. Essa era a altura em que o dinheiro devia ser investido e não guardado, tal como na altura escrevemos em vários artigos publicados no Diário do Minho e que estão disponíveis no nosso site. Nessa ocasião, os investidores que precisavam do consenso da multidão para agir pagaram muito caro por esse conforto.
Num artigo do Wall Street Journal, de 23 de junho passado, e com o título "Grandes investidores falharam o rally nas ações desde 2009: Fundos de Pensões, e Endowments das Universidades diversificados noutros ativos, obtêm performances desapontantes" são apresentados os resultados da gestão dos maiores investidores institucionais do mundo.
Tanto os fundos de pensões como os endowments (um endowment é constituído por donativos de dinheiro ou imóveis a uma organização sem fins lucrativos com o objetivo de suportar as atividades dessa organização) gerem enormes patrimónios financeiros: nos fundos de pensões, o Calpers, que é o fundo de pensões dos funcionários públicos da Califórnia, destaca-se com cerca de 300 mil milhões de dólares. No caso dos endowments, Harvard, Yale, Princeton e Stanford lideram em volumes, cujo maior é o de Harvard com 32,7 mil milhões, seguido de Yale com 20,8 mil milhões.
Apesar do enorme contributo dado por Keynes a seguir à primeira guerra mundial no desenvolvimento da gestão profissional de investidores institucionais - enquanto responsável máximo pela gestão do endowment do Kings College de Cambridge - só a partir da década de 60 é que os grandes investidores institucionais começaram a ter maior exposição a ações em detrimento das obrigações que até aqui dominavam estes portfólios. Procuravam-se melhores rentabilidades, num contexto de taxas de juro baixas e maior diversificação dos investimentos. Um portfólio equilibrado era constituido por 60% de ações e 40% de obrigações.
Investimentos alternativos: Hedge Funds, Private Equity, Capital de Risco, Silvicultura, etc.
Harvard, Yale, Princeton e Stanford lideram o mundo dos endowments em tamanho e na adoção madrugadora de portfólios diversificados e orientados para as ações. A partir do final da década de 80, iniciaram a alocação a investimentos alternativos, menos líquidos, não cotados publicamente, mas onde julgavam haver espaço para retornos mais elevados e que lhes permitiriam aumentar a diversificação dos ativos em gestão.
Os portfolios diversificados e orientados para as ações produziram resultados superiores.
Nos últimos 25 anos, os endowments protagonizaram manchetes com as suas performances extraordinárias e a sua deslocação dos investimentos em títulos cotados para alternativas mais ilíquidas. A aplicação de princípios de investimento fundamental produziu resultados superiores. Para muitos investidores, os endowments representam o pináculo do sucesso no investimento. Por isso, não é surpreendente que muitos investidores desejem replicar esses feitos. Em junho de 2013, os maiores portfolios tinham uma média de 60% do seu capital em investimentos alternativos.
No entanto, os resultados dos últimos 5 anos ficaram muito aquém das expectativas. Apesar de alguns destes investimentos terem tido melhor performance que as ações na última década, como por exemplo em private equity, este resultado, só foi conseguido em cerca de 30% destes fundos, ou seja, também nesta classe de ativos muitos perderam dinheiro ou tiveram rentabilidades medíocres.
Embora estes investimentos alternativos se tenham comportado melhor que as ações durante a crise de 2008 e sejam considerados menos voláteis, tiveram uma performance muito pior que o S&P500 desde 2009, um período no qual os índices americanos mais que dobraram.
Porque não conseguiram estes investidores profissionais identificar em 2009 que as ações estavam muito baratas face aos lucros que estavam a gerar para os seus acionistas?
As universidades dependem do rendimento dos seus investimentos para financiar as suas atividades e muitos fundos de pensões terão dificuldades para assumir no futuro os compromissos com os beneficiários. Estes constrangimentos e o facto de representarem enormes massas de dinheiro e atraírem a atenção da comunicação social, têm colocado enorme pressão sobre os gestores. A Universidade de Harvard, que detém o maior endowment do mundo, conseguiu um retorno médio anual de 10,5% nos últimos três anos até Junho de 2013, substancialmente abaixo dos retornos de 18,45% do S&P500, dividendos incluídos, no mesmo período. A Universidade de Yale e de Stanford, conseguiram retornos de 12,8% e 11,5%.
Média anualizada dos retornos até 30 de junho de 20135 anos10 anos15 anos20 anos25 anosYale University3,3%11,0%11,8%13,5%13,2%Harvard University1,7%9,4%9,6%11,9%11,5%Todos os endowments3,8%6,8%5,6%7,7%8,4%Todos os fundos mistos equilibrados5,1%6,0%4,9%7,0%7,9%60% ações / 40% Obrigações5,9%7,4%5,7%7,6%8,3%
Uma possível explicação para esta fraca performance e que estas classes alternativas estão caras e terão os seus retornos futuros pressionados. Além do mais, são menos líquidas e por essa razão, estas grandes instituições não conseguiram vender parte destes investimentos para investir em 2009 nas ações. Ainda, o facto doss hedge funds e as empresas de private equity, de uma forma geral, cobrarem aos seus investidores comissões muito mais elevadas que os fundos tradicionais, incluindo comissões de gestão superiores a 2% e uma percentagem dos lucros, que em média ronda os 20%, embora haja comissões mais agressivas, limita os retornos líquidos nestes produtos. Este é aliás o principal argumento do Calpers ao anunciar que vai terminar com 24 gestores de hedge funds e 6 de fundos de fundos, conforme noticiou a Bloomberg, num artigo com título "Calpers retira 4 mil milhões da gestão de hedge funds, alegando custos". Segundo o responsável pelos investimentos, Ted Eliopoulos, o objetivo é reduzir complexidade e reduzir custos com a gestão, que proporcionava retornos medíocres.
Como pode um investidor individual ter sucesso e proteger o seu dinheiro?
O sucesso de longo prazo, contrastando com as dificuldades de curto prazo, deixam muitos investidores na dúvida: como posso posicionar o meu portfólio para aumentar as probabilidades de sucesso?
Muitas instituições tentam copiar estes grandes investidores. Contudo, a dimensão dos valores em gestão, o horizonte de investimento - que nestas instituições é de décadas - e os enormes recursos humanos disponíveis fazem certamente muita diferença. Basta que um destes três factores não se conjugue para que toda a estratégia seja posta em causa.
É frequente encontrar algumas destas classes de ativos em fundos de investimento comercializados em Portugal. É quase certo que a maior parte dos investidores não têm conhecimento das suas características e da necessidade de horizontes de investimento muito longos para que estes ativos produzam resultados. Não têm qualquer conhecimento de quem os gere, em que consistem estes investimentos e quais os objectivos que lhe estão subjacentes. Pior, em caso de necessidade de resgate, a sua falta de liquidez obriga a penalizações muito elevadas e mesmo à impossibilidade de levantamento de fundos, que pode levar anos a conseguir-se.
Os investidores devem concentrar-se no essencial, isto é, investindo em ativos de longo prazo, publicamente cotados e com grande liquidez, em vez de se focarem em manobras de diversão pouco produtivas. Devem construir portfólios sólidos, fiscalmente responsáveis e orientados para as ações, em vez de imitarem o consenso convencional e quase sempre mal estruturado. Ignorar os princípios fundamentais do investimento tem como quase inevitável consequência a obtenção de resultados desapontantes.
A orientação para objetivos de investimento de longo prazo é o factor mais poderoso no resultado final. Decisões de alocação tomadas de ânimo leve podem causar graves prejuízos aos investidores. Estratégias de investimento bem ponderadas, cuidadosamente implementadas e mantidas com firmeza criam os alicerces do sucesso no investimento.
Segundo Warren Buffett, o mais esquivo dos objetivos do Homem, é manter as coisas simples e não nos desviarmos daquilo a que nos propusemos fazer.
Nota: O Fundo Soberano da Noruega, pela sua dimensão, será tratado em artigo individual.
O argumento que defende que os mercados financeiros são eficientes é o perfeito exemplo da diferença entre a teoria e a prática. Como Yogi Berra, o famoso treinador de baseball, disse: "Em teoria, não há diferença entre teoria e prática. Na prática, há". Em teoria uma empresa vale aquilo que o mercado diz que ela vale; na prática isto simplesmente não é verdade.
Apesar do consenso académico relativamente à eficiência dos mercados, os mercados financeiros nunca serão eficientes porque são, e sempre serão, guiados pelas emoções humanas: o medo e a ganância. Os mercados e os preços das ações, periódica e imprevisivelmente, atingirão altitudes e fossos exagerados. Os conhecimentos e os horizontes temporais dos participantes dos mercados também variam. Os académicos ignoram deliberadamente a performance de mais de cinquenta anos de Warren Buffett assim como as de outros grandes investidores em valor. Se os mercados são eficientes, como explicar o espantoso sucesso de Warren Buffett?
A Carta Anual que Warren Buffett escreve aos acionistas da Berkshire Hathaway foi publicada muito recentemente.
Este é um ano muito especial por se comemorarem 50 anos desde que Buffett e Munger assumiram o controlo da empresa. Como sempre acontece, a primeira página apresenta as rentabilidades ano a ano desde 1965:
Valor Contabilístico por AçãoValor de Mercado por AçãoS&P500 (Dividendos Incluídos)Valorização Anual Composta de 1965 a 201419,4%21,6%9,9%Valorização Acumuladada desde 1964 a 2014751.113%1.826,163%11.196%
Da leitura da carta traduzi alguns parágrafos que nos podem tornar a todos melhores investidores:
(...)"Os nossos resultados nos investimentos beneficiaram de um vento de cauda muito favorável. No período compreendido entre 1964 e 2014, o S&P 500 subiu de 84 para 2059. Isto significa, com dividendos reinvestidos, um retorno acumulado de 11.196%. Simultaneamente, o poder de compra do dólar perdeu uns estarrecedores 87%. Este declínio significa que o que custa agora um dólar custaria 13 cêntimos em 1965.
Esta performance tão distinta entre as ações e o dólar contém uma mensagem importantíssima para os investidores. No relatório anual de 2011, definimos o investimento como "a transferência, para outros, do nosso poder de compra no presente com a expectativa razoável de receber mais poder de compra - após impostos - no futuro".
A conclusão, pouco convencional porém inescapável, a tirar dos últimos cinquenta anos é que tem sido muito mais seguro investir numa coleção diversificada de negócios americanos do que investir em títulos - obrigações do tesouro, por exemplo - indexados à moeda americana. Isto aconteceu também no meio século precedente, um período que incluiu uma Grande Depressão e duas guerras mundiais. Os investidores devem prestar atenção a esta lição. De uma forma ou outra, esta história repetir-se-á durante o próximo século.
Os preços das ações serão sempre mais voláteis que os ativos indexados ao dinheiro. No longo prazo, contudo, estes ativos são mais arriscados - muito mais arriscados - do que portfólios diversificados de ações compradas ao longo do tempo e mantidas em carteira de forma a minimizar taxas e comissões. Esta lição não é habitualmente ensinada nas escolas de gestão onde a volatilidade é vista, quase universalmente, como equivalente ao risco. Esta assunção pedagógica, embora fácil de ensinar, é completamente errada: a volatilidade está muito longe de ser sinónimo de risco. As populares fórmulas que confundem os dois termos levam estudantes, investidores e presidentes de empresas por maus caminhos.
É obviamente verdade que ter ações um dia, uma semana ou um ano é bastante mais arriscado do que ter dinheiro em obrigações do tesouro. Isto é importante para determinados investidores - bancos de investimento, por exemplo - cuja viabilidade pode ser ameaçada por quedas nos preços dos ativos e que podem ser obrigados a vender títulos em mercados deprimidos. Qualquer entidade que tenha necessidades de financiamento de curto prazo deverá manter quantias apropriadas em obrigações de tesouro e depósitos a prazo.
Para a esmagadora maioria dos investidores, contudo, que podem - e devem - investir com um horizonte de investimento de décadas, os declínios nas cotações não são importantes. A sua atenção deve estar concentrada na obtenção de ganhos significativos de poder de compra ao longo da sua vida de investimentos. Para estes investidores, um portfólio diversificado de ações, compradas ao longo do tempo, é muito menos arriscado que títulos indexados ao dólar (ou qualquer outra moeda).
Se, ao invés, o investidor teme a volatilidade dos preços e a encara, erroneamente, como medida de risco, ele pode, ironicamente, acabar por fazer coisas muito arriscadas. Recordemos os comentadores que há seis anos lamentavam os preços a cair e aconselhavam o investimento em "seguras" obrigações do tesouro ou depósitos a prazo.
As pessoas que ouviram este sermão e seguiram os seus conselhos estão agora a receber uma ninharia dos investimentos que, pensavam elas, iriam financiar uma reforma agradável. (O S&P estava nessa altura abaixo dos 700; agora ronda os 2100.) Se não fosse pelo medo de uma volatilidade de preços sem significado, estes investidores teriam assegurado para si um bom rendimento vitalício se tivessem simplesmente comprado um fundo de índice de baixo custo cujos dividendos cresceriam ao longo do tempo assim como o capital inicialmente investido (com muitos altos e baixos, sem dúvida).
Os investidores podem, como é óbvio, com o seu próprio comportamento, tornar as ações altamente arriscadas. E muitos fazem-no. "Trading" ativo, tentativas de adivinhar o mercado, diversificação inadequada, o pagamento de comissões elevadas e desnecessárias a gestores e conselheiros e a alvancagem podem destruir os retornos de que um investidor em ações de muito longo prazo poderia beneficiar. De facto, a alavancagem não tem lugar no estojo de ferramentas de um investidor: Tudo pode acontecer em qualquer altura nos mercados. E nenhum comentador televisivo, economista ou conselheiro - e muito menos Charlie e eu - consegue dizer-vos quando se instalará o caos. Os profetas do mercado enchem os nossos ouvidos mas nunca encherão as nossas carteiras.
A prática dos pecados do investimento listados acima não está limitada ao "pequeno investidor". Os investidores institucionais não conseguem, desde há longos anos, igualar a performance de um pouco sofisticado investidor em fundos de índices que, simplesmente, está inativo há décadas. A principal razão são as comissões. Muitas instituições pagam somas substanciais a consultores que, por sua vez, recomendam gestores pagos a peso de ouro. E esse é um jogo de tolos.
Existem, como é óbvio, alguns gestores excelentes - embora, no curto prazo, seja difícil determinar se a performance se deve ao talento ou à sorte. A maioria, contudo, são bastante melhores a gerar comissões do que a gerar retornos. Na verdade, a sua competência essencial é serem bons vendedores. Em vez de ouvirem esse canto das sereias, os investidores - grandes e pequenos - deveriam ler "The Little Book of Common Sense Investing" de Jack Bogle, (fundador da Gestora de Fundos Vangard e hoje um dos grandes criticos da indústria de fundos).
Há décadas, Ben Graham apontou a culpa do fracasso no investimento, utilizando uma citação de Shakespeare: "A culpa, meu caro Bruto, não é das estrelas, mas de nós mesmos".(...)"
Procuramos, nas conversas que fazemos, alertar os investidores para o facto dos preços de mercado terem no curto prazo as suas limitações. As variações mensais ou anuais das ações são muitas vezes erráticas e não são indicativas de qualquer alteração no valor intrínseco. São cotações de preço e podem ser significativamente diferentes do real valor subjacente a essas empresas. No longo prazo, contudo, os preços das ações e o valor intrínseco invariavelmente convergem.
Buffett e o seu sócio Charlie Munger acreditam que isso é verdade no que diz respeito às ações da Berkshire Hathaway: a subida do valor intrínseco por ação da Berkshire ao longo dos últimos 50 anos é sensivelmente igual ao ganho de 1.826.163% no preço de mercado das ações da empresa.
Na prática, se há 50 anos um investidor tivesse investido 1.000 dólares em Obrigações do Tesouro americano a 10 anos, cuja taxa média anual nestas 5 décadas foi de 6,58%, teria hoje 24.200 USD. Se tivesse escolhido aceitar a volatilidade do mercado, tivesse paciência e investisse os mesmos 1000 USD em ações da empresa do Senhor Warren Buffett, teria hoje 18.262.630 USD.
Dito de outra forma, o investimento feito pelos restantes acionistas na empresa de Warren Buffett no momento em que Buffett assumiu o comando, teria sido 754 vezes superior ao investimento "seguro" em Obrigações do Tesouro. Este é o verdadeiro efeito bola de neve e, devido a ele, Warren Buffett é hoje o segundo homem mais rico do mundo.
A maioria dos agentes do negócio do investimento não pode olhar para o longo prazo. Existem muitos conflitos de interesses que impedem a tomada das melhores decisões para os seus clientes. No Governo de um país, da mesma forma, precisamos desesperadamente de líderes que deixem de dizer aquilo que queremos ouvir, que ponham de lado as divisões partidárias e que nos peçam para fazer as escolhas difíceis e enfrentar os problemas imediatos e os, aparentemente irresolúveis, problemas de longo prazo - mesmo que isso lhes custe o cargo nas eleições seguintes. Face a face, a maioria dos políticos diz as coisas certas. Juntem-se, porém, vários políticos na mesma sala e nada resulta. Obviamente, é necessária uma liderança forte.
Os melhores investimentos têm uma Margem de Segurança considerável. Este é o conceito de Benjamin Graham - comprar activos com um desconto tal que até o azar ou as vicissitudes do ciclo do negócio não conseguem descarrilar o investimento. Tal como se constrói uma ponte que suporta 30 toneladas mas só lá circulam camiões de 10 toneladas, também não podemos permitir que o resultado dos nossos investimentos dependa do acerto de todos os nossos pressupostos, que o mercado nos ajude, enfim, que tudo corra bem.
O mesmo princípio aplica-se às economias locais e nacionais. Se construirmos uma economia como um castelo de cartas, ela eventualmente implodirá. Se nos endividarmos em excesso, se acumularmos enormes défices sem fim à vista, se fizermos promessas impossíveis de cumprir ou se nos tornarmos cada vez mais dependentes da beneficência estrangeira para nos mantermos acima da linha de água, não temos uma Margem de Segurança. As coisas podem arrastar-se mais um bocado mas o desregramento acaba por nos apanhar.
Embora os cofres de um país não estejam habitualmente cheios de dinheiro - os políticos não o permitem - levar o endividamento ao limite é mais uma erosão da Margem de Segurança nacional. A capacidade de endividamento não utilizada é uma espécie de fundo de emergência. Hoje, os mercados podem estar optimistas e uma dívida de 127% do PIB é possível; amanhã, 60 ou 70% é o limite e quem ultrapassar este limite está em apuros. Hoje a taxa de juro que nos é exigida para nos emprestarem dinheiro pode ser de 2%. Amanhã, o volátil Sr. Mercado pode exigir 6% - em 2011 exigiu 16%. Em tal ambiente, todos sabemos agora, não seríamos capazes de emitir dívida e por isso, fomos na altura, intervencionados pela TROIKA.
Invista com Margem de Segurança
Não desejaríamos que as nossas finanças pessoais fossem tão precárias, com a falência a um dia mau de distância. É por isso que, individualmente, poupamos para o futuro e fazemos seguros. Nenhum investidor racional quer depender da oração ou de uma intervenção divina para a sua viabilidade futura. Arrumar a casa e construir uma Margem de Segurança adequada demora tempo. Por isso os investidores devem começar já a investir com uma estratégia de décadas e a fazê-lo com Margem de Segurança confortável.
Os investidores profissionais, que gerem o dinheiro alheio, não conseguem aguentar quando o mercado está a subir e eles ficam para trás. Mesmo quando os preços se tornam absurdos, são incapazes de ter dinheiro disponível e esperar pacientemente. Precisam de acompanhar o mercado e quando ficam para trás, ficam desorientados. Fazem coisas loucas para apanhar o mercado, incluindo alavancar as posições para espremer mais um retorno extra, comprar ativos mais arriscados e a preços superiores ao seu real valor. São atraídos pelo que tem subido e compram mais e vendem o que tem tido pior performance relativa.
Esta é a forma como funciona a "indústria" de fundos de investimento. Os fundos que tiveram melhor performance no último mês são os que vão conseguir angariar mais clientes para os próximos tempos. É a partir destes números que a banca de retalho vai seleccionar os fundos a vender aos seus clientes. A tecnologia torna possível que a performance de um gestor seja avaliada, não apenas anual, trimestral e mensalmente, mas também diariamente.
Se os seus resultados vão ser avaliados no curto prazo, se gerem um fundo e a sua performance vai ser publicada num jornal todos os dias, se o seu track record vai ser avaliado por comités de investimento todos os meses, se corre o risco de perder clientes e até o seu emprego devido a uma má performance de curto prazo, então o longo prazo torna-se completamente irrelevante.
Na realidade, diversos estudos comprovam que o que subiu recentemente pode vir a ter performances piores no futuro e o que está a comportar-se pior actualmente terá melhores performances no futuro. Infelizmente, este pensamento contrário não abunda nas instituições financeiras. As pressões de curto prazo e a compulsão quase universal para seguir o mercado dão origem a muitas bolhas. Nas palavras do famoso economista, John Kenneth Galbraith: "Uma bolha tem origem nos preços que sobem, quer sejam de acções, imobiliário, peças de arte, etc. Uma subida nos preços atrai a atenção de mais compradores que empurram os preços para níveis ainda mais altos".
Richard Fuscone versus Grace Groner
Li recentemente a "história financeira" de dois investidores muito diferentes.
Richard Fuscone, um tipo brilhante que teve uma carreira extraordinária em Wall Street. Fuscone licenciou-se em Dartmouth e fez um MBA na Universidade de Chicago. Subiu a pulso nas fileiras da alta finança e tornou-se Executive Chairman das Americas na Merrill Lynch. Chegou a integrar uma lista de "40 abaixo de 40" executivos de sucesso na Crain's, uma das mais prestigiadas publicações financeiras americanas.
Fuscone reformou-se em 2000 para se dedicar a "interesses pessoais e filantrópicos". David Komansky, ex-CEO da Merrill Lynch elogiou a "sua competência, capacidade de liderança e integridade pessoal". Fuscone é o tipo de pessoa que qualquer jovem interessado em finanças admiraria.
A outra pessoa é Grace Groner, que nasceu em 1909 no Illinois, Estados Unidos. Orfã desde os 12 anos, nunca casou. Iniciou a sua carreira durante a Grande Depressão. Trabalhou 43 anos na mesma empresa como secretária. Vivia numa casa modesta e comprava roupas usadas. Nunca teve um carro.
Fuscone pediu protecção contra credores em 2010 para evitar que a sua mansão com 11 casas de banho, duas piscinas, dois elevadores e garagem para sete automóveis fosse penhorada pelo banco. Isto aconteceu após ter sido obrigado a vender a casa de férias na Florida.
"Toda a minha carreira foi na indústria de serviços financeiros e a crise financeira causou a devastação total nas minhas finanças pessoais. Actualmente, não tenho qualquer rendimento" declarou Fuscone no pedido de falência".
Meses antes, Grace Groner faleceu. Tinha 100 anos de idade. Os amigos mais próximos ficaram chocados ao descobrir que ela tinha deixado uma fortuna, avaliada em cerca de 7 milhões de dólares, à universidade onde tinha estudado, com o objetivo de financiar bolsas de estudo. Em 1935, Grace comprou 3 acções da empresa onde trabalhava, Abbott Laboratories, por 180 dólares; nunca as vendeu e reinvestiu sempre os dividendos recebidos. Ao longo da sua vida, através do seu advogado, fazia doações para os mais necessitados da sua área de residência. Viajou pelo mundo.
Não existe um cenário plausível em que uma secretária de uma empresa farmacêutica poderia vencer LeBron James num jogo de basquetebol ou operar um cérebro melhor do que um neurocirurgião. No entanto, essa mesma secretária pode fazer muito melhor que um gigante de Wall Street. Estas histórias são fascinantes porque não acontecem em mais nenhuma área a não ser as finanças.
Se alguém nos pedir para gerir o seu dinheiro com o objectivo de conseguir um lucro rápido nos próximos seis meses ou um ano, não saberíamos como consegui-lo. Que poderíamos nós fazer para atingir este objectivo? Trabalhar mais, pensar mais depressa, fazer mais transacções, adivinhar as cotações de amanhã?
Infelizmente, os horizontes de investimento, essenciais para ter sucesso, são muito difíceis de conseguir para aqueles gestores de dinheiro cujos resultados de curto prazo ditarão se eles estarão em actividade no longo prazo.
Estes gestores profissionais não conseguem investir com Margem de Segurança, relaxam os padrões de exigência - quer na qualidade dos ativos a investir quer no preço a que os compram - e criam uma nova tese de investimento na qual eles próprios conseguem acreditar. Depois, é só convencer os clientes prometendo bons retornos com base no que aconteceu no último mês ou meses.
Contudo, os investidores não sabem que ativos estão nestes fundos, se estão baratos ou caros, se são seguros ou não, onde estão depositados ou quem os gere. A maioria dos gestores profissionais, nos fundos que gerem, não conseguem, desde há longos anos, igualar a performance do mercado. A principal razão são as comissões, a diversificação exagerada e o excesso de concentração no curto prazo.
Da mesma forma que não consumimos tudo o que poderíamos consumir e a maioria não atinge o limite do cartão de crédito porque queremos estar preparados para futuras eventualidades e conjunturas menos favoráveis, não devemos investir sem Margem de Segurança. Só assim estamos preparados para futuras eventualidades e conjunturas desfavoráveis. Muitas das decisões que um investidor tem que tomar no dia-a-dia são apenas decisões de bom senso.
O número acima é um dos milhares que pode observar, num dia, se consultar o site do fundo do petróleo da Noruega em www.nbim.no. Os últimos 6 dígitos do número que aparece no ecrã do computador são impossíveis de escrever sem que tenham já mudado várias vezes ao segundo e refletem o valor de mercado dos ativos do maior fundo soberano do mundo.
A Noruega descobriu o primeiro campo de petróleo em 1969. O Fundo de Pensões Global do Governo Norueguês, como é oficialmente conhecido, foi formalmente criado em 1990 com o nome Fundo do Petróleo e com o objetivo de gerir a riqueza do petróleo norueguês de uma forma sustentável e de longo prazo. A ideia original por detrás da sua criação tinha duas vertentes: em primeiro lugar, o Fundo serviria como um veículo de poupança de longo prazo que procurasse garantir o rendimento de um recurso não renovável através da diversificação num vasto portfólio de títulos internacionais. Existe uma obrigação ética de partilhar a riqueza dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de milhões de anos, com as gerações futuras.
Em segundo lugar, o Fundo seria um mecanismo que isolaria a economia norueguesa da chamada "doença holandesa" ou a "maldição dos recursos naturais". A experiência de outros países demonstra que o súbito aumento na riqueza de recursos naturais pode inflacionar os preços domésticos e as taxas de câmbio, fazer diminuir a competitividade internacional e resultar num processo de desindustrialização. Uma outra consequência potencial é que este enorme recurso de capital pode desincentivar os cidadãos de trabalhar e desenvolver o seu potencial humano.
Disciplina Fiscal
O Fundo incentiva a disciplina fiscal no orçamento do governo. Em tempos de abundância, menos de 4% do Fundo é gasto; em tempos de crise, mais de 4% é gasto para contrabalançar o ciclo económico. O compromisso de longo prazo à regra dos 4% impede o governo de exagerar nos gastos. Tendo em conta a dimensão do Fundo, mesmo este nível de gastos pode ser excessivo e o banco central da Noruega tem vindo a advertir que o gasto de 4% pode vir a tornar-se muito grande.
O mandato do Fundo é maximizar o poder de compra internacional, tendo em conta níveis aceitáveis de risco. O Ministério das Finanças é responsável pela sua gestão de longo prazo. O Norges Bank Investment Management (NBIM) - uma unidade autónoma dentro do Norges Bank, o banco central - gere os ativos de acordo com as linhas mestras traçadas pelo Ministério. O NBIM gere também as reservas de moeda estrangeira do banco central.
Transparência
No site pode ler-se "gerimos o fundo em nome do povo norueguês - atual e futuras gerações. Dependemos da confiança para cumprir com a nossa missão, por isso procuramos ser um gestor de investimentos profissional, transparente e responsável".
A transparência é sublinhada pela extensa lista de publicações disponíveis nos websites do Ministério das Finanças e do NBIM e os retornos do Fundo são publicados mensalmente. O Ministério fornece ao Parlamento relatórios detalhados que incluem informação acerca dos retornos no investimento, estratégia e implementação das regras éticas. O Norges Bank publica relatórios financeiros trimestrais e uma listagem anual de todos os seus investimentos, incluindo a dimensão e poder de voto. De facto, o NBIM fornece muito mais informação do que qualquer outro fundo soberano ou fundo de pensões do mundo.
O efeito bola de neve
A primeira transferência de fundos verificou-se em 1996, na altura o equivalente a 300 milhões de dólares. Hoje, dia 25 de novembro de 2014, o fundo tem um valor de mercado de cerca de 872 mil milhões de dólares e o seu beneficiário final é o povo da Noruega. A política de investimentos foi caminhando no sentido de uma maior exposição às ações: até 1998, o fundo investia apenas em obrigações governamentais.
Em 25 de junho deste ano, comunicaram que a alocação a ações passaria a ser de 70%, reforçando assim os investimentos na classe de ativos que melhor remunera os investidores.
O horizonte de investimento alargado permite implementar uma estratégia de investimento de longo prazo e torna o Fundo mais tolerante à volatilidade de retornos e a perdas potenciais de curto prazo do que a maioria dos investidores. Isto permite-lhe focar-se preferencialmente em investimentos em ações.
Estratégia de Investimento
A estratégia é baseada em várias convicções: a convicção de que o mercado é essencialmente eficiente; um compromisso na diversificação; um foco nas ações; um benchmark claramente articulado; seleção e monitorização cuidada dos gestores de ativos (internos e externos ao NBIM), especialmente para ativos menos líquidos; e um compromisso no investimento responsável. Este último é fundamental no sistema de valores do Fundo. O Fundo deve ser gerido com vista a conseguir bons retornos para o benefício das gerações futuras e deverá haver respeito pelos direitos fundamentais de quem é afetado pelas empresas em que o Fundo investe. Estas atividades refletem a convicção de que, dado o longo horizonte de investimento, ter em conta estes fatores conduzirá a resultados financeiros mais sustentáveis a longo prazo.
Performance/Escrutínio
O comportamento e performance dos fundos soberanos têm vindo a ser alvo de escrutínio especialmente desde a crise financeira de 2008. As variações da coroa norueguesa não têm impacto no poder de compra internacional do Fundo e o Fundo não faz a cobertura de risco para as variações na sua moeda. Desta forma, os retornos são apresentados numa moeda internacional, baseada na combinação ponderada de 35 moedas.
Em várias ocasiões, a gestão do fundo foi questionada pelo povo, sobretudo como consequência de correções substanciais nos preços das obrigações em 2007 e das ações em 2008. O fundo caiu globalmente cerca de 24%. Apesar da enorme pressão pública, o ministério da Finanças e os gestores do fundo mantiveram-se focados no valor desses investimentos e em 2010 o valor do fundo era já consideravelmente superior a 2008.
Uma comunicação clara das performances passadas, particularmente em períodos menos positivos, deverá ajudar. O público recordar-se-á durante a próxima crise que dar atenção aos pedidos populares para fechar posições em 2008 teria resultados muito negativos. Desde a sua incepção, o Fundo tem vindo a aumentar o seu perfil de risco e, até esta altura, o país beneficiou desta rejeição de reações de curto prazo a performances adversas.
No final de 2013 o fundo tinha a seguinte composição: 61,7% investido em ações (com retorno de 26,3%), 37,3% investido em obrigações (com rentabilidade de 0,1%) e 1,0% investido em imobiliário (com um retorno de 11,8%). Globalmente, o fundo obteve uma remuneração anual de 15,9%.
Em julho passado, os gestores do fundo comunicaram ter sido aumentado o investimento em ações para 70% dos ativos do fundo.
Pode o fundo de petróleo servir realmente como modelo para investidores particulares?
O Modelo Norueguês e a filosofia que lhe está subjacente, é adequado para a maioria dos investidores. Enquanto que o Modelo da Universidade de Yale, investe em ativos menos líquidos e sem cotação pública observável, o Modelo Norueguês tem assentado sobretudo na estratégia também conhecida por 60/40 e que permite alocar 60% a ações cotadas em todo o mundo e 40% em obrigações:
1- a performance histórica dos investimentos em ações, a classe de ativos que melhor remunerou o capital nos últimos 116 anos,
2- o custo mais baixo de investir em ativos cotados em bolsas organizadas e com grande liquidez,
3- a menor probabilidade de haver problemas de "agência" quando os ativos têm um valor no mercado todos os dias, reflectindo com total transparência perdas e ganhos. Estes ativos são custodiados em instituições financeiras sólidas e todos os dias, a qualquer hora, é possível saber o seu valor e transformá-los em dinheiro.
Da mesma forma que é transparente para 5 milhões de Noruegueses, é-o para investidores particulares. Devidamente informados e conhecedores dos verdadeiros riscos associados com estes investimentos, os investidores podem colher os seus extraordinários benefícios: desde logo, retornos acima da média, maior diversificação e grande liquidez que permite, no fim de contas, o acesso imediato ao dinheiro se, efectivamente, ele fizer falta.
Em 2011, o Ministro das Finanças norueguês realçou a importância do Fundo numa apresentação ao Parlamento: "os resultados dos últimos anos mostram que as enormes perdas incorridas durante a crise financeira foram mais que compensadas pelos ganhos conseguidos na subida de mercado subsequente. Uma razão importante foi o facto de nos termos mantido fiéis a uma estratégia de longo prazo". O Ministro sublinha o facto de não bastar seguir a estratégia certa, é essencial mantermo-nos fiéis a ela durante os momentos maus.
Por isso, o verdadeiro Investidor em Valor não escolhe estar dentro ou fora do mercado nesta ou naquela altura. Para colher retornos acima da média no mercado financeiro, é preciso ter assento permanente. O resultado está à vista.
"Já trabalho com o Warren (Buffett) há tanto tempo, que julguei que seria apenas uma nota de rodapé"
Estas foram as palavras de Charlie Munger quando a revista Forbes, em 1993, o incluiu, pela primeira vez, na lista dos americanos mais ricos.
Por detrás da extraordinária história da Berkshire Hathaway, estão dois génios financeiros: o reconhecidíssimo Warren Buffett e o seu sócio "silencioso", Charles Thomas Munger, que aprecia este seu afastamento da ribalta. Desde 1964, quando Warren Buffett e, alguns anos depois, Munger, assumiram a gestão da Berkshire, o seu valor de mercado aumentou de 10 milhões de dólares para 367,6 mil milhões; ou seja, 36.761 vezes. Os acionistas da Berkshire tiveram, desde o início, uma rentabilidade anualizada de 22,89%. Por outras palavras, 1000 dólares investidos na Berkshire em 1964 valeriam hoje 36,7 milhões de dólares.
Tal como Buffett, Munger nasceu em Omaha, no Nebraska. Licenciou-se em direito em Harvard e iniciou a sua vida profissional como advogado na Califórnia. Antes da sua ligação a Buffett e aos destinos nas Berkshire, Munger, que completou 91 anos no dia 1 de janeiro, conseguiu ganhar 19,8% ao ano para os seus clientes ao longo de treze anos, o que demonstra a sua capacidade individual como investidor.
"Um excelente negócio comprado ao preço justo é superior a um negócio razoável comprado barato"
Warren Buffett declarou em muitas ocasiões que o grande contributo de Charlie, como é conhecido, foi levá-lo na direção de não procurar apenas pechinchas, mas antes, a importância de comprar um excelente negócio ao preço justo como a essência de criação de valor a médio e longo prazo. Um negócio razoável irá sempre multiplicar o investimento a taxas medianas enquanto que um negócio que rentabiliza os capitais a taxas excecionais, comprado ao preço justo, com horizonte de investimento longo, terá um efeito multiplicador impressionante.
Segundo Munger, "o jogo do investimento consiste em tentar fazer melhores previsões que os outros. Como conseguimos fazer isso? Uma das formas é limitarmos as tentativas às nossas áreas de competência. Se tentarmos prever o futuro de tudo, vamos falhar devido à falta de especialização."
O processo de avaliação de investimentos de Munger
A primeira regra é ver uma ação como a propriedade de um negócio e avaliar a qualidade durável do negócio quanto às suas vantagens competitivas. É importante procurar mais valor, em termos de cash flows descontados, do que o que estamos a pagar no momento da compra. A segunda é atuar apenas quando se tem vantagem, isto é, quando as probabilidades estão largamente a nosso favor. É fundamental mantermos a disciplina e aguentar a turbulência e, após um período de vários anos, colhemos os frutos.
Checklist para escolher as empresas onde investir:
1º negócios que sejamos capazes de entender.
2º o negócio deverá ter características intrínsecas que lhe conferem uma vantagem competitiva durável.
3º preferimos que os gestores da empresa tenham integridade e talento.
4º finalmente, por muito boa que a empresa seja, não vale um preço infinito. Temos, portanto, que ter um preço que faça sentido e que nos permita uma margem de segurança contra as vicissitudes normais da vida.
Na opinião de Munger, a razão pela qual estas ideias não se espalharam mais rapidamente é porque são demasiado simples.
Sobre Margem de Segurança
A margem de segurança está sempre dependente do preço que pagamos quando fazemos o investimento. Se pagarmos pouco, a margem de segurança é grande; se pagarmos muito, poderemos não ter nenhuma. Munger sugere que se siga o princípio da construção das pontes: as pontes são projetadas pelos engenheiros com um sistema de backup e capacidade extra para prevenir possíveis falhas ou algo que corra mal. As estratégias de investimento devem seguir o mesmo princípio.
O Círculo de Competências
A sua abordagem ao investimento é melhor resumida por Thomas Watson, fundador da IBM: "não sou um génio, sou inteligente em determinados pontos e mantenho-me perto desses pontos".
Munger conhece bem o seu círculo de competências. De forma a manter-se dentro destes círculos, aplica, em primeiro lugar, um filtro com o objetivo de limitar os seus investimentos apenas a candidatos simples e compreensíveis. Como ele próprio declara, "no investimento, temos três categorias: sim, não e é demasiado difícil de entender". Para identificar potenciais "sim", procura um negócio dominante e fácil de compreender que consiga manter-se e singrar em todos os ambientes económicos. Compreensivelmente, poucas empresas sobrevivem a esta análise. Muitas empresas, favoritas de muitos investidores, tais como biofarmacêuticas e tecnológicas, seguem diretas para a categoria de muito difícil de entender. Negócios altamente publicitados e OPV's merecem um não imediato. Aquelas empresas que sobrevivem a esta primeira monda são agora sujeitas aos filtros do modelo mental de Charlie. O processo é intenso mas eficiente.
Ao longo desta avaliação exaustiva, Munger não depende de bases de dados. Leva em consideração todos os aspetos relevantes, internos e externos, da empresa e da respetiva indústria mesmo que eles sejam difíceis de identificar, medir ou reduzir a números. Encara os relatórios financeiros e a contabilidade subjacente com uma dose de ceticismo típico do midwest americano: são apenas o início da avaliação do valor intrínseco. A lista de fatores adicionais que examina é aparentemente interminável e inclui elementos tais como o clima regulatório atual e futuro; as relações entre a empresa, trabalhadores, fornecedores e clientes; os impactos potenciais de alterações tecnológicas; as forças e vulnerabilidades competitivas; o poder de fixar preços; escala; impactos ambientais e, extremamente importante, a presença de "exposições escondidas" e que vulnerabilizam a posição da empresa.
O Processo de Aprendizagem
"Não conheço ninguém que tenha aprendido, com grande rapidez, a ser um grande investidor. Warren ampliou muito o seu círculo de competências e é melhor investidor no período em que eu o conheço, e eu também. O segredo é aprender sempre. Temos que gostar do processo de aprendizagem.
Se queremos ser investidores, iremos fazer alguns investimentos onde não temos toda a experiência necessária. No entanto, se continuarmos a melhorar aos poucos, ao longo do tempo, começaremos a fazer investimentos que, quase garantidamente, terão desfechos favoráveis. A chave é a disciplina, trabalho e experiência. É como jogar golfe, temos que praticar. Se não aprendermos continuamente, seremos inevitavelmente ultrapassados.
Vejo constantemente pessoas que têm sucesso na vida e não são as mais inteligentes ou até as mais diligentes. São, no entanto, autênticas máquinas de aprender. Todos os dias se deitam um pouco mais sábias do que quando se levantaram e isso ajuda muito, principalmente quando se tem muitos anos à frente.
A aquisição de sabedoria é um dever moral. Não é apenas algo que fazemos para avançar na vida. O corolário desta proposição, que é bastante importante, é que ficamos viciados na aprendizagem perpétua. E sem esta aprendizagem perpétua, não teremos grande sucesso. Não chegaremos longe com base naquilo que já sabemos. Vamos avançar na vida com aquilo que vamos aprender todos os dias".
"Ter consciência do que não sabemos é mais importante do que ser brilhante"
Custo de Capital e Custo de Oportunidade
Quando questionados na última Assembleia Geral da Berkshire sobre o custo de capital, Buffett responde assim: "Charlie e eu não sabemos qual é o nosso custo de capital. Isto é ensinado nas universidades mas somos cépticos. Apenas tentamos fazer a coisa mais inteligente com o dinheiro que temos disponível. Nunca vi um cálculo de custo de capital que fizesse sentido para mim. Charlie?
Munger: Nunca. Segundo os manuais de economia, as pessoas inteligentes tomam as decisões com base no custo de oportunidade - por outras palavras, são as alternativas que são importantes. É assim que tomamos as nossas decisões. Obviamente que o capital não é gratuito. Mas os teóricos dizem que se estivermos a gerar um retorno no capital de cem por cento, não devemos investir em algo que gera apenas oitenta. Loucura!"
Sobre o Valor das Previsões
"As pessoas sempre desejaram que alguém lhes revelasse o futuro. Há muito tempo, os reis contratavam pessoas que liam as entranhas das ovelhas. Há sempre um mercado para as pessoas que fingem que sabem o futuro. Prestar atenção aos oráculos dos dias de hoje é tão irracional como o rei que contratava o sábio que lia os intestinos da ovelha. Isto acontece uma e outra vez".
Nas assembleias gerais da Berkshire Hathaway, Warren Buffett e Charlie Munger, sentados a uma mesa no centro do palco do Century Link em Omaha, respondem a perguntas dos acionistas ao longo de cerca de 6 horas. Warren Buffett é o primeiro a responder e de seguida passa a palavra a Charlie. A intervenção mais frequente é: "nada a acrescentar". Ao contrário, eu teria muito mais a acrescentar sobre um Senhor cuja sabedoria continuará a beneficiar os que a levam à prática. Deixo uma das citações mais importantes para criar valor no mercado de capitais:
"O investimento exige muita gratificação adiada. É essa espera que nos ajuda como investidores e muitas pessoas não aguentam esperar. Se não nascermos com o gene da gratificação adiada, temos que trabalhar muito para ultrapassar esse obstáculo".
Este ano, voltámos a Omaha, Nebraska, para ouvir Warren Buffett e Charlie Munger na Assembleia de Acionistas da Berkshire, onde estiveram presentes mais de 40 mil acionistas entre os quais conceituados investidores em valor com 3 e 4 décadas de resultados consistentes.
As credenciais para acesso ao Century Link tinham a seguinte mensagem:
"Celebrando 50 Anos de uma parceria rentável"
Esta devia ser a grande mensagem da Assembleia deste ano: os acionistas da Berkshire são os grandes beneficiários do investimento que fizeram. Este é na sua essência o capitalismo dos donos que gera um circulo virtuoso: criar riqueza para todos e quem o faz é devidamente recompensado por isso.
Infelizmente, o mundo é como é, e não como deveria ser, e esta não é a prática geral dos mercados financeiros.
Na sua carta aos acionistas de fevereiro passado, Warren Buffett recomenda um livro com o título que dá o nome a este artigo "Where are the Customers Yachts?", de Fred Schwed Jr. O autor do livro, escrito em 1940, começou a trabalhar em Wall Street em 1927 e, passados alguns anos, mudou de vida. A sua visão de Wall Street, retratada com humor, é arrasadora. O que Schwed faz neste livro é capturar completamente - numa linguagem enganadoramente simples - a loucura que se encontra no centro do negócio dos investimentos: a crença generalizada que existe alguém que nos consegue dizer como transformar, depressa, pouco dinheiro em muito.
Schwed diverte-se mais do que se indigna:"O corretor influencia o cliente com o seu conhecimento do futuro mas só depois de se convencer a si próprio. O pior que pode ser dito do corretor é que ele quer desesperadamente convencer-se e que por isso consegue convencer-se - de forma geral, mal".
Jason Zweig, colunista do Wall Street Journal, escreveu o prefácio da última edição, publicada em 2006. Segundo ele, "os nomes e os rostos e a maquinaria de Wall Street são completamente diferentes do tempo de Schwed mas o jogo mantém-se inalterado. O investidor individual continua situado no fundo da cadeia alimentar, um minúsculo plancton num oceano de predadores".
Schwed apresenta de forma soberba a diferença entre investir e especular: especulação é um esforço, provavelmente sem sucesso, de transformar pouco dinheiro em muito. Investimento é um esforço, que deverá ser bem sucedido, de impedir que muito dinheiro se transforme em pouco.
Hoje, tal como na altura de Schwed, as pessoas que tentam enriquecer depressa continuam a insistir em chamar-se, a si próprias, investidores - ainda que sejam claramente especuladores. Os computadores e o trading online não fizeram nada para melhorar as probabilidades de sucesso.
A Paixão pelas Profecias
A origem de Wall Street foi uma árvore onde compradores e vendedores se encontravam. Essa árvore cumpria a função de mercado; era um local que todos conheciam e onde iam para fazer negócios. Criou-se um conjunto de procedimentos que regulavam as transacções. Em breve, porém, os corretores adicionaram o negócio da profecia ao negócio da corretagem.
Quanto mais previsões forem feitas, mais negócios se fazem e mais comissões se podem cobrar. Até porque vão estar erradas e será "necessário corrigir a situação". Isto acontece uma e outra vez, ....
O croupier da mesa de roleta não diz que consegue adivinhar a ordem pela qual os números vão sair. Assegura-se apenas que as apostas são pagas e que a casa não é enganada - um trabalho que requer competência.
É muito difícil, no entanto, encontrar no sistema financeiro alguém que queira ser apenas o croupier, desde o assistente comercial, aos gestores, ao CEO. Os clientes têm o hábito de fazer perguntas acerca do futuro financeiro. Quando se coloca a um gestor de conta ou de dinheiro uma questão difícil, podemos ter a certeza que iremos receber uma resposta detalhada. Raramente recebemos a resposta mais difícil: não sei.
A Família Gotrocks e os "Ajudantes"
Na carta aos acionistas de 2005, Warren Buffett escreve uma parábola muito simples que talvez clarifique a loucura e a pouca produtividade do nosso vasto e complexo sistema de mercado. Apresento aqui um resumo:
Era uma vez uma família abastada chamada Gotrocks, que cresceu ao longo de gerações e inclui agora milhares de irmãos, irmãs, tias, tios e primos, possui 100% das acções dos Estados Unidos. Todos os anos, os Gotrocks colhem as recompensas dos investimentos: a totalidade do crescimento dos lucros que milhares de empresas geraram e a totalidade dos dividendos por elas distribuidos (os Gotrocks adquirem também todos os IPO's emitidos durante o ano). Todos os membros da família enriquecem ao mesmo ritmo e reina a harmonia. O seu investimento compõe retornos ao longo de décadas, criando uma riqueza enorme, porque os Gotrocks estão a "jogar" um jogo de vencedores.
Certo dia, surgem em cena uns "Ajudantes" de falas mansas e convencem alguns primos "inteligentes" que é possível ganhar uma parte maior dos lucros e dos dividendos. Estes Ajudantes convencem os primos a vender algumas acções de umas empresas a outros primos e a comprar acções de outras empresas aos mesmo primos. Os ajudantes intermedeiam as transacções e recebem uma "pequena" comissão pelos seus serviços. A propriedade das empresas é assim reordenada pelos membros da família.
Para sua grande surpresa, contudo, a fortuna da família começa a crescer a um ritmo mais lento. Porquê? Pelo simples motivo de que alguns dos lucros estão agora a ser consumidos pelos Ajudantes. A fatia do bolo que cabe à família - no início - 100% de todos os dividendos pagos e dos lucros reinvestidos nos negócios - começa a diminuir simplesmente porque parte dos retornos está agora a ser consumido pelos Ajudantes.
Para piorar a situação, a família apenas pagava impostos sobre os dividendos recebidos. Agora, alguns dos membros estão a pagar impostos sobre mais valias diminuindo assim a fortuna total da família.
Os primos "inteligentes" rapidamente se dão conta que o seu plano, de facto, diminuiu a taxa de crescimento da fortuna da família. Eles reconhecem que a sua incursão na área de Stock Picking (escolha das melhores ações) foi um fracasso e concluem que precisam de ajuda profissional para poderem escolher as melhores acções.
Assim, contratam especialistas em Stock Picking - mais Ajudantes - para ganharem vantagem face aos restantes primos. Um ano mais tarde, quando a família avalia a sua fortuna, descobre que a sua fatia do bolo diminuiu ainda mais.
Para piorar a situação, os novos gestores sentem-se compelidos a justificar as comissões que cobram e transaccionam as acções da família a um ritmo frenético aumentando, não só as comissões de corretagem pagas aos primeiros Ajudantes, mas também os impostos sobre mais valias. Agora, a antiga fatia de 100% dos dividendos e lucros está cada vez menor.
"Ora bem, tentámos escolher bem as acções sozinhos e, quando isso falhou, não conseguimos escolher os gestores que o fizessem. Que fazemos?" Não satisfeitos com os seus anteriores fracassos, os primos decidem contratar mais Ajudantes. Contratam os melhores consultores de investimentos com o objectivo de os ajudarem a encontrar os melhores gestores que, por sua vez, irão escolher as melhores acções. Os consultores, obviamente, declaram ser capazes de fazer isso mesmo. "Paguem-nos apenas uma pequena comissão pelos nossos serviços", asseguram os novos Ajudantes, "e tudo ficará bem". Infelizmente, a fatia da família diminui outra vez.
Finalmente alarmados, a família reúne-se e tenta compreender a cadeia de eventos desde que alguns primos tentaram ser mais inteligentes que outros. "Como é possível", interrogam-se todos, "que o nosso quinhão original de 100% de todos aqueles lucros e dividendos está agora reduzido a 60%?"
O ancião da família, o tio sábio, responde suavemente: "todo aquele dinheiro pago aos Ajudantes e todos aqueles impostos extra desnecessários saem directamente dos lucros e dividendos da família. Voltemos à casa de partida imediatamente. Livrem-se de todos os corretores. Livrem-se de todos os gestores. Livrem-se de todos os consultores. E assim a nossa família colherá de novo 100% de tudo o que a economia criar, ano após ano.
Seguiram o conselho do velho tio sábio e regressaram à estratégia original: manter todas as acções em carteira e ficar quieto.
No mundo real, não seguiram o conselho do tio sábio. No dia 21 de Maio passado, o Financial Times noticiava na 1ª página a condenação, pelo Departamento de Justiça norte-americano, de 6 grandes bancos por manipulação cambial. Entre dezembro de 2007 e janeiro de 2013, traders do Citigroup, JPMorgan, Barclays e Royal Bank of Scotland, descrevem-se a si próprios como "O Cartel". Utilizavam um chat privado e linguagem codificada com o objectivo de manipular as taxas de câmbio e "aumentar os seus lucros". Loretta Lynch, a procuradora geral americana, declarou: "A multa que os bancos irão pagar - 5,6 mil milhões de dólares - é proporcional ao mal causado. Estas multas devem dissuadir os concorrentes de procurar lucros sem olhar à legalidade e ao bem público".
Embora com uma carreira curta no mundo financeiro, Schwed capta muito bem a sua essência no livro que aqui apresento. O título que escolheu, "Onde estão os iates dos clientes?", segundo se consta tem origem na seguinte anedota:
Num dia de Verão, por volta de 1870, juntou-se um grupo de amigos de um famoso investidor em Newport, Rhode Island, onde admiravam os enormes iates dos corretores mais ricos de Wall Street. Depois de uns momentos, o investidor perguntou secamente: "Onde estão os iates dos clientes?".
A diferença entre Risco e Volatilidade
Há anos, li um artigo de Jason Zweig, colunista do Wall Street Journal e autor de vários livros de investimento, onde contava que, numa conferência de jornalistas, lhe pediram para definir o seu trabalho. Ele respondeu: "o meu trabalho é escrever exatamente a mesma coisa 50 a 100 vezes por ano, de tal forma que nem os meus editores nem os meus leitores pensem que eu me estou a repetir".
Infelizmente, não tenho os mesmos dotes de Jason Zweig e os editores deste jornal e os estimados leitores facilmente se apercebem que digo sempre a mesma coisa. Não o faço apenas por não ser um "Jason Zweig", mas também porque o meu trabalho na Casa de Investimentos é a salvaguarda e a valorização dos patrimónios dos nossos Clientes. A coerência no investimento é determinante para atingir estes dois objectivos.
Ao longo dos últimos anos, nos artigos que escrevemos, nas reuniões com investidores ou potenciais investidores, nunca escolhemos o caminho mais fácil: dizer o que todos dizem nestas circunstâncias e procurar encostar-nos ao "conforto" da multidão, fazendo o que os profissionais de dinheiro fazem. Na crise financeira de 2008/2009 (em que o maior índice americano, S&P caiu 57% e o MSCI - que congrega 23 mercados desenvolvidos - 59%), quando houve o downgrade da dívida americana em agosto de 2011 (com o S&P a cair 21% e o MSCI 25%), o chamado fiscal cliff até final do mesmo ano, (os índices voltaram a cair significativamente), com a crise de dívida soberana na europ a em 2012(o resgate à Grécia, o resgate a Portugal, a dívida Italiana ou Francesa) ou a crise na Rússia e Ucrânia em outubro passado (S&P caiu 9,8% e o MSCI caiu 10,5%), dissemos sempre a mesma coisa. Agora, com a actual situação na Grécia e a falta de acordo com os credores, só podemos dizer e fazer o mesmo:
No investimento, as previsões políticas e económicas de curto prazo são uma distracção muito cara para os investidores. A prazo, as notícias sobre os mercados financeiros serão positivas. O que verdadeiramente importa é a qualidade dos ativos que temos e o desconto a que os compramos do seu real valor. Se investirmos com horizonte de investimento adequado, após ter feito uma análise profunda dos ativos e garantindo que estamos a comprar bom e barato, a disciplina e a paciência para esperar, permitirão obter bons retornos.
Já aqui escrevi que vivemos uma crise de retornos baixos: as taxas de juro, sobretudo na Europa e Estados Unidos, ainda em mínimos historicamente baixos, fazem com que os investimentos de taxa fixa não sejam hoje investimentos a considerar e sejam investimentos muito arriscados e quase sem retorno É nossa convicção que os investidores nesta classe de ativos serão chamados a assumir perdas consideráveis no futuro. Não sabemos quando subirão as taxas e a que ritmo. Sabemos, no entanto, que as taxas de juro foram trazidas para perto de zero para ajudar os países, as empresas e os particulares e recuperarem de excessos de endividamento, que a níveis médios de longo prazo, não seriam suportáveis para a riqueza que estes produzem.
O Problema do Investidor Individual
Os investidores gostam que lhes apresentem uma previsão ou um acontecimento certo. Talvez por isso, têm preferência por investimentos de taxa fixa já que, no momento do investimento, fica definida a data em que será pago o rendimento (juro no caso do depósito a prazo ou o cupão no caso da obrigação) e a data em que vencerá. No caso das obrigações que normalmente têm maturidades muito longas, é fundamental que o investidor tenha consciência que durante este período a solvabilidade do emitente da obrigação (a quem está a emprestar o seu dinheiro) pode alterar-se significativamente e existe o risco de não vir a receber parte dos rendimentos, todo o seu capital ou ter que ser prolongado o prazo de dívida e o seu capital seja devolvido mais tarde. Há ainda um risco, durante o perído em que tem a obrigação, das taxas de juro subirem e ver o seu dinheiro "atado" a um rendimento muito baixo por longos anos .
As obrigações, que também sofrem flutuações de preço, têm menos liquidez do que grande parte das ações em que investimos (com excepção do Tesouro Americano). O exemplo é apresentado no gráfico abaixo, que representa as variações de preço de uma obrigação do Estado Português emitida em 20 de janeiro deste ano e que se vence em 2045. Esta obrigação paga um cupão anual de 4,1% e o Estado Português compromete-se a pagar aos investidores, em 2045, os 2,5 mil milhões de euros que pediu emprestado.
Obrigação do Estado Português a 30 anos
Esta obrigação foi muito falada no mercado no início do ano. Com a queda das taxas de juro de Portugal de longo prazo para perto dos 2%, esta emissão teve uma valorização de mercado de mais de 42,19% até Março. Esta e outras emissões nacionais similares atraíram muitos investidores, que verificaram, desde então, uma correção do valor da obrigação para os níveis iniciais, à medida que as taxas de juro voltaram a recuperar e percepção que os investidores têm do risco do Estado Português voltou a subir.
Obrigação da Berkshire Hathaway, a 20 anos
Aproveitando um contexto de taxas de juro tão baixo na Europa, e a excelente qualidade de crédito a Berkshire, empresa do Sr. Warren Buffett, fez uma emissão em euros em Março passado a 20 anos com um cupão de 1,625%.
O que é um excelente investimento para a Berkshire, não será para os investidores destas obrigações que ficarão nos próximos 20 anos "atados" a um rendimento muito baixo. É muito pouco provável que durante estes 20 anos as taxas de juro se mantenham aos atuais níveis. Por isso, para os investidores, embora investindo numa empresa de excelente rating, este foi um investimento muito arriscado na medida em que, se as taxas de juro continuarem a subir para níveis normais de longo prazo e os investidores quiserem vender, podem ter que aguardar muitos anos para não verificarem perda de capital.
Muitos investidores poderão pensar que com estas obrigações a cotar todos os dias, poderão mais tarde ou mais cedo vender com ganhos. Nesse caso, estão a deixar o seu futuro financeiro à sorte e à probabilidade de encontrarem um investidor mais distraído ou que que não saiba o que está a fazer. Mas, neste caso, esta já se torna uma operação especulativa e sem margem de segurança.
Qual é a diferença entre Risco e Volatilidade?
O que significa realmente Risco? O Senhor Warren Buffett costuma dizer que, no investimento, o verdadeiro risco é não saber o que se está a fazer.
Porque se espera que o cidadão comum consiga tomar todas estas decisões de investimento no seu melhor interesse? Quem está do outro lado, a vender os produtos financeiros, sabe muito mais sobre eles (ou pelo menos deveria saber) e, por isso, parte para o negócio com enorme vantagem. É natural que o Senhor Buffett soubesse que, para muitos anos, estes serão os mínimos das taxas de juro e nada melhor do que contrair dívida neste contexto, com este prazo tão dilatado e com uma taxa de juro inferior à do Estado Português.
O risco inerente a um investimento é a probabilidade de perda permanente de capital.
A volatilidade, variação ou flutuação, é a escolha dos académicos para definir e medir o risco e deve-se ao facto de poder ser quantificável e aplicável nos modelos que os académicos produzem para prever o futuro e explicar as difíceis questões da teoria financeira moderna. Contudo, na prática, esta não é uma boa definição de risco. Ao pensar no risco, procuramos identificar a coisa acerca da qual os investidores estão preocupados e, por isso, exigem uma compensação para a suportar.
Embora muitos investidores temam a volatilidade, as variações de preço, nunca ouvi um investidor queixar-se: "o retorno esperado não é suficientemente alto para justificar esta volatilidade". O que os investidores temem é a possibilidade de perda permanente de capital.
A perda permanente de capital é muito diferente de volatilidade ou flutuação. Uma flutuação negativa - que, como o nome indica, é temporária - não representa um grande problema se o investidor tiver a capacidade de manter as suas posições em carteira até que essa flutuação negativa passe. Uma perda permanente - da qual não há recuperação possível - pode ocorrer por uma de duas razões: primeiro, o investidor vende durante uma flutuação negativa e assume a perda, por falta de convicção, necessidades financeiras ou pressões emocionais . Segundo, o activo onde nvestiu não consegue recuperar por razões fundamentais, porque não tinha a qualidade necessária para suportar esse recuo temporário da economia.
Se comprarmos uma acção por 10 euros e a vendermos por 20 um ano mais tarde, este investimento foi arriscado ou não?
Muitos poderão dizer que não porque o lucro comprova que o investimento era seguro. O académico dirá que era obviamente arriscado uma vez que a única forma de ganhar 100% num ano é assumindo riscos enormes. Pessoalmente, diria que pode ter sido um investimento genial e seguríssimo ou então um "lançamento de dados" que teve sorte.
Os investidores podem (e devem) "aguentar" a volatilidade mas não têm qualquer hipótese de desfazer uma perda permanente de capital.
A única "fórmula" consistente de investimento que conhecemos é o investimento em valor. O investidor individual precisa de fazer duas coisas muito difíceis: ignorar a multidão e ter paciência para que o investimento dê frutos. Segundo neurocientistas e psicólogos, estes são os maiores handicaps que temos que contrariar para ser bem sucedidos. É simples, mas não é fácil.
Porque são diferentes os Investidores em Valor?
Desde o início da gestão, em 15 de Novembro de 2010 até 31 de outubro passado, conseguimos uma rentabilidade acumulada de 80,47%, com carteiras de investimento crescentes. Esta rentabilidade significa uma valorização de 12,63% ao ano. Poderíamos ter feito melhor, sobretudo no último ano e meio. No entanto, fizemos sempre, com a informação disponível na altura da decisão, o que era melhor para os nossos Clientes.
Comprámos quando muitos estavam pessimistas com o mercado acionista, comprámos quando muitos estavam a vender, como em agosto de 2011 com a descida do rating dos Estados Unidos. Pelo contrário, vendemos quando todos estavam a comprar, como aconteceu ao longo do último ano em que vendemos o que havíamos comprado em 2011 e início de 2012. Mantivémos dinheiro parado quando todos estavam mais optimistas e, por isso, mais disponíveis para o aplicar. No passado 24 de agosto e nas semanas seguintes, voltamos a comprar com mais volume e aplicámos grande parte dos valores disponíveis. Fizemos o contrário da maioria, não seguimos a multidão.
O nosso trabalho é comprar a pessimistas e vender a optimistas.
O verdadeiro segredo do investimento é que não tem segredos. Todos os aspectos importantes do investimento foram tornados públicos vezes sem conta, desde 1934, com a primeira edição do livro "Security Analysis". Que tanta gente falhe em adoptar uma estratégia de investimento intemporal e de baixo risco permite, a quem a adopta, ter sucesso consistentemente. São muito poucos os que seguem esta filosofia de investimento, que precisa de tempo e de muita disciplina para ser bem sucedida.
A génese da Casa de Investimentos
Há 9 anos, quando iniciámos a constituição da Casa de Investimentos, fizemo-lo na convicção plena que só assim teríamos independência para fazer a "coisa certa": tomar as decisões que melhor servem os interesses dos nossos clientes. Conscientes de que tínhamos a filosofia de investimento certa, só com independência poderíamos traçar objectivos a médio e longo prazo para criar riqueza. Era necessário que a nossa remuneração pela gestão do dinheiro dos nossos clientes não dependesse do comissionamento gerado pela venda de produtos criados pela "indústria" financeira mundial e vendidos para todos os intermediários financeiros ou das comissões de transação que, a ritmo acelerado, fazem os ativos mudar de dono em menos de um dia.
Nós temos tempo porque somos os donos e os gestores da Casa de Investimentos e quem, no longo prazo, ganha a confiança e respeito - a que atribuímos tanto valor - dos nossos Clientes.
Incomoda-me imenso que num país pobre onde é tão difícil poupar porque os salários são baixos, os impostos muito elevados e a nossa capacidade de criar riqueza diminuída pela máquina do estado, se trate a pontapé o dinheiro das pessoas. É isso mesmo: os últimos 5 anos mostraram que a banca e algumas grandes empresas destruíram muitos milhares de milhões de euros a quem colocou o dinheiro à sua guarda ou investiu nas ações destas empresas. Destruíram anos de trabalho e esforço de poupança e a liberdade de muitos poderem tomar decisões sobre o seu próprio destino.
Esta foi e continua a ser a nossa motivação: criar riqueza para os nossos Clientes, fazê-lo de forma compreensível, confiável e com boas rentabilidades.
O mercado accionista português
Nestes últimos 5 anos, os investidores portugueses que investiram em ações e que, em larga maioria, o fazem em ações nacionais, tiveram perdas muito grandes com os aumentos de capital da banca, a saída dos mercados da Brisa e Cimpor, a falência do Banco Espírito Santo, a destruição de valor da Portugal Telecom/Pharol, etc. O principal índice accionista, PSI20, registou um desvalorização de 17,96% incluindo os dividendos que foram distribuídos. Para além destas perdas, tiveram um elevado custo de oportunidade: 100 mil euros aplicados na Casa de Investimentos, valem hoje cerca de 180 mil euros. Os mesmos 100 mil euros, investidos nas ações do PSI 20, valeriam cerca de 82 mil euros.
Estes valores tão diferentes, mesmo que capitalizados à mesma taxa daqui para o futuro, resultariam em montantes muito diferentes daqui a 10 anos e muito mais a 20 anos. Os 82 mil euros, capitalizados a 12,63%, resultariam daqui a 10 anos em 269 mil e, daqui a 20 anos, em 885 mil euros. Os actuais 180 mil que teriam ganho na Casa de Investimentos, capitalizados à mesma taxa de 12,63% a 10 anos resultariam em 591 mil e a 20 anos resultariam em 1.942 mil euros.
Esta diferença enorme realça a dificuldade de recuperar de perdas, realça o impacto tão negativo que todos estes atores tiveram e terão na vida de quem lhes confiou o dinheiro ou seguiu os seus conselhos ou simplesmente investiu nas empresa que geriam.
Esta diferença enorme realça, sobretudo, a importância de investir numa carteira diversificada de ações de grandes empresas mundiais; as verdadeiras máquinas de criar dinheiro que, ao longo de décadas, estabeleceram e reforçaram vantagens competitivas duráveis - vendendo os seus produtos e serviços em todo o mundo e consolidando balanços em muitas moedas diferentes; que lhes permitem ganhar retornos acima da média, recomprar ações próprias quando as cotações caem, amontoar dinheiro no balanço para aumentarem, ano após ano, os seus dividendos e gerir a sua expansão com grande margem de segurança; para resistirem às conjunturas desfavoráveis, aos ataques da concorrência - que tentará sempre disputar mercados em que os retornos do capital são maiores - e que, depois das crises, recuperam mais fortes e ainda mais ricas. Da mesma forma que consumimos diariamente produtos e serviços produzidos por estas grandes empresas, é também nelas que devemos aplicar as nossa poupanças.
Devemos alocar o nosso dinheiro a quem o valoriza e o protege. Para que isso aconteça, é crucial investir em empresas sólidas e com gente competente e honesta.
Porque são diferentes os investidores em valor?
Apesar da nossa frustração, face aos retornos desde o início deste ano, estamos convictos que os fundamentos económicos positivos das empresas que temos em carteira se reflectirão nos seus preços de mercado e que com tempo, a sua cotação se aproximará do valor intrínseco destes negócios. Na sequência de outros períodos em que os receios macroeconómicos pesaram nos nossos retornos, conseguimos fortes retornos assim que esses receios se aliviaram. Em cada um desses períodos menos positivos, as empresas em que estamos investidos tinham características semelhantes às de hoje: preço/valor abaixo das médias de longo prazo, um crescente número de candidatos a comprar e perspectivas sólidas de crescimento. A nossa abordagem bottom up concentrada produz, historicamente, fortes resultados no longo prazo para os nossos Clientes. No entanto, o caminho para lá chegar não se fará sem solavancos.
A nossa confiança nos resultados futuros está baseada em três princípios fundamentais:
1. A filosofia, testada pelo tempo, do investimento em valor, baseada numa mentalidade de "dono" do negócio para o longo prazo e posta em prática por grandes investidores como Keynes, Graham, Templeton, Buffett e Seth Klarman, mantém-se válida em todo o mundo.
2. A nossa equipa de análise de investimentos tem a capacidade, experiência, disciplina e está alinhada com os interesses dos nossos clientes para aplicar com sucesso o investimento em valor.
3. É nossa forte convicção que as empresas que temos em carteira têm a força competitiva e a capacidade de gestão para fazer crescer o valor por acção. Têm também a margem de segurança entre o preço da acção e o valor da empresa capaz de conseguir retornos atractivos.
O conhecimento da história financeira, da forma como as instituições financeiras operam nos bons e nos maus momentos, o conhecimento da natureza humana e dos seus vieses comportamentais, o conhecimento da teoria financeira e a vontade em continuar diariamente a remover ignorância, permitirão tomar partido das oscilações dos mercados financeiros e da insanidade que de tempos a tempos, toma conta do sentimento da multidão. E isto acontece em todas as classes de ativos e não apenas nas ações.
O mundo do investimento está virado do avesso.
O que é visto como arriscado é quase certamente muito mais seguro do que aquilo que hoje é visto como sólido. Na última carta aos acionistas, Warren Buffett demonstra que, nos últimos 50 anos, o investimento em ações foi, por larga margem, o melhor investimento. O mesmo se verificou nos 50 anos anteriores em que tivémos duas guerras mundiais e a grande depressão. Os investimentos indexados ao dólar (obrigações e depósitos) perderam nos últimos 50 anos cerca de 87% do seu valor. O mesmo aconteceu para a maioria das moedas.
Com as novas regras "bail-in" aprovadas para a banca europeia, que entram em vigor em janeiro próximo, o princípio que se aplica é o da salvaguarda do dinheiro dos contribuintes. Esta lei vem tornar mais arriscados os depósitos a prazo e as obrigações emitidas pela banca. O risco pode vir de todo o lado: de produtos estruturados a partir de dívida, dos fundos de investimento que têm estas obrigações em carteira. Esta alteração tão profunda às regras do passado deveria obrigar os reguladores a uma enorme campanha de sensibilização e "educação" financeira para que cada um esteja mais preparado para se defender.
As folias da natureza humana, que resultam da busca da riqueza instantânea e do lucro sem esforço parecem estar sempre connosco. Enquanto as pessoas sucumbirem a este aspecto da sua natureza, o Investimento em Valor manter-se-á, como tem acontecido nos últimos 80 anos, uma abordagem sensata e de baixo risco ao investimento de longo prazo com sucesso.
Aos nossos Clientes agradecemos a confiança e paciência.
Obrigada.
Quando um gestor com uma reputação brilhante assume a gestão de um negócio com uma má reputação económica, é a reputação do negócio que se mantém intacta
-- Warren Buffett
Porque motivo empregam as empresas de genéricos exércitos de advogados na procura de buracos nas leis de patentes? Porque as grandes empresas farmacêuticas como a Pfizer, Novartis ou Merck são imensamente lucrativas e basta um pequeno sucesso no levantamento de uma patente para que se consigam receitas consideráveis. No final dos anos 90, as empresas de capital de risco financiavam qualquer start-up na área das redes de informática porque a Cisco estava a crescer 40% ao ano com margens operacionais de 25%.
O capital procura sempre as áreas com maior retorno esperado. Os investidores avaliam as empresas procurando aquelas que aumentaram mais os lucros e, quase sempre, assumem que esta tendência se manterá para o futuro. Muitas vezes, as empresas que parecem fantásticas no espelho retrovisor acabam por ter performances mais fracas no futuro. Se uma empresa está a gerar grandes lucros, atrai a concorrência. A natureza básica de qualquer mercado livre é que, quanto maiores forem os lucros, mais forte será a concorrência.
O conceito de vantagens competitivas, ou fossos económicos, é crucial para a forma como analisamos as ações das empresas e o valor que lhes está subjacente. Michael Porter, professor de Harvard, e Warren Buffett foram os pioneiros a estabelecer os princípios da análise da estratégia competitiva e dos fossos económicos. Porter diz que "vantagem competitiva é o coração da performance da empresa em mercados livres" e o seu livro, que trata este assunto, pretende mostrar como uma empresa pode criar e manter as vantagens competitivas na sua indústria e como pode implementar estratégias que as fortaleçam para o futuro. Buffett explica as vantagens competitivas como os atributos que a empresa tem que lhe permite manter os concorrentes à margem. A este conjunto de vantagens competitivas chama-lhe moat, ou fosso, como os que existiam à volta dos castelos medievais para proteger dos inimigos. Ou seja, a empresa cria à sua volta um fosso que lhe permite manter os concorrentes afastados e continuar a beneficiar de lucros acima da média do setor. Certamente que os concorrentes tentarão sempre obter uma parte dessses lucros e, na realidade, a maior parte das vezes, conseguem-no, reduzindo as rentabilidades do negócio.
O que realmente interessa ao investidor em valor é encontrar os negócios com grandes vantagens competitivas e que têm elevada probabilidade de as manter para o futuro. Mais importante do que comprar um negócio razoável em saldo, é comprar um negócio excecional a preços sensatos. O que torna um negócio excecional é o seu poder de criar valor para os acionistas da empresa (através de lucros sólidos e crescentes para o futuro) e para os clientes (através da oferta de valor presente nos serviços e produtos que vende).
Warren Buffett diz que demorou quase 20 anos a compreender este facto: um negócio excecional comporá sempre os retornos, ano a ano, a taxas excecionais. Um negócio razoável, pode ser comprado barato, mas continuará a compor retornos a taxas medíocres. Acrescenta, aliás, que foi o seu sócio, Charlie Munger, que o fez compreender e adoptar esta estratégia ao longo do tempo.
Como podemos avaliar as vantagens competitivas e a sua durabilidade?
Para analisar as vantagens competitivas de uma empresa devemos analisar os últimos 10 anos da sua atividade:
1º Avaliar os lucros históricos e verificar se a empresa tem sido capaz de gerar retornos sólidos nos seus ativos e nos seus capitais próprios. Esta análise permite determinar se a empresa conseguiu construir o dito fosso à volta do seu negócio.
2º Avaliar a origem dos lucros: se a empresa conseguiu retornos sólidos e lucros consistentes, o que impede os concorrentes de lhe "roubar" os lucros?
3º Devemos estimar quanto tempo poderão durar estas vantagens competitivas. Algumas empresa conseguirão fazê-lo durante anos, outras conseguem fazê-lo décadas.
4º Importa analisar a estrutura competitiva da indústria. Como competem entre si as empresas desta indústria? Importa saber se a indústria é atrativa, com muitas empresas lucrativas, ou se é uma indústria em que as empresas lutam pela sobrevivência.
Analisar as vantagens competitivas é uma atividade complexa. O que procuramos são empresas que conseguem lucros em excesso do seu custo de capital - empresas que conseguem gerar substanciais somas de dinheiro relativamente aos investimentos feitos. Para o fazer, usamos algumas métricas, que na realidade são atalhos, que permitem fazer o trabalho de identificação das empresas que têm realmente vantagens competitivas:
1- A empresa gera free cash flow? Se sim, quanto? Às empresas que geram free cash flow sobra dinheiro depois de reinvestirem o que é necessário para manter o negócio a funcionar. Ou seja, este é o dinheiro que pode ser retirado todos os anos da empresa sem danificar o negócio. Se dividirmos o free cash flow pelas vendas (ou receitas) isto diz-nos qual é a proporção de cada euro, ou dólar, em vendas que a empresa é capaz de converter em lucros em excesso. Se este quociente resultar em 5% ou mais, é muito povável que tenhamos encontrado uma máquina de fazer dinheiro e é um excelente sinal de que a empresa tem fosso económico.
2 - Quais as margens líquidas da empresa? A margem líquida é a receita líquida em relação às vendas e diz-nos quantos lucros a empresa gera por euro de vendas. Empresas que conseguem 15% ou mais estão a fazer um bom trabalho.
3 - Que retornos tem no capital próprio (Return on Equity, ROE) ? É a receita líquida em relação aos capitais próprios e mede os lucros relativamente a cada dólar de capital que os acionistas investiram na empresa. Embora com algumas falhas, esta medida é útil como ferramenta para avaliar os lucros globais. As empresas que consistentemente geram 15% ou mais, estão a gerar retornos sólidos com o dinheiro dos acionistas.
4 - Quais são os retornos nos activos, (Return on Assets, ROA)? É a receita líquida em relação aos ativos da empresa e mede a eficiência com que a empresa transforma os seus ativos em lucros. Se a empresa consegue um valor superior a 6 a 7%, poderá ter uma vantagem competitiva face aos concorrentes.
Na análise da empresa e destas métricas, a consistência é essencial, uma vez que é a capacidade de manter os concorrentes afastados durante um longo período de tempo que torna a empresa valiosa. É essencial olhar para um histórico de 10 anos e verificar a consistência dos resultados.
Muitas vezes ouvimos dizer que um ativo vale aquilo que pagarem por ele. Não é verdade. Muitas vezes os ativos cotam preços muito diferentes do seu valor. Uma empresa vale o valor presente de todo o dinheiro que vai ganhar no futuro.
Na Casa de Investimentos, procuramos, na alocação dos valores que nos confiam à gestão, um conjunto limitado de boas empresas cujos negócios subjacentes tenham fundamentos económicos soberbos, que sejam geridas por gestores capazes e honestos e que estejam a transacionar a preços sensatos. Na realidade, não existem muitas centenas de negócios extraordinários e muitos deles transacionam normalmente a prémio. Só em circunstâncias extraordinárias, estes negócios vêm cotar preços que julgamos baratos. É nessas circunstâncias que estamos compradores.
Ao prestar grande atenção à avaliação das empresas, estamos a maximizar o impacto de algo que conseguimos prever (a performance financeira de uma empresa) nos nossos retornos de investimento e a minimizar aquilo que não conseguimos adivinhar (o entusiasmo ou pessimismo de grande parte dos participantes do mercado). Quando compramos uma ação, tudo o que precisamos de saber é que o preço a que compramos é bastante mais baixo que o valor provável do negócio e que seremos largamente compensados com lucros crescente para o futuro.
As empresas apresentadas na tabela são alguns exemplos de empresas com vantagens competitivas. Estes são negócios excepcionais e alguns são investimentos que fizemos no passado. Nunca devemos esquecer no entanto que, por muito boa que seja uma empresa, não vale um preço infinito. Muitos destes negócios estão caros. Isto não quer dizer que não subam. O investidor que os compra hoje está a confiar que haverá no futuro quem os deseje ainda mais.
Valor com muitos anosTítuloFundaçãoCapitalização *Retorno Acumulado %Retorno Anualizado %Johnson & Johnson1887276,833 USD8334,9115,64 desde 1985Microsoft1975369,208 USD63301,3024,80 desde 1986General Electric1878267,717 USD2440,7611,28 desde 1985Walmart1962237,386 USD6988,1315,11 desde 1985Berkshire Hathaway1965348,82 USD6844,0716,66 desde 1987Coca-Cola1886178,722 USD5773,4914,28 desde 1985Total1924108,718 EUR2111,0612,90 desde 1989Procter & Gamble1837222,547 USD4577,6713,45 desde 1985Wells Fargo1852294,843 USD14685,0017,79 desde 1985L'Oréal191994,284 EUR7478,2715,244 desde 1985Nike197296,291 USD66966,8023,77 desde 1985Nestlé1866229,46 USD1326,9810,98 desde 1989McDonald's195594,567 USD5353,4714,00 desde 1985Medtronic1949107,399 USD24659,5019,80 desde 1985BMW191660,566 EUR2083,2114,51 desde 1989Unilever1929122,177 EUR1241,3410,71 desde 1989Louis Vuitton198782,362 EUR1087,4910,18 desde 1989Oracle1977176,257 USD56797,5024,43 desde 19863M190292,261 USD3686,3712,65 desde 1985Heineken186441,679 EUR2595,4313,78 desde 1989Lindt184513,621 CHF2163,9913,00 desde 1989Novartis1758267,297 CHF1607,9911,76 desde 1989*Valores em milhares de milhões
Charlie Munger, sócio há muitos anos de Warren Buffett, aconselha: "Procure mais valor, em termos de cash flow futuro, do que o que está a pagar. Aja apenas quando tiver uma vantagem. É muito básico. Tem que compreender as probabilidades e ter a disciplina de só investir quando as probabilidades estão a seu favor".
As variações entre preços máximos e mínimos observadas dia 24 de agosto são o resultado do trading automático, do uso de instrumentos especulativos e com enorme alavancagem, de milhões de pessoas poderem comprar e vender ativos a partir do seu computador - sem qualquer preparação para o fazer - e da falta de convicção, da maior parte dos gestores profissionais de dinheiro, nas empresas em que investem. Estas atitudes potenciam variações enormes, que se verificam em minutos, como aconteceu. O "entusiasmo" da comunicação social empurra os investidores para más decisões e o factor medo assume o controlo na tomada de decisões.
Por si só, esta volatilidade não significa mais risco. Antes pelo contrário. Com o mesmo valor, podemos comprar uma fração maior da empresa.
Não sabemos a que preços cotarão os mercados na próxima semana ou daqui a um mês ou um ano. Sabemos, no entanto, que a maior parte das maiores e melhores empresas do mundo continuarão a fixar novos records de lucros daqui a 3, 5 ou 10 anos e que os seus acionistas serão largamente recompensados.
Com certeza que os investidores têm razão para estarem preocupados com as empresas excessivamente endividadas, com as empresas com posições competitivas fracas e que hoje estão excessivamente caras. Contudo, não faz sentido terem medo acerca da prosperidade das melhores empresas do mundo, que hoje podemos comprar com descontos substanciais.
Objectivo do nosso trabalho
O nosso objectivo de investimento é o crescimento de capital a longo prazo. Na prossecução deste objectivo, investimos em títulos que acreditamos estarem subvalorizados na altura da compra e que têm potencial de crescimento. O princípio orientador é a consideração das acções como uma fracção de propriedade de um negócio e a sua compra quando o preço a que cotam é baixo relativamente ao valor total do negócio.
Para sabermos o valor do negócio, analisamos profundamente o balanço e o histórico de resultados da empresa nos últimos 10 anos para chegar a uma estimativa do valor fundamental. Investimos maioritariamente em títulos de empresas americanas e europeias. Procuramos negócios com história consistente de criação de riqueza para os accionistas. Gostamos que estes negócios sejam geridos por gestores capazes e com participação no capital da empresa.
Por muito bom que seja o negócio e a empresa, gostamos de comprar a preços sensatos.
A queda no preço das matérias-primas
Há uma década atrás começou a corrida às matérias-primas e foi definida uma nova era: "os preços subirão para sempre". A procura da China, que consome cerca de 50% da produção mundial de metais como o ferro, alumínio ou zinco e a depreciação do dólar americano - a moeda que serve de cotação para quase tudo que é extraído do solo - contribuíram para o boom dos preços. Os especuladores e o sistema financeiro, como sempre, regaram o fogo com gasolina, adicionando todo o tipo de produtos derivados e alavancados, estruturados ou "encapotados", que permitiram criar a bolha e gerar elevadas comissões.
O fortalecimento do dólar e o abrandamento da economia chinesa provocaram uma grande queda nos preços. O índice de 22 matérias-primas compilado pela Bloomberg está a preços de 1999. A recuperação da economia americana não é suficiente para promover preços altos. Hoje, o grande problema para os produtores de matérias primas é o excesso de oferta. Quando os preços caem muito e durante muito tempo, a produção tende a ser reduzida e os grandes produtores compram as empresas mais pequenas e mais alavancadas, vendem ativos não relacionados com o negócio e preparam a próxima década. Nessa altura, que pode ser de largos anos, um novo ciclo de subida de preços recomeça.
Para as empresas transformadoras e para o consumidor final, os preços deprimidos das matérias-primas resultam em aumentos de margens e de poder de compra e não constituem pressão sobre a inflação. Por si só, no mundo desenvolvido, este impacto é positivo.
China
O que é mau para a China não é necessariamente mau para o resto do mundo. Este ano, a economia chinesa deverá crescer 7%, a taxa mais baixa dos últimos 25 anos. O governo chinês tem procurado reorientar a economia do investimento para o consumo. O abrandamento económico chinês, que explica muito da queda de 40% nos preços da matérias-primas, desde o seu máximo em 2011, tem impacto para um pequeno grupo de países exportadores de ferro e minerais. Segundo a empresa Emerging Advisors, as exportações de países desenvolvidos para a China representam menos de 9% das exportações totais desses países. À medida que a economia é orientada para mais consumo, é natural que os países mais ricos sejam os maiores beneficiários dessa transformação. As exportações dos Estados Unidos para a China representam apenas 0,9% do PIB americano.
A correcção no mercado acionista chinês, que desde o início do ano é de 9,5%, tem provocado as mais variadas reações sobre o seu impacto no abrandamento da economia mundial. A verdade é que este mercado tem ainda um peso surpreendentemente pequeno: as ações disponíveis para negociação (free-float) equivalem a 1/3 do PIB do país, enquanto que nas economias desenvolvidas tem um peso superior a 100%. Os ativos financeiros dos agregados familiares investidos em ações são inferiores a 15%. Este é o motivo pelo qual as subidas tão elevadas registadas nos últimos anos nos mercados acionistas contribuiram pouco para aumentar o consumo e as quedas não causarão grandes estragos. Muitas ações foram compradas com crédito e a desalavancagem forçada explica porque razão as iniciativas levadas a cabo pelo governo Chinês não foram suficientes para estancar a sangria. Estes financiamentos representam apenas 1,5% dos ativos totais do sistema bancário chinês. No dia 25 de agosto o PBC, banco central chinês, anunciou a redução das reservas que os bancos deverão manter, libertando liquidez para o sitema bancário e reduzindo as taxas de juro.
As variações cambiais
Nos últimos anos, temos assistido a uma "guerra cambial" entre as principais potências económicas. Esta é a forma mais rápida de dar competitividade à economia de um país, aumentando as suas exportações. No entanto, o valor da moeda de um país tenderá, a prazo, a reflectir os fundamentos macroeconómicos da economia que lhe está subjacente.
Nas últimas semanas, a desvalorização da moeda chinesa, o Yuan, tem motivado correcções consideráveis nas moedas dos países com maiores relações comerciais com a China. No entanto, mesmo depois desta desvalorização, a moeda chinesa continua mais forte do que há um ano atrás, resultando numa depreciação pequena face às moedas com quem tem mais relações comerciais.
O nível das taxas de juro
Os investimentos em taxa fixa continuam a não ser alternativa de rendimento às ações. O que pagam hoje as obrigações de vários países, a prazo, atarão os investidores a rendimentos medíocres para 10 anos ou obrigarão a assumirem perdas para sair destes ativos antes do vencimento. As obrigações a 10 anos do tesouro Americano, pagam 2,16%, o tesouro Alemão paga 0,77% (têm taxas negativas até 4 anos), o Japão paga 0,395%, a França paga 1,13%, a Inglaterra paga 1,9% e o Canadá paga 1,43% e até Portugal emitiu recentemente dívida com yields negativos.
Não sabemos quando nem a que ritmo subirão as taxas no mundo desenvolvido. As economias não registam pressões inflacionistas e a queda nos preços das matérias primas e nos combustíveis permitiram à Reserva Federal Americana manter os níveis atuais de taxas e não ter pressa para subidas abruptas. A economia americana continua a recuperar e está agora a atingir uma situação considerada de pleno emprego - taxa de desemprego a rondar os 5%. A subida das taxas de juro fará subir o apetite por ativos americanos e, potencialmente, tornará o dólar americano ainda mais forte.
O Norges Bank, que gere o maior fundo soberano do mundo, reportou uma perda de 2,2%, no trimestre, na sua carteira de obrigações .
O medo e a ganância
Procuramos estar preparados, financeira e psicologicamente, para as variações do mercado. Em Agosto de 2011, a propósito das quedas de 18% verificadas nos mercados acionistas mundiais, motivadas pelo downgrade da dívida americana, escrevemos no Jornal i "Ignore a Multidão". Ficámos sem liquidez nas carteiras dos nossos Clientes e durante cerca de 2 meses algumas ações que comprámos estiveram a perder vários pontos percentuais. Quase todas essas posições foram vendidas em 2012, 2013 e 2014. As rentabilidades foram excepcionais, como muitos dos Clientes bem recordam e se encontra documentado nos nossos Relatórios e Contas, disponíveis no site.
Em 19 de Setembro do ano passado, escrevi aqui um artigo, "Cash is KING - A dolorosa decisão de manter dinheiro parado". No penúltimo parágrafo dizia o seguinte:
"Ao contrário de 2008 e 2009, hoje achamos que cash is king (dinheiro é rei). Embora não sejamos adeptos de ter dinheiro parado, a estes níveis de mercado, ter liquidez significa poder aproveitar as oportunidades de valor que surjam. A questão não é se, mas quando".
Nas últimas duas semanas as oportunidades de valor têm surgido e ter dinheiro disponível para as aproveitar permitirá retornos mais consitentes e maiores aos nossos Clientes do que se tivessemos seguido a maioria que investe no mercado sem margem de segurança.
Muitos investidores teimam em estar sempre errados nos movimentos extremos de mercado. Haverá sempre uma justificação a posteriori para que grande parte dos investidores institucionais estejam hoje fora do mercado. Quanto mais não seja, estão a proteger o seu posto de trabalho e a sua carreira. Estes são os que ganham muito quando os Clientes ganham alguma coisa.
Nestas ocasiões sabemos que muitos investidores que estão totalmente em dinheiro ou em equivalentes (depósitos a prazo e obrigações) se sentem confortáveis. Não deviam. Estão a optar por um ativo terrível para o longo prazo, que paga quase zero e que deverá perder valor. As políticas seguidas pelos governos mundiais para resolver a crise trarão pressões inflacionistas a prazo e isso acelerará a queda do valor real dos ativos em dinheiro ou equivalente.
As ações conseguirão melhor performance que estes investimentos e seguramente por uma margem substancial. Esperar pelo conforto das boas notícias nos mercados é abdicar duma parte significativa da sua valorização.
Há certamente problemas preocupantes nas economias mundiais. Há sempre incerteza sobre o que será o futuro. Se tudo estivesse bem, não conseguiríamos comprar bons ativos a desconto do seu valor.
Contudo, se os investidores não estiverem no mercado financeiro para correr os 100 metros e estiverem preparados para a maratona, tal como faz um bom empresário, os resultados serão muito satisfatórios.
1. As Convertíveis da Volkswagen
A Volkswagen receberá capital "grátis" graças à maturidade, no próximo mês, de uma obrigação de 3,7 mil milhões de euros. A estrutura desta obrigação não significa que este valor se vai juntar aos problemas financeiros do construtor automóvel. Os portadores desta obrigação, com maturidade a 9 de novembro, serão pagos em ações da VW e não em dinheiro uma vez que as obrigações são obrigatoriamente convertíveis em capital da empresa. Com as ações esmagadas pelo escândalo das emissões poluentes, os investidores receberão ativos com menos valor do que o preço original das obrigações.
Estas obrigações subordinadas foram emitidas com um cupão anual de 5,5% e, na maturidade, o investidor recebe obrigatoriamente ações da Volkswagen ao preço fixado aquando da emissão: 173,40 euros. Esta obrigação chegou a cotar a 150% do valor facial, acompanhando desde a sua emissão a cotação das ações.
As ações a entregar são as preferenciais, que estiveram já a cair 50% face ao preço de conversão. No dia anterior às notícias que davam conta do escândalo na Volkswagen, estas obrigações cotavam a 100,8%. A cotação actual é de 72% e a cotação da acção é de 105,15 euros. Um porta-voz da Volkswagen, Claus-Peter Tiemann, declarou que as condições da dívida se mantêm inalteradas.
Hoje, muitos acham que a marca VW, assim como o seu acesso futuro aos mercados, está comprometida e que as futuras emissões de obrigações serão profundamente escrutinadas pelos investidores. Infelizmente a história mostra-nos uma e outra vez que os investidores se esquecem depressa.
2. Millennium BCP - a conversão de obrigações
Em maio passado, o Millennium BCP propôs aos detentores de duas obrigações a sua conversão para ações. Estas obrigações haviam sido emitidas em setembro e outubro de 2008, com vencimento em 2018. Nos dois casos, os cupões eram variáveis e de cerca de 1,43%.
O Banco propôs aos seus detentores a conversão daquele crédito que tinham sobre o banco em ações BCP, numa altura em que as obrigações cotavam a cerca de 92,5% do valor da emissão e as ações a cerca de 0,0876 euros. Foi proposto como preço de referência para as ações 0,0836. Neste caso, os investidores abdicaram, ao preço de 92,5%, de um yield de 4,09% até à maturidade em outubro de 2018, para terem hoje uma menos valia na ação de mais de 40% face ao valor a que converteram.
Esta operação financeira originou a emissão de cerca de 5 mil mihões de novas ações diluindo mais uma vez os antigos acionistas. Agora, em vez de serem divididos por 54 mil milhões de ações, os lucros do banco serão divididos por 59 mil milhões de ações.
Esta troca de obrigações por ações foi um aumento de capital de mais 9%. O Millennium BCP fez, desde a sua fundação, 34 aumentos de capital, passando de 3,5 milhões de ações para os 59 mil milhões!
3. Abengoa - o excesso de dívida e aumento de capital
Depois da empresa ter anunciado que os bancos concordaram em subscrever um aumento de capital por emissão de novas ações, a maioria das obrigações desta empresa espanhola de energias renováveis, permanece abaixo dos 60% do valor facial. Os investidores da Abengoa não estão convencidos que um aumento de capital bem sucedido possa restaurar a saúde financeira da empresa e receiam que este negócio não seja suficiente para a empresa suportar os mais de 6,5 mil milhões de euros de dívida líquida consolidada.
O balanço muito alavancado da empresa obrigou-a sempre a pagar o dinheiro mais caro para conseguir atrair os investidores. Estas obrigações também foram vendidas pela banca no nosso país, com taxas de juro muito elevadas. Na esmagadora maioria dos casos, é de supor que os clientes da banca que as colocou não foram alertados para o excesso de dívida desta empresa e para o facto destas taxas implicarem riscos elevados.
É natural que os clientes procurem um retorno elevado. Quem não quereria, se fosse possível, uma coisa ao estilo do Madoff, em média 11% ao ano, garantido e sem ter que ver a carteira de investimentos variar muito ao longo do ano? Mas isto não existe. Num "mundo" com taxas de juro próximas de zero, é de esperar que quando alguém paga garantidamente estas taxas, esteja a tentar "manter a cabeça fora da água" ou a incorrer em operações excessivamente arriscadas, que podem ser bem sucedidas, ou não.
Os investidores procuram rendimentos mais elevados para o seu dinheiro agarrados à ideia que uma obrigação é dinheiro garantido. Com tantos exemplos tão maus em que perdem sempre dinheiro, é difícil de entender porque razão continuam a ter disponibilidade para atirar dinheiro para a fogueira, na expectativa que o seu desta vez não arda. É surpreendente porque continuam a confiar nestes "conselheiros".
4. Hedge Funds - o trade que era suposto salvar o ano está a arruiná-lo
Os gestores de hedge funds e de private equity têm estado a investir, ao longo do último ano, em dívida emitida por empresas de energia em dificuldades na expectativa, com a recuperação dos preços de petróleo, de verem o preço das obrigações recuperarem.
Para angariarem montantes consideráveis junto de investidores, venderam-lhes a ideia de que esta era a oportunidade de uma vida. Com a queda continuada dos preços do crude, os prejuízos de muitas destas empresas têm vindo a agravar-se e as empresas mais alavancadas, onde teoricamente os ganhos potenciais poderiam ser maiores, têm provocado grandes perdas a estes investidores. A desvalorização do yuan em Agosto e a queda abrupta das empresas farmacêuticas devido a preocupações acerca dos preços dos medicamentos, têm contribuído negativamente para os resultados alcançados este ano.
"As pessoas foram esmagadas. Foram completamente destruidas" declarou Stephen Schwarzman, CEO do Blackstone Group LP, durante a apresentação de resultados.
As empresas de private equity podem esperar que a turbulência passe uma vez que não têm que devolver o dinheiro aos clientes nos próximos anos. Os gestores dos hedge funds não dispõem desse luxo. Durante anos, os gestores de hedge funds queixaram-se da falta de oportunidades num período de relativa placidez nos mercados. Contudo, agora que a volatilidade está de regresso, poucos foram capazes de aproveitar.
Para além da energia, grandes gestores de dinheiro, como Fortress Investment Group LLC estão a encerrar fundos que estavam em actividade há muito tempo enquanto que outros, como a Greenlight Capital Inc de David Einhorn, registam, este ano, perdas de dois dígitos.
5. Relação entre desemprego e inflação parece ter-se rompido
Os mercados financeiros esperam que as taxas se mantenham historicamente baixas durante os próximos anos. Esta era de condições monetárias pouco convencionais não mostra sinais de terminar. Se os bancos centrais do mundo desenvolvido quiserem regressar à normalidade desejada, o conjunto de ferramentas tradicional pode não ser suficiente.
No curto prazo, os economistas acreditam que o desemprego e a inflação se deveriam mover em direcções opostas: desemprego elevado deveria pesar nos preços e baixo desemprego, com o aumento de salários, deveria aumentar inflação.
Infelizmente, em muitos países esta relação habitual entre desemprego e inflação parece ter-se rompido. Em 2008, o crescimento económico desabou e o desemprego cresceu brutalmente mas a inflação caiu gradualmente para baixo das previsões. Em contraste, agora, o desemprego caiu para níveis extraordinariamente baixos nos Estados Unidos, Inglaterra e na Alemanha e, apesar disso, a inflação mantém-se anémica. Isto confunde os bancos centrais.
É cada vez mais provável que as taxas de juro se mantenham muito baixas nos próximos 3 a 5 anos. Com o aumento de estímulos por parte do BCE, é cada vez mais provável que as taxas negativas das obrigações alemãs possam estender-se até aos 10 anos.
Este é um contexto muito difícil para os investidores ganharem dinheiro em investimentos de taxa fixa. Actualmente o dinheiro é quase de graça. Estas circunstâncias extraordinárias confundem o investidor e levam-no a correr riscos que não serão recompensados.
Cuidado, há muita gente por aí a tentar separá-lo do seu dinheiro.